Resenhas na RBL: 17.01.2008

As seguintes resenhas foram recentemente publicadas pela Review of Biblical Literature:

Young S. Chae
Jesus as the Eschatological Davidic Shepherd: Studies in the Old Testament, Second Temple Judaism, and in the Gospel of Matthew
Reviewed by Daniel M. Gurtner

Robert B. Chisholm Jr.
Interpreting the Historical Books: An Exegetical Handbook
Reviewed by Brian D. Russell

Craig Cooper, ed.
Politics of Orality: (Orality and Literacy in Ancient Greece, Vol. 6)
Reviewed by Jonathan A. Draper

Tamás Czövek
Three Seasons of Charismatic Leadership: A Literary-Critical and Theological Interpretation of the Narrative of Saul, David and Solomon
Reviewed by Robin Gallaher Branch

John Paul Heil
Ephesians: Empowerment to Walk in Love for the Unity of All in Christ
Reviewed by Gosnell L. Yorke

J. Todd Hibbard
Intertextuality in Isaiah 24-27: The Reuse and Evocation of Earlier Texts and Traditions
Reviewed by Jeffery M. Leonard

Steven W. Holloway, ed.
Orientalism, Assyriology and the Bible
Reviewed by Patricia Dutcher-Walls

George H. van Kooten, ed.
The Revelation of the Name YHWH to Moses: Perspectives from Judaism, the Pagan Graeco-Roman World, and Early Christianity
Reviewed by Sabrina Inowlocki

Jerome Murphy-O’Connor
Jesus and Paul: Parallel Lives
Reviewed by Joseph A. Fitzmyer, S.J.

Grant R. Osborne
The Hermeneutical Spiral: A Comprehensive Introduction to Biblical Interpretation
Reviewed by Oda Wischmeyer

Rosemary Radford Ruether, ed.
Feminist Theologies: Legacy and Prospect
Reviewed by Mary L. Coloe

Megan Hale Williams
The Monk and the Book: Jerome and the Making of Christian Scholarship
Reviewed by Jonathan Yates

Jesus e os camponeses: novo livro de D. Oakman

Quem já leu algo de Douglas E. Oakman, como Jesus and the Economic Questions of His Day (1987) ou Palestine in the Time of Jesus: Social Structures and Social Conflicts (com K. C. Hanson, 2. edition 2008), sabe da importância de seus estudos para se entender a Palestina da época de Jesus.

Pois mais um estudo de Oakman, Jesus e os camponeses, acaba de ser publicado agora em janeiro de 2008, na coleção Matrix: The Bible in Mediterranean Context da editora Cascade Books, que tem outros estudos bem interessantes:

OAKMAN, D. E. Jesus and the Peasants. Eugene, OR : Cascade Books, 2008, 348 p. – ISBN 9781597522755

Diz a editora:

While some of the chapters focus on systemic issues, others probe the depths of individual Gospel passages. The author’s keen eye for textual detail, archaeological data, comparative materials, and systemic overviews make this volume a joy for anyone interested in understanding Jesus in his own context. The volume is organized into three interrelated parts:
1) Political economy and the peasant values of Jesus
2) The Jesus traditions within peasant realities
3) The peasant aims of Jesus.

Leitura do livro de Rute: algumas dificuldades

Meu artigo Leitura socioantropológica do livro de Rute ficou pronto no dia 27 de dezembro. Será publicado na revista Estudos Bíblicos número 98, em junho de 2008. Confira aqui a minha proposta de leitura.

Contudo, ainda não sei se consegui fazer uma leitura socioantropológica – que explica os fatos sociais – ou uma leitura sócio-histórica – que descreve os dados sociais relevantes! Mas o que foi feito, bem ou mal, já foi feito. A partir de março, por favor, as avaliações são bem-vindas.

O que eu gostaria de colocar a seguir, após a bibliografia e as resenhas de obras sobre Rute, são algumas questões difíceis que encontrei ao estudar o texto e ao confrontar posições de diferentes autores. Questões que eu chamaria de abertas, porque podem ter muitas respostas ou mesmo não ter nenhuma resposta mais segura, por enquanto. Como já disse, o livro é pequeno, muito bem escrito, mas tem alguns nós difíceis de desatar.

Observo que neste texto serão colocados apenas os problemas. As soluções que encontrei ou escolhi estarão na revista Estudos Bíblicos.

1. Uma questão metodológica, para começar. Já abordada em meu artigo Leitura socioantropológica da Bíblia Hebraica. Uma típica dificuldade encontrada pelos biblistas no uso da leitura socioantropológica é a diversidade de tendências e a grande extensão do campo das ciências sociais, o que faz com que alguém, mesmo com um conhecimento razoável das obras de Durkheim, Weber e Marx e de eventuais pensadores mais recentes, se sinta bastante perdido quando se fala de perspectivas de conflito, funcionalismo estrutural, idealismo cultural, materialismo cultural… Com freqüência não se sabe que método escolher ou misturam-se na análise várias tendências sociológicas, criando um método eclético que corre o risco de oferecer uma belíssima solução para um problema inexistente ou mal colocado. Ou, como alertam outros autores, nós, biblistas, costumamos utilizar teorias antropológicas e sociológicas que já foram abandonadas pelos especialistas nas respectivas áreas, porque consideradas superadas. Ou, em outras duras palavras: chegamos sempre atrasados, e o resultado é bastante insatisfatório.

2. Por que será que o autor/a de Rute situa os acontecimentos em Belém de Judá e os seus personagens como efrateus? Por causa da genealogia de Davi em 4,17b-22 (Booz gerou Obed, Obed gerou Jessé e Jessé gerou Davi)? Mas seria a genealogia de Davi parte da obra original ou um acréscimo posterior usado para “canonizar” o livro? Ora a genealogia tem uma perspectiva exclusivamente androcêntrica, em contraste com o restante do livro que tem uma perspectiva ginocêntrica. Como conciliar as duas coisas? Buscando outra solução, há quem pense que pode ser uma aplicação da profecia de Mq 5,1-3 (5,1a: “E tu, Belém-Éfrata, pequena entre os clãs de Judá, de ti sairá para mim aquele que governará Israel”)… Porém assim não estamos, mais uma vez, arrumando uma solução “davídica” para o problema? Outros dizem: sim, solução davídica, mas não por causa deste ou daquele texto, mas porque há um “davidismo” forte entre os judaítas que elogiam Belém em contraste com Jerusalém, pois os reis (de Jerusalém) levaram Judá ao exílio, enquanto Davi (de Belém) levou as tribos acuadas e dispersas a grande país… Contudo, pergunta-se ainda: há realmente este “davidismo” no pós-exílio? Como comprová-lo? De qualquer maneira, seria viável a postura que insiste em ler o livro de Rute como uma defesa da restauração da dinastia davídica no pós-exílio?

3. Por que escolher Moab como destino da família de Elimelec e uma moabita, Rute, como a portadora da solução para a crise da família? Moab é a terra de um povo que outras tradições bíblicas vêem com hostilidade, conforme se lê em Dt 23,3-7 e Ne 13,1-3. Lembro ao leitor que em todo o livro apenas os territórios de Judá (restrito a Belém de Judá e aos efrateus) e Moab (restrito a “campos de Moab e às moabitas Orfa e Rute”) são explicitamente citados.

4. A migração da família de Elimelec para Moab e a volta de Noemi e Rute a Belém poderiam estar sugerindo ao leitor uma analogia com a situação de exílio babilônico e volta para Judá e isto poderia ser usado como um argumento razoável para colocar o livro na época persa?

5. Terá mesmo existido em Yehud – nome aramaico do Judá pós-monárquico -, a partir da metade do século V a.C, a chamada comunidade do “Segundo Templo”, também apelidada pelos estudiosos, em alemão, de Bürger-Tempel-Gemeinde? Esta comunidade pode ser sumariamente definida como uma unidade social que surge da união do pessoal do templo com os proprietários de terra, criando um sistema econômico autônomo. Esta Bürger-Tempel-Gemeinde criaria, assim, uma sociedade dentro da sociedade, um restrito grupo privilegiado não co-extensivo com a sociedade mais ampla da província. Seria este o contexto no qual foi escrito o livro de Rute, que defende a tradicional estrutura do clã (mishpâhâ) constituído por um agrupamento de famílias ampliadas (bêth-‘abhôth) que moram na mesma região e se auxiliam tanto no setor social quanto no econômico, constituindo uma comunidade jurídica local?

6. Na época do domínio persa sobre Yehud, há, pelo menos, outras três propostas para dar estabilidade e identidade à comunidade. Há a proposta de Zorobabel e Josué: reconstruir o Templo e o altar, narrada em Ag 1,1-15a; Zc 4,1-6a;10b-14; Esd 3,1-13; já a proposta de Esdras é manter a pureza da raça e observar a Lei, narrada em Esd 9,1-10,44; Ne 8,1-18 e, finalmente, a de Neemias, que é reconstruir Jerusalém, devolver terras alienadas e perdoar dívidas de agricultores empobrecidos, como está em Ne 5,1-19. As três vêm de Jerusalém. Ora, estas três propostas são rejeitadas ou, no mínimo, ignoradas pelo autor/a do livro de Rute. Jerusalém, o Templo, o culto, as autoridades centrais enviadas pela Pérsia nem são mencionadas no livro. Situar a estória na “época dos juízes”, não seria um modo inteligente de camuflagem literária utilizada pelo autor/a do livro de Rute para fazer sua própria proposta tão diferente das outras? E nem tão sutil assim é o desafio à proibição de casamentos com estrangeiras decretado por Esdras: Rute não é apenas uma estrangeira, ela é uma moabita. E assim é insistentemente chamada no livro: “Rute, a moabita”! Uma moabita que jamais é designada na estória como estrangeira residente (ger), merecedora de ajuda, pessoa com direitos (Dt 24,19–21), mas que é uma nokriyyâ, uma estrangeira sem nenhum direito (Rt 2,10). Para aqueles que gostam de pensar que a estória está, de fato, falando dos “dias em que julgavam os juízes”, pergunto: onde estão estes juízes no quarto ato do livro (4,1-12)? Nem mesmo se usa o verbo “julgar” (shâphat), na reunião em que se decide quem vai comprar a propriedade de Noemi e se casar com Rute …

7. Quem lida com o livro de Rute enfrenta o grande problema de decidir se a solução proposta pelo autor/a no capítulo 4 envolve além do resgate da terra, a ge’ulla (Lv 25), também o casamento com o cunhado, o levirato (Dt 25,5-10), e qual seria a relação entre estas duas leis. Esta questão divide os especialistas, pois Rute não é judaíta, Booz não é seu cunhado, não há contrato de casamento (contrariando normas legais documentadas, na época, em papiros da comunidade judaíta de Elefantina), o texto fala o tempo todo apenas de “resgate”, a exigência de casamento com Rute feita por Booz ao parente anônimo que tem direito de resgate da terra parece extraordinária, já que os textos das leis não falam nada disso. Estaríamos lidando com uma lei anterior a Dt 25,5-10, que poderia ser chamada de “casamento redentor”, mais amplo que o levirato em sentido estrito? Ou, em sentido oposto, estaríamos lidando com uma interpretação bem mais recente de Dt 25,5-10, uma espécie de midrash da antiga lei, aplicada aqui de maneira muito mais livre? Enfim, por que as duas leis estariam interligadas, devendo ser executadas em conjunto (4,5)? Ou ainda: o livro de Rute aplica, no capítulo 4, a lei do resgate e do levirato ou apenas a lei do resgate?

8. Uma questão menor, mas que aparece em certos autores é a compra da terra que Booz faz no capítulo 4. De quem é a terra? É de Noemi ou de outra pessoa do clã para quem Noemi já vendera a terra? Há autores que dizem ser de outra pessoa. Mas onde está isto no texto?

9. Onde foi escrito o livro de Rute? Em Jerusalém? Em outro lugar? Esta é uma questão que não abordei…

10. Quem escreveu o livro de Rute? Um homem? Uma mulher? Qualquer um dos dois? O livro tem uma perspectiva ginocêntrica e isto coloca a possibilidade de uma autoria feminina. Mas seria esta autoria feminina necessária para explicar a perspectiva do livro? Sendo as duas genealogias do final – uma curta, 4,17b, e uma longa, 4,18-22 – essencialmente androcêntricas, e considerando como bastante provável que não faziam parte da obra original, quando teriam sido acrescentadas e quem o teria feito?

Libânio analisa a greve de fome de Dom Cappio

Merece leitura atenta a entrevista do teólogo João Batista Libânio à IHU On-Line:

A greve de fome de Dom Cappio: um ato de nítido alcance político

“Ao assumir uma posição política, não a exerceu no estilo de Cristandade, como se escreveu, porque não o fez em nome de nenhum dos poderes do Estado. Tentou influenciar o Estado pelo lado que compete a todas as instituições e pessoas fazê-lo: gerar ideias, valores, contrapor-se a outras diferentes, exprimir posições com gestos radicais”, afirma João Batista Libânio, em entrevista por e-mail à IHU On-Line, refletindo sobre a greve de fome de Dom Cappio e sua luta contra a transposição do Rio São Francisco.

Licenciado em Filosofia pela Faculdade de Filosofia de Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, em Letras Neolatinas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), em Teologia pela Hochschule Sankt Georgen, em Frankfurt, Alemanha, Libânio é também mestre e doutor em Teologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana (PUG) de Roma e leciona Teologia no Instituto Santo Inácio de Belo Horizonte.

É autor de uma imensa produção teológica. Entre outros, citamos os seguintes livros: Teologia da revelação a partir da Modernidade (5. ed. São Paulo: Loyola, 2005); Eu creio – Nós cremos. Tratado da fé (2. ed. São Paulo: Loyola, 2005); Qual o caminho entre o crer e o amar? (2. ed. São Paulo: Paulus, 2005); e Introdução à vida intelectual (3. ed. São Paulo: Loyola, 2006). Dele, também foi publicado o artigo “Contextualização do Concílio Vaticano II e seu desenvolvimento” no livro A Teologia na universidade contemporânea (São Leopoldo: Unisinos, 2005, p. 13-45), organizado por Inácio Neutzling.

João Batista Libânio é assíduo nas páginas da revista IHU On-Line. Publicamos uma entrevista com ele na 103ª edição, de 31-05-2004, um artigo na 136ª edição, de 11-05-2005, outra entrevista na edição número 150, de 08-8-2005, uma entrevista na 214ª edição, de 02-04-2007, e mais uma entrevista na 224ª edição, de 20 de junho de 2007. Confira também um artigo de Libânio, intitulado “Contextualização do Concílio Vaticano II e seu desenvolvimento” e publicado nos Cadernos Teologia Pública, número 16, de 2005.

 

IHU On-Line – Como o senhor vê o papel de Dom Cappio no debate sobre as obras de transposição do Rio São Francisco? O que o senhor pensa sobre a greve de fome e sobre a proposta de revitalização, defendida por Dom Cappio?

João Batista Libânio – A consciência e a interioridade de uma pessoa escapam à nossa análise. O mundo das intenções está entregue a Deus e à consciência pessoal. As ações, desde que se exteriorizam, caem sob o nosso juízo que sempre é parcial e desde ângulos determinados. Uma primeira análise: o aspecto testemunhal de Dom Cappio. Os que convivem com ele, que o conheceram e conhecem atestam a limpidez evangélica de seu agir. Prefiro ficar com tal testemunho do que levantar suspeitas azedas, como certos órgãos de publicidade. Admiro a coragem, a ousadia do gesto. Ultrapassa o comum dos mortais. Ninguém arrisca a vida, se não em casos extremos e heroicos. Ele o fez. E por quê? Pelo que ele escreveu, falou e outros comentaram, ele se pôs ao lado do povo pobre mais ligado ao Rio São Francisco e de que ele tem experiência pessoal. Bom recordar que ele, com pequeno grupo, percorreu o Rio São Francisco das nascentes na Serra da Canastra até a sua foz durante um ano. Adquiriu conhecimento minucioso e bem localizado do mundo diretamente ligado à problemática do rio. Ora bem, a partir desse ângulo analisou o projeto da transposição e o processo como ele foi e vinha sendo conduzido.

Formou-se um duplo juízo: técnico-político e ético. Sob o primeiro aspecto, considerou o projeto do Governo não corresponder aos interesses do povo ribeirinho e visar a outros interesses, especialmente do agronegócio, embora indiretamente também atinja pessoas necessitadas do Nordeste. Não viu proporção entre os benefícios reais para o povo e os custos. Mais: com instituições especializadas pensou em alternativas mais econômicas e mais populares, segundo sua análise. Foi mais longe: emitiu um juízo ético presidente Lula sobre o processo. Considerou que ele desrespeitava o povo, enganava-o, não cumpriu o prometido, foi feito à sorrelfa, não permitindo amplo debate público. Tentou diálogo. E, não sendo acolhido, lançou mão do recurso do jejum público. Neste momento, um ato religioso, por motivação ética e teologal de compromisso com os pobres, assumiu nítido caráter político. A pessoa era figura religiosa de forte simbolismo popular – um bispo -, o conteúdo do ato permitia dupla leitura – jejum ou greve de fome -, a motivação pessoal explicitada fazia parte do universo religioso – opção evangélica pelos pobres -, mas o alcance externo assumia caráter altamente político. Contestava uma decisão política do Governo e exigia atitude política de sua reversão. Portanto, vejo tal ação como um ato de nítido alcance político. Todo cidadão tem direito de protestar, pessoal ou em grupo, contra qualquer decisão do Estado.

O fato de ser bispo não o priva de tal direito. Outra coisa é ver se tal ato político, no conjunto da situação nacional, sendo feito pela figura de um bispo, produz o efeito desejado ou, pelo menos, desperta a nação para realidade importante, ou, pelo contrário, oferece munição fácil para adversários mal intencionados do Governo. Este é o ponto mais difícil da análise. O governo Lula, ao ser enfraquecido, abre espaço, na atual conjuntura, não para alternativas melhores, e sim para possível retrocesso na linha do PSDB, com efeitos ainda muito piores para o povo. A revitalização do Rio São Francisco, as alternativas propostas merecem ser consideradas pelo governo na medida em que elas realmente signifiquem um ganho popular.

IHU On-Line – O senhor acha que o jejum de Dom Cappio pode ser visto como um exemplo da mistura entre fé e política? Como o avalia nesse sentido?

João Batista Libânio – Aprendi, em outros tempos, uma distinção que, se não me engano, remonta a A. Gramsci entre Estado e Sociedade Civil. O Estado exerce o poder na quádrupla forma de executivo, legislativo, judiciário e repressivo. Mas ele necessita para legitimar-se de idéias, símbolos, valores, razões aceitadas pelas pessoas, imaginário simbólico favorável, consenso popular e de grupos/entidades importantes. Numa palavra, existe o mundo da hegemonia que dirige, orienta, legitima o Estado. Porque o poder recorre fortemente a ela, pressiona-a para justificá-lo. Hoje a maior fonte de legitimação vem dos meios de comunicação social. Esses fazem circular idéias e valores de outras instituições. Empresas capitalistas que financiam programas, donos de produtoras e transmissoras televisivas, grupos poderosos que compram tempo de propaganda influenciam pesadamente na orientação das ideias na sociedade. E um conflito radical com o Estado, poderia levá-lo à crise e mesmo à perda de legitimidade e substituição. Na Argentina dos militares, com a derrota na guerra das Malvinas, o poder militar ficou de tal modo deslegitimado, que se foi. No Brasil, o governo militar foi perdendo legitimidade até ser substituído por governo formalmente democrático.

D. Cappio, como bispo, projeta sobre o mundo simbólico e representativo a força da Igreja católica. É verdade que sua força foi diminuída pela intervenção de outros bispos em linha oposta. Em todo caso, sua simbólica vinha do status de bispo. Ao assumir uma posição política, não a exerceu no estilo de Cristandade, como se escreveu, porque não o fez em nome de nenhum dos poderes do Estado. Tentou influenciar o Estado pelo lado que compete a todas as instituições e pessoas fazê-lo: gerar idéias, valores, contrapor-se a outras diferentes, exprimir posições com gestos radicais. Não se mistura fé e política, porque não é a pessoa do bispo, em nome de sua função de bispo, que legisla, que administra o Estado, que julga ou que coíbe militarmente alguma atividade política. Mas alguém, de representatividade religiosa, defende interesses e valores explicitados e sujeitos ao juízo e crítica de qualquer outra instituição ou sujeito. Aliás, foi ao que assistimos. Pessoas e instituições que o defenderam, e pessoas e instituições que divergiram. Até aí, o papel político do bispo cabe dentro de sua função episcopal e dentro da democracia. Em outras palavras, o bispo fez pressão sobre o Estado em determinada direção. Algo absolutamente correto. É discutível técnica e politicamente se a direção e o momento de tal ação atingiram ou não o bem desejado: servir os mais pobres e desprovidos de água (continua).

Fonte: Notícias IHU – 15/1/2008.

A Bíblia e seu tempo: coisa rara no Brasil

Acabei de ver, pela primeira vez, os dois DVDs de A Bíblia e seu tempo – um olhar arqueológico sobre o Antigo Testamento.

Que, como todo mundo já sabe, é o documentário que a Revista História Viva, da Duetto Editorial, acabou de lançar. E que é baseado no livro de Finkelstein/Silberman, The Bible Unearthed.

Ora, se você leciona História de Israel ou trabalha com qualquer disciplina bíblica ou apenas quer aprender mais… o que está esperando? Corra e compre. É coisa rara e extraordinária sair algo tão qualificado assim por aqui.

Sabe o que é estudar História de Israel guiado por Israel Finkelstein, Neil Asher Silberman, Thomas Römer, Jacques Briend, Donald B. Redford, Amihai Mazar, John Van Seters, David Ussishkin e outros… todos especialistas de renome em arqueologia, história ou exegese?

Vou ver o documentário mais uma vez. Dura cerca de três horas e meia.

Recomendo o documentário aos meus colegas, claro, e aos meus alunos de História de Israel (Primeiro Ano) e Literatura Deuteronomista (Segundo Ano), nem é preciso dizer, com insistência e urgência, pois já em fevereiro estaremos tratando disso em sala de aula…

Até onde sei, em 2021, o documentário não pode ser mais encontrado no comércio, a não ser no Mercado Livre. Mas vi cópias, completas ou incompletas, no YouTube. Estão lá os volumes I e II. O primeiro só em inglês, mas é possível colocar legendas automáticas em português. O segundo tem legendas em português.

Escrevendo hebraico e grego em Unicode

Como escrever hebraico, grego e outras línguas do Antigo Oriente Médio usando fontes Unicode no Windows XP, Vista ou outro sistema?

Eu já anotara algo sobre isto no dia 19 de junho de 2007 em Como usar fontes Unicode no Windows XP.

Agora, novamente, no blog Tyndale Tech, veja as explicações datadas de sexta-feira passada. Muito interessantes.

Livros sobre Israel e sua historia a caminho

Comprados na Amazon.com, os seguintes livros sobre Israel e sua história estão a caminho. Talvez em tempo para que algumas de suas idéias sejam debatidas com os alunos ainda neste primeiro semestre de 2008.

BERQUIST, J. L. (ed.) Approaching Yehud: New Approaches to the Study of the Persian Period. Atlanta: Society of Biblical Literature, 2007, ix + 249 p. – ISBN 9781589831452.

FINKELSTEIN, I.; MAZAR, A. The Quest for the Historical Israel: Debating Archaeology and the History of Early Israel. Atlanta: Society of Biblical Literature, 2007, 220 p. – ISBN 9781589832770.

FINKELSTEIN, I.; SILBERMAN, N. A. David and Solomon: In Search of the Bible’s Sacred Kings and the Roots of the Western Tradition. New York: The Free Press, 2006, 352 p. – ISBN 9780743243629.

GRABBE, L. L. A History of the Jews and Judaism in the Second Temple Period: Vol 1, Yehud: A History of the Persian Province of Judah. London: T & T Clark, 2006, 496 p. – ISBN 9780567043528.

GRABBE, L. L. Ancient Israel: What Do We Know and How Do We Know It? London: T & T Clark, 2007, 328 p. – ISBN 9780567032546.

Resenhas na RBL: 08.01.2008

As seguintes resenhas foram recentemente publicadas pela Review of Biblical Literature:

Russell C. D. Arnold
The Social Role of Liturgy in the Religion of the Qumran Community
Reviewed by Carol A. Newsom

John Sietze Bergsma
The Jubilee from Leviticus to Qumran: A History of Interpretation
Reviewed by Erhard Gerstenberger

Christian Blumenthal
“Es wird aber kommen der Tag des Herrn”: Eine textkritische Studie zu 2Petr 3,10
Reviewed by Jörg Frey

Walter Brueggemann
The Theology of the Book of Jeremiah
Reviewed by Carolyn J. Sharp

Catharine Edwards and Greg Woolf, eds.
Rome the Cosmopolis
Reviewed by Jonathan L. Reed

Jeffrey C. Geoghegan
The Time, Place, and Purpose of the Deuteronomistic History: The Evidence of “Until This Day”
Reviewed by Timothy M. Willis

John Goldingay
Old Testament Theology: Israel’s Faith
Reviewed by Stephen A. Reed

Mark W. Hamilton, Thomas H. Olbricht, and Jeffrey Peterson, eds.
Renewing Tradition: Studies in Texts and Contexts in Honor of James W. Thompson
Reviewed by Korinna Zamfir

Ulrich Luz; Helmut Koester, ed.; James Crouch, trans.
Matthew 1-7: A Commentary
Reviewed by David Sim
Reviewed by Charles L. Quarles

Joan Goodnick Westenholz and Aage Westenholz
Cuneiform Inscriptions in the Collection of the Bible Lands Museum Jerusalem: The Old Babylonian Inscriptions
Reviewed by Michael S. Moore

Raphaëlle Ziadé
Les martyrs Maccabées: de l’histoire juive au culte chrétien: Les homélies de Grégoire de Nazianze et de Jean Chrysostome
Reviewed by Jan Willem van Henten

Reforma tributaria e pacote do governo

Entidades lançam movimento por reforma tributária e defendem pacote do governo
Várias entidades de representação da sociedade civil, da igreja e movimentos sociais lançaram hoje uma campanha em defesa do que chamam de uma “reforma tributária justa”. O documento do movimento foi enviado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, aos ministros Guido Mantega (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento), e para deputados e senadores. No documento, essas entidades defendem as medidas anunciadas pelo governo para compensar o fim da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), como a elevação das alíquotas do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e da CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido) das instituições financeiras. “Foi uma medida acertada e justa, pois atinge os mais ricos e sobretudo os bancos, o sistema financeiro e empresas estrangeiras.” O documento diz que “as classes ricas do Brasil se articularam com seus políticos no Senado Federal e conseguiram derrubar a CPMF”. “A CPMF era um imposto que penalizava os mais ricos e 70% dele provinha de grandes empresas e bancos. Os seus mecanismos de arrecadação impediam a sonegação e permitiam que a Receita Federal checasse as movimentações financeiras com o imposto de renda, evitando fraudes e desvios.” As entidades criticam o PSDB, DEM e outras entidades que criticaram a elevação das alíquotas do IOF e da CSLL. “As forças conservadoras voltaram a se articular para condenar essas medidas, tendo à frente Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e Febraban (Federação Brasileira de Bancos].” Entre os signatários do movimento estão…

Fonte: Folha Online: 10/01/2008 – 12h55

Finkelstein contesta Mazar sobre Palácio de Davi

Israel Finkelstein – e outros colegas – contestam Eilat Mazar sobre o pretenso Palácio de Davi, descoberto em Jerusalém [sobre a descoberta leia aqui].

O seu texto, publicado hoje, sob permissão, por Jim West, na lista de discussão Biblical Studies, é:

FINKELSTEIN, I. et al. Has King David’s Palace in Jerusalem Been Found? Tel Aviv University.

Infelizmente, o acesso é restrito aos assinantes da lista. Mas o texto está disponível para download em Academia.edu, aqui.