5. Arrendamento estatal grego e luta dos Macabeus pela liberdade (332-142 a.C.)
:: Arrendamento do Estado e mobilização dos excedentes
5.1. A pólis grega não tinha uma burocracia estatal profissional. Quanto às finanças públicas, a pólis arrendava a particulares o recolhimento os impostos, por tempo limitado.
> A administração ptolomaica somou este arrendamento à estrutura oriental de controle do Estado sobre o cálculo e a arrecadação dos impostos: as aristocracias orientais participaram, assim da exploração econômica e tiveram influência no Estado.
5.2. Dois decretos de Ptolomeu II Filadelfo, de 261/260 a.C., sobre a administração da província siro-fenícia, mostram que havia em um distrito um ecônomo que controlava as finanças e toda uma hierarquia de funcionários inferiores. Todos os camponeses palestinos pagavam tributo: cada um pagava ao arrendatário de sua aldeia.
5.3. No fim do século III a.C. José Tobias assumiu o controle sobre a arrecadação tributária da província siro-fenícia. Flávio Josefo diz que ele levou aos judeus a prosperidade. E foi de dois modos: fez diminuir o número de bocas para comer através da escravidão (rendendo assim mais excedentes) e estimulou culturas mais rentáveis (olivais no lugar de cereais).
:: A aristocracia se emancipa da hierocracia
5.4. A teoria grega do Estado admitia a pólis e o éthnos. Sob Antíoco III, a Judeia é considerada como éthnos (pode ser que o fosse também sob os Ptolomeus). O decreto de Antíoco III, de 198 a.C., é ilustrativo, especialmente porque nos permite ver os primeiros passos da emancipação da aristocracia (a gerousia) da hierocracia. A autonomia étnica trouxe aos aristocratas das cidades novas possibilidades: a lei baseava-se no poder do conquistador, proprietário nominal da terra conquistada, que cedia a quem ele bem quisesse a sua exploração. Isto estava em contradição com a base jurídica da posse (e não propriedade da terra, segundo a tradição judaica (a terra é de Iahweh). Estava aberto o caminho para a ruptura da aristocracia com a tradição antiga.
5.5. Esta ordem política foi confirmada pelos Selêucidas sucessores de Antíoco III, como o testemunham documentos macabeus e romanos.
:: Motivos da luta dos Macabeus pela liberdade
5.6. O problema do comércio, aos sábados, em Jerusalém, permanecia. E isso era insuportável aos ricos. Aí vem Jasão.
5.7. Há um texto em Estrabão que foi identificado como um manifesto antiasmoneu originário dos círculos helenizantes. E eles justificam suas atitudes dizendo que as prescrições judaicas tradicionais violam as normas mosaicas. Jerusalém fora fundada por Moisés como pólis e devia se adequar a isso.
5.8. A resistência dos Macabeus é contra a intromissão estatal no direito sagrado: os Macabeus são sacerdotes – os revolucionários fazem valer os antigos mandamentos: 1Mc 2,34;2,46 etc; os seus adversários seguem as ordens do rei: 1Mc 2,19-20;6,21-23 etc. Baseiam-se na antiga solidariedade de descendência (chamada por Kippenberg de solidariedade segmentária – segmentärer Solidarität) contra o domínio político do Estado helenizante.
5.9. E os motivos da luta são também econômicos, gerados pelo arrendamento estatal. Quando, em 142 a.C., o rei Demétrio II concedeu aos judeus isenção das contribuições, isto foi festejado como libertação da escravidão e começo de uma nova era (1Mc13,41-42).
> É que, com o desaparecimento do arrendamento, a aristocracia não era mais identificada com o Estado, dando aos camponeses maior folga em relação aos senhores da terra. A desigualdade permaneceu a mesma, mas os camponeses conseguiram controle sobre o excedente.
5.10. Já no ano 152 a.C., Demétrio I fizera uma promessa de isenção, o que nos dá ideia do montante dos tributos. É 1Mc 10,29-31 que narra a isenção dos três tipos de tributos:
. todo o povo (e não só a gerousia e parte dos sacerdotes, como no decreto de Antíoco III) é libertado dos impostos individuais
. é suspenso um tributo que corresponde a um terço da colheita e a metade dos frutos das árvores
. é assegurada a isenção dos impostos (= 2,5% sobre a circulação de mercadorias) e do dízimo (= antigo imposto sobre os produtos da terra). Eles agora são receitas do Estado macabeu, recolhidos junto aos judeus
5.11. Concluindo: o sistema de arrendamento estatal grego a aristocratas abastados é que levou, em boa parte, ao conflito. Como direito de conquista da terra, os dominadores exigiam tributos, e os aristocratas os recolhiam dos camponeses e os repassavam, violando as normas étnicas internas do povo judeu.
. A lógica (grega) deste arrendamento era: reduzir o direito de cidadania a pequena faixa aristocrática, mantendo os produtores como simples moradores, objeto de conquista, sem direito de cidadania.
. E esta lógica estava funcionando, até que, em Jerusalém, uma camada aristocrática forçou a helenização e entrou em choque com o direito sagrado tradicional do povo judeu. Aí veio o conflito com os Macabeus. Que não teve objetivos religiosos. O que se queria era uma reforma da constituição da Judeia.
Leia em seguida:
Capítulo 9: Oposição da religião à política – Opposition der Religion gegen die Politik