Mês da Bíblia 2011: Êxodo, segundo a revista Concilium

VAN IERSEL, B.; WEILER, A. et al. Êxodo: paradigma sempre atual. Concilium, Petrópolis, n. 209, 1987, 144 p.

Por Sebastião de Magalhães Viana Junior

A Revista Internacional de Teologia “Concilium” foi fundada em 1965 pelos teólogos Congar, Hans Küng, Metz, Rahner e Schillebeeckx. Como era de se esperar, tendo seu início com os maiores teólogos europeus do século XX, aos poucos agrupou ao seu redor teólogos de renome do mundo inteiro. Este exemplar da Revista que está conosco traz três listas dos membros do comitê de direção e dos de consulta de Sagrada Escritura e História da Igreja. De fato, são nomes de peso, espalhados pelo mundo, cujo pensamento se reúne nos resultados das publicações. Elaborada por teólogos europeus, latino-americanos, asiáticos, americanos e africanos, e com publicação simultânea em 7 línguas (francês, inglês, italiano, alemão, holandês, espanhol e português), cada número da Revista sempre volta seu olhar e a direção de sua reflexão para algum tema específico e de interesse para os cristãos, ainda que muitos dos temas sejam polêmicos. Isso acontece porque a motivação para a fundação da Revista se encontra na vontade de manter vivo o “espírito do Concílio Vaticano II”, empenhado em abrir a Igreja Católica para o diálogo com o mundo. Quando um número traz um tema relevante e/ou polêmico, o pano de fundo para sua escolha é manter sempre aberto o diálogo da teologia com a sociedade.

Neste fascículo, que apresentaremos, há uma novidade: “é o primeiro elaborado após a decisão da comissão de direção de reunir num mesmo número a matéria de exegese e de história da Igreja” (p. 5). O que quiseram foi “tornar visível a eficiência da Sagrada Escritura na história que se segue após” (p. 5), ou seja, sem Escrituras a história desenvolvida a partir delas, cujos próprios fundamentos estão nelas, não faz sentido. Tratar do Êxodo desse ponto de vista não significa descartar a importância de sua análise teológica, adotando a atualidade de sua discussão como critério. Por evidenciar tão bem a liberdade, o Êxodo torna-se um “paradigma sempre atual”, “de eficácia perene”. Isso já oferece bastante material para nossa apresentação.

Os temas discutidos foram assim distribuídos: “após o editorial, Roland Murphy – desde o início e até há pouco tempo, um dos diretores da seção de exegese [lembrando que este número é de 1987] – faz uma breve análise sobre a relação entre a Sagrada Escritura e a História da Igreja. […] Do próprio tema se trata em quatro seções.

A primeira se restringe às Escrituras, mas já demonstra de algum modo como o acontecimento-êxodo se torna um paradigma. Rita Burns explica como, no Pentateuco, as experiências do Egito são tematizadas. Zenger chega à conclusão de que o tema do novo êxodo em Isaías – realizado no mesmo tempo das tradições mais recentes do Pentateuco – amplia essa temática. As reflexões sobre os dados bíblicos terminam com o artigo de Casey a respeito de como este tema é apresentado no Apocalipse de São João.

Na segunda seção tomamos conhecimento de desenvolvimentos ulteriores. Pinchas Lapide escreve sobre a tradição judaica pós-bíblica. John Newton analisa alguns textos programáticos de diferentes movimentos eclesiais que apelam para o êxodo-evento, enquanto Weiler faz pesquisas a respeito da experiência de comunidades semelhantes. A seção termina com uma contribuição esclarecedora de Kort sobre o romance de Leon Uris intitulado Exodus.

A terceira seção se dedica aos desenvolvimentos contemporâneos na própria teologia. Dussel expõe a teologia da libertação, Young a teologia negra e Bergant a teologia feminista. Dussel elabora um modelo estrutural do êxodo-paradigma, relevante também para as duas outras formas de teologia.

A quarta seção apresenta um caráter mais estimativo e hermenêutico. O sociólogo e teólogo Baum avalia a influência do êxodo-paradigma na política, o teólogo da libertação Severino Croatto esclarece os efeitos recíprocos do motivo do êxodo na história da libertação e das experiências nesta história sobre a interpretação daqueles trechos bíblicos. Tracy finalmente tenta uma avaliação teológica” (p. 5-6).

Pelo que pudemos perceber, grande parte da primeira seção não apresenta nada de novo. Com efeito, o terreno da exegese bíblica é bem movediço. Pisar nele é correr o risco de afundar e perder-se. Dizemos isso porque temos em mãos artigos escritos há mais de duas décadas, e, pelo modo como a pesquisa arqueológica tem avançado, reafirmar qualquer coisa sobre o Pentateuco (ou sobre qualquer outro livro bíblico) como verdade absoluta, sem considerar a possibilidade de amanhã ter de desfazer-se de tudo isso, é incorrer em erro grave com a ciência bíblica. O que até então se disse deve ser aceito até que não se diga algo mais bem fundamentado. Sendo assim, a primeira seção não nos interessa muito, já que pretendemos apresentar a atualidade sempre evidente do tema do Êxodo presente na narrativa bíblica. Claro que sua importância não deixa de existir, porque é a partir das Escrituras que é possível perceber o êxodo como paradigma.

As alusões ao Êxodo sempre são muito numerosas, desde os livros do Antigo Testamento até a História da Igreja, como vimos. Desde o início da tradição hebraica, o Êxodo tornou-se o grande ato salvífico de IHWH, através do qual Ele libertou Israel e o instituiu como povo. Muitos notaram que Israel vê as raízes de sua nacionalidade e de sua religião no Êxodo, muito mais do que poderiam vê-las na história dos patriarcas. A razão de sua fé é histórica. Acreditar que IHWH preocupa-se com o povo oprimido é possível porque Ele mesmo manifestou seu poder e sua vontade salvando-o da opressão. Não é sem razão que a memória desse evento permanece ainda muito viva. “Por quê? Por que esse êxodo de tão alta antiguidade já há muito não caiu no esquecimento? É porque nós, judeus, em contraste com outras religiões, nunca separamos a história mundial da história da salvação. Desde sempre a salvação é sentida em Israel como um processo histórico-terreno, que, entretanto, em seu significado mais profundo é antes de tudo de natureza religiosa. Pois nem Moisés nem Aarão são os heróis deste drama, mas Deus, que se revela como o libertador dos fracos e desprovidos de direitos” (Pinchas Lapide, p. 49).

Esse grande evento era comemorado na festa da Páscoa, na qual era feita a recitação litúrgica da história do grande acontecimento (cf. Dt 6,20ss). Celebrar é tornar célebre. Era preciso celebrar a Pessah (páscoa), a festa judaica da libertação e da constituição do povo. Celebrar é fazer ser lembrado: quanto mais se lembra menos se esquece. Mais do que a libertação e constituição do povo, em primeiro lugar, celebrava-se o Deus vivo como fonte da vida.

Este tema liga-se diretamente ao da seção seguinte, na qual são apresentados enfoques genitivos da teologia (da libertação, do negro, da mulher), a partir da leitura do Êxodo. Embora os autores dessa seção (Enrique Dussel, Josiah Young e Dianne Bergant) escrevam com muita propriedade, deve ficar claro que eles não têm a pretensão de reelaborar toda a teologia bíblica. À luz de sua fé e do conhecimento que têm, pretendem, nos parece, decifrar esses setores relevantes da existência humana. Contudo, o ponto de vista que orienta seu trabalho e sua pesquisa há de reconhecer sua própria insuficiência diante do grande leque de possibilidade de novos enfoques. Em vinte anos, quantos outros não poderiam ser discutidos, tendo como ponto de partida o mesmo Êxodo? Como aconteceu outrora com o povo de Israel, sempre que houver alguma insatisfação com o modo como as coisas estão estabelecidas, numa relação dominador-dominado; sempre que houver um certo “mal-estar” por isso, presente geralmente em grupos minoritários e fracos, haverá um novo modo de acender esperanças. As teologias descritas nessa seção são sempre libertadoras; elas respondem aos sinais dos tempos, porque animam a práxis transformadora das relações humanas.

Por esse motivo, o Êxodo é sempre um paradigma atual: ele desemboca em práticas transformadoras, onde houver uma realidade que precise ser mudada (por exemplo, quanto ao espaço da mulher na sociedade, ele se reflete na teologia quando se redescobre e se resgata imagens maternas de Deus, purificando-o de imagens patriarcais e cheia de conotações masculinas, ou quando, na Bíblia, as figuras femininas são redescobertas; quanto ao negro, a teologia cujo enfoque se volta para ele, aparece como resposta ao etnocentrismo, que procura estabelecer uma determinada etnia como a perspectiva humana padrão. Quando surge a discriminação de multidões e de povos inteiros, lá é necessário haver o êxodo deles).

Enfim, cremos que neste mês da Bíblia, empenhados na leitura do livro do Êxodo, teremos um novo vigor para propor mudança onde imperar experiências baseadas no sistema de opressão. A proposta de leitura desse número da Revista “Concilium” para o mês da Bíblia de 2011 é válida, embora o fascículo seja de 1987. Isso só reafirma o que dissemos com os diversos autores: “Êxodo: paradigma sempre atual”. Ela vem ajudar-nos, iluminando-nos com o texto bíblico, a confrontar nossas vidas com a Palavra de Deus, levando-nos também ao nosso êxodo.

Mês da Bíblia 2011: Êxodo, segundo a CNBB

CNBB Travessia: passo a passo, o caminho se faz – Ex 15,22-18,27. Brasília: CNBB, 2011, 88 p. – ISBN 9788579720864

Por Ferdinando Henrique Pavan Rubio

Este livro apresenta, de maneira introdutória, subsídios para estudo, reflexão, oração e prática para o mês da Bíblia de 2011. A “Travessia”, como sugere o tema, segue o roteiro apresentado em Ex 15,22-18,27 e a escolha se justifica, pois o êxodo e a caminhada são realidades vividas no dia a dia do povo de Deus.

O objetivo da reflexão sobre a caminhada do povo de Deus no deserto é animar as comunidades cristãs de hoje. Tratando disso, dedicaremos mais atenção às etapas da marcha no deserto depois da libertação do Egito, fato que antecede a experiência de Deus e a revelação do Sinai.

O lema escolhido “Aproximai-vos do Senhor” (Ex 16,9) é um convite a renunciar aos ídolos mudos e retomar a caminhada, fiéis ao Senhor.

Finalmente, este livro foi escrito a três mãos. A primeira parte, “Êxodo e caminhada”, que contextualiza a travessia no êxodo, foi elaborada por Frei Vicente Artuso. A segunda parte, “As etapas da caminhada”, com os roteiros para estudo e reflexão, foi desenvolvida por Frei Ildo Perondi (Ex 15,22-17,16) e por Valmor da Silva (Ex 18).

A primeira parte do livro logo nos apresenta que êxodo significa saída, é caminhada em marcha, enfrentando dificuldades, vencendo etapas e também celebrando conquistas passo a passo; a esperança final da caminhada é a entrada na terra prometida.

O tema do êxodo possui profundo sentido teológico, pois revela que o Senhor é o personagem central da história. Ele está presente nos acontecimentos como libertador que supera o poderoso concorrente, o faraó do Egito.

É provável que a época histórica do êxodo do Egito ocorreu por volta de 1250 a.C., durante o domínio do poderoso faraó Ramsés II que reinou por 67 anos e que grande parte dos livros de Êxodo e Números foi formada a partir do cativeiro de Babilônia (587-538 a.C.). O Pentateuco, por sua vez, só ficou pronto por volta de 400-350 a.C.

Aliás, partida (êxodo), caminhada (deserto), parada (sinais), chegada (Moab) são etapas na realização do projeto do Êxodo bem costuradas nos cinco livros do Pentateuco.

Na segunda parte dessa obra, seguem-se os passos da travessia pelo deserto, a caminhada após a passagem do mar, até a chegada ao monte Sinai. Vejamo-los:

Primeiro roteiro, Ex 15,22-27: O povo de Deus no deserto – Neste trecho o povo já saiu do Egito e a caminhada em busca da Terra Prometida agora começa a entrar pelo deserto. Mas após três dias de viagem o estoque de água acabou. Veio a sede e a primeira fonte encontrada em Mara, era de água amarga. Por isso o povo começou a murmurar, mas Moisés agirá em nome do povo para resolver o problema da sede. Esta passagem bíblica termina indicando que, quando partiu de Mara, o povo caminhou mais um longo trecho e chegou até Elim. Desta vez não houve mais murmurações e então o povo encontrou a abundância: doze fontes de água, setenta palmeiras e o lugar para o descanso! (cf. Ex 15,27).

Segundo roteiro, Ex 16,1-36: O povo de Deus diante da fome – Depois da sede em Mara, surgiu outro problema na caminhada do povo: a fome. Então o povo voltou a murmurar! Deus, porém, escutou o clamor de seu povo e, usando o maná e as codornizes, solucionou o flagelo da fome.

Terceiro roteiro, Ex 17,1-7: A sede leva seu povo a tentar seu Deus – Faltou água e o povo “murmurou” contra Moisés outra vez. Ele já não sabia mais o que fazer, pois até corria o risco de ser apedrejado. A solução para o problema veio, outra vez, do meio do povo, quando Deus mandou que Moisés escolhesse os “anciãos” para ajudá-lo e que levasse consigo a vara. Assim, Moisés golpeou a rocha e dela saiu água! Novamente o problema foi resolvido.

Quarto roteiro, Ex 17,8-16: A oração e a luta vencem o inimigo – O novo conflito surgiu com os amalecitas, que atacaram o povo de Deus que rumava à Terra Prometida. Josué foi o responsável pela organização do povo para a defesa e realização do combate com os inimigos. Enquanto isso, Moisés, junto com seus dois ajudantes, subiu à montanha para interceder e pedir ajuda. Aqui, a intervenção divina foi o que desequilibrou o combate, trazendo a vitória ao povo de Deus.

Quinto roteiro, Ex 18,1-12: Famílias se encontram para um projeto comum – Antes de acampar ao pé do monte Sinai, em pleno deserto, um novo episódio marca o fim dessa caminhada. Chega Jetro, com a filha e os netos, para encontrar o genro. O assunto entre Moisés e o sogro girou em torno dos feitos do Senhor em favor de Israel, algo que causou grande alegria a Jetro, a ponto de louvar e professar a fé no Deus Javé.

Sexto roteiro, Ex 18,13-27: O caminho da participação passa pela descentralização – A palavra de Jetro impulsiona nova organização com maior descentralização do poder, ao sugerir escolher do meio do povo homens capazes, tementes a Deus, seguros, incorruptíveis, e organizá-los como chefes de mil, de cem, de cinquenta e de dez. juntamente com Moisés, eles serão juízes permanentes e dividirão a carga, de maneira proporcional.

Mês da Bíblia 2011: Êxodo, segundo o Centro Bíblico Verbo

CENTRO BÍBLICO VERBO A caminhada no deserto: entendendo o livro do Êxodo 15,22-18,27. São Paulo: Paulus, 2011, 112 p. – ISBN 9788534928045

Por Wesley Gonçalves de Oliveira

A equipe do Centro Bíblico Verbo publicou recentemente, a cargo da Paulus editora, um riquíssimo livro que, servindo de reflexão em encontros ou cursos bíblicos, busca oferecer às pessoas e comunidades um roteiro simples com fundamentação bíblica para assuntos importantes na pastoral.

Organizado para ser um subsídio para o Mês da Bíblia de 2011, A caminhada no deserto – Entendendo o livro do Êxodo 15,22-18,27 oferece elementos capazes de mostrar com clareza o contexto em que os textos desse livro foram escritos, incentivando o leitor a se aprofundar na mensagem e a viver os ensinamentos de Deus. Os autores são Maria Antônia Marques e Shigeyuki Nakanose.

Este subsídio pertence à coleção “Do povo para o povo” e surgiu da necessidade de socializar numa linguagem simples e didática as descobertas da pesquisa bíblica. A leitura divide-se em uma introdução e cinco encontros. Cada um traz orientações sobre o tema proposto, situando, comentando e aprofundando o texto sugerido para os debates.

A estrutura do livro é a seguinte:

  • Introdução a Êxodo 15,22-18,27: aqui temos uma visão geral das narrativas citadas, da estrutura do Livro do Êxodo (divisão, época de escrita, contexto…) e uma síntese da proposta deste estudo em cinco encontros
  • Primeiro encontro – Ex 15,22-27 e 17,1-7: a falta de água (episódios de Mara e da água da rocha) – Título do capítulo: Deus está presente em nossa caminhada
  • Segundo encontro – Ex 16,1-3.12-21: o alimento (episódios do maná e das codornizes) – Título do capítulo: A partilha gera vida
  • Terceiro encontro – Ex 17,8-16: a guerra santa (combate contra Amalec) – Título do capítulo: Deus quer a vida em plenitude para todos os povos, nações e línguas
  • Quarto encontro – Ex 18,1-12: encontro de Moisés com sua família (chegada de Jetro, de Séfora e dos filhos) – Título do capítulo: Deus se faz presente nas relações cotidianas
  • Quinto encontro – Ex 18,13-27: a descentralização do poder (epísódio dos juízes) – Título do capítulo: A centralização do poder destrói a comunidade

Os encontros salientam de modo geral a importância da partilha, reavivando a experiência da gratuidade de Deus nos milagres experimentados em nossa vida cotidiana. Além disso, os responsáveis pelo texto falam sobre as relações humanas, meditam acerca do compromisso com a justiça e a solidariedade e destacam vários temas presentes no livro do Êxodo que ainda são atuais em nossa sociedade.

É mister observar que esses textos contêm memórias das dificuldades vivenciadas no deserto. No entanto, é possível identificar algumas repetições: por exemplo, há dois relatos sobre a falta de água. Percebemos informações que causam estranheza: por exemplo, em Ex 4,20, por ordem de Javé, Moisés, sua mulher e seu filho voltam para o Egito, mas em Ex 18,2, a mulher e os filhos – que agora são dois – estão em Madiã.

Afinal, qual é o nome do sogro de Moisés? Raguel (Ex 2,16-18) ou Jetro (Ex 4,18; 18,1-12)? Os dois são apresentados como sacerdotes de Madiã e como sogros de Moisés. Outra questão que podemos observar é a insistência na observância da Lei, tema que não é próprio da realidade do deserto.

Para compreender essas questões levantadas pela leitura do texto bíblico, os autores enfatizam que é fundamental saber a época em que ele foi escrito e como foi o processo de redação. O livro do Êxodo preserva uma memória antiga, mas grande parte desse livro foi escrita no período pós-exílico, por volta do ano 400 a.C. Nesse período, a observância da Lei de Deus era fundamental.

A insistência na observância da Lei aparece diversas vezes nos textos da caminhada no deserto. Em Ex 15,26, após o relato da cura da água, lemos: “Se ouvires atento a voz de Javé teu Deus e fizeres o que é reto diante dos seus olhos, se deres ouvido a seus mandamentos e guardares todas as suas leis, nenhuma enfermidade virá sobre ti, das que enviei sobre os egípcios. Pois eu sou Javé, aquele que te restaura”.

Neste mesmo capítulo, em Ex 15,26, surge a teologia da retribuição: se o povo for obediente à Lei, ninguém ficará doente. Essa compreensão teológica é típica do tempo de Esdras e Neemias (450-398 a.C.). E, por fim, o preconceito contra os estrangeiros, que aparece na guerra contra os amalecitas (Ex 17,8-16). Esses elementos comprovam que grande parte dos textos de Êxodo 15-18 foram compostos no período do pós-exílio, por volta do ano 400 a.C.

Em Ex 16,4.28-29 o texto insiste na observância da Lei e especifica a exigência de guardar o sábado. Em Ex 18,16.20, lemos: “… e lhes faço conhecer os decretos de Deus e as suas leis. Ensina-lhes os estatutos e as leis, faze-lhes conhecer o caminho a seguir e as obras que devem fazer”. Porém, é importante perceber que, conforme a narrativa, Moisés só recebe a Lei mais à frente, em Ex 19.

É no tempo de Esdras que se dá a redação final do livro do Êxodo. Assim, podemos entender o porquê da insistência da observância da Lei, de Deus poderoso aniquilando os inimigos de Israel, e a exclusão das mulheres do cenário sociopolítico, econômico e religioso. São temas e compreensões teológicas do pós-exílio que foram inseridos na caminhada no deserto e atribuídos a Javé. Mas, nas entrelinhas de Ex 15,22-18,27, podemos encontrar a memória da partilha, da solidariedade e da experiência de um Deus que caminha com o povo.

Em suma, o Êxodo é um acontecimento sempre vivo. Deve ser lembrado sempre. É a história de um povo a caminho. Um ensinamento que deve ser celebrado de geração em geração (cf. Ex 13,8-9). Por isso somos convidados a entrar nessa caminhada e refazer esse percurso, procurando novas luzes para a nossa caminhada de hoje, afirmam os autores.

Mês da Bíblia 2011: subsídios apresentados pelos alunos

O livro do Êxodo faz parte de meu programa de Pentateuco, disciplina estudada no Primeiro Ano de Teologia do CEARP neste semestre. Em geral, apenas os 15 primeiros capítulos do livro do Êxodo são estudados quase no final do ano.

O texto proposto para ser aprofundado no Mês da Bíblia deste ano, Ex 15,22-18,27, nem entra no programa, por falta de tempo. Mesmo assim, pedi aos alunos, como fiz no ano passado com o livro de Jonas, que se encarregassem de apresentar alguns dos estudos disponíveis em português sobre estes textos. Onze textos foram apresentados e uma síntese do que foi feito será publicada a partir de hoje no blog.

A ordem de publicação é aleatória, porque os publico à medida em que os recebo. Ao clicar nos títulos dos livros, o leitor será remetido ao post sobre ele.

Ex 15,22-18,27 é formado por um conjunto de tradições sobre a caminhada no deserto, composto pelos seguintes textos:
. Ex 15,22-27: Mara, a água amarga
. Ex 16,1-36: o maná e as codornizes
. Ex 17,1-7: a água da rocha
. Ex 17,8-16: combate contra Amalec
. Ex 18,1-12: encontro de Jetro com Moisés
. Ex 18,13-27: instituição dos juízes

Os textos apresentados:

BALANCIN, E. M.; STORNIOLO, I. Como ler o livro do Êxodo: o caminho para a liberdade. 9. ed. São Paulo: Paulus, 1997, 64 p. – ISBN 8534901953
Por Bruno Luiz Ferreira da Silva

CENTRO BÍBLICO VERBO A caminhada no deserto: entendendo o livro do Êxodo 15,22-18,27. São Paulo: Paulus, 2011, 112 p. – ISBN 9788534928045
Por Wesley Gonçalves de Oliveira

CNBB Travessia: passo a passo, o caminho se faz – Ex 15,22-18,27. Brasília: CNBB, 2011, 88 p. – ISBN 9788579720864
Por Ferdinando Henrique Pavan Rubio

DA SILVA, V. Deus ouve o clamor do povo: teologia do êxodo. São Paulo: Paulinas, [2004] 2010, 113 p. – ISBN 8535614435
Por Severino Germano da Silva

LOPES, M. Deus liberta escravos e faz nascer um povo novo: Êxodo 15 a 18. São Leopoldo: CEBI/Paulus, 2011, 74 p. – ISBN 9788577331284
Por André Luís Rodrigues

MESTERS, C.; OROFINO, F. A Caminhada do Povo de Deus. Os desafios da travessia: Ex 15-18. São Leopoldo: CEBI, 2011, 48 p. – ISBN 9788577331253
Por Luciano Giopato Roncoleta

PIXLEY, G. V., Êxodo. São Paulo: Paulus, 1987, 252 p. – ISBN 8505006224 [o livro em português está esgotado, mas o original espanhol está disponível online aqui] Por Mateus Morais e Silva

SAB Aproximai-vos da presença do Senhor (Ex 16,9): Mês da Bíblia 2011. São Paulo: Paulinas, 2011, 56 p.
Por Thiago José Barbosa de Oliveira Santos

SCHWANTES, M. et al. A memória popular do êxodo. 2. ed. Estudos Bíblicos, Petrópolis, n. 16, 1996, 84 p.
Por Victor Mariano Rodrigues

VAN IERSEL, B.; WEILER, A. et al. Êxodo: paradigma sempre atual. Concilium, Petrópolis, n. 209, 1987, 144 p.
Por Sebastião de Magalhães Viana Junior

VV.AA. Animação Bíblica da Pastoral: passo a passo a travessia se faz. Vida Pastoral, São Paulo, n. 280, setembro-outubro de 2011, 64 p.
Por Edson Carlos Braz

Leia Mais:
Mês da Bíblia 2011: Ex 15,22-18,27 – Um
Mês da Bíblia 2011: Ex 15,22-18,27 – Dois
Alguns comentários do Livro do Êxodo

Um dicionário bíblico atualizado e em português

Estou falando do

BERLEJUNG, A.; FREVEL, C. (orgs.) Dicionário de termos teológicos fundamentais do Antigo e do Novo Testamento. São Paulo: Loyola/Paulus, 2011, 536 p. – ISBN 9788515037872.

Traduzido do original alemão, este dicionário comenta os termos, os conceitos e os temas centrais do Antigo e Novo Testamentos. É o mais atualizado do gênero em língua portuguesa.

O original alemão é de 2006, mas já existe uma segunda edição, sem alterações, publicada em 2009:

BERLEJUNG, A.; FREVEL, C. (orgs.) Handbuch theologischer Grundbegriffe zum Alten und Neuen Testament. 2. Auflage. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 2009, 468 Seiten – ISBN 9783534224029.

Diz a sinopse da Paulus:
O presente dicionário é concebido tanto como livro de estudo quanto como obra enciclopédica de consulta. Comenta os termos, os conceitos e os temas centrais do Antigo e do Novo Testamento que são fundamentais para a fé cristã até os nossos tempos, tornando-se assim um subsídio e um compêndio indispensável de teologia bíblica para teólogos, estudantes e pessoas interessadas na Sagrada Escritura. O volume foi elaborado com a colaboração de renomados cientistas e pesquisadores internacionais, segundo o mais atual estado da pequisa da exegese e da teologia.

No fascículo 282 da REB, de abril de 2011, nas páginas 520-522, há uma resenha de Jaldemir Vitório (FAJE, Belo Horizonte), ainda sobre a tradução italiana de 2009. Com fortes recomendações. Aliás, ele termina assim: “Quanto sei, algo parecido em nossa língua, seja, apenas, o Vocabulário de Teologia Bíblica, de Xavier Léon-Dufour, publicado pela Editora Vozes, na década de 70″ [a edição atual é a décima, de 2009].

De minha parte, li algumas coisas de historiografia e gostei. Está bem atualizado. O assunto é tratado, quanto ao Antigo Testamento, por Ernst Axel Knauf, da Universidade de Berna, Suíça. Velho conhecido do Seminário Europeu sobre Metodologia Histórica.

Onde encontrar a Vida Pastoral no site da Paulus?

Um serviço de “utilidade pública”… também para os meus alunos.

Clique aqui… e eis a Vida Pastoral.

Excelente revista. Leia online, ou faça o download, disponível em PDF. É de graça…

Ora, se há uma coisa aborrecida na Internet é a volatilidade dos links…

Como disse, dia desses, John Hobbins sobre os biblioblogs:
A gripe I will air right away: it is sad that some biblical bloggers, when they hang up their skates, delete their past blogging from the internet. One of the consequences of blog-deletion is that links to posts and comments on the deleted blog no longer work.
Um desabafo que eu quero fazer já: é triste que alguns biblioblogueiros, quando “penduram as chuteiras”, apaguem seus antigos blogs da Internet. Uma das consequências da exclusão de um blog é que os links para posts e comentários no blog excluído ficam quebrados em outras páginas.

Um link é uma entidade, como se sabe, alterável, breve, caduca, descontinuada, efêmera, extinguível, findável, finita, frágil, fugaz, fugidia, fugitiva, impermanente, inconstante, indefinida, infrequente, instável, morredoura, movediça, móvel, mudadiça, passadiça, perecível, provisória, temporária, transitiva, transitória, volátil, voltívola, volúvel… Criada, aliás, à nossa imagem e semelhança…

Ecumenismo hoje: uma reflexão teoecológica

O tema de capa da Revista IHU On-Line desta semana, edição 370, publicada em 22.08.2011, é:

O ecumenismo hoje. Uma reflexão teoecológica

O que significa ser ecumênico no atual contexto contemporâneo? Que avanços e obstáculos existem na busca de unidade das Igrejas cristãs? E, diante da chamada crise ambiental, qual o papel das cristãs e dos cristãos na defesa da Criação? Por ocasião do 6º Encontro de Agentes para o Ecumenismo (Mutirão Ecumênico), promovido pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs – CONIC, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB e Conselho Latino-Americano de Igrejas – CLAI, com a participação de agentes ecumênicos dos estados do RS, SC, PR e SP, a IHU On-Line dedica esta edição ao ecumenismo hoje, em perspectiva teoecológica.

As entrevistas:

  • Dom Francisco de Assis Silva: “Ser ecumênico é abrir-se à alteridade”
  • Walter Altmann: 500 anos depois: Recordar a Reforma, olhando para os desafios comuns da cristandade
  • Manoel João Francisco: Tolerância e alteridade: princípios para confiar no outro, reconhecendo as diferenças
  • Marcelo Barros: Ecumenismo e macroecumenismo: unidade interior na diversidade de caminhos
  • Anivaldo Padilha: “O ecumenismo é movido pelo Espírito e não pode ser considerado propriedade de nenhuma igreja”
  • Nancy Cardoso Pereira: Ecumenismo, ecologia, economia: um olhar feminino e feminista
  • Haroldo Reimer: De apocalípticos a proféticos: a metanoia necessária diante da Criação
  • Erico Hammes: “A abertura para a unidade com o outro/a é inerente à identidade”
  • Paulo Homero Gozzi: Unidade, liberdade, caridade: o desafio de superar a “ignorância” em torno do ecumenismo
  • Marcelo Schneider: Nem diplomacia, nem cordialidade: um mandato apostólico fundamental
  • Arno Kayser: Criação: denominação cristã para a sinfonia do universo

Líbia: se Kadafi perde o poder, quem o ganha?

A grande pergunta que segue aberta é como os insurgentes líbios poderão converter sua vitória no campo de batalha em uma paz estável e aceita por todos. O Conselho Nacional de Transição (CNT), em Benghazi, já reconhecido por tantos estados nacionais como sendo o governo legítimo da Líbia, é de duvidosa legitimidade e de duvidosa autoridade. Os próprios insurgentes admitem que sem a guerra aérea feita a seu favor pela OTAN – com 7459 ataques aéreos sobre os partidários de Kadafi – estariam mortos ou fugindo.

La guerra civil en Libia duró más de lo esperado, pero la caída de Trípoli llegó antes de lo pronosticado. Como en Kabul en 2001 y en Bagdad en 2003, no había una postura de defender a ultranza al régimen derrotado, cuyos partidarios parecían haberse derretido una vez que vieron que la derrota era inevitable. Mientras es claro que el coronel Muammar Khadafi perdió poder, no resulta claro saber quién lo ganó. Los rebeldes estaban unidos ante un enemigo común, pero no mucho más. El Consejo Nacional de Transición (CNT) en Benghazi, ya reconocido por tantos estados extranjeros como el gobierno legítimo de Libia, es de dudosa legitimidad y autoridad. Pero hay otro problema para terminar la guerra. Los insurgentes mismos admiten que sin la guerra aérea hecha a su favor por la OTAN –con 7459 ataques aéreos sobre blancos de Khadafi– estarían muertos o huyendo. La cuestión, por lo tanto, sigue abierta a cómo pueden los rebeldes convertir pacíficamente su victoria del campo de batalla asistida por el exterior en una paz estable y aceptable para todos los partidos de Libia.

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Fonte: Patrick Cockburn, de The Independent para Página/12. Publicado em português por Carta Maior: 24/08/2011

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