Internet ajuda a furar bloqueio midiático imposto por Israel
Por Marco Aurélio Weissheimer – Carta Maior: 06/01/2009
É bem conhecida a frase que afirma que a primeira vítima em tempos de guerra é a verdade. Bloqueios midiáticos fazem parte do esforço propagandístico dos militares. A história se repete agora com a nova onda de ataques perpetrada por Israel contra os palestinos da Faixa de Gaza. O governo israelense proibiu a entrada de jornalistas estrangeiros na área. Isso não vem impedindo, porém, que as imagens do massacre contra a população civil de Gaza circulem diariamente pelo mundial. A eficácia do bloqueio midiático diminuiu significativamente graças à internet.
A rede Al Jazeera está na faixa de Gaza, produzindo diariamente reportagens sobre o ataque de Israel. Suas matérias (ver exemplo abaixo, publicado por Luiz Carlos Azenha no Vi o Mundo) são vistas diariamente por milhões de pessoas em todo o mundo árabe. Elas expõem o caráter, ao mesmo tempo, homicida e suicida, da política de Israel para “garantir a segurança do povo judeu”. A única coisa que a ação do exército israelense parece estar garantindo é espalhar mais ódio pela região, por várias gerações.
A blogosfera se encarrega de espalhar essas imagens mundo afora. Além disso, há também blogs funcionando desde Gaza, relatando diariamente o que está acontecendo. Um deles é o Moments of Gaza. Idelber Avelar, do blog Biscoito Fino e a Massa, traduziu um texto desse blog mantido por Natalie Abou Shakra, ativista do Movimento Free Gaza.“Um relato ao vivo dos horrores perpetrados pelo exército israelense na maior prisão ao ar livre do mundo”, resume Idelber:
“Vittorio me disse ontem … quando lhe perguntei como ele responde à morte … ele me disse que já não tem lágrimas para chorar … que suas lágrimas secaram … olho para ele sentado diante de mim … um homem bonito de um metro e oitenta … trinta e três anos … sua maior preocupação no mundo: salvá-lo e “permanecer humano”, que é como ele termina [Bomba!] cada artigo que escreve …”
O Biscoito Fino traduziu também um relato de outro blog que opera diretamente de Gaza, o In Gaza. “Mais um relato em primeira mão que confirma o que já sabemos: no massacre israelense em Gaza, a prática é matar mesmo os civis feridos que estão sendo carregados”, escreve Idelber Avelar. O relato:
Trabalhadores médicos de emergência, Arafa Hani Abd al Dayem, 35 anos, e Alaa Ossama Sarhan, 21 anos, tinham atendido o chamado para ir buscar Thaer Abed Hammad, 19, e seu amigo morto Ali, 19, que haviam estado fugindo do bombardeio, quando foram eles mesmos atingidos por disparo de um tanque israelense.
Era pouco depois das 8:30 da manhã de 04 de Janeiro, e eles estavam na região de Attattra, Beit Lahia, noroeste de Gaza, na área da escola americana bombardeada no dia anterior, em que mataram um guarda-noturno civil de 24 anos, destroçando-o, queimando o que restara.
Gemendo de dor, com o pé direito amputado e lacerações de bomba de fragmentação ao longo das costas, de todo o corpo, Thaer Hammad conta como seu amigo Ali foi morto. “Estávamos atravessando a rua, saindo de nossas casas, e aí o tanque disparou. Havia muita gente saindo, não éramos os únicos”. Hammad interrompe seu testemunho, de novo gemendo de dor. Ao longo dos dois últimos dias, desde que a invasão terrestre de Israel e a campanha intensificada de bombardeios começaram, os residentes de toda Gaza têm estado fugindo de suas casas. Muitos não tiveram a chance de escapar, tendo sido pegos dentro de casa, enterrados vivos, esmagados. O médico continua a narrativa: “Depois que foram bombardeados, Thaer não conseguia caminhar. Ele chamou Ali para que o carregasse”. O resto da história é que Ali havia carregado Thaer por alguma distância quando atiraram na cabeça de Ali, bala disparada por um soldado não visto, bem na direção na qual eles fugiam. Ali morto, Thaer ferido, e as pessoas fugindo, a ambulância foi chamada”.
A uniformidade pausterizada da mídia comercial
Essa diversidade de informações que circula pela internet está ausente da cobertura da imensa maioria da mídia comercial brasileira, que repete praticamente as mesmas manchetes todos os dias, formando um coro uniforme. Um exemplo disso:
10 horas e 52 minutos da manhã de 5 de janeiro de 2009. Manchete do UOL/Folha de São Paulo: “Israel divide Gaza em três e busca milicianos”. Da mesma forma, no site de Zero Hora, de Porto Alegre: “Israel divide Gaza em três e começa nova fase de ataques”. A mesma manchete é destaque no site do Globo: “Israel inicia nova fase da ofensiva e divide a Faixa de Gaza em três”.
Detalhe: Israel proibiu a entrada de jornalistas estrangeiros em Gaza. Qual é, então, a fonte dessas notícias uniformemente distribuídas pelo mundo afora?
Resposta: o próprio governo de Israel. A cobertura da maioria esmagadora da mídia não passa de divulgação das informações oficiais do governo israelense. Quem quiser uma alternativa a essa cobertura pasteurizada tem que, obrigatoriamente, recorrer à internet. A guerra que aparece aí é bem diferente da apresentada pelos veículos tradicionais.