Gêneros gregos e autores judeus

Em 1998 escrevi um artigo que começava assim:

A partir do século III a.C., com a assimilação da língua e dos gêneros literários gregos, vários judeus tentam explicar aos seus conterrâneos e aos gregos cultos, especialmente de Alexandria, que o judaísmo é uma religião respeitável e recomendável pela sua antiguidade e pelos feitos de seus líderes.

Escrevendo em grego, e em gêneros literários gregos – da historiografia à filosofia – autores como Aristeias, Artápano, Teodoto, Jasão de Cirene e outros nos legam uma literatura de apologia do judaísmo, mas que é, ao mesmo tempo, excelente testemunho da resistência e da submissão desse povo e dessa cultura ao dominador grego.

Neste artigo, proponho a abordagem, em um primeiro momento, desta literatura de um modo geral e, em seguida, da Carta de Aristeias a Filócrates e de alguns historiadores como Demétrio, Eupólemo, o Samaritano anônimo, Artápano e o Pseudo-Hecateu.

Naturalmente esta é apenas uma amostragem, mas creio que bastante significativa, do processo de helenização que avança inexoravelmente entre os judeus durante os últimos três séculos antes da era cristã.

 

Agora leio

Um artigo:

Jewish-Greek Literature in the Hellenistic and Roman Eras: Some Findings from a Study of Genre – By Sean A. Adams, University of Glasgow, UK – The Bible and Interpretation: October 2020

Autores judeus compuseram obras literárias em grego principalmente entre meados do século III a.C. e o final do século II d.C. Tanto antes como depois desse período,ADAMS, S. A. Greek Genres and Jewish Authors: Negotiating Literary Culture in the Greco-Roman Era. Waco, TX: Baylor University Press, 2020 temos poucas evidências sobreviventes de que os judeus usavam o grego como língua de composição. Isso não quer dizer que os judeus usassem apenas o grego neste período. Está claro, pelos Manuscritos do Mar Morto, que tanto o hebraico quanto o aramaico ainda eram usados para composição. No entanto, este período de tempo oferece uma oportunidade única de ver como uma cultura minoritária se envolveu com a literatura da cultura dominante: adotando, adaptando e apropriando-se dela. A discussão oferecida aqui avalia como os autores judeus participaram dos gêneros gregos. O que se segue é um resumo de algumas descobertas recentes, bem como algumas sugestões sobre as implicações dos dados, incluindo o que este período pode nos dizer sobre a interação cultural e práticas educacionais antigas.

(…)

Uma descoberta fundamental dos estudos do judaísmo helenístico é o reconhecimento de que alguns autores judeus adotaram os gêneros gregos e foram amplamente influenciados pela cultura literária grega. Escrever em grego não implica automaticamente a adoção de gêneros gregos ou influência substancial das práticas de escrita grega (por exemplo, a apocalíptica judaica). No entanto, muitos textos mostram consciência das práticas composicionais gregas e participam, em graus variados, de gêneros gregos reconhecíveis. Esse noivado não foi acidental, nem foi feito de forma inconsciente. Dos corpora maiores de Fílon de Alexandria e Flávio Josefo a obras individuais, como a Carta de Aristeu a Filócrates, ganhamos uma noção da consciência de gênero de certos autores judeus, como eles classificaram gêneros e textos em categorias, muitas vezes com base em características formais e propósito, e como estes categorias interagiram entre si para formar um sistema holístico.

 

Jewish authors composed literary works in Greek primarily between the middle of the third century BCE and the end of the second century CE. Both before and after this period, we have little surviving evidence that Jews used Greek as a compositional language. This is not to say that Jews only used Greek; it is clear from collections found near Qumran (i.e., the Dead Sea Scrolls) that both Hebrew and Aramaic were still employed for composition. However, this time period provides a unique opportunity to see how one minority culture engaged with the dominant culture’s literature: adopting, adapting, and appropriating it. The discussion offered here evaluates how Jewish authors participated in Greek genres. What follows is a summary of some recent findings (Adams 2020) as well as some suggestions about the implications of the data, including what this period can tell us about cultural interaction and ancient education practices.

(…)

The most basic finding of studies into Hellenistic Judaism is the recognition that some Jewish authors adopted Greek genres and were widely influenced by Greek literary culture. Writing in Greek does not automatically imply the adoption of Greek genres or substantial influence of Greek writing practices (e.g., Jewish apocalyptic). Nevertheless, many texts display awareness of Greek compositional practices and participate, to varying degrees, in recognizable Greek genres. This engagement was not accidental, nor was it done subconsciously. From the larger corpora of Philo and Josephus to individual works, such as Letter of Aristeas, we gain a sense of the genre consciousness of certain Jewish authors, how they sorted genres and texts into categories often based on formal features and purpose, and how these categories related to each other to make a holistic system (cf. Adams 2020, 90-92, 229-39).

 

Um livro:

ADAMS, S. A. Greek Genres and Jewish Authors: Negotiating Literary Culture in the Greco-Roman Era. Waco, TX: Baylor University Press, 2020, 448 p. – ISBN 9781481312912.

O mundo antigo, assim como o nosso, floresceu em diversidade e intercâmbio culturais. As riquezas dessa realidade social são evidentes nos escritos de judeus nas eras helenística e romana. Os autores judeus basearam-se na ampla gama de convenções literárias gregas e deram novas expressões às orgulhosas tradições de sua fé e identidade étnica. Eles não hesitaram em modificar e adaptar as formas que receberam da cultura circundante, mas suas obras permanecem como participantes legítimos da tradição literária greco-romana.

Em Greek Genres and Jewish Authors [Gêneros gregos e autores judeus], Sean A. Adams argumenta que uma compreensão robusta do gênero antigo facilita a interpretação textual adequada. Essa perspectiva é vital para um insight sobre o autor, o propósito original da obra e como os leitores originais a teriam recebido. Adotando uma teoria de gênero protótipo cognitivo, Adams fornece uma discussão detalhada de autores judeus que escreveram em grego de ca. 300 a.C. a ca. 135 d.C. – incluindo autores do Novo Testamento – e sua participação em gêneros gregos. Os nove capítulos se concentram em amplas divisões de gênero (por exemplo, poesia, didática, filosofia) para fornecer estudos sobre o envolvimento de cada autor com gêneros gregos, identificando expressões e características representativas e atípicas.

A contribuição mais proeminente do livro reside em sua síntese de dados para fornecer uma macroperspectiva sobre as maneiras pelas quais os autores judeus participaram e adaptaram os gêneros gregos – em outras palavras, como os membros de uma cultura minoritária intencionalmente se envolveram com as práticas literárias da cultura dominante ao lado dos recursos dos judeus tradicionais, resultando em expressões de texto exclusivas.

 

The ancient world, much like our own, thrived on cultural diversity and exchange. The riches of this social reality are evident in the writings of Jews in the Hellenistic and Roman eras. Jewish authors drew on the wide range of Greek literary conventions and gave fresh expressions to the proud traditions of their faith and ethnic identity. They did not hesitate to modify and adapt the forms they received from the surrounding culture, but their works stand as legitimate participants in Greco-Roman literary tradition.

In Greek Genres and Jewish Authors, Sean Adams argues that a robust understanding of ancient genre facilitates proper textual interpretation. This perspective is vital for insight on the author, the work’s original purpose, and how the original readers would have received it. Adopting a cognitive-prototype theory of genre, Adams provides a detailed discussion of Jewish authors writing in Greek from ca. 300 BCE to ca. 135 CE–including New Testament authors–and their participation in Greek genres. The nine chapters focus on broad genre divisions (e.g., poetry, didactic, philosophy) to provide studies on each author’s engagement with Greek genres, identifying both representative and atypical expressions and features.

The book’s most prominent contribution lies in its data synthesis to provide a macroperspective on the ways in which Jewish authors participated in and adapted Greek genres–in other words, how members of a minority culture intentionally engaged with the dominant culture’s literary practices alongside traditional Jewish features, resulting in unique text expressions. Greek Genres and Jewish Authors provides a rich resource for Jewish, New Testament, and classical scholars, particularly those who study cultural engagement, development of genres, and ancient education.

Sean A. Adams is Senior Lecturer in New Testament and Ancient Culture in the Department of Theology and Religious Studies at the University of Glasgow.

Talmud online

Para quem tem interesse no Talmud, lembro que a tradução de Adin Steinsaltz está online em hebraico e inglês no site Sefaria.

Sobre isso dois artigos, em inglês, podem ser lidos:

:: Online library sets Talmud ‘free’ with full, no-charge translations – By Ben Sales – 8 February 2017 – The Times of Israel
For centuries, studying a page of the Talmud has come with a bevy of barriers to entry. Written mostly in Aramaic, the Talmud in its most commonly printed form also lacks punctuation or vowels, let alone translation. Its premier explanatory commentary, composed by the medieval sage Rashi, is usually printed in an obscure Hebrew typeface read almost exclusively by religious, learned Jews. Even then, scholars can still spend hours figuring out what the text means. And that’s not to mention the Talmud’s size and cost: 37 full volumes, called tractates, take up an entire shelf of a library and can cost several thousand dollars. Now, a website hopes to build on these earlier breakthroughs and break all the barriers at once. Sefaria, a website founded in 2013 that aims to put the seemingly infinite Jewish canon online for free, has published an acclaimed translation of the Talmud in English. The translation, which includes explanatory notes in relatively plain language, was started by Rabbi Adin Steinsaltz in 1965 and is considered by many to be the best in its class (…) The translation’s publication was made possible by a multimillion-dollar deal with the Steinsaltz edition’s publishers, Milta and Koren Publishers Jerusalem, and financed by the William Davidson Foundation, a family charity. The edition will be known as The William Davidson Talmud.

:: The Babylonian Talmud Is Now Available Free Online in English and Hebrew – By Yair Rosenberg – February 7, 2017 – Tablet
One of the most accessible Hebrew and English translations of the Babylonian Talmud is going open source. Today, Sefaria, an online nonprofit bringing traditional Jewish texts to the internet, announced that it will be posting the entire compendium with the crisp bilingual translation of Jerusalem polymath Rabbi Adin Steinsaltz Even-Yisrael. A multi-decade scholarly effort first published in Israel, the Hebrew Steinsaltz Talmud has long been a print staple of the beit midrash, while the English edition has been distributed by Random House and Koren Publishers. Now, however, both translations will be available to anyone with an internet connection, thanks to a grant from the William Davidson Foundation.

Quem é Adin Steinsaltz? Confira aqui, aqui e aqui.

Observo que o site Sefaria está também disponível em aplicativos gratuitos para Android e iOS.

Uma história do judaísmo

Um livro recebido com muito entusiasmo por especialistas na área.

GOODMAN, M. A History of Judaism. Princeton: Princeton University Press, 2018, 656 p. – ISBN 9780691181271.

GOODMAN, M. A History of Judaism. Princeton: Princeton University Press, 2018, 656 p.

In this magisterial and elegantly written book, Martin Goodman takes readers from Judaism’s origins in the polytheistic world of the second and first millennia BCE to the temple cult at the time of Jesus. He tells the stories of the rabbis, mystics, and messiahs of the medieval and early modern periods and guides us through the many varieties of Judaism today. Goodman’s compelling narrative spans the globe, from the Middle East, Europe, and America to North Africa, China, and India. He explains the institutions and ideas on which all forms of Judaism are based, and masterfully weaves together the different threads of doctrinal and philosophical debate that run throughout its history.

Martin Goodman é Professor de Estudos Judaicos na Universidade de Oxford, Reino Unido.

Leia mais sobre o livro no site da editora.

Quem somos nós? A visão judaica

Quem somos nós? Falam Autores Judeus do Século III ao Século I a.C. Artigo publicado na Ayrton’s Biblical Page em 1998.

A partir do século III a.C., com a assimilação da língua e dos gêneros literários gregos, vários judeus tentam explicar aos seus conterrâneos e aos gregos cultos, especialmente de Alexandria, que o judaísmo é uma religião respeitável e recomendável pela sua antiguidade e pelos feitos de seus líderes.

Escrevendo em grego, e em gêneros literários gregos – da historiografia à filosofia – autores como Aristeias, Artápano, Teodoto, Jasão de Cirene e outros nos legam uma literatura de apologia do judaísmo, mas que é, ao mesmo tempo, excelente testemunho da resistência e da submissão desse povo e dessa cultura ao dominador grego.

Neste artigo, proponho a abordagem, em um primeiro momento, desta literatura de um modo geral e, em seguida, da Carta de Aristeias a Filócrates e de alguns historiadores como Demétrio, Eupólemo, o Samaritano anônimo, Artápano e o Pseudo-Hecateu.

Naturalmente esta é apenas uma amostragem, mas creio que bastante significativa, do processo de helenização que avança inexoravelmente entre os judeus durante os últimos três séculos antes da era cristã.

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Segundo os gregos, quem são os judeus?

Quem são os judeus? Falam autores gregos do século IV a.C. ao século I d.C. Cadernos do Cearp, Ribeirão Preto, n. 9, p. 39-60, 1998.

Como é que os gregos antigos veem os judeus? Existe compreensão e aceitação de sua cultura ou não? Constituem os judeus um povo a ser respeitado ou “civilizado”? Como é de se esperar, não temos uma opinião abrangente dos gregos sobre os judeus. O homem grego comum não pode mais testemunhar nesta questão. Mas há os escritos de vários autores da época. E através deles podemos perguntar aos gregos: Quem são, para vocês, os judeus?

As respostas serão diferenciadas, mas nos 18 autores que analisarei a seguir aparecem alguns elementos comuns:

  • os judeus são vistos e julgados a partir dos padrões culturais e civilizatórios gregos, transformando-se assim a sua história em uma história muitas vezes mítica e absurda porque a diferença cultural não é respeitada
  • os costumes alimentares e cultuais judaicos, em geral causam profunda estranheza ao mundo grego
  • as origens de Israel são frequentemente desfiguradas por feroz anti-semitismo que tem sua origem nos conflitos da época do autor e que não deveria ser assim retroprojetado para o final do II milênio.

Do século V a.C. ao início do século II d.C., de Heródoto a Plutarco, são conhecidos 175 fragmentos de 57 autores gregos que falam dos judeus. Destes 57 autores vou apresentar apenas 18. São os mais interessantes quanto às suas opiniões e/ou informações sobre os judeus. Muitos dos outros que deixo de lado trazem apenas informações geográficas sobre a Palestina ou referências muito vagas aos judeus.

Este artigo está disponível na Ayrton’s Biblical Page. Clique aqui e continue a leitura.

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Flávio Josefo, homem singular

Flávio Josefo, homem singular em uma sociedade plural. Cadernos de Teologia, Campinas, n. 5, p. 29-51, 1998.

Neste artigo, sem grandes pretensões de originalidade, mas que tem como objetivo estimular a leitura da obra de Flávio Josefo, importante historiador judeu  do século I d.C., gostaria de  destacar  6 momentos fundamentais:

1. A origem aristocrática de Josefo, sua ligação com os asmoneus, seus estudos e sua formação.

2. A  experiência do deserto na adolescência e a opção religiosa. Casamento e reintegração na vida da família em Jerusalém.

3. A viagem a Roma: o aristocrata provinciano que vê a grandeza e o poderio do Império. A influência deste fato no seu confronto posterior com Roma.

4. O comando da Galileia, a contemporização, a derrota, a suspeita sobrevivência, a “profecia” feita a Vespasiano.

5. De prisioneiro a amigo dos romanos no cerco de Jerusalém. Ao lado de Tito, sua teologia é: Deus abandonou os judeus e agora está com os romanos (traição teológica).

6. Sua condição privilegiada em Roma, as rivalidades e os ciúmes, a obra histórica: encomenda e defesa.

Procurarei sempre olhar Flávio Josefo como ator e intérprete: participa dos acontecimentos e depois os interpreta. Objetivamente Josefo é um traidor de seu povo: este é o nosso olhar crítico hoje. Entretanto, subjetivamente, ele não se vê como traidor, mas modelo: a visão de si mesmo que aparece  na sua obra será destacada.

Este artigo está disponível na Ayrton’s Biblical Page, com bibliografia atualizada até 2015. Clique aqui e continue a leitura.

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The Rylands Genizah Collection

Parte dos escritos judaicos encontrados na guenizá da sinagoga Ben Ezra do Cairo e que estão na Biblioteca John Rylands, da Universidade de Manchester, Reino Unido.

The John Rylands University Library, The University of Manchester holds a collection of nearly 15,000 fragments, mostly written in Hebrew and Judeo-Arabic, from the Genizah of the Ben Ezra Synagogue in Old Cairo, purchased from the estate of Dr Moses Gaster in 1954. About 90% of the items are on paper, the remainder on parchment. The vast majority are very small fragments. They date from the 10th to the 19th century AD and include religious and literary texts, documentary sources, letters, and material relating to grammar, philosophy, medicine, astrology and astronomy. Rylands Genizah currently contains high resolution images of the great majority of these fragments.

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O Papiro Nash está online
The Cairo Genizah Collection

A invenção do povo judeu

Este livro acaba de sair no Brasil. Mas já fez muito barulho pelo mundo afora.

SAND, S. A invenção do povo judeu. São Paulo: Benvirá, 2011, 576 p. – ISBN 9788502134775.

Em inglês: SAND, S. The Invention of the Jewish People. London: Verso, 2010, 344 p. – ISBN 9781844676231.

English edition first published by Verso 2009 – Translation Yael Lotan. The Invention of the Jewish People was first published as Matai ve’ekh humtza ha’am hayehudi? [When and How Was the Jewish People Invented?], Resling 2008.

Shlomo Sand, judeu, estudou história na Universidade de Tel Aviv, Israel, e na École des hautes études en sciences sociales, em Paris. É professor de História Contemporânea na Universidade de Tel Aviv, Israel.

Diz a editora Benvirá, do grupo Saraiva:
A invenção do povo judeu ficou 19 semanas na lista de mais vendidos em Israel, em 2008, e é alvo de polêmica acirrada onde quer que seja lançado. Neste trabalho iconoclasta, ao questionar a identidade dos judeus como nação, o historiador Shlomo Sand, ele mesmo judeu, sugere as bases para uma nova visão do futuro político da “Terra Prometida”. Amparado em farta pesquisa, o autor questiona o discurso historiográfico canônico e formula a tese de que os judeus sempre formaram comunidades religiosas importantes em diversas regiões do mundo, mas não constituem uma nação portadora de uma origem única. O conceito de estado-nação é, portanto, posto em xeque, assim como a ideia de Israel como um Estado pertencente aos judeus do mundo todo – aqueles que escolheram outra pátria em vez de retornar à terra de seus ancestrais. Para o autor, Israel deveria reconhecer seus habitantes, sejam eles israelenses ou palestinos. Publicado em dez línguas, este é um livro questionador, e por isso mesmo necessário, assim como todos os que se propõem a lançar novas luzes sobre a História e seus mitos.

Diz a Amazon.com sobre o autor:
Shlomo Sand studied history at the University of Tel Aviv and at the École des hautes études en sciences sociales, in Paris. He currently teaches contemporary history at the University of Tel Aviv. His books include The Invention of the Jewish People, L’Illusion du politique: Georges Sorel et le débat intellectuel 1900, Georges Sorel en son temps, Le XXe siècle à l’écran and Les Mots et la terre: les intellectuels en Israël.

Diz André Egg, em sua resenha do livro, publicada na Gazeta do Povo em 20/09/2011, sob o título Políticas da história em Israel:

A Invenção do Povo Judeu, de Shlomo Sand, publicado originalmente em 2008, acaba de sair no Brasil, depois de já ter provocado boas discussões em outros países. O autor é professor em Tel Aviv e em Paris, e se considera ele próprio um testemunho da dificuldade em definir a etnicidade judaica. Sua decisão de escrever a obra surgiu da discordância política com os processos de construção da história disseminada nos livros didáticos em Israel. Segundo Sand, com base numa visão sionista do passado, o Estado de Israel se fundamenta na garantia de privilégio aos judeus. Os não judeus possuiriam posição jurídica, social e econômica inferior. O escritor demonstra como a necessidade de uma classificação rigorosa de cidadãos privilegiados levou a uma articulação íntima da política dominante com o rabinato. E contaminou o pensamento jurídico ou mesmo a pesquisa universitária em biologia e genética. Articulando uma retórica política contra o fundamento etnorreligioso do Estado de Israel, o livro de Sand realiza um meticuloso trabalho de desconstrução do discurso sionista. O autor documenta o surgimento da historiografia sionista e seu predomínio até hoje no meio acadêmico e escolar em Israel, demonstrando que, ao mesmo tempo em que os nacionalismos se fortaleceram na Europa do século 19, especialmente nos locais de cultura germânica e no Leste Europeu, historiadores pioneiros começam a escrever as sínteses históricas capazes de dar uma identidade nacional aos judeus. Isso era então uma novidade porque desde sempre os judeus se definiram como tais pelo pertencimento a uma comunidade religiosa. Sand segue o percurso dos eruditos alemães, depois iídiches do Leste Europeu, passa pela fundação dos jewish studies em universidades norte-americanas e chega na criação da Universidade de Jerusalém. Em todos esses lugares o discurso era semelhante, com algumas pequenas variações: a Bíblia deveria ser lida como documento histórico fiel, com a história dos patriarcas, do Êxodo, do reino de Davi. Após a destruição do segundo templo pelo imperador romano no ano 70 d.C., teria se iniciado um exílio de quase 1,9 mil anos, em que os judeus estiveram aguardando o prometido retorno à sua terra de origem. Esta terra seria sua por direito, e o Estado de Israel deveria servir para guardar esse direito de todos os judeus exilados. Nesse discurso, os judeus não teriam se misturado com outros povos durante este tempo, tendo mantido uma pureza étnica que seria o testemunho de sua situação de povo eleito…

Leia o texto completo.

Leia Mais:
Página do autor Shlomo Sand na Amazon.com

Mística e Razão: dialética no pensamento judaico

A Editora Perspectiva e a Livraria da Vila convidam para o lançamento, hoje, 20 de junho de 2011, das 19h00 às 22h00, do livro de Alexandre Leone, Mística e Razão: Dialética no Pensamento Judaico.

Local: Livraria da Vila – Lorena – Piso Térreo – Alameda Lorena, 1731

LEONE, A. Mística e Razão: Dialética no Pensamento Judaico. São Paulo: Perspectiva, 2011, 200 p. – ISBN 9788527309127

Diz a editora:
“Abraham Joshua Heschel (1906-1972), notável filósofo judeu, voltou sua atenção diretamente para a literatura rabínica tradicional em Torá min ha-Shamaim be-Aspaklaria shel ha-Dorot (A Torá Revelada Apreendida Através das Lentes das Gerações de Sábios), em especial para aquela contida no Talmud, no Midrash e nos comentaristas medievais. Dessa leitura emerge uma visão dialética das correntes de pensamento que animaram os debates das primeiras interpretações rabínicas sobre questões como o elemento humano e o divino na revelação; a imanência versus a transcendência de Deus; a relação entre observância religiosa e o espírito por trás da observância; a noção de milagre versus a ideia de uma natureza autônoma; e muitos outros temas do debate judaico que têm atravessado os séculos. Heschel identifica, a partir de duas escolas de pensamento rabínico dos primeiros séculos da era comum – a escola de rabi Akiva, de tendência mística, e a escola de rabi Ishmael, de tendência racionalista –, dois grandes paradigmas que tensionaram dialeticamente o pensamento rabínico desde o final da Antiguidade e durante a Idade Média. Essas tendências têm permeado o pensamento judaico e, desde então, contribuído para uma abordagem única no trato da contradição. A leitura dialética das fontes rabínicas redimensiona a relação entre razão e misticismo na experiência religiosa judaica e, para além de aprofundar o debate moderno sobre a natureza da experiência religiosa, é também uma poderosa crítica contra as leituras fundamentalistas dos textos tradicionais judaicos. Este pensamento e esta leitura são o objeto de reflexão do rabino e pesquisador Alexandre Leone, em Mística e Razão: Dialética no Pensamento Judaico, que a Perspectiva leva ao leitor em mais um volume da coleção Estudos”.

Alexandre Leone: graduado em ciências sociais, tornou-se mestre e doutor em cultura judaica pela FFLCH-USP. Ordenou-se rabino e recebeu o Master of Arts (Jewish Philosophy) pelo Jewish Theological Seminary of America-JTS, de Nova York. É professor da Escola Dominicana de Teologia, do Colégio Bialik e pesquisador do Centro de Estudos Judaicos da USP. É rabino da comunidade judaica de Alphaville. Estudioso do pensamento e da filosofia judaica medieval e moderna, sua pesquisa está centrada no aspecto ético e humanizante do judaísmo.

Conheci Alexandre Leone no Congresso da SOTER de 1999, quando, partindo do relato de Gênesis 1, apresentou a interpretação judaica da criação baseado em três fontes rabínicas: o Midrash, o sábio medieval Maimônedes e, especialmente, a interpretação mística baseada no Zohar, que vê a criação como um processo constante e o ser humano como parceiro de Deus na criação.