Homenagem a Dom Aloísio Lorscheider

Dom Aloísio Lorscheider – Por Dom Demétrio Valentini

Dom Aloísio partiu. No apagar das luzes de 2007, apagou-se a chama luminosa de sua privilegiada inteligência. Silenciou o coração bondoso que resistiu a tantos embates. Descansou o laborioso frade franciscano, o teólogo competente, o bispo dedicado, o cristão humilde e temente a Deus. Morreu o cardeal que cativou os corações e que deixa tantas saudades.

Sentiremos sua falta. Sobretudo em nossas assembleias. Não teremos mais sua análise de conjuntura teológica, vazada em linguagem simples, fluente, acessível, e ao mesmo tempo profunda, que ele nos fazia todos os anos, ao longo das presidências de D. Ivo seu primo, de D. Luciano seu amigo, e de D. Jayme seu conterrâneo. Suas posições claras e serenas inspiravam confiança em todos, e davam firmeza para nossas opções pastorais.

No parecer do Pe. Alberto Antoniazzi, D. Aloísio era o “bispo completo”: humanamente dotado de exímias virtudes, que nele se traduziam em grande bondade que inspirava profunda confiança; uma esmerada formação teológica; um apurado senso pastoral; uma incansável disposição para o trabalho; uma lúcida percepção dos problemas, sem que lhe faltasse a intrépida coragem de se posicionar serenamente em favor das mudanças que a Igreja deveria fazer.

Tive o privilégio de conhecê-lo quando ele ainda não era bispo, e lecionava teologia em Roma, no Antonianum. Com muita simplicidade vinha ao seminário onde estávamos, no Pio Brasileiro, simplesmente para visitar o Oliveira, amigo seu, de Divinópolis, onde o próprio D. Aloísio tinha feito seus estudos fundamentais de filosofia e teologia. Depois, ficamos sabendo que aquele frade muito simples e muito amigo tinha ficado bispo de Santo Ângelo, no Rio Grande do Sul.

Mas então se dava uma coincidência muito importante, que traçou a trajetória de D. Aloísio. Ele foi eleito bispo no início de 1962, ano em que no mês de outubro iria começar o Concílio Vaticano II. Dom Aloísio tinha todas as condições para mergulhar fundo nos debates conciliares, e prestar um valioso serviço aos seus colegas bispos brasileiros.

D. Aloísio foi cedo valorizado pelo episcopado brasileiro, graças à perspicácia de D. Hélder e do pequeno grupo de líderes que procurou organizar a “bancada” da CNBB no Concílio.

Pude presenciar um lance decisivo. Os bispos do Brasil se hospedavam na “Domus Mariae”, a casa da Ação Católica italiana, que ficava ao lado do Pio Brasileiro. Logo na primeira reunião que realizaram, enquanto se organizavam as comissões do Concílio, D. José Távora veio ao encontro de D. João Aloísio Hoffmann, e perguntou: – É você o bispo teólogo? E Dom João respondeu: – Não, eu sou um pobre colono! O teólogo é aquele lá!

E apontou para D. Aloísio Lorscheider, a quem de imediato D. Távora se dirigiu, convidando-o a coordenar as reuniões de estudo, que passaram a ser feitas com assiduidade na Domus Mariae ao longo de todo o Concílio. Foi lá que D. Aloísio se firmou como baluarte do episcopado brasileiro.

Terminado o Concílio, ele foi cedo eleito secretário geral da CNBB, posto que lhe abriu o caminho para a presidência, que ele exerceu por dois mandatos seguidos, nos duros tempos da ditadura brasileira, enquanto era também eleito presidente do Celam, atingindo o auge de sua influência no final do pontificado de Paulo VI, que o admirava muito e lhe pedia com frequência sua ajuda competente.

E aí se inscreve um obscuro capítulo da vida de D. Aloísio. No conclave em que foi eleito papa o Cardeal Luciani, D. Aloísio era o cardeal que mais se destacava entre todos os que não eram italianos. E sobre ele se dirigiam as expectativas para a hipótese de ser eleito um cardeal que não fosse italiano. Consta que o próprio João Paulo I teria confidenciado seu voto em D. Aloísio.

E por que então D. Aloísio não foi eleito no conclave que se seguiu à repentina morte de Luciani? Aí entra o episódio que alterou a situação. Infelizmente, nos dias que antecederam a morte de João Paulo I, D. Aloísio teve uma crise cardíaca, enquanto pregava retiro aos padres da diocese de Santa Cruz do Sul. Superada a crise, foi para o conclave. Dizem que em Roma tinham até preparado uma cadeira de rodas para receber D. Aloísio no aeroporto, para mostrar que este cardeal estava fora de combate! O episódio teve evidente repercussão. Morto um papa de repente, não iam eleger um cardeal que tinha problemas cardíacos.

Pois bem, agora a história comprova que ele teria tido um longo, e certamente profícuo pontificado. Mas D. Aloísio soube servir a Igreja com muita dedicação, mesmo não sendo papa. Tornou-se uma referência importante, por seu testemunho de humilde competência e de serena coragem.

Em dois contextos a presença de D. Aloísio foi particularmente importante: para o povo simples, de quem ele foi pastor, e para a CNBB, que ele qualificou com sua lúcida contribuição teológica.

A propósito, permito-me citar um episódio de cada contexto, entre muitos outros que poderiam ser lembrados.

Ele foi bispo de Fortaleza durante 22 anos. Era comovente ouvi-lo contar as peripécias de suas visitas pastorais no sertão do Ceará. Hospedava-se na casa da gente simples e humilde. Certa vez, a dona de casa ficou tão contente com a visita do bispo que resolveu preparar-lhe um café com o pó guardado em casa há muito tempo. Colocou a chaleira sobre o fogo para ferver a água, junto com o café. Mas na hora de servir o café, o bico da chaleira estava trancado. Acontece que uma pobre barata tinha se refugiado na chaleira, e tinha fervido junto com a água e o café. Quando a dona de casa se deu conta, não teve dúvidas: tirou a barata, e serviu o café! D. Aloísio, como bom teólogo, se lembrou das palavras do Evangelho: “Se beberem algum veneno mortal, não lhes fará mal nenhum” (Mc 16,18). E como bom pastor, tomou o café, para alegria de todos que assim puderam preparar para o bispo o melhor que podiam lhe oferecer!

Certa vez, na assembleia da CNBB, D. Possamai, Bispo de Ji-Paraná em Rondônia, pediu que a CNBB solicitasse a Roma a autorização para os Diáconos, na Amazônia, poderem ao menos conferir a unção dos enfermos aos moribundos, pois na Amazônia todos morrem sem este conforto cristão. Parecia um pedido teologicamente equivocado, como D. Amaury Castanho logo reagiu, lembrando São Tiago: “se alguém está doente, chamem os presbíteros”.

Foi então que D. Aloísio, sentado atrás de D. Amaury, tocou no ombro dele e falou: “Dom Amaury, a palavra ‘presbítero’ neste contexto não tem o mesmo sentido que lhe damos hoje!”. D. Amaury ficou incomodado, mas silenciou diante do cardeal. No intervalo, aproveitei para perguntar a D. Aloísio, imaginando-o papa: – Diante deste pedido, o que o Sr. faria?

Foi então que D. Aloísio desabafou: – Se fosse por mim, distribuiria o ministério de acordo com as necessidades do povo. Se a comunidade precisasse de um confessor, diria para alguém: você vai atender confissões e perdoar a todo mundo. Se precisasse de alguém para urgir os enfermos, incumbiria uma pessoa para cuidar bem disto. E se a comunidade precisasse de alguém para presidir a Eucaristia, simplesmente alguém da comunidade poderia ser designado para isto. Esta questão dos ministérios precisa ser revista de alto a baixo, desde o ministério de Pedro até o último ministério a ser implantado nas pequenas comunidades.

Assim pensava D. Aloísio. Este o cardeal que quase ficou papa. Este o cardeal que não ficou papa. Infelizmente!

Dom Demétrio Valentini – Bispo de Jales – SP

Fonte: Adital: 29.12.2007

Resenhas na RBL: 03.01.2008

As seguintes resenhas foram recentemente publicadas pela Review of Biblical Literature:

Joseph Blenkinsopp
Opening the Sealed Book: Interpretations of the Book of Isaiah in Late Antiquity
Reviewed by Riemer Roukema

Greg Carey
Ultimate Things: An Introduction to Jewish and Christian Apocalyptic Literature
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A. Andrew Das
Solving the Romans Debate
Reviewed by David J. Downs

Martin Hengel; Claus-Jürgen Thornton, ed.
Studien zur Christologie: Kleine Schriften IV
Reviewed by Lidija Novakovic

Larry W. Hurtado, ed.
The Freer Biblical Manuscripts: Fresh Studies of an American Treasure Trove
Reviewed by Juan Hernández Jr.

Percy S. F. van Keulen
Two Versions of the Solomon Narrative: An Inquiry into the Relationship between MT 1 Kgs. 2-11 and LXX 3 Reg. 2-11
Reviewed by Zipora Talshir

Victor Matthews
Manners and Customs in the Bible: An Illustrated Guide to Daily Life in Bible Times
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Santiago Guijarro Oporto
Jesús y sus primeros discípulos
Reviewed by Ruben Dupertuis

Christine Stark
«Kultprostitution» im Alten Testament? Die Qedeschen der Hebräischen Bibel und das Motiv der Hurerei
Reviewed by Christian Frevel

Guy Waters
The End of Deuteronomy in the Epistles of Paul
Reviewed by Kenneth D. Litwak

Karen Strand Winslow
Early Jewish and Christian Memories of Moses’ Wives: Exogamist Marriage and Ethnic Identity
Reviewed by Amelia Devin Freedman

A Bíblia e seu tempo em DVD

No site da Revista História Viva, publicada pela Duetto, como noticiado em The Bible Unearthed em DVD: agora no Brasil e em A Bíblia e seu tempo, já estão disponíveis os dois DVDs de

A Bíblia e seu tempo – um olhar arqueológico sobre o Antigo Testamento.

Vol. 1: Os patriarcas – O êxodo
Vol. 2: Os reis – “O livro”

Preço [em 19.01.2013]: R$ 39,90 + frete. Os DVDs são vendidos também nas bancas.

Nota em 11.12.2019: esgotados, os DVDs devem ser procurados no Mercado Livre.

Livro sobre Deuteronomista em italiano

Vi hoje no BibbiaBlog que o livro de Thomas RÖMER, The So-Called Deuteronomistic History: A Sociological, Historical and Literary Introduction. New Edition. London: T & T Clark, 2007, x + 202 p. ISBN 9780567032126, que comentei aqui, foi traduzido para o italiano:

RÖMER, T. Dal Deuteronomio ai libri del Re. Introduzione storica, letteraria e sociologica. Torino: Claudiana, 2007, 224 p. ISBN 9788870166743.


Nesta obra Thomas Römer tenta responder às várias questões que continuam a ser discutidas a propósito da Obra Histórica Deuteronomista com uma solução de compromisso entre as soluções de Harvard e de Göttingen. Ele defende uma desenvolvimento da obra em três estágios, com uma primeira edição anterior ao exílio (Harvard – F. M. Cross), uma segunda edição durante o exílio (a tese de M. Noth) e uma edição final no pós-exílio (a edição DtrN de Göttingen – R. Smend).

Einstein: Sua Vida, Seu Universo

ISAACSON, W. Einstein: Sua Vida, Seu Universo. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, 656 p. – ISBN 9788535911282.

Tradução do inglês: Einstein: His Life and Universe. New York: Simon & Schuster, 2007, 704 p. – ISBN 9780743264730

Diz a editora:
Einstein: sua vida, seu universo, a nova biografia de Albert Einstein, baseia-se numa coleção de cartas divulgadas em 2006, vinte anos depois da morte de sua enteada, conforme ela determinara em testamento. Escrita pelo jornalista Walter Isaacson, que já presidiu os grupos Time e cnn, e amplamente elogiada pela crítica, revela um Einstein avesso a qualquer tipo de dogma. Foi esse espírito rebelde que permitiu o nascimento da teoria que revolucionaria a física. O conteúdo das cartas desnuda a vida íntima de uma mente genial. Um homem simples e afável, mas ao mesmo tempo impertinente e distante, Einstein mantinha relacionamentos pessoais difíceis, segredos e casos extraconjugais, além de desprezar a guerra e se divertir com a aura de celebridade. Livre de amarras, Einstein podia explorar sua curiosidade, traço fundamental de sua personalidade e, em suas próprias palavras, essencial para seu brilhantismo: Não tenho nenhum talento especial, apenas uma ardente curiosidade. Mas, no fim da vida, a rebeldia deu lugar ao inconformismo, tanto em termos científicos quanto políticos. Einstein: sua vida, seu universo nos revela o menino curioso, o estudante genial e insolente que se apaixona pela colega de curso, o funcionário do escritório de patentes que revoluciona a física, o homem atormentado por problemas conjugais, o pai muitas vezes ausente, o físico por fim reconhecido no mundo todo, o militante pacifista e sua busca frustrada pela teoria do campo unificado uma solução matemática que explicasse as idiossincrasias da recém-nascida mecânica quântica, fruto de uma ideia sua”.

 

Sem usar matemática, biografia de Einstein conta como o gênio mudou a física
Em 1905, [Einstein] sacou que o tempo não era absoluto: para alguém se movendo, o tempo passa mais devagar do que para quem está parado. Dez anos depois, cravou que o espaço é curvo: um meteoro não é atraído pela lei de gravidade da Terra; na verdade, ele escorrega como uma bola de sinuca numa caçapa. Apesar de se tratarem de conceitos físicos avançados, essas teorias estão explicadas para gente normal na ótima biografia “Einstein – Sua Vida, seu Universo”. Mesmo longo, o livro não traz uma única equação matemática. E extrapola a física teórica, já que a vida de Einstein se confunde com a história do século 20: fala da vida pessoal, dos amores, da decisão de criar a bomba atômica, da criação do Estado de Israel e, principalmente, dos processos mentais que fizeram Albert Einstein (1879-1955) virar um “Einstein”. Ou seja, faz você viajar com ele na velocidade da luz. Fonte: Folha Online: 17/12/2007 – 08h35.

Leia também:
Astrônomos da Alemanha veem “parto” de planeta – Folha Online: 03/01/2008 – 08h16