Quem está vencendo esta guerra?

Conflito aumenta intolerância entre israelenses

O clima belicoso gerado pela guerra no Líbano se estendeu também para dentro da sociedade israelense, com manifestações cada vez mais freqüentes de intolerância em relação à minoria que se opõe à guerra.

Pesquisas de opinião indicam que a maioria da população de Israel apoia a ofensiva no Líbano. Mas há uma minoria significativa, que inclui israelenses de esquerda e pacifistas e também os cidadãos árabes do país, que não aceita a posição do governo e exige um cessar-fogo imediato.

Em Israel, os protestos de rua contra a guerra viraram alvos de agressões verbais e físicas.

Artigos contrários à guerra, publicados em jornais e sites na internet, recebem uma quantidade sem precedentes de respostas agressivas de internautas.

Psicologia

A BBC Brasil ouviu vários analistas que tentaram explicar as manifestações de ódio contra a minoria que se opõe à guerra e a falta de empatia da maioria dos israelenses com o sofrimento de civis libaneses.

O doutor em psicologia Roni Berger é um dos diretores da ONG Natal, que fornece apoio emocional a civis que sofrem de traumas em decorrência do conflito.

“A maioria dos israelenses percebe o Hezbollah como uma ameaça existencial”, disse Berger.”É muito difícil sentir empatia com o outro quando uma pessoa se sente diretamente ameaçada.”

Berger, especialista em psicologia de massas e principalmente em situações de traumas coletivos, já foi assessor do governo americano depois dos ataques ao World Trade Center e do governo do Sri Lanka depois do tsunami.

“O medo existencial gera ódio e intolerância”, afirmou. “Quando animais se sentem ameaçados, eles são capazes de destroçar os outros.”

“Quando a própria sobrevivência está em jogo, acaba a empatia, a capacidade de generosidade diminui significativamente, e esse é um fenômeno internacional que também encontrei em Nova Orleans, depois do furacão Katrina.”

“Em Israel existe uma raiva enorme contra o Hezbollah, por ter atacado a população, e os israelenses capazes de sentir empatia com o sofrimento dos libaneses são uma minoria.”

Casa destruída

Ruti Gur, diretora de uma ONG feminista e moradora de Haifa, faz parte dessa minoria.

No último domingo, dia 23, a casa de Gur foi diretamente atingida por um míssil disparado pelo Hezbollah.

Por sorte, no momento do bombardeio a casa estava vazia, mas foi severamente danificada e ficou inabitável. Partes da construção terão que ser demolidas.

Gur, o marido e seus dois filhos terão de procurar um lugar alternativo para morar, e a reconstrução da casa poderá levar mais de seis meses.

“Dois dias antes do ataque em casa, participei de uma manifestação de mulheres pela paz, em Haifa. Várias pessoas na rua nos chamaram de ‘traidoras’ e chegaram a nos agredir fisicamente”, disse Gur à BBC Brasil.

“Depois que senti, na minha pele, o que significa ter a própria casa atingida por mísseis, sinto mais empatia ainda pelas mulheres do Líbano e pretendo continuar participando dos protestos contra a guerra.”

“Mas quero deixar bem claro que também sinto muita raiva do Hezbollah por ter destruído minha casa, e condeno a concepção militarista dos dois lados, tanto de Israel como do Hezbollah”, concluiu Gur.

Opinião segura

O doutor em Sociologia Lev Grinberg, da Universidade Ben Gurion, disse que a falta de empatia da maioria dos israelenses com a população árabe libanesa também decorre do fato que, há dezenas de anos, Israel mantém a ocupação dos territórios palestinos.

“Depois de quase 40 anos de ocupação, existe uma perda geral de sensibilidade”, afirmou Grinberg.

“Mas a falta de sensibilidade em relação ao outro lado não é um fenômeno específico apenas de Israel, acontece em todas as situações de guerra. Quanto mais cresce a violência, diminui a empatia, e há menos apoio ao caminho do diálogo e das negociações. Nesses momentos o caminho da ‘força e mais força’ prevalece.”

O jornalista Gideon Levy escreveu recentemente um artigo, no jornal Haaretz, afirmando que a guerra deve ser “interrompida imediatamente”. “Era desnecessária desde o inicio, mesmo se o pretexto era justificado, e é chegado o momento de pará-la.”

Levy recebeu 513 reações de internautas, a maioria delas extremamente violentas, o chamando de “traidor”, “lixo” ou dizendo “tomara que um missil do Hezbollah acerte a sua cabeça”.

Mas o jornalista afirmou que “prefere o ódio à indiferença”.

“Assim, pelo menos se cria uma discussão na sociedade, e a violência das reações indica rachaduras no consenso. As pessoas começam a ter dúvidas se realmente estão com a razão, pois quem tem segurança de suas posições não grita, é capaz de falar calmamente”, disse Levy.

Fonte: Guila Flint – BBC Brasil: 26/07/2006

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