A polissemia das manifestações populares

A polissemia das manifestações populares

Por Edson Elias de Morais* e Luana Garcia*: Notícias: IHU On-Line 28/06/2013

Os partidos de Esquerda estão comemorando porque o povo está “acordando” e foi para as ruas. Os partidos de Direita estão comemorando porque o povo está “acordando” e foi para as ruas. Os apartidários estão comemorando porque o povo está “acordando” e foi para as ruas. Cada um interpreta à sua maneira e faz as ponderações e indicações segundo suas agendas. A mídia, os partidos de Direita e seus simpatizantes estão comemorando ainda mais, porque estão percebendo nisso um “filão” inesperado contra o governo Dilma e principalmente contra o PT. Estão utilizando os gritos, as revoltas, as manifestações como sinônimos de crítica ao governo e não a uma sociedade viciada politicamente, a uma sociedade corrompida estruturalmente e um sistema societário fadado à desigualdade.

Após a manifestação de apoio ao movimento de São Paulo, houve o comentário de uma manifestante de Londrina, um desabafo e crítica ao fato de terem sido reprimidas as bandeiras do PSTU e do PSOL na manifestação da cidade, na página do Facebook. Ela argumentava que a esquerda tem contribuído para todo esse processo. É verdade, os partidos de esquerda historicamente são mobilizadores de revoltas e revoluções populares, está ou esteve na base do processo de politização das pessoas e tem uma agenda em prol dos trabalhadores. Concordo que não foi coerente proibir as bandeiras partidárias na manifestação, uma vez que ali se faziam presentes pessoas de várias classes sociais, partidos e credos.

Foi e está sendo uma manifestação popular, sem uma coordenação específica, mas de identificação com uma causa, a partir do ponto de vista e da crítica de cada indivíduo. O grande guarda-chuva ideológico é um “país melhor”, “justiça”, “educação”, “saúde” e “transporte” de qualidade. E aqui cabe qualquer programa político, qualquer partido e qualquer política-econômica, pois são grandes abstrações generalizantes. São problemas reais e concretos? São. Mas da forma como estão sendo discursados não passam de revoltas, em vez de serem um projeto de política.

Os partidos de Esquerda estão comemorando porque o povo está “acordando” e foi para as ruas. Os partidos de Direita estão comemorando porque o povo está “acordando” e foi para as ruas. Os apartidários estão comemorando porque o povo está “acordando” e foi para as ruas. Cada um interpreta à sua maneira e faz as ponderações e indicações segundo suas agendas. A mídia, os partidos de Direita e seus simpatizantes estão comemorando ainda mais, porque estão percebendo nisso um “filão” inesperado contra o governo Dilma e principalmente contra o PT. Estão utilizando os gritos, as revoltas, as manifestações como sinônimos de crítica ao governo e não a uma sociedade viciada politicamente, a uma sociedade corrompida estruturalmente e um sistema societário fadado à desigualdade.

A maioria dos manifestantes demonstra saber exatamente as responsabilidades que cabem a cada setor da sociedade e, mediante esse quadro, muitos tendem a negar as bandeiras partidárias, enquanto alguns as defendem ferrenhamente. Podemos observar que nesse processo existe uma tensão evidente entre os meios tradicionais de participação e a necessidade de negá-los, sejam quais forem: partidos, sindicatos, comunidades de bairro, etc, como se fugissem diretamente da corrupção que, por vezes, vigora nessas organizações.

Por mais que alguns manifestantes, em sua minoria, incitem  a política sem políticos, o poder total ao povo, e levantam bandeiras anarquistas, outros manifestantes, talvez uma maioria, apontam que a representação política é necessária, mas deve contar com mais controle e vigilância do povo, para que não desvirtue os princípios democráticos, como a utilização correta dos recursos públicos.

Parece estar diluído entre os que marcham pelas diferentes causas, que alguns tipos de responsabilidades cabem apenas aos indivíduos que estão no poder, sendo que, uma vez negadas essas responsabilidades, elas constituem barreiras para a transparência das instituições democráticas, e fomentam práticas injustas, ações incorretas, corrupção, entre outras falhas, que só existem em uma sociedade em desacordo com suas instituições e com falência da vigilância pública.

Viver em uma democracia é, acima de tudo, poder reclamar por ações como estas, (re)estabelecer a confiança nas instituições formais, organizar movimentos legítimos da sociedade civil, ter canais para esse tipo de manifestações e não sofrer repressões.

Quando as instituições funcionam mal, o abalo e o fracasso das condições democráticas são sentidos, sobretudo entre os mais pobres e vulneráveis, onde se encontram déficits em todos os âmbitos: econômico, cultural e social. Novas barreiras se erguem para esse indivíduo na medida em que as desigualdades se intensificam, e as saídas por vias institucionais, ou a confiança na política – ou nos ideais políticos – sofrem de total descrédito. No caso brasileiro, os vícios políticos e os procedimentos que envolvem a máquina governamental favorecem não só tais práticas excludentes, mas também intensificam as múltiplas desigualdades.

E é diante desta realidade, do fracasso das condições democráticas, do mau funcionamento das instituições políticas e do agravamento das desigualdades sociais que o povo se revolta. Por isso é uma revolta plural que pode, por defender tantos ideais, se perder no enfrentamento de metas especificas, por não ter um projeto e uma organização devido à falta de uma politização no processo de socialização. Ficam reféns do calor do momento e da esperteza de alguns partidos políticos, e por esse motivo as atuais manifestações populares podem servir a dois senhores ou mais, simultaneamente.

* Edson Elias de Morais é mestrando em Ciências Sociais, Licenciatura / Bacharelado em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Londrina e Bacharelado em Teologia pela Faculdade Teológica Sul Americana, Londrina-PR. 


* Luana Garcia é mestranda em Ciências Sociais, Especialista em Ensino de Sociologia e Licenciatura / Bacharelado em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Londrina.

Como leremos em 2020?

A saída para o mercado editorial: tentativas, erros e aprendizados – Eber Freitas: Revolução eBook 27/06/2013

Como leremos em 2020? (…) Para responder à pergunta inicial, o pesquisador Sílvio Meira, fundador do C.E.S.A.R (Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife) palestrou durante o 4º Congresso Internacional do Livro Digital, que ocorreu entre os dias 13 e 14 de junho [de 2013].


As possibilidades não deixaram muitas pessoas felizes. Após uma contextualização histórica – desde a conhecida revolução de Gutenberg até a leitura em modo “shuffle” [embaralhado, não linear, fora de ordem, aleatório] da era do Twitter -, Sílvio Meira aponta para conclusões incertas: “nesse tipo de contexto, nessas novas plataformas, qual o futuro dos livros? Livros, eu acho, vão ser fluxos. Fluxos como conteúdo aumentado, compartilhado em rede como serviço”. Essa consideração, no entanto, implica em uma ampla contextualização.


(…) “Antes de Gutenberg, a gente tem um sistema baseado em recreação/recriação, que é criativo, coletivo, contextual, instável, baseado na performance. Dentro ou exatamente no meio de Gutenberg, nós temos o estável, o canônico, o individual, o original, o autônomo, o universo da composição. Depois de Gutenberg a gente tem um conjunto de coisas que não tem exatamente nome”, afirma.


E o que representa esse conjunto de coisas ainda sem nome ou características difíceis de mapear? “A gente faz sempre, a gente faz coisas e remistura, a gente toma coisas emprestadas, a gente reformata, a gente se apropria. Estamos vendo um universo que, no futuro, talvez seja chamado de percomposichange – um universo de performance, composição e mudança simultânea”, descreve. Tudo isso, pouco necessário lembrar, é um tiro fatal na atual visão de copyright das editoras, livrarias, agentes e autores.


De acordo com Sílvio Meira, a leitura está se tornando cada vez mais fragmentada e menos canônica (…) O “Livro” é cada vez menos um produto final a ser entregue em uma embalagem e mais uma espécie de serviço com muitos outros valores e ferramentas agregados. E não é apenas isso: o livro, a partir de agora, deve ser visto como um elemento integrado à World Wide Web.


“A rede como um todo é uma plataforma de compatibilidade. É uma infraestrutura, um conjunto de serviços em cima dessa infraestrutura e um conjunto de aplicações em cima desse serviço. Livros fazem parte de um conjunto articulado de sistemas e, como conteúdo, dependem dessas plataformas de compatibilidade ao redor. A plataforma móvel, digital, conectada e programável é muito mais eficaz, muito mais leve, muito mais eficiente, muito mais barata do que a plataforma física”, explica Sílvio Meira.


“Isso vai mudar exatamente o que a gente vai entender como ‘Livro’ no futuro próximo. Escrita, propriedade do material, distribuição, leitura, replicação e preservação vão mudar porque a plataforma de compatibilidade já está mudando”, alerta.


A resposta para quem trabalha na indústria do livro é profética, mas não muito animadora. E pode ser resumida em uma sigla: TEA (tentativas, erros e aprendizado). Esqueça os acertos.

Até aqui o texto, ou melhor, trechos do texto, que precisa ser lido por inteiro.

Observo que o mais impressionante, para mim, não foi o texto e nem suas conclusões, mas sua rejeição quando proposto para discussão a um grupo de “intelectuais” acostumados, como todos nós, às tradicionais práticas de leitura e que refletiam sobre as dificuldades, nesta área, dos atuais estudantes.

Alguns dos presentes não apenas rejeitaram o texto: nem quiseram ouvir a conclusão. A exposição precisou ser interrompida, pois atingiu certezas e irritou uns poucos, que retrucaram ser esta uma especulação inútil.

E, acrescento: intelectuais que, por dever de ofício, falam todos os dias às novas gerações! Estamos assim tão desarvorados face à revolução digital?