Jesus foi mais uma vítima do imperialismo romano?

ANDRADE, N. J. Killing the Messiah: The Trial and Crucifixion of Jesus of Nazareth. New York: Oxford University Press, 2025, 296 p. – ISBN ‎ 9780197752487.

Há muito tempo, em uma manhã de primavera em Jerusalém, Pôncio Pilatos julgou um pregador misterioso. Jesus de Nazaré foi pregado em uma cruz logo depois e morreu em agonia. Os efeitos desse veredito repercutiram em todo o mundo e moldaram dois milênios de história. Mesmo assim, o julgamento permanece envolto em mistério até hoje. Os Evangelhos não são claros sobre quais acusações Pôncio Pilatos julgou. Eles retratam Pilatos como abraçando a inocência de Jesus, apesar de tê-lo matado. Ficamos com mais perguntas do que respostas. Por que Pôncio Pilatos condenou um homem que ele acreditava inocente? Qual foi o crime de Jesus? Como devemos entender o papel de Pilatos na execução de Jesus?ANDRADE, N. J. Killing the Messiah: The Trial and Crucifixion of Jesus of Nazareth. New York: Oxford University Press, 2025, 296 p.

Killing the Messiah aborda essas questões e analisa a trajetória que levou Pilatos a decidir crucificar Jesus. Ele determina por que e como Pilatos considerou Jesus culpado de comportamento criminoso e os papéis desempenhados por várias pessoas para garantir a crucificação de Jesus. Ele também investiga como as motivações pessoais e obrigações sociais de Pilatos e outras autoridades afetaram a forma como avaliaram a criminalidade de Jesus. Para fazer isso, ele situa o julgamento de Jesus dentro do contexto geopolítico do Oriente Médio romano. Nas décadas anteriores à vida de Jesus, e ao longo dos séculos que se seguiram, os tribunais romanos determinaram os resultados de milhares de julgamentos em toda a região. O julgamento de Jesus ocorreu sob o mesmo aparato legal básico de todos eles.

Ao abordar a prisão, o julgamento e a sentença de Jesus da perspectiva da história romana e legal, este livro nos ajuda entender melhor a condenação mais famosa da história mundial.

Nathanael J. Andrade é professor de História na Universidade Binghamton, NY, USA.

Leia também o artigo do mesmo autor Pilate’s Legal Path to Crucifying Jesus, publicado em The Bible and Interpretation, em março de 2025.

O autor começa citando Geza Vermes, The Religion of Jesus the Jew. Minneapolis: Fortress Press, 1993, que diz:

Ele morreu na cruz por ter feito a coisa errada (causado uma comoção) no lugar errado (o Templo) na hora errada (pouco antes da Páscoa). Aqui está a verdadeira tragédia de Jesus, o judeu.

 

Long ago, on a spring morning in Jerusalem, Pontius Pilate passed judgement on a mysterious preacher. Jesus of Nazareth was nailed to a cross shortly after and died in agony. The effects of this verdict have reverberated throughout the world and have shaped two millennia of history. Even so, the trial remains shrouded in mystery to this day. The New Testament Gospels are unclear about what charges Pontius Pilate judged. They portray Pilate as embracing Jesus’ innocence despite having him killed. We are left with more questions than answers. Why did Pontius Pilate condemn a man he believed innocent? What was Jesus’ crime? How should we understand Pilate’s role in Jesus’ execution?

Nathanael J. AndradeKilling the Messiah addresses these questions and analyzes Pilate’s path to crucifying Jesus. It determines why and how Pilate deemed Jesus guilty of criminal behavior and the roles played by various people in ensuring Jesus’ crucifixion. It also probes how the personal motivations and social obligations of Pilate and other authorities affected how they assessed Jesus’ criminality. To do this, it situates Jesus’ trial within the geo-political context of the Roman Middle East. In the decades before Jesus’ lifetime, and throughout the centuries that followed, Roman courts determined the outcomes of millions of trials throughout the region. Jesus’ trial took place in the same basic legal apparatus as all of these. By approaching the arrest, trial, and sentencing of Jesus from the perspective of Roman and legal history, this book sheds fresh light on the most famous conviction in world history.

A história de Isaías

STROMBERG, J.; HIBBARD, J. T. (eds.) The History of Isaiah: The Formation of the Book and its Presentation of the Past. Tübingen: Mohr Siebeck, 2021, 599 p. – ISBN 9783161560972.

Diz o Prefácio:STROMBERG, J.; HIBBARD, J. T. (eds.) The History of Isaiah: The Formation of the Book and its Presentation of the Past. Tübingen: Mohr Siebeck, 2021, 599 p.

O livro de Isaías é um produto da história. A natureza dessa história e o que significa que Isaías é um produto dela, dificilmente são questões de consenso no campo dos estudos bíblicos. Isso deveria ser esperado. A história é complexa. E provavelmente confunde, mais frequentemente do que confirma, as tentativas de entendê-la completamente. Mesmo assim, a pesquisa isaiânica colocou o dedo no cerne do problema metodológico. No cerne de uma compreensão histórica deste livro profético está uma consideração da palavra “história” em duas aplicações distintas, mas relacionadas.

Primeiro, quais processos históricos levaram à forma final do livro? E segundo, que tipo de representação histórica o livro oferece ao leitor?

A primeira questão examina como Isaías se tornou um livro. A última inspeciona sua apresentação da história, uma apresentação complexa envolvendo diversos modos de exposição (perspectiva profética, reflexão poética sobre o presente e relatos em prosa do passado). Esta história envolve as tradições bíblicas e envolve as relações de Israel com os grandes impérios do Antigo Oriente Médio, um passado já distante do ponto de vista da forma final do livro. Para a maioria dos estudiosos, responder a uma pergunta envolve perguntar a outra, a diacronia do livro sendo relacionada à apresentação da história encontrada nele e vice-versa. Para entender melhor a história de Isaías, este volume de ensaios se dedica a essas duas linhas de investigação e seu relacionamento.

O volume foi dividido em três partes.

A primeira fornece um conjunto de ensaios dedicados às questões metodológicas envolvidas no exame da diacronia do livro de Isaías e sua apresentação da história. Nesta seção o objetivo é permitir a reflexão sobre os procedimentos analíticos pressupostos nos estudos diacrônicos e sincrônicos apresentados pela segunda e terceira partes do volume.

A segunda parte oferece uma consideração da história de Isaías à luz das tradições bíblicas. De uma perspectiva histórica, essas tradições permanecem indispensáveis, até mesmo fundamentais para a compreensão da história de Isaías. Isso é verdade em relação à diacronia textual de Isaías, bem como à sua representação histórica. Aqui, essa relação é examinada em relação aos diferentes estágios na formação textual de Isaías e da Bíblia Hebraica.

A terceira parte deste volume investiga a história de Isaías por meio de um foco nos impérios explicitamente mencionados no livro. A justificativa que norteia a seleção dos impérios aqui investigados (Assíria, Babilônia e Pérsia) deriva do papel fundamental desempenhado pela interação de Israel com essas nações na formação do livro em cada um de seus principais estágios.

Ao estruturar o volume dessa forma, esperamos que o leitor perceba o todo e não apenas as partes. Teoria e prática estão ligadas tanto quanto as histórias da Bíblia e do Antigo Oriente Médio. Assim, nosso objetivo ao compor este volume é fornecer ao leitor um tratamento metodologicamente informado deste tópico central – a história de Isaías – pois abrange todo o livro, se relaciona com as tradições da Bíblia e emerge das complexidades da vida no Antigo Oriente Médio.

Além disso, nosso objetivo ao selecionar colaboradores era fornecer um tratamento representativo deste tópico complicado, um que refletisse as diferentes perspectivas em jogo no campo dos estudos bíblicos hoje. Em um empreendimento deste tipo é, talvez, inevitável que lacunas na cobertura, no entanto, permaneçam.

Veja o sumário do livro em pdf, clicando aqui.

Jacob Stromberg é Professor de Antigo Testamento na Universidade Duke, Durham, NC, USA.

J. Todd Hibbard é Professor de Estudos Religiosos na Universidade de Detroit Mercy, Detroit, USA.

 

Preface

The book of Isaiah is a product of history. The nature of that history and what it means that Isaiah is a product of it are hardly matters of consensus in the field. This should be expected. History is complex. And it probably confounds, more often than it confirms attempts to understand it completely. Even so, Isaianic scholarship has put its collective finger on the crux of the methodological problem. At the heart of an historical understanding of this prophetic book lies a consideration of the word “history” in two distinct but related applications. First, what historical processes led to the book’s final form? And second, what kind of historical representation does the book offer to the reader? The former question examines how Isaiah became a book. The latter inspects its presentation of history, a complex presentation involving diverse modes of exposition (prophetic forecasting, poetic reflection on the present, and prose accounts of the past). This history engages the Biblical traditions and it involves Israel’s dealings with the great empires of the Ancient Near East, much of which lay in the past from the point of view of the book’s final form. For most scholars, answering either question involves asking the other, the diachrony of the book being related to the presentation of history found therein and vice versa. To understand better the history of Isaiah, this volume of essays devotes itself to these two lines of inquiry and their relationship.

To this end, the volume is divided into three parts. The first provides a set of essays devoted to the methodological issues involved in examining the diachrony of the book of Isaiah and its presentation of history. In this section, the aim is to enable reflection upon the analytical procedures presupposed in the diachronic and synchronic studies presented by the second and third parts of the volume. The second part offers a consideration of the history of Isaiah in the light of the Biblical traditions. From an historical perspective, these traditions remain indispensable, even foundational for understanding the history of Isaiah. This is true regarding Isaiah’s textual diachrony as well as its historical representation. Here this relationship is examined in relation to differing stages in the textual formation of Isaiah and the Hebrew Bible. The third part of this volume investigates the history of Isaiah by means of a focus on those empires explicitly mentioned in the book. The rationale guiding the selection of those foreign empires here investigated (Assyria, Babylon, and Persia) derives from the pivotal role played by Israel’s interaction with these nations in the formation of the book in each of its major stages.

In structuring the volume this way, we hope the reader will perceive the whole and not just the parts. Theory and practice are bound together every bit as much as are the histories of the Bible and the Ancient Near East. Thus, our aim in putting this volume together is to provide the reader with a methodologically informed treatment of this central topic – the history of Isaiah – as it spans the whole book, relates to the traditions of the Bible, and emerges out of the complexities of life in the Ancient Near East. Moreover, our goal in selecting contributors was to provide a representative handling of this complicated topic, one reflecting the differing perspectives at play in the field today. In an undertaking of this scope, it is perhaps inevitable that gaps in coverage will, nonetheless, ­remain.

Jacob Stromberg, born 1974; D. Phil. Oxford; since 2011 Lecturer in Old Testament at Duke University.

J. Todd Hibbard, born 1968; PhD University of Notre Dame; since 2011 Associate Professor of Religious Studies, University of Detroit Mercy.

Leituras sobre a decifração da escrita cuneiforme

A decifração da escrita cuneiforme no século XIX foi feita por alguns dedicados pioneiros. Quatro nomes costumam ser citados como fundamentais neste empreendimento: Rawlinson, Hincks, Talbot e Oppert. Dos quatro, dois se destacam: o major britânico Henry Creswicke Rawlinson (1810-1895) e o clérigo irlandês Edward Hincks (1792-1866).Rawlinson, Oppert, Talbot e Hincks: os decifradores do cuneiforme no século XIX

Infelizmente eles não escreveram relatos completos do processo de decifração do acádio. Daí ser difícil encontrar uma história satisfatória da decifração da língua acádia e da escrita cuneiforme na qual ela foi registrada. Há, na verdade, vários relatos publicados, mas é preciso ser prudente, pois muitos são bastante imprecisos.

Pensando nisso é que cito aqui, do mais recente ao mais antigo, alguns relatos que andei lendo ultimamente e que são recomendados por especialistas em assiriologia como confiáveis.

2021

STRECK, M. P. Research on the Akkadian Language. In: VITA, J.-P. (ed.) History of the Akkadian Language (2 Vols). Leiden: Brill, 2021, 1692 p. – ISBN 9789004445208, capítulo 1.

Michael P. Streck começa seu texto sobre a pesquisa da língua acádia mostrando que o desafio enfrentado pelos pioneiros não foi nada fácil, pois tiveram que decifrar uma língua desconhecida em uma escrita desconhecida.

Ele diz:

Depois que Georg Friedrich Grotefend começou a decifrar o persa antigo em escrita cuneiforme, em 1802, várias décadas se passaram antes que essa extraordinária conquista da mente humana fosse concluída e coroada pela decifração muito mais difícil da escrita cuneiforme acádia. Esta última decifração foi preparada pela “conquista da Assíria”. Na década de 1840, Paul-Émile Botta e Austen Henry Layard escavaram três capitais do império neoassírio, Nínive, Kalhu e Dur-Sharrukkin*. Milhares de textos cuneiformes, escritos em assírio e babilônico, foram encontrados durante essas escavações. Esses textos cuneiformes e as inscrições trilíngues (persa antigo, elamita e babilônico) do império aquemênida permitiram que os estudiosos abordassem com sucesso a escrita cuneiforme acádia. O maior crédito por essa conquista é devido a Edward Hincks.

Hincks, um pastor irlandês, dedicou-se ao estudo de línguas antigas. Ele escreveu uma gramática hebraica, passou um tempo decifrando os hieróglifos egípcios, pesquisou sobre etrusco e aprendeu sânscrito. Em 1846, ele publicou um artigo no qual concluiu a decifração do persa antigo, fez uma contribuição importante para o cuneiforme elamita e notou alguns princípios básicos do cuneiforme acádio. Em conexão com o último, ele reconheceu que “tanto as línguas assírias quanto as babilônicas parecem ter muito em comum com as línguas semíticas”.

Durante os anos seguintes, Hincks publicou muitos artigos sobre o cuneiforme acádio. Em cada um deles, ele alcançou um progresso substancial. Ele compilou listas de sinais, reconheceu a polifonia da escrita cuneiforme e traduziu o primeiro texto acádio mais longo. O destaque desta série de artigos é a contribuição de Hincks de 1852 [Edward Hincks, “On the Assyrio-Babylonian Phonetic Characters,” Transactions of the Royal Irish Academy 22 (1852): 293–370]. Com base na percepção do caráter semítico do acádio e no fato de que as palavras semíticas são compostas por consoantes-raiz e morfemas flexionais consistindo de vogais ou sílabas, Hincks não só foi capaz de decifrar 252 sinais cuneiformes acádios, mas também de decodificar a estrutura gramatical da língua**.

Além de Hincks, também Henry C. Rawlinson, William Fox Talbot e Julius Oppert contribuíram para a decifração do cuneiforme acádio. A fase de decifração foi concluída pelo famoso teste da Royal Asiatic Society em 1857: os quatro estudiosos traduziram, independentemente uns dos outros, mas no geral consistentemente, uma inscrição do rei assírio Tiglat-Pileser I [Edward Hincks, Henry C. Rawlinson, William Fox Talbot, and Julius Oppert, Inscription of Tiglath Pileser i, King of Assyria, B.C. 1150 (London, 1857)].

* A Assíria teve 4 capitais:
1. Assur: capital da Assíria desde o II milênio a.C. e cidade de grande importância religiosa ao longo de toda a sua história
2. Kalhu (Nimrud), escolhida como capital por Assurnasírpal (reinou de 883 a 859 a.C.)
3. Dur-Sharrukkin (Khorsabad), construída por Sargão II a partir de 713 a.C.
4. Nínive, escolhida como capital por Senaquerib (reinou de 705 a 681 a.C.)

** O cuneiforme acádio usa sinais que representam uma palavra inteira (logogramas) e sinais que representam sílabas (fonogramas), variando de 600 a 900 formas de sinais individuais. O número flutua devido a fusões e divisões (Digital Corpus of Cuneiform Lexical Texts: Sign Lists).

 

2011

CATHCART, K. J. The Earliest Contributions to the Decipherment of Sumerian and Akkadian. Cuneiform Digital Library Journal 2011(1). Disponível online.

Kevin J. Cathcart diz:

Até recentemente, não havia relatos satisfatórios da decifração do acádio e da escrita cuneiforme na qual ele foi escrito. Publicações sobre a decifração são geralmente muito boas na decifração do persa antigo (Friedrich 1966; Gordon 1968; Pope 1999), mas são totalmente inadequadas para o cuneiforme mesopotâmico (cf. Daniels 1994: 54 n. 1). Há um relato competente da decifração do acádio em R. W. Rogers, History of Babylonia and Assyria (1915), mas inevitavelmente ele ficou datado e tivemos que esperar pelas contribuições recentes de Peter T. Daniels (1994, 1996) e Mogens Trolle Larsen (1996, 1997) para detalhes mais completos e precisos. Por mais estranho que pareça, é um livro popular sobre as descobertas em Tell Mardikh (antiga Ebla) de C. Bermant e M. Weitzman (1979) que apresenta um relato útil, embora imperfeito, para um público mais amplo. É mérito deles que os autores tenham se dado ao trabalho de examinar a correspondência relevante de A. H. Layard-Rawlinson na Biblioteca Britânica. Minha própria contribuição foi publicar o máximo de correspondência de Hincks que pude localizar e apresentar os detalhes de suas extensas publicações, algumas das quais são encontradas em periódicos obscuros e esquecidos.

Nos comentários finais ele diz:

O teste de 1857: os homens que decifraram a escrita no prisma de Tiglat-Pileser I (rei da Assíria de 1115 a 1076 a.C.) à esquerda foram, de cima para baixo, Henry Creswicke Rawlinson, William Henry Fox Talbot, Edward Hincks e Julius OppertRawlinson raramente reconheceu as contribuições de Hincks para a decifração da escrita cuneiforme. Em uma nota de rodapé, ele escreveu uma vez (1850: 448): “Presto de boa vontade um testemunho da grande sagacidade que ele trouxe para este e muitos outros aspectos conectados com as inscrições cuneiformes, e que muito frequentemente o tornou independente de dados.” Em cartas a Layard, por outro lado, ele geralmente descarta Hincks e seu trabalho. Quando Hincks foi empregado por um ano pelo Museu Britânico, Rawlinson reclamou amargamente aos curadores que ele se viu “suplantado por um cavalheiro, que, por mais que se tente disfarçar o fato, é, por sua atual e inquestionável proficiência, notoriamente devedor em grande medida aos meus artigos publicados” (Larsen 1996: 335). Uma avaliação séria dos materiais à nossa disposição, no entanto, apoia a visão de Julius Wellhausen (1876) de que não se está dizendo muito, se alguém chama Hincks de verdadeiro decifrador do cuneiforme assírio-babilônico. Não pode haver dúvidas de que qualquer um que se desse ao trabalho de estudar cuidadosamente os artigos de Hincks publicados de 1846 a 1852 teria feito um bom começo na pesquisa cuneiforme.

Rawlinson é mais lembrado pela edição e publicação dos cinco volumes de Cuneiform Inscriptions of Western Asia (1861-1884) com considerável ajuda de Edwin Norris e outros estudiosos. Duas outras figuras, Jules Oppert e Henry Fox Talbot, fizeram sentir sua presença quando a primeira fase crítica da decifração foi concluída em 1852. As contribuições de Oppert para a elucidação do acádio e do sumério merecem um estudo detalhado. Só então poderemos avaliar seu papel na próxima fase de decifração. Ele certamente merece um lugar ao lado do gênio Hincks e do dedicado Rawlinson.

Autores citados neste trecho:

Bermant, Chaim & Weitzman, Michael. Ebla: An Archaeological Enigma. London: Weidenfeld & Nicholson, 1979.

Cathcart, Kevin J. The Correspondence of Edward Hincks. 3 vols. Dublin: University College Dublin Press, 2007-2009.

Daniels, Peter T. “Edward Hincks’s Decipherment of Mesopotamian Cuneiform,” in K. J. Cathcart, ed., The Edward Hincks Bicentenary Lectures. Dublin: Department of Near Eastern Languages, University College Dublin, pp. 30-57, 1994.

Daniels, Peter T. “Methods of Decipherment,” in P. T. Daniels & W. Bright, eds., The World’s Writing Systems. New York & Oxford: Oxford University Press, pp. 143-159, 1996.

Friedrich, Johannes. Entzifferung verschollener Schriften und Sprache. 2nd ed. Berlin & New York: Springer-Verlag, 1966. Extinct Languages. New York, 1957, is a translation of the 1st edition.

Gordon, Cyrus H. Forgotten Scripts: The Story of their Decipherment. London: Thames and Hudson, 1969.

Hincks, Edward. “On the First and Second Kinds of Persepolitan Writing,” Transactions of the Royal Irish Academy 21, 114-131, 1846.

Hincks, Edward. “On the Assyrio-Babylonian Phonetic Characters,” Transactions of the Royal Irish Academy 22, 293-370, 1852.

Larsen, Mogens T. “Hincks versus Rawlinson: The Decipherment of the Cuneiform System of Writing,” in B. Magnusson et al., eds., Ultra terminum vagari: Scritti in onore di Carl Nylander. Rome: Quasar, pp. 339-356, 1997.

Larsen, Mogens T. The Conquest of Assyria: Excavations in an Antique Land 1840-1860. London: Routledge, 1996.

Pope, Maurice. The Story of Decipherment: From Egyptian Hieroglyphics to Maya Script. Rev. edn; London: Thames & Hudson, 1999.

Rawlinson, Henry C. “On the Inscriptions of Assyria and Babylonia,” JRAS 12, 401-483, 1850.

Rawlinson, Henry C. The Cuneiform Inscriptions of Western Asia, assisted by E. Norris, G. Smith, and T. G. Pinches, 5 vols. London: Trustees of the British Museum, 1861-1884.

Rogers, Robert W. History of Babylonia and Assyria. 6th edn. Vol. 1. New York: Abingdon Press, 1915.

Wellhausen, Julius. “Über den bisherigen Gang und den gegenwärtigen Stand der Keilentzifferung,” Rheinisches Museum für Philologie 31, 153-175, 1876.

 

1997

Larsen, Mogens T. Hincks versus Rawlinson: The Decipherment of the Cuneiform System of Writing. In: B. Magnusson et al., eds., Ultra terminum vagari: Scritti in onore di Carl Nylander. Rome: Quasar, pp. 339-356, 1997.

Diz o autor:

Meu objetivo neste artigo é descrever os aspectos centrais do processo que levou à decifração do sistema cuneiforme mesopotâmico. Ao dar ao meu artigo o título “Hincks versus Rawlinson”, não desejo sugerir que um desses homens sozinho conseguiu isso. Ao me concentrar na competição e rivalidade que existia entre eles, e na maneira como o processo de decifração foi descrito e explicado na literatura subsequente sobre o assunto, espero mostrar como essas conquistas devem ser entendidas à luz de um conjunto mais amplo de preocupações intelectuais e culturais.

Diz Mogens Trolle Larsen na avaliação, no final do artigo:

Os relatos que foram publicados sobre o trabalho que levou à compreensão final tanto do sistema cuneiforme persa quanto, subsequentemente, do mesopotâmico são infelizmente incompletos e, em alguns casos, claramente enganosos. Nenhum dos personagens principais envolvidos na conquista escreveu uma descrição coerente ou abrangente do processo e das ideias envolvidas, e uma série de eventos que envolveram confrontos violentos de personalidades fortes resultou em uma situação em que visões altamente preconceituosas foram autorizadas a dominar o único relato aparentemente autorizado.A Inscrição de Behistun, Irã

Com isso refiro-me ao livro The Rise and Progress of Assyriology, escrito pelo encarregado das antiguidades egípcias e assírias no Museu Britânico, Sir E. A. Wallis Budge, e publicado em 1925. Já no prefácio encontramos uma declaração clara sobre o que Budge queria realizar com o livro:

“O objetivo do livro é contar ao leitor em geral como Rawlinson fundou a ciência da assiriologia, como ela foi estabelecida somente pelos curadores do Museu Britânico”.

Consequentemente, o livro foi escrito porque

“Estudantes, tanto na Inglaterra quanto no continente, ignoram cada vez mais completamente o fato de que o mundo deve a ciência da assiriologia aos ingleses”.

Aqui, finalmente, encontra-se uma justificativa para a suspeita agonizante de Hincks, expressa já em 1849, de que sua posição como irlandês o impediria de ser reconhecido pelas realizações que havia alcançado. E, de fato, a apresentação de Budge de Rawlinson como “o pai da assiriologia” se tornou a visão padrão em livros sobre decifração, léxicos etc. Budge descreveu Hincks como uma figura secundária no processo, embora reconheça que Rawlinson aprendeu com ele; ele está até disposto a “assumir que seus méritos como decifrador são iguais aos de Rawlinson”, mas de alguma forma isso não “diminui o valor da conquista independente de Rawlinson, nem rouba de Rawlinson sua prioridade”. Sua rejeição de Hincks foi além disso, no entanto, pois em uma resenha do único livro já escrito sobre a vida de Hincks, Budge afirmou que “ele não era um grande estudioso”. E seu relato do tempo infeliz de Hincks no Museu Britânico não é apenas factualmente incorreto, é simplesmente pérfido; ele alegou que o emprego de Hincks foi descontinuado e seus cadernos arquivados porque

“Rawlinson descobriu que Hincks não suportava o trabalho penoso de copiar, e que suas traduções eram incompletas e duvidosas, e por causa de seus ataques a outros pioneiros não podiam ser publicadas pelo Museu Britânico”.

Deve-se notar que Rawlinson não tinha absolutamente nenhuma autoridade no Museu na época, então certamente não cabia a ele decidir sobre isso, ou mesmo sobre qualquer outro assunto no Museu Britânico. Talvez também se deva notar que ele copiou muito poucos textos cuneiformes mesopotâmicos e traduziu praticamente nenhum. Sua reivindicação de ser o «pai da assiriologia» repousa na posição influente que ele veio a ocupar no Museu Britânico e seu papel decisivo na publicação dos primeiros volumes de textos, os cinco tomos que agora são chamados de «Rawlinson I-V». A tarefa prática de copiar e editar estes recaiu principalmente sobre outros, no entanto.

Tabuinha com escrita protocuneiforme de Uruk IV, ca. 3200 a.C.Não é minha intenção julgar e declarar Rawlinson ou Hincks como o vencedor que deve ser homenageado como o decifrador do cuneiforme mesopotâmico ou aquele que finalmente penetrou as complexidades da escrita e da linguagem e alcançou uma verdadeira compreensão dos textos. Os estudos mais recentes sobre Hincks dão ênfase às suas contribuições (…) “Foi Hincks, e ele quase sozinho, que tornou possível ler, mais uma vez, os memoriais da primeira civilização do mundo”, disse Peter T. Daniels [Daniels, Peter T. “Edward Hincks’s Decipherment of Mesopotamian Cuneiform,” in K. J. Cathcart, ed., The Edward Hincks Bicentenary Lectures. Dublin: Department of Near Eastern Languages, University College Dublin, pp. 30-57, 1994].

Minha opinião é que a decifração e a leitura dos textos cuneiformes mesopotâmicos foram o resultado de uma colaboração relutante e não reconhecida entre duas personalidades extremamente ambiciosas e sensíveis. Rawlinson chega até nós como o homem dedicado, paciente e extremamente cuidadoso, enquanto Hincks aparece como o verdadeiro gênio, cujas intuições constituíram uma grande parte da base do trabalho de Rawlinson.

Finalmente na nota 57, a última do texto, ele explica:

Este artigo é um desenvolvimento da descrição que apresento no livro The Conquest of Assyria: Excavations in an Antique Land, Routledge, London, 1996. Remeto a este trabalho para uma discussão mais detalhada da relação entre a decifração e as atividades arqueológicas.

 

1996

LARSEN, M. T. The Conquest of Assyria: Excavations in an Antique Land, 1840-1860. New York: Routledge, [1996] 2016, 424 p. – ISBN 9781138991620.

No prefácio diz Mogens Trolle Larsen:

Este livro é sobre o “estranho de olhos brilhantes do Frangistão” que falava inglês e que quebrou o silêncio oriental, Austen Henry Layard, bem como sobre os outros pioneiros, Paul-Émile Botta, Hormuzd Rassam, Henry Rawlinson e Victor Place, que na Assíria encontraram o que era visto como parte da herança histórica da Europa, apesar da percepção de que sua arte era estranha e primitiva.

As vidas e atividades desses homens nos apresentam uma imagem da Europa e do Oriente Médio no século XIX. A base para sua compreensão e interpretação do que eles desenterraram estava, é claro, enraizada em seu tempo, suas percepções e preconceitos. No entanto, suas descobertas também se tornaram parte daquela grande revolução intelectual que varreu a Europa na segunda metade do século XIX, quando descobertas científicas e acadêmicas mudaram a visão de mundo tradicional herdada e lançaram as bases para nossa própria compreensão do mundo.

Henry Creswicke Rawlinson (1810-1895) e Edward Hincks (1792-1866) aparecem em vários momentos deste livro. Os capítulos 10, 24 e 32, por exemplo, “O soldado inglês ideal”, “Rawlinson no paraíso” e “Rawlinson acerta” têm as atividades do major Rawlinson como assunto principal. Mas há também, por todo o livro, a citação e análise da correspondência entre Layard e Rawlinson. Hincks aparece menos que Rawlinson neste livro, mas não é de modo algum negligenciado.

Também a rivalidade Rawlinson-Hincks é analisada. No capítulo 20 “Os mistérios do cuneiforme”, por exemplo.

Escrita cuneiformeDiz Mogens Trolle Larsen:

O problema para Layard era que Rawlinson se limitava a tais generalidades não específicas e parecia bastante relutante em sequer dar uma dica do que estava lendo nos textos. A correspondência deles já estava acontecendo há dois anos dessa forma, e é compreensível que a paciência de Layard estivesse acabando. Rawlinson havia afirmado antes que estava “bastante certo” de suas leituras dos textos, e agora, quando parecia estar à beira da solução final, não havia fim para sua cautela. Deve ter sido tentador para Layard concluir que Rawlinson estava retendo seus resultados reais para estar em posição de publicá-los ele mesmo em triunfo e ganhar o máximo de honra e prestígio. De fato, é compreensível que o major em Bagdá tenha achado um tanto insatisfatório fornecer a Layard os frutos de seu trabalho para que pudessem ser publicados no livro sobre Nimrud.

Também é possível que Rawlinson não estivesse tão perto da solução quanto ele gostava de alegar; na verdade, ele pode até ter usado uma estratégia deliberada de criar uma cortina de fumaça que pudesse confundir e dissuadir seus rivais. Fica claro na correspondência que ele se sentiu ameaçado não apenas por Layard, que estava realmente trabalhando duro nos textos, mas especialmente por um certo Dr. Hincks que é mencionado repetidamente em suas cartas.

Este homem, que Rawlinson claramente considerava seu rival mais perigoso, embora ele também alegasse que estava “se perdendo em um atoleiro”, havia escrito uma série de artigos eruditos sobre hieróglifos egípcios, bem como estudos cuneiformes. Ele era um velho pároco rural em Killyleagh, no Condado de Down, um homem que não tinha treinamento especial em “estudos orientais” além de seu conhecimento de hebraico. Ele primeiro se interessou pelo egípcio e seu trabalho em cuneiforme foi aparentemente motivado pelo desejo de ver se os mesmos princípios que eram válidos para a escrita hieroglífica poderiam se aplicar ao cuneiforme.

Esses dois homens deveriam completar a fase inicial da decifração, mas não em um espírito de colaboração e amizade; em vez disso, sua conquista conjunta foi marcada por rivalidade e competição. O relacionamento complexo e muitas vezes tenso que se desenvolveu entre eles teve suas raízes em suas percepções divergentes do que aconteceu durante a fase final da decifração da escrita persa antiga, aquela encontrada na primeira coluna em Behistun. Será lembrado que com o relatório de Rawlinson de 1838 a decifração estava muito avançada, mas alguns problemas fundamentais ainda estavam inexplicados, o mais sério dos quais dizia respeito à própria base para uma decifração correta, a natureza da escrita.

Foi nessa situação que Hincks mostrou pela primeira vez seus dons excepcionais como decifrador em seu trabalho sobre cuneiforme. Em junho de 1846 ele deu uma palestra em Dublin na qual resolveu o quebra-cabeça das muitas consoantes na escrita persa antiga.

A fundação de Jericó

Estou lendo o livro de MITHEN, S. After the Ice: A Global Human History, 20,000 – 5000 BC. London: Weidenfeld & Nicolson, 2011, 664 p. O livro foi publicado, em inglês, em 2003. Há uma tradução para o português, Depois do gelo, pela Imago, Rio de Janeiro, 2007.

Steven Mithen (nascido em 1960) é um arqueólogo britânico, conhecido por seu trabalho sobre a evolução da linguagem, música e inteligência, caçadores-coletores pré-históricos e as origens da agricultura. Ele é professor de Pré-história Inicial na Universidade de Reading, Reino Unido. Veja suas publicações.

Diz Steven Mithen no prefácio:MITHEN, S. After the Ice: A Global Human History, 20,000 - 5000 BC. London: Weidenfeld & Nicolson, 2011, 664 p.

Este livro é uma história do mundo entre 20000 e 5000 a.C. Foi escrito para aqueles que gostam de pensar no passado e desejam saber mais sobre as origens da agricultura, das cidades e da civilização. E também para os que pensam no futuro. O período em discussão foi o de aquecimento global, durante o qual surgiram novos tipos de plantas e animais — espécies domésticas que sustentaram a revolução agrícola (…)

Este livro faz perguntas simples sobre a história humana: o que aconteceu, quando, onde e por quê? Oferece respostas entremeando uma narrativa histórica com argumentos causais. Ao fazê-lo, atende também aos leitores que perguntarão: “como sabemos disso?” — muitas vezes uma pergunta muito apropriada quando os indícios arqueológicos parecem tão escassos. E After the Ice [Depois do Gelo] faz outro tipo de pergunta sobre o passado: como era viver em tempos pré-históricos? Qual era a experiência do dia a dia daqueles que viveram o aquecimento global, uma revolução agrícola e a origem da civilização?

Tentei escrever um livro que torne acessível a um vasto público os indícios da pré-história, mantendo ao mesmo tempo os mais altos níveis de erudição acadêmica.

E no capítulo 1, O nascimento da história, o autor explica:

A história humana começou em 50000 a.C. ou por aí. Talvez 100000 a.C., mas certamente não antes. A evolução humana tem um pedigree bem mais longo — pelo menos 3 bilhões de anos se passaram desde a origem da vida, e 6 milhões desde que nossa linhagem se cindiu à do chimpanzé. A história, desenvolvimento cumulativo de fatos e conhecimento, é assunto recente e surpreendentemente curta. Pouca coisa de importância aconteceu até 20000 a.C. — as pessoas apenas continuaram vivendo como caçadores-coletores, exatamente como vinham fazendo seus ancestrais por milhões de anos. Viviam em pequenas comunidades e jamais permaneciam muito tempo em um assentamento. Pintaram-se algumas paredes de cavernas e fizeram-se algumas armas de caça mais ou menos excelentes; mas não houve fatos que influenciassem o curso da história futura, que criassem o mundo moderno.

Então vieram uns espantosos 15 mil anos que testemunharam a origem da agricultura, das cidades e da civilização. Em 5000 a.C., as fundações do mundo moderno já se haviam estabelecido, e nada do que veio depois — a Grécia clássica, a Revolução Industrial, a era atômica, a Internet — jamais se igualou ao significado desses fatos. Se 50000 a.C. assinalou o nascimento da história, 20000 – 5000 a.C. foi a sua maioridade.

 

O capítulo 7 trata da Fundação de Jericó: arquitetura neolítica, enterro e tecnologia do Vale do Jordão, 9600 – 8500 a.C.

Transcrevo abaixo uma tradução deste capítulo. O estudo de Jericó faz parte, ainda que em sobrevoo, de meu programa de História de Israel. Mas sempre tive curiosidade de saber mais sobre a Jericó pré-histórica. Meu professor de arqueologia no PIB, Robert North, fez escavações em Ghassul e sempre falava com entusiasmo de Kathleen Kenyon, que escavou Jericó.

Steven Mithen (nascido em 1960)John Lubbock* está parado na sombra da noite das colinas palestinas, olhando um grupo de pequenas moradas redondas no vale embaixo. Possuem telhados planos de palha e se misturam com abrigos de palha, não diferentes dos que ele viu em Ohalo em 20000 a.C. Mas as casas agora são completamente novas. Salgueiros, choupos e figueiras cercam a aldeia, evidentemente alimentados por uma nascente local e crescendo exuberantes no novo mundo quente e úmido do Holoceno. Mais adiante, pântanos chegam até a beira do lago Lissan — conhecido hoje como Mar Morto.

Muitas árvores foram derrubadas para fornecer material de construção e criar pequenos campos para cevada e trigo. Se essas safras são biologicamente domésticas ou selvagens, parece inteiramente sem importância, uma vez que com certeza chegou o novo mundo da agricultura. A data é 9600 a.C. e John Lubbock olha para Jericó, aldeia que assinala uma virada na história do oeste asiático.

Minha primeira visão de Tell es-Sultan, a antiga Jericó, foi igualmente impressionante, mas menos pitoresca. Também eu fiquei parado à sombra das colinas palestinas, cerca de meio quilômetro a oeste do que se tornara um grande monte constituído por vários milênios de construções desmoronadas e detritos humanos, erodidos pelo sol, pelo vento e pela chuva. Muito a leste, faixas de brilhantes amarelos e deslumbrantes brancos do vale do Jordão ainda ardiam ao sol; imediatamente abaixo de mim, os prédios de blocos cinza-opaco da cidade palestina que hoje cerca o antigo sítio. Mas ali, no centro de minha visão, estava Tell es-Sultan, famosa como a “mais antiga cidade do mundo”. Parecia uma pedreira antiga, ou mesmo uma zona de bombardeio.

Isso, claro, era culpa da minha profissão — os arqueólogos que começaram a cavar o monte em 1867. Poucos anos depois, o Capitão Charles Warren fora procurar as muralhas derrubadas pelas trombetas de Josué e seus israelitas, acreditando que Tell es-Sultan era a antiga Jericó bíblica. Uma equipe de estudiosos alemães o seguiu entre 1908 e 1911, e depois John Garstang, da Universidade de Liverpool, na década de 1930. Mas foram as grandes escavações de Kathleen Kenyon, entre 1952 e 1958, que revelaram ao mundo a antiga Jericó[1].

Kathleen escreveu que “o oásis está quase como imaginamos o Jardim do Éden”[2]. As verdes árvores e a Terra agrícola arável que cercavam a Jericó para a qual eu olhava espalhavam-se por muitos quilômetros além do belo oásis que Kathleen vira. Irrigação moderna hoje leva água de ‘Ain es-Sultan — a nascente que deu origem à aldeia — a campos distantes no vale. Assim, usei a imaginação para abater aquelas árvores distantes e plantei muito mais palmeiras em torno do monte. Demoli as construções de concreto e blocos pré-moldados e plantei campos de milho no lugar. Depois armei um conjunto de tendas brancas que Kathleen usara no pé do monte. Uma vez erigidas, eu via um rio de trabalhadores deixando o monte ao fim do dia de trabalho, os arqueólogos e estudantes instalando-se para o chá, antes de começar a classificar as descobertas.

Esse foi o dia em que eles tiveram a primeira sugestão da mais antiga construção dentro do monte. A cidade da Idade do Bronze e a de edifícios retangulares do Neolítico Tardio já eram bem conhecidas. Mas nesse dia, que eu sabia ter sido em algum momento em 1956, “ficou claro”, Kathleen escreveria depois, “que estávamos penetrando numa diferente fase abaixo… os pisos eram de terra, não de gesso… as paredes eram curvas e as plantas das casas pareciam ser redondas”[3].

Sabemos que grupos de pessoas natufianas acamparam junto à nascente, porque ali se encontraram espalhados seus instrumentos em forma de meia-lua. Com toda probabilidade plantaram cereais, ervilhas, lentilhas, e conseguiram uma magra colheita antes de partirem para viver em outra parte no vale ou nas colinas.

Por volta de 9600 a.C., as secas de verão chegaram ao fim. Novas chuvas alimentaram os rios que se precipitaram pelas colinas palestinas; o Jordão começou a encher. Espessas camadas de solo rico e fértil foram depositadas no vale do Jordão por novas enchentes anuais, e estas foram irrigadas pela fonte que fluía com um vigor recém-descoberto. As safras cultivadas floresceram, muito provavelmente substituindo as plantas selvagens não cuidadas como principais fornecedoras de alimentos. Os natufianos tardios estenderam a duração de sua estada, até que a história se repetiu e a vida sedentária da aldeia renasceu longe das matas mediterrâneas preferidas pelos natufianos iniciais. E assim Jericó foi fundada, e com ela as pessoas se tornaram agricultores.

As pessoas continuaram a viver em Jericó até os dias atuais. A primeira aldeia foi sepultada sob casas, armazéns e santuários construídos por sucessivas gerações, as que usaram cerâmica, bronze, e depois entraram nos anais da história do Antigo Testamento. E assim um monte gigante foi criado pela nascente de ‘Ain es-Sultan, de 250 metros de comprimento e mais de 10 metros de altura. Consistia de paredes de adobe desmoronadas e camada sobre camada de pisos de casas e fossas de lixos; mas, além de detritos humanos, o monte continha os pertences perdidos e os túmulos ocultos de 10 mil anos de história humana.

Kathleen Kenyon (1906-1978) chegou a Jericó querendo aplicar o que para ela eram técnicas moderníssimas de escavação. Como Dorothy Garrod, que descobrira o natufiano, Kathleen foi uma das grandes arqueólogas britânicas do século XX. As duas venceram no que era em essência um mundo masculino. Kenyon estudou em Oxford durante a década de 1920 e, em seguida, dirigiu escavações na Inglaterra e na África. Atuou como diretora do Instituto de Arqueologia do University College, em Londres, durante a guerra, e acabou por tornar-se diretora do St. Hugh’s College, em Oxford. Recebeu muitas honrarias, que culminaram com a concessão do título de Dama do Império Britânico em 1973[4].

Seu objetivo em 1952 era explorar mais as fases finais da antiga cidade, aquelas relacionadas com a história bíblica, e descobrir os vestígios mais antigos, que julgava mais importantes e merecedores de “completa exploração”. Tinha toda razão. Isso se tornou evidente para o mundo em 1957, quando ela publicou uma história popular de seu trabalho, Digging Up Jericho [Desenterrando Jericó]. Os acadêmicos, porém, tiveram de esperar até o início da década de 1980 para que saíssem os volumes adequadamente enormes descrevendo a arquitetura, a cerâmica e a sequência-chave de camadas dentro do monte[5]. Infelizmente, Kathleen havia morrido alguns anos antes de sua publicação.

John Lubbock está agora dentro da aldeia, ajudando a construir uma casa de adobe. Há muita obra de construção em andamento, pois os abrigos de sapé são aos poucos substituídos por construções mais perenes. Com as chuvas de inverno confiáveis, safras produtivas e abundante caça selvagem dentro do vale, o povo de Jericó não precisa partir. Sempre que eles preferem passar várias semanas ou meses fora, visitando amigos e parentes ou em longas expedições de caça ou comércio, sabem que voltarão a Jericó. E assim estão dispostos a investir tempo e energia na construção de casas de adobe e na limpeza de campos. Uma vez construídas umas poucas casas, Jericó atraiu novos moradores dispostos a deixar seus grupos de caçadores-coletores e juntar-se ao novo estilo de vida de cultivar plantações.

Lubbock passou a manhã cavando argila do fundo do vale e transportando-a em um trenó de madeira para a aldeia; lá, ela é misturada com palha e cortada em tijolosA Torre de Jericó em Tell es-Sultan oblongos que são deixados para secar ao sol. Eles serão unidos com uma argamassa de lama para fazer as paredes de moradias redondas, cada uma com cerca de 5 metros de diâmetro e com pisos rebaixados. As paredes superiores serão construídas com gravetos e galhos, o teto com juncos untados com argila.

Nessa noite, depois de se banhar na fonte, Lubbock anda pela aldeia e conta nada menos que cinquenta moradas — algumas dispostas em torno de pátios para uso de grandes famílias, outras sós ou em grupos isolados. Há fogueiras dentro e fora, e um denso véu de fumaça paira entre os becos. As pessoas sentam-se em pátios, algumas trançando esteiras e cestos, outras trocando noticias e fazendo planos para o dia seguinte. Em 9600 a.C., é provável que haja mais de quinhentas pessoas vivendo em Jericó — talvez a primeira vez na história da humanidade que uma população completamente viável estava vivendo no mesmo lugar ao mesmo tempo.

Dentro de 500 anos, Jericó já se tornara ainda maior, com mais de setenta moradias, talvez com uma população de mil habitantes. Uma parte bem maior da mata em redor foi aberta e grandes áreas se achavam em cultivo. Muitas das moradias originais já haviam desabado ou sido deliberadamente derrubadas para construírem-se outras sobre suas ruínas. Mas a diferença mais impressionante em relação à aldeia era que seu lado oeste, de frente para as colinas palestinas, era cercado por um enorme muro de pedra e uma grande torre circular havia sido construída em seu interior.

Kathleen Kenyon descobriu essas construções durante suas escavações em 1956. Parece improvável que a muralha, de 3,6 metros de altura e 1,8 de largura na base, tenha cercado todo o assentamento, pois nenhum vestígio dela se encontrou no lado leste. Dentro desse muro ela descobriu os restos da torre, de 8 metros de altura e 9 de diâmetro na base, com um peso estimado de mil toneladas. Uma escada interna, com 22 degraus de pedra, conduzia ao topo. Tal arquitetura era inteiramente sem precedentes na história humana, e é a mais notável das descobertas de Kathleen — seriam necessários pelo menos 100 homens, trabalhando durante 100 dias, para construir a muralha e a torre. Como ela própria sugeriu, “em concepção e construção, essa torre não faria vergonha diante de um dos mais grandiosos castelos medievais”[6]. A muralha e a torre permanecem inteiramente únicos para esse período.

Kathleen supôs que foram construídos para defender a cidade de ataque, uma conclusão aparentemente incontestável, em vista das ligações bíblicas de Jericó. Só em 1986 Ofer Bar-Yosef fez algumas perguntas óbvias: quem eram os inimigos de Jericó? Por que a muralha não foi reconstruída depois de ser sepultada por detritos de casas após não mais que 200 anos? Por que não há outros locais fortificados da mesma data no oeste asiático?

Bar-Yosef concluiu que as muralhas eram para defesa, mas não contra um exército invasor— o inimigo era a água e a lama das enchentes[7]. Jericó vivia em perpétuo perigo quando a chuva aumentava e o desflorestamento desestabilizava sedimentos nas colinas palestinas, que podiam então ser carregados para a borda da aldeia pelos wadis próximos. Quando o lixo da aldeia sepultou as muralhas, o nível de assentamento já tinha literalmente se elevado pelo acúmulo de casas desmoronadas e lixo humano. Isso afastou as ameaças da água e lama das enchentes. Simplesmente não se precisava mais de uma muralha.

Ofer Bar-Yosef descartou a ideia de que a torre se destinava a fortificação. Ficou impressionado com sua ótima conservação, e sugeriu que isso pode ter sido ajudado pela presença de uma plataforma de adobe em cima da construção de pedra. A própria Kathleen encontrou, ligadas ao lado norte da muralha, vestígios de construções que julgou que poderiam ter sido usadas para armazenar grãos. Em vista disso, Bar-Yosef sugeriu que a torre era de propriedade pública ou estava a serviço da comunidade, talvez como um centro de cerimônias anuais. Não parece provável que algum dia se encontre uma resposta definitiva — embora mais escavações nas vizinhanças da torre certamente ajudassem. O que é claro é que, com a construção da muralha e da torre, as pessoas criavam arquitetura e atividade comunal em escala inteiramente nova. Começara uma nova fase da história humana.

Em fins da década de 1950, assentamentos de aldeias semelhantes na Europa — embora muito mais novos em idade —já haviam sido descritos como neolíticos. Na década de 1920, Gordon Childe, o principal arqueólogo do período pré-guerra, cunhara a expressão “Revolução Neolítica” para se referir ao surgimento repentino de assentamentos que ele acreditava refletir uma mudança radical no modo de vida. Isso não apenas envolvia agricultura, mas arquitetura, cerâmica e machados de pedra polida. Childe pensava que estes formavam um “pacote neolítico”, que sempre era adquirido como um todo único e indivisível.[8].

Kathleen Kenyon (1906–1978), arqueóloga britânica conhecida por suas escavações em Jericó.Kathleen Kenyon descobriu que ele estava errado. Embora as casas, túmulos e estilo de vida deles em geral se encaixassem bem no molde neolítico, os primeiros aldeões em Jericó não dispunham de um dos elementos cruciais do pacote neolítico: a cerâmica. As poucas tigelas, vasos, pratos ou copos que sobreviveram eram feitos de pedra; é provável que muitos mais tenham sido feitos de madeira ou fibras vegetais. E assim Kathleen cunhou um novo termo para a cultura inicial de Jericó: o Neolítico Pré-Cerâmico (PPN na sigla em inglês). Na verdade, designou a primeira aldeia em Jericó como pertencente ao “Neolítico Pré-Cerâmico A” — um período que agora se sabe ter durado não mais do que mil anos após o início do Holoceno.

Aqueles que viveram na aldeia “PPNA” de Jerico, viveram literalmente com seus mortos. Kathleen descobriu nada menos que 276 sepulturas, embora escavasse apenas 10% do assentamento. Estavam todos associados às construções, de uma forma ou de outra; ficavam embaixo do piso, sob a estrutura das casas, entre paredes e dentro da torre. Continuava a tradição-chave de enterro do Natufiano Tardio: as pessoas tendiam mais a ser enterradas sós que em grupos; muito poucos artefatos, quando tinha algum, eram enterrados com os mortos.

Após os enterros, e muito provavelmente quando toda a carne já se havia decomposto, cavavam-se frequentemente covas para tirar os crânios, muitos dos quais eram depois reenterrados em outro lugar dentro da aldeia. Uma coleção de cinco crânios de bebês foi colocada dentro de uma cova abaixo do que Kathleen julgava fosse um altar. Mas a maioria das crianças e bebês, que representavam 40% dos enterros, foi deixada intacta — eram principalmente os crânios dos adultos os removidos para exposição e eventual reenterro.

Por que havia tal interesse pelos crânios? Era um interesse que se tornaria muitíssimo elaborado à medida que a aldeia de Jericó se tornava uma cidadezinha, levando à cobertura dos crânios com máscaras de gesso e olhos de conchas de caurim. Kathleen pensou que houvera um culto aos ancestrais e estabeleceu uma comparação com o povo do rio Sepik na Nova Guiné, que em tempos recentes usava os crânios de venerados ancestrais em seus rituais. Mas jamais vamos saber exatamente por que as pessoas de Jericó — e na verdade de todo o oeste asiático e além — exumavam e reenterravam crânios humanos, talvez após um período de exposição[9].

Como acontecia com essas práticas funerárias, os instrumentos usados pelos aldeões de Jericó eram muito semelhantes aos do Natufiano Tardio, embora tenham algumas grandes inovações tecnológicas. A mais impressionante foi o uso de adobe para construção — trabalho intensivo que demonstrava o compromisso com a vida da aldeia. Contudo, muitos dos artefatos de pedra continuaram em grande parte sem mudança. Ainda se faziam micrólitos, assim como uma gama de lâminas, raspadores e foices. Machados e enxós de pedra, o que não surpreende, foram encontrados em número muito maior que antes. Eram usados para derrubar a vegetação para os campos. Esse desmatamento pode ter contribuído para a erosão do solo, aumentando a necessidade de uma muralha defensiva. Um artigo, porém, merece especial atenção: um novo tipo de ponta de flecha, conhecida pelos arqueólogos como ponta “el-Khiam”. Era de forma triangular, com duas ranhuras laterais usadas para prender ao cabo, e batizada com o nome do sítio onde foram descobertos os primeiros espécimes[10].

Assim como os micrólitos geométricos e lunares tinham vindo e passado de moda, o mesmo aconteceu com as pontas el-Khiam. Elas atingiram o auge da popularidade por volta de 9000 a.C, quando aparecem quase simultaneamente em todas as regiões ocidentais e centrais do Crescente Fértil. Como tal, não esta claro onde se originou o novo desenho, ou por que se tornou tão largamente adotado por toda essa vasta região. Muitas têm desenho aerodinâmico, e bem podem ter levado a uma substancial melhora na eficiência da caça. Mas nova pesquisa, empregando estudo microscópico, mostrou que um grande número dessas pontas foi usado mais como sovelas e puas que como pontas de projéteis, como se supunha tradicionalmente [11].

As gazelas continuaram a ser o principal alvo dos caçadores. Mas com a expansão da floresta, uma gama maior de animais tornou-se disponível como presa – e, portanto, os ossos de gamos e javalis se juntaram aos de gazelas e íbex dentro dos montes de lixo de Jericó. Raposas e pássaros, especialmente aves de rapina, também se tornaram proeminentes. É improvável que tenham sido caçados como comida: pele de raposa, garras, elegantes penas de asas e caudas podem ter sido artigos cruciais de adorno do corpo. Podem ter feito parte das redes de comércio que se desenvolvia rapidamente no vale do Jordão e além. Pois Jericó não estava sozinha nesse novo mundo neolítico.

 

Notas
1. O relato popular de Kenyon (1957) sobre seu trabalho, Digging Up Jericho, continua sendo um clássico e contém um resumo do trabalho anterior sobre o tell. As datas de radiocarbono para o assentamento PPNA [Pre-Pottery Neolithic A – Neolítico pré-cerâmico A] em Jericó são resumidas em Bar-Yosef & Gopher (1997). Eles listam quinze datas da trincheira ocidental que variam de 10300 ± 500 (10856–9351 cal a.C.) a 9230 ± 220 (8796–8205 cal a.C.), e três da seção norte entre 9582 ± 89 AP (9160 ± 8800 cal a.C.) e 9200 ± 70 AP (8521–8292 cal a.C.) [Obs.: cal = calibrated. As medições de datação por radiocarbono produzem idades em “anos de radiocarbono”, que devem ser convertidas em idades de calendário por um processo chamado calibração. AP = “Antes do presente” é uma marcação de tempo utilizada na arqueologia, paleontologia e geologia, que tem como base de referência o ano de 1950 d.C.].Área do Crescente Fértil, c. 7500 a.C., com os principais sítios. Jericó foi um dos principais sítios do período Neolítico Pré-Cerâmico.
2. Kenyon (1957, p. 25).
3. Kenyon (1957, p. 70).
4. Para uma breve biografia de Kenyon, veja Champion (1998).
5. Para a arquitetura e estratigrafia de Jericó, veja Kenyon & Holland (1981); para a cerâmica e outros achados, veja Kenyon & Holland (1982, 1983).
6. Kenyon (1957, p. 68).
7. Bar-Yosef (1996) argumentou que os muros de Jericó eram para defesa contra inundações e deslizamentos de terra.
8. Para as opiniões de Childe sobre o Neolítico, veja, por exemplo, Childe (1925, 1928).
9. Embora Kenyon tenha se referido aos cultos de crânios do vale do rio Sepik na Nova Guiné, ela não desenvolveu seu argumento de que estes poderiam fornecer analogias úteis para aqueles da PPNA. Na região do rio Sepik, os ancestrais do clã eram normalmente representados por máscaras, muitas vezes de pessoas que supostamente desempenharam um papel fundamental na formação e história do clã. Assim como Kenyon sugere, os crânios engessados ​​da PPNA podem ter sido de pessoas que desempenharam um papel fundamental na fundação da aldeia. No vale Sepik, crânios decorados e cabeças encolhidas eram frequentemente feitos de cabeças decepadas de inimigos; Baxter Riley (1923) fornece descrições particularmente evocativas de como as cabeças e crânios eram preparados. As práticas de caça de cabeças e o uso de cabeças como troféus, como praticado na Oceania, também podem fornecer analogias úteis para as práticas da PPNA e foram descritas por Hutton (1922, 1928) e Von Furer-Haimendorf (1938).
10. Pontas El-Khiam são pontas simétricas feitas em pequenas lâminas com dois entalhes basais. Elas foram originalmente definidas a partir das escavações no terraço de El-Khiam por Echegaray (1963). Por vinte anos, essa ponta foi o único tipo definido para o PPNA, mas à medida que coleções mais extensas se tornaram disponíveis, outros artefatos de tipo foram propostos, notavelmente a ponta do vale do Jordão e a ponta de Salibiya (Nadel et al., 1991). Todos os três são triangulares em forma com uma base estreita. Outros tipos de artefatos de sílex também foram reconhecidos como exclusivos do PPNA, notavelmente o truncamento de Hagdud, conforme descrito por Bar-Yosef et al. (1987). Para aqueles que gostam das complexidades da tipologia de pedra lascada neolítica do Crescente Fértil, Gebel e Kozlowski (1994) é uma leitura essencial. As frequências relativas de pontas El-Khiam, truncamentos Hagdud, micrólitos e pequenos pedaços bifaciais foram usadas para definir duas fácies do PPNA, o Khiamiano e o Sultaniano, com o último tendo baixas frequências de micrólitos e a presença de truncamentos Hagdud e picaretas bifaciais. Há um debate em andamento sobre se o Khiamiano e o Sultaniano representam kits de ferramentas funcionalmente diversos da mesma cultura, encontrados em locais diferentes (Nadel, 1990) ou dentro do mesmo assentamento (Mithen et al., 2000) ou fases cronologicamente sucessivas do PPNA (Bar-Yosef 1998b). Alguns argumentam que o Khiamiano é meramente uma mistura pós-deposicional do Sultaniano e do Natufiano subjacente (Garfinkel, 1996).
11. Isso é evidente pelos traços de microdesgaste presentes nas pontas, muitos dos quais indicam um movimento circular característico de perfuração ou perfuração em vez das fraturas de impacto que surgem nas pontas de projéteis. Esses estudos de microdesgaste estão sendo conduzidos por Sam Smith como pesquisa de doutorado na Universidade de Reading. Um relatório preliminar sobre as pontas de Dhra’ é fornecido em Goodale & Smith (2001).

 

Bibliografia citada neste capítulo

Bar-Yosef, O. 1998b. Jordan prehistory: A view from the west. In The Prehistoric Archaeology of Jordan (ed. D.O. Henry), pp. 162–74. Oxford: British Archaeological Reports, International Series, 705.

Bar-Yosef, O. & Gopher, A. 1997. Discussion. In An Early Neolithic Village in the Jordan Valley. Part I: The Archaeology of Netiv Hagdud (eds. O. Bar-Yosef & A. Gopher), pp. 247–66. Cambridge, MA: Peabody Museum of Archaeology and Ethnology, Harvard
University.

Bar-Yosef, O., Gopher, A. & Nadel, D. 1987. The ‘Hagdud Truncation’ – a new tool type from the Sultanian industry at Netiv Hagdud, Jordan Valley. Mitekufat Haeven 20, 151–7.

Baxter Riley, E. 1923. Dorro head hunters. Man 23, 33–5.

Champion, S. 1998. Women in British Archaeology, visible and invisible. In Excavating Women. A History of Women in European Archaeology (eds. M. Diaz-Andreu & M.L.S. Sørenson), pp. 175–97. London: Routledge.

Childe, V.G. 1925. The Dawn of European Civilisation. London: Kegan Paul.

Childe, V.G. 1928. The Most Ancient Near East. The Oriental Prelude to European Prehistory. London: Kegan Paul.

Echegaray, G.J. 1963. Nouvelles fouilles à El-Khiam. Revue Biblique 70, 94–119.

Garfinkel, Y. 1996. Critical observations on the so-called Khiamian flint industry In Neolithic Chipped Stone Industries of the Fertile Crescent and their Contemporaries in Adjacent Regions (eds. H.G. Gebel & S. Kozlowski), pp. 15–21. Berlin: Ex Oriente.

Gebel, H.G. & Kozlowski, S. 1994. Neolithic Chipped Stone Industries of the Fertile Crescent and their Contemporaries in Adjacent Regions. Berlin: Ex Oriente.

Goodale, N. & Smith, S. 2001. Pre-Pottery Neolithic A projectile points at Dhra’, Jordan: Preliminary thoughts on form, function and site interpretation. Neo-lithics 2:01, 1–5.

Hutton, J.H. 1922. Divided and decorated heads as trophies. Man 22, 113–14.

Hutton, J.H. 1928. The significance of head-hunting in Assam. Journal of the Royal Anthropological Institute of Great Britain and Ireland 58, 399–408.

Kenyon, K. 1957. Digging Up Jericho. London: Ernest Benn Ltd.

Kenyon, K. & Holland, T. 1981. Excavations at Jericho, Vol. III: The Architecture and Stratigraphy of the Tell. London: British School of Archaeology in Jerusalem.

Kenyon, K. & Holland, T. 1982. Excavations at Jericho, Vol. IV. The Pottery Type Series and Other Finds. London: British School of Archaeology in Jerusalem.

Kenyon, K. & Holland, T. 1983. Excavations at Jericho, Vol. V: The Pottery Phases of the Tell and Other Finds. London: British School of Archaeology in Jerusalem.

Lubbock, John. 1865. Pre-historic Times, as Illustrated by Ancient Remains, and the Manners and Customs of Modern Savages. London: Williams & Norgate.

Crânio engessado encontrado em Jericó (Tell es-Sultan), Neolítico Pré-Cerâmico B, c. 7200 a.C. BM 12741-42Mithen, S.J., Finlayson, B., Pirie, A., Carruthers, D. & Kennedy, A. 2000. New evidence for economic and technological diversity-in the Pre-Pottery Neolithic A: Wadi Faynan 16. Current Anthropology 41, 655–63.

Mithen, S.J., Finlayson, B., Mathews, M. & Woodman, P.E. 2000. The Islay Survey. In Hunter-Gatherer Landscape Archaeology, The Southern Hebrides Mesolithic Project, 1988–98, Vol. 2 (ed. S. Mithen), pp. 153–86. Cambridge: McDonald Institute for Archaeological Research.

Nadel, D. 1990. The Khiamian as a case of Sultanian intersite variability. Journal of the Israel Prehistoric Society 23, 86–99.

Nadel, D., Bar-Yosef, O., Gopher, A. 1991. Early Neolithic arrowhead types in the southern Levant: A typological suggestion. Paléorient 17, 109–19.

von Furer-Haimendorf, C. 1938. The head-hunting ceremonies of the Konyak Nagas of Assam. Man 38, 25.

 

*Este livro conduz alguém dos tempos modernos aos pré-históricos: alguém para ver os instrumentos de pedra sendo feitos, os fogos ardendo nos lares e as moradas ocupadas; alguém para visitar as paisagens do mundo da era do gelo e vê-las mudar. Escolhi um rapaz chamado John Lubbock para essa tarefa. Ele visitará cada um dos continentes, começando no oeste da Ásia e seguindo pelo mundo afora: Europa, as Américas, Austrália, leste da Ásia, sul da Ásia e África. Viajará da mesma forma como os arqueólogos escavam — vendo os mais íntimos detalhes das vidas das pessoas, mas incapaz de fazer qualquer pergunta e com sua presença inteiramente desconhecida. Farei comentários para explicar como os sítios arqueológicos foram descobertos, escavados e estudados; as formas como contribuem para nossa compreensão de como surgiram a agricultura, as cidades e a civilização. Quem é John Lubbock? Ele vive em minha imaginação como um rapaz interessado no passado e com medo do futuro — não o seu próprio, mas o do planeta Terra. Tem o mesmo nome de um polímata vitoriano que, em 1865, publicou seu próprio livro sobre o passado e intitulou-o Prehistoric Times [Tempos pré-históricos]. O John Lubbock vitoriano (1834-1913) era vizinho, amigo e seguidor de Charles Darwin. Foi um banqueiro que instigou reformas financeiras-chave, um membro liberal do Parlamento que apresentou a primeira legislação para proteção de monumentos antigos e férias em bancos (públicos), um botânico e entomologista com muitas publicações científicas em seu nome. [Mas] vou mandar um John Lubbock dos dias de hoje para os tempos pré-históricos, levando um exemplar do livro de seu xará. Lendo-o em remotos cantos do mundo, ele apreciará tanto os feitos do John Lubbock vitoriano quanto o notável progresso que os arqueólogos fizeram desde a publicação de Prehistoric Times menos de 150 anos atrás. Uso John Lubbock para assegurar que esta história é mais sobre vidas de pessoas que apenas os objetos que os arqueólogos encontram.

O que especialistas em arqueologia fazem?

Dig Scene Investigators: What do archaeology specialists do? – By Nathan Steinmeyer: BAR – February 19, 2025

Hoje a arqueologia é bem mais especializada do que nos seus primeiros anos, com arqueólogos buscando responder a perguntas cada vez mais minuciosas e complexas. Mas o que são essas especializações e como elas afetam uma escavação? Para responder a essa pergunta, a BAR conversou com especialistas para perguntar o que eles fazem no campo.

Ceramistas
Uma das descobertas mais importantes em quase qualquer escavação arqueológica, a cerâmica nos conta muito sobre as pessoas que viveram ou passaram por um local. Ao fornecer informações sobre a cultura, a tecnologia e, especialmente, o lugar no tempo de uma sociedade, a cerâmica desempenha um papel fundamental na compreensão de um local desde o início. Com tantos tipos de cerâmica antiga, no entanto, os arqueólogos geralmente recorrem a especialistas para aprender mais sobre o que a cerâmica pode revelar sobre o passado.O arqueólogo da IAA Jacob Sharvit ( à esquerda ) e a líder ambiental da Energean, Karnit Bahartan, examinam dois jarros de armazenamento cananeus após serem recuperados do fundo do mar Mediterrâneo em 30 de maio de 2024.

(…)

Zooarqueólogos
Exigindo ampla experiência em biologia animal, os zooarqueólogos são outros especialistas importantes em escavações. Ao analisar restos da fauna e seus contextos arqueológicos, esses especialistas ajudam a entender a relação entre povos antigos e o meio ambiente, seja investigando dietas antigas, domesticação animal ou práticas de pastoreio e caça.

(…)

Arqueólogos espaciais
Arqueólogos espaciais são especialistas em entender a topografia de sítios arqueológicos usando equipamentos tecnológicos como dispositivos GPS portáteis, níveis topográficos, estações totais, equipamentos RTK, drones e muito mais. Também é necessária experiência para transformar dados topográficos e espaciais em resultados significativos e apresentáveis. O avanço contínuo de equipamentos e softwares necessita de especialistas dedicados para atingir os resultados mais completos e precisos.

(…)

Geoarqueólogos marinhos
Semelhante à arqueologia espacial, a geoarqueologia marinha foca no contexto ambiental de sítios arqueológicos, mas, como o nome indica, debaixo d’água. Dadas as condições incrivelmente desafiadoras e específicas da arqueologia marítima, os geoarqueólogos utilizam ferramentas e técnicas de ponta para documentar adequadamente sítios e achados.

(…)

Escavações no cemitério filisteu de AscalonConservadores
Apesar do que filmes como Indiana Jones podem sugerir, a arqueologia é muito mais do que caça ao tesouro, e um especialista importante nesse esforço é o conservador. Esses indivíduos altamente treinados, que geralmente têm formação em estudos de museus e ciências exatas, preservam objetos escavados para estudo e exibição no futuro e também trabalham para proteger o local e suas características após a conclusão da escavação.

(…)

Osteologistas
Semelhantes aos zooarqueólogos, os osteologistas trabalham com ossos, mas ossos humanos em vez de animais. Além de garantir que restos mortais e sepulturas humanas sejam manuseados de forma responsável, esses especialistas respondem a perguntas sobre como as pessoas viveram, morreram e foram enterradas com base em seus restos mortais. Da identificação de doenças antigas à análise de práticas de sepultamento, os osteologistas se especializam nos mínimos detalhes da existência humana cotidiana e da morte.

Leia, abaixo, o texto completo.

 

Since the early years of archaeology, the discipline has gradually become more specialized, with archaeologists seeking to answer ever more minute and complex questions. But what are these specializations and how do they affect an excavation? To answer this question, BAR caught up with specialists to ask them what they do in the field.

Ceramicists
One of the most important finds on nearly any archaeological dig, ceramics tell us a lot about the people who lived in or passed through a site. By providing information about a society’s culture, technology, and especially place in time, ceramics play a key role in understanding a site from the very start. With so many types of ancient pottery, however, archaeologists often turn to specialists to learn more about what ceramics can reveal about the past.

Nava Panitz-Cohen, Hebrew University of Jerusalem
“On a historical excavation, pottery is usually the most ubiquitous find. Since the sheer quantity can be daunting, the dig ceramic specialist has to classify and process the pottery in a way that will allow for ongoing research and analysis that will give the silent sherds a voice. Most of the work during the excavation itself is technical. First and foremost, an integral documentation and recording system in the field must be established that will allow for the secure reconstruction of the pottery’s context after it is excavated. After being washed, all the pottery that is collected in the field is sorted. The ceramic specialist then carefully examines all sherds, choosing which to keep. If the pottery is restorable, all sherds are kept. The results of sorting are recorded in an excavation database, so we know what was kept and what was discarded. In many instances, the pottery is the only indicator of the chronology and type of context. This stage of processing is critical for the ongoing research that will take place subsequently in the laboratory.”

Zooarchaeologists
Requiring extensive expertise in animal biology, zooarchaeologists are another key specialist in excavations. By analyzing faunal remains and their archaeological contexts, these specialists help to understand the relationship between ancient people and the environment, whether it is investigating ancient diets, animal domestication, or herding and hunting practices.

Abra Spiciarich, Ludwig Maximilian University of Munich
“Animal bones found in archaeological contexts are studied by zooarchaeologists to reconstruct past ways we interacted with animals. This varies from trying to uncover the beginning of domestication to using animals for rituals and feasts. To properly excavate bones, we use dental tools to carefully expose the entire skeleton, take lots of photos, make a top plan, and collect them with properly labeled bags or boxes, but never plastic bags because this creates moisture that will damage the remains. Once back in the lab, we create detailed spreadsheets recording what we can about the bones: element, side, species, completeness, age, and taphonomic evidence, like burn marks, cut marks, gnawing by scavengers, etc. We then take this dataset, apply statistical queries, and see what this tells us about how animals were used within specific contexts of a site.”

Lidar Sapir-Hen, Tel Aviv University
“My lab members and I collaborate with the excavation staff, from the time of planning, through the excavation, and following it. In the first stage of the work, we collaborate to understand the excavation aims and to design a protocol for the comprehensive retrieval of finds. During the excavation itself, our presence in the field is necessary. We direct the workers and students through the stages of retrieving and handling animal bones. Sometimes, our on-site input may change the course of an excavation. In addition, it is important for us to see and understand the context the finds were retrieved from, for subsequent analysis and interpretation. This collaboration continues into the post-excavation stage in the lab and includes a dialogue with all experts to formulate a comprehensive understanding of past human societies.”

Spatial Archaeologists
Spatial archaeologists specialize in understanding the topography of archaeological sites using technological equipment such as handheld GPS devices, dumpy levels, total stations, RTK equipment, drones, and more. Expertise is also required to turn topographic and spatial data into meaningful and presentable results. The continued advancement of equipment and software necessitates dedicated specialists to achieve the most complete and precise results.

Ido Wachtel, Hebrew University of Jerusalem
“Spatial archaeologist allows researchers to explore how ancient societies interacted with and adapted to their environments, as well as to uncover patterns, relationships, and hidden insights within archaeological data. At the regional level, systematic field surveys and spatial analysis form the cornerstone of our research, shedding light on the locations, sizes, and densities of human occupations and other different ways of human-landscape interactions. For example, archaeological predictive modeling enables us to predict the location of unknown archaeological sites and offers a comprehensive framework for protecting cultural heritage. At the site level, precise GPS and drone technologies have revolutionized site documentation.”

Marine Geoarchaeologists
Similar to spatial archaeology, marine geoarchaeology focuses on the environmental context of archaeological sites, but, as the name implies, underwater. Given the incredibly challenging and specific conditions of maritime archaeology, geoarchaeologists utilize cutting-edge tools and techniques to properly document sites and finds.

Isaac Ogloblin Ramirez, University of Haifa
“Documenting underwater archaeological contexts and collecting archaeological samples presents significant challenges due to diving limitations. Even under the best conditions, precisely documenting a stratigraphy sequence is nearly impossible due to the way colors change underwater. Given these conditions, the active involvement of geoarchaeologists during fieldwork is crucial for accurately documenting stratigraphic context and ensuring proper sample collection. This involvement helps prevent data misinterpretations resulting from improper sampling techniques. Following these intense underwater excursions, collected samples are transported to the laboratory for analysis, which aids in drawing conclusions about human behavior. The emerging field of underwater geoarchaeology is paving the way for innovative insights into humans and their aquatic environments.”

Conservators
Despite what movies like Indiana Jones may suggest, archaeology is about much more than treasure hunting, and an important specialist in this endeavor is the conservator. These highly trained individuals, who often have backgrounds in both museum studies and the hard sciences, preserve excavated objects for future study and display and also work to protect the site and its features after excavation is completed.

Orna Cohen
“As a conservator, I am involved in the process of digging and planning possible future development. While exposing structures, like walls and pillars, we must protect them until it is decided whether to dismantle or keep them. On the micro level, we glue cracked stones, restore stones to their original places, protect floors, and so on. When it comes to artifacts, it involves rescuing, strengthening, and packing them to be shipped to the laboratory where I will clean, consolidate, stabilize, restore, and treat them. During the excavation, we also plan the protection of the sites between the seasons with coverings, drainage, and fencing.”

Osteologists
Similar to zooarchaeologists, osteologists work with bones, but human bones rather than animal. In addition to making sure that human remains and graves are handled responsibly, these specialists answer questions about how people lived, died, and were buried based on their remains. From identifying ancient illnesses to analyzing burial practices, osteologists specialize in the minute details of everyday human existence and death.

Rachel Kalisher, Brown University
“As a bioarchaeologist, my primary responsibility is to handle human remains ethically and with the utmost respect. In that regard, I do my best to thoroughly document and report my findings. Prior to removing remains from the ground, I sketch each burial context, including accompanying artifacts and the location of the skeletal remains themselves. I note the body position and orientation and make any other notes that will be useful for interpretation. Bones are carefully removed and initially stored in paper bags, which ensures that the moisture from the adhering dirt dries out and does not produce mold. Once removed, the bones come straight to the laboratory where I remove dirt with wooden tools and brushes. I record the bones that are present, note any anomalies, and take photos and measurements when necessary.”

Relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo na Bíblia

KAZEN, T. Dirt, Shame, Status: Perspectives on Same-Sex Sexuality in the Bible and the Ancient World. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2024, 224 p. -ISBN 9780802884343.

Um exame acadêmico da sexualidade entre pessoas do mesmo sexo na Bíblia no contexto do mundo antigo.KAZEN, T. Dirt, Shame, Status: Perspectives on Same-Sex Sexuality in the Bible and the Ancient World. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2024, 224 p.

Proibições bíblicas de atos sexuais entre pessoas do mesmo sexo são frequentemente usadas como provas para apoiar a opressão das comunidades LGBT no ocidente hoje. No entanto, tal interpretação dessas escassas referências ignora o contexto sociohistórico crítico do mundo antigo.

Analisando uma riqueza de fontes primárias, Thomas Kazen traz estudos bíblicos para uma conversa com as normas e práticas sexuais do mundo antigo. Textos do antigo Oriente Médio, gregos e romanos, incluindo o Antigo e o Novo Testamento, exibem preocupações antigas sobre hierarquia em relacionamentos sexuais. Examinando referências à sexualidade através das lentes de poder e subordinação, honra e vergonha, e pureza, Kazen lança luz sobre passagens homofóbicas na Bíblia. Atenção especial é dada às leis levíticas e às epístolas paulinas. Por fim, Kazen nos chama a renegociar o equilíbrio entre nossa herança antiga e nossos valores contemporâneos.

Cuidadosamente pesquisado e apresentado de forma acessível, Dirt, Shame, Status oferece aos leitores uma visão sobre as diversas influências culturais na Bíblia. O trabalho de Kazen oferece uma perspectiva informada e importante sobre um tópico controverso de interesse perene. Acadêmicos, estudantes e todos os leitores curiosos das Escrituras acharão este volume um recurso indispensável para entender textos e contextos antigos complexos.

Thomas Kazen é professor e pesquisador na área de estudos bíblicos na Escola de Teologia de Estocolmo, University College Stockholm, Suécia. Ele é autor de vários livros e artigos em inglês e sueco.

 

A scholarly examination of same-sex sexuality in the Bible in the context of the ancient world.

Scriptural prohibitions of same-sex sexual acts (so-called “clobber passages”) are often used as prooftexts to support the oppression of LGBT communities in the West today. However, such interpretation of these scant references ignores critical sociohistorical context from the ancient world.

Thomas Kazen (1960-)Analyzing a wealth of primary sources, Thomas Kazen brings biblical studies into conversation with the sexual norms and practices of the ancient world. Near Eastern, Greek, and Roman texts, including the Old and New Testaments, exhibit ancient concerns about hierarchy in sexual relationships. Examining references to sexuality through the lenses of power and subordination, honor and shame, and purity, Kazen sheds light on homophobic passages in the Bible. Special attention is given to the Levitical laws and the Pauline epistles. Ultimately, Kazen calls us to renegotiate the balance between our ancient heritage and our contemporary values.

Carefully researched and accessibly presented, Dirt, Shame, Status lends readers insight into the diverse cultural influences on the Bible. Kazen’s work offers an informed and important perspective on a controversial topic of perennial interest. Scholars, students, and all curious readers of Scripture will find this volume to be an indispensable resource for understanding complex ancient texts and contexts.

Thomas Kazen is professor and research chair of biblical studies at Stockholm School of Theology, University College Stockholm. He has authored numerous books and articles in English and Swedish, including Moral Infringement and Repair in Antiquity and Impurity and Purification in Early Judaism and the Jesus Tradition.

Ações simbólicas no livro de Ezequiel

MAYFIELD, T. D.; BARTER, P. (eds.) Ezekiel’s Sign-Acts: Methods and Interpretation. Berlin: Walter de Gruyter, 2024, 240 p. – ISBN 9783111519739.

As passagens de Ezequiel que descrevem as instruções e a dramatização de mensagens divinas (Ezequiel 3-5; 12; 24; 37) estão entre as mais bizarras da BíbliaMAYFIELD, T. D.; BARTER, P. (eds.) Ezekiel’s Sign-Acts: Methods and Interpretation. Berlin: Walter de Gruyter, 2024, 240 p. Hebraica. O profeta é ordenado a incorporar sua mensagem de julgamento a Jerusalém, e essas ações esclarecem os oráculos que elas cercam. No entanto, esses atos de sinais são frequentemente negligenciados nos estudos de Ezequiel, que tendem a se concentrar nas visões estranhas e nos oráculos controversos do livro. Este volume aborda a crescente diversidade de abordagens nos estudos de Ezequiel, convidando acadêmicos seniores e juniores internacionais a se concentrarem nos textos relativos às ações simbólicas de Ezequiel. Ele visa redirecionar a atenção acadêmica para esses textos frequentemente ignorados, que são tão centrais para a compreensão da natureza da profecia, bem como do livro de Ezequiel.

 

The Ezekiel passages describing the instructions for, and dramatization of, divine messages (Ezekiel 3-5; 12; 24; 37) are among the most bizarre in the Hebrew Bible. The prophet is commanded to embody his message of judgment to Jerusalem, and these actions clarify the oracles they surround. Yet, these sign-acts are frequently overlooked within Ezekiel studies, which tend to focus on the book’s strange visions and controversial oracles. This volume addresses the growing diversity in approaches in Ezekiel studies by inviting international senior and junior scholars to focus on the texts concerning Ezekiel’s sign-acts. It aims to redirect scholarly attention to these often-ignored texts, which stand so central to understanding the nature of prophecy as well as the overall book of Ezekiel.

Tyler D. Mayfield, Lousville, KY, USA, and Penelope Barter, Amsterdam, The Netherlands.

História da língua acádia

VITA, J.-P. (ed.) History of the Akkadian Language (2 Vols). Leiden: Brill, 2021, 1692 p. – ISBN 9789004445208.

O acádio é, depois do sumério, a língua mais antiga atestada na Mesopotâmia, bem como a mais antiga língua semítica conhecida. É também uma língua com um dos registros escritos mais longos da história. E, no entanto, diferentemente de outras línguas relevantes escritas ao longo de um grande período de tempo, não houve nenhum volume dedicado à sua própria história. O objetivo do presente trabalho é preencher esse vazio. Como ele cresceu para abraçar tantas facetas do acádio, e alguns de seus capítulos são tão extensos, o trabalho é dividido em dois volumes, o primeiro cobrindo as partes 1–4 (Contexto linguístico e períodos iniciais), o segundo cobrindo as partes 5–8 (O segundo e o primeiro milênios a.C. Vida após a morte).VITA, J.-P. (ed.) History of the Akkadian Language (2 Vols). Leiden: Brill, 2021, 1692 p.

Um trabalho desse tipo só poderia ser um esforço coletivo. O resultado é apresentado em 26 capítulos escritos por 25 autores. É, portanto, um trabalho com uma gestação longa e complexa. Os autores receberam apenas uma sugestão geral de que, na medida do possível, seus capítulos não deveriam se limitar aos aspectos gramaticais da língua, mas também deveriam levar em conta seu contexto histórico e cultural.

Veja o sumário do livro e informações sobre os autores, em pdf, clicando aqui.

Juan-Pablo Vita é pesquisador do CSIC (Consejo Superior de Investigaciones Científicas) em Madri. Ele trabalha com línguas semíticas do noroeste (especialmente ugarítico) e acádio (em particular dialetos acádios periféricos), contato linguístico e história social e econômica da Síria e Canaã na Idade Recente do Bronze. Ele também é epigrafista da Mission archéologique syro-française de Ras Shamra-Ougarit.

 

Akkadian is, after Sumerian, the second oldest language attested in the Ancient Near East, as well as the oldest known Semitic language. It is also a language with one of history’s longest written records. And yet, unlike other relevant languages written over a long period of time, there has been no volume dedicated to its own history. The aim of the present work is to fill that void. Because it grew to embrace so many facets of Akkadian, and some of its chapters are so extensive, the work is divided into two volumes, the first covering parts 1–4 (Linguistic Background and Early Periods), the second covering parts 5–8 (The Second and First Millennia bce. Afterlife).

Juan-Pablo Vita (1967-)A work of this type could only be a collective endeavor. The outcome is presented in 26 chapters written by 25 authors. It is, therefore, a work with a long and complex gestation. The authors were given only a general suggestion that, as far as possible, their chapters should not be limited to the grammatical aspects of the language, but should also take into account its historical and cultural background.

Juan-Pablo Vita is a researcher at the Spanish National Research Council (csic) in Madrid. He works on Northwest Semitic languages (especially Ugaritic) and Akkadian (in particular peripheral Akkadian dialects), language contact, and the social and economic history of Syria and Canaan in the Late Bronze Age. He is also epigraphist of the Mission archéologique syro-française de Ras Shamra-Ougarit.