CENTRO BÍBLICO VERBO A caminhada no deserto: entendendo o livro do Êxodo 15,22-18,27. São Paulo: Paulus, 2011, 112 p. – ISBN 9788534928045
Por Wesley Gonçalves de Oliveira
A equipe do Centro Bíblico Verbo publicou recentemente, a cargo da Paulus editora, um riquíssimo livro que, servindo de reflexão em encontros ou cursos bíblicos, busca oferecer às pessoas e comunidades um roteiro simples com fundamentação bíblica para assuntos importantes na pastoral.
Organizado para ser um subsídio para o Mês da Bíblia de 2011, A caminhada no deserto – Entendendo o livro do Êxodo 15,22-18,27 oferece elementos capazes de mostrar com clareza o contexto em que os textos desse livro foram escritos, incentivando o leitor a se aprofundar na mensagem e a viver os ensinamentos de Deus. Os autores são Maria Antônia Marques e Shigeyuki Nakanose.
Este subsídio pertence à coleção “Do povo para o povo” e surgiu da necessidade de socializar numa linguagem simples e didática as descobertas da pesquisa bíblica. A leitura divide-se em uma introdução e cinco encontros. Cada um traz orientações sobre o tema proposto, situando, comentando e aprofundando o texto sugerido para os debates.
A estrutura do livro é a seguinte:
- Introdução a Êxodo 15,22-18,27: aqui temos uma visão geral das narrativas citadas, da estrutura do Livro do Êxodo (divisão, época de escrita, contexto…) e uma síntese da proposta deste estudo em cinco encontros
- Primeiro encontro – Ex 15,22-27 e 17,1-7: a falta de água (episódios de Mara e da água da rocha) – Título do capítulo: Deus está presente em nossa caminhada
- Segundo encontro – Ex 16,1-3.12-21: o alimento (episódios do maná e das codornizes) – Título do capítulo: A partilha gera vida
- Terceiro encontro – Ex 17,8-16: a guerra santa (combate contra Amalec) – Título do capítulo: Deus quer a vida em plenitude para todos os povos, nações e línguas
- Quarto encontro – Ex 18,1-12: encontro de Moisés com sua família (chegada de Jetro, de Séfora e dos filhos) – Título do capítulo: Deus se faz presente nas relações cotidianas
- Quinto encontro – Ex 18,13-27: a descentralização do poder (epísódio dos juízes) – Título do capítulo: A centralização do poder destrói a comunidade
Os encontros salientam de modo geral a importância da partilha, reavivando a experiência da gratuidade de Deus nos milagres experimentados em nossa vida cotidiana. Além disso, os responsáveis pelo texto falam sobre as relações humanas, meditam acerca do compromisso com a justiça e a solidariedade e destacam vários temas presentes no livro do Êxodo que ainda são atuais em nossa sociedade.
É mister observar que esses textos contêm memórias das dificuldades vivenciadas no deserto. No entanto, é possível identificar algumas repetições: por exemplo, há dois relatos sobre a falta de água. Percebemos informações que causam estranheza: por exemplo, em Ex 4,20, por ordem de Javé, Moisés, sua mulher e seu filho voltam para o Egito, mas em Ex 18,2, a mulher e os filhos – que agora são dois – estão em Madiã.
Afinal, qual é o nome do sogro de Moisés? Raguel (Ex 2,16-18) ou Jetro (Ex 4,18; 18,1-12)? Os dois são apresentados como sacerdotes de Madiã e como sogros de Moisés. Outra questão que podemos observar é a insistência na observância da Lei, tema que não é próprio da realidade do deserto.
Para compreender essas questões levantadas pela leitura do texto bíblico, os autores enfatizam que é fundamental saber a época em que ele foi escrito e como foi o processo de redação. O livro do Êxodo preserva uma memória antiga, mas grande parte desse livro foi escrita no período pós-exílico, por volta do ano 400 a.C. Nesse período, a observância da Lei de Deus era fundamental.
A insistência na observância da Lei aparece diversas vezes nos textos da caminhada no deserto. Em Ex 15,26, após o relato da cura da água, lemos: “Se ouvires atento a voz de Javé teu Deus e fizeres o que é reto diante dos seus olhos, se deres ouvido a seus mandamentos e guardares todas as suas leis, nenhuma enfermidade virá sobre ti, das que enviei sobre os egípcios. Pois eu sou Javé, aquele que te restaura”.
Neste mesmo capítulo, em Ex 15,26, surge a teologia da retribuição: se o povo for obediente à Lei, ninguém ficará doente. Essa compreensão teológica é típica do tempo de Esdras e Neemias (450-398 a.C.). E, por fim, o preconceito contra os estrangeiros, que aparece na guerra contra os amalecitas (Ex 17,8-16). Esses elementos comprovam que grande parte dos textos de Êxodo 15-18 foram compostos no período do pós-exílio, por volta do ano 400 a.C.
Em Ex 16,4.28-29 o texto insiste na observância da Lei e especifica a exigência de guardar o sábado. Em Ex 18,16.20, lemos: “… e lhes faço conhecer os decretos de Deus e as suas leis. Ensina-lhes os estatutos e as leis, faze-lhes conhecer o caminho a seguir e as obras que devem fazer”. Porém, é importante perceber que, conforme a narrativa, Moisés só recebe a Lei mais à frente, em Ex 19.
É no tempo de Esdras que se dá a redação final do livro do Êxodo. Assim, podemos entender o porquê da insistência da observância da Lei, de Deus poderoso aniquilando os inimigos de Israel, e a exclusão das mulheres do cenário sociopolítico, econômico e religioso. São temas e compreensões teológicas do pós-exílio que foram inseridos na caminhada no deserto e atribuídos a Javé. Mas, nas entrelinhas de Ex 15,22-18,27, podemos encontrar a memória da partilha, da solidariedade e da experiência de um Deus que caminha com o povo.
Em suma, o Êxodo é um acontecimento sempre vivo. Deve ser lembrado sempre. É a história de um povo a caminho. Um ensinamento que deve ser celebrado de geração em geração (cf. Ex 13,8-9). Por isso somos convidados a entrar nessa caminhada e refazer esse percurso, procurando novas luzes para a nossa caminhada de hoje, afirmam os autores.