Seria a Amazônia a fronteira final do capitalismo?

Noam Chomsky é um linguista, filósofo, sociólogo, cientista cognitivo, comentarista e ativista político norte-americano, reverenciado em âmbito acadêmico como “o pai da linguística moderna”. É professor emérito de linguística no Massachusetts Institute of Technology (MIT) e leciona na Universidade do Arizona. É autor de mais de 70 livros sobre linguística, conflitos armados, política, mídia e filosofia.

Conversamos com Noam Chomsky sobre as consequências das eleições no Brasil para o mundo, os riscos da expansão da OTAN e as alternativas para as crises social eNoam Chomsky (1928- ) ambiental. Ele retoma a memória dos movimentos sindical e por direitos civis nos EUA e exalta a importância do MST e o MTST na atual configuração da luta de classes.

Em um trecho da entrevista, diante da pergunta sobre a crise ambiental,

Seria a Amazônia a fronteira final do capitalismo?

Chomsky disse:

Pode ser a fronteira final da sociedade organizada na Terra, não apenas para o capitalismo. Assim como foi de conhecimento geral, por um longo tempo, que se as tendências atuais persistirem, a Amazônia, da qual a maior parte é território brasileiro, será obliterada. E, assim, chegaremos a um ponto em que a umidade produzida será insuficiente para sustentar a floresta, e ela se tornará uma savana, ao invés de ser o maior reservatório de carbono, vai se tornar um imenso emissor de carbono.

Isso é um desastre para o Brasil, uma catástrofe que o mundo não terá realmente como superar. Era algo previsto para acontecer em algumas décadas, mas, recentemente, os cientistas brasileiros descobriram que, com o aumento do desmatamento madeireiro ilegal, a mineração, o agronegócio financiado pelo governo Bolsonaro começou a tomar porções da Amazônia que já se encontram em estado crítico — o qual só era esperado para décadas mais adiante.

Uma das piores consequências da eleição desse primeiro turno, foi a eleição de pessoas como Ricardo Salles. Ele é uma liderança da verdadeira campanha para destruir a vida humana na Terra. Isso soa como um exagero, mas não é. É isso que significa a destruição da Amazônia, que é uma das principais formas de comprometer a vida humana.

Voltemos ao dia 8 de novembro nos Estados Unidos. O Partido Republicano pode tomar o Congresso. Eles são 100% negacionistas, não se importam, negam que a mudança climática esteja ocorrendo. E dizem “quem se importa?”. Trump era o mais explícito em relação a isso, mas o resto do Partido Republicano também não se importa, porque está enriquecendo empresas de combustíveis fósseis, cujos lucros estão explodindo.

Muitas outras coisas que estão acontecendo ao redor do mundo e, assim como a destruição da Amazônia, são espantosas. O Ártico tem esquentado bem mais do que os cientistas esperavam, e isso tem como consequência o derretimento do permafrost, que tem uma quantidade astronômica de carbono armazenado e que começa a derreter, liberando consequentemente gases tóxicos na atmosfera.

Uma das principais empresas de energia, a ConocoPhillips acabou de anunciar uma descoberta científica importante. Encontraram uma forma de desacelerar o degelo do permafrost no Alasca, onde exploram petróleo, por um método mediante o qual se introduzem hastes metálicas no gelo. Por que estão fazendo isso? Para que possam endurecer a superfície e extrair o petróleo, mantendo a produtividade. Então não é só capitalismo selvagem — em forma bestial. Atrasaremos o degelo do permafrost para que possamos extrair, precisamente, e mais rapidamente, o material que destruiu o mundo.

Coisas assim estão acontecendo em todo lugar. Muitos estavam bastante empolgados com a incrível proeza de Israel e Líbano terem chegado a um acordo, há poucos dias, sobre uma antiga disputa territorial no mar Mediterrâneo. Mas isso tinha apenas a ver com a repartição das áreas de extração submarina de gás, o que pode ser, na verdade, um golpe de misericórdia mais rápido nos países que possuem costas no Mediterrâneo.

Alguns cientistas descobriram que as estimativas de aumento do nível do mar no Mediterrâneo eram muito moderadas. E a previsão agora é de que, no fim desse século, esse aumento chegará a dois metros e meio. Imaginem isso: dois metros e meio de aumento do nível do mar!

Então, Israel e Líbano estavam discutindo sobre quem vai ter o direito de enfiar a adaga no coração de todas aquelas sociedades. Isso é o que está sendo celebrado. Quando você vai ao sul da Ásia, você presencia coisas similares. É como se aqueles que Adam Smith chamava de “mestres da humanidade” tivessem feito uma aposta para ver quem nos destruiria primeiro.

Alguns dias atrás, a Associação Meteorológica Mundial mostrou sua análise da situação climática global, dizendo que devemos dobrar os investimentos no desenvolvimento de tecnologias sustentáveis até 2030, poucos anos daqui até lá, se quisermos ter esperanças de sobreviver de forma organizada. Enquanto isso, na Ucrânia, os poderes globais estão investindo recursos escassos na destruição em massa, retrocedendo os esforços limitados que deveriam ser direcionados para lidar com a crise climática. Ao mesmo tempo, condenam a Arábia Saudita por não estar produzindo óleo suficiente para a destruição.

Alguém assistindo isso do espaço, pensaria que essa espécie está enlouquecendo, a luta de classes se tornando completamente bestial.

Leia a entrevista completa.

Fonte: Bolsonaro é um instrumento da guerra de classes global – Uma entrevista com Noam Chomsky – Jacobin Brasil: 27/10/2022