Teólogos defendem agenda verde

Teólogos defendem agenda verde para igrejas

Reunidos nesta capital desde a quarta-feira, 21, teólogas e teólogos e identificados com teologias contextuais encerraram a terceira edição deste ciclo de debates ouvindo três “visões globais” do Fórum Mundial de Teologia e Libertação (FMTL).

Mercy Odudoye, de Gana, Felix Wilfred, da Índia, e Guillermo Kerber, do Uruguai, trouxeram abordagens objetivas acerca da urgência da adoção de uma “agenda verde” para dentro das igrejas e do meio acadêmico teológico.

“Trabalhamos com ecologia e nos declaramos pós- modernos. O hinduísmo tem lidado há milênios com as mesmas categorias, considerando os aspectos éticos da compreensão holística de nosso papel no mundo”, afirmou Felix Wilfred, apontando para a ironia de que outras religiões e até esferas seculares chamarem igrejas cristãs a um engajamento em torno de questões ecológicas.

Na verdade, essa preocupação sempre esteve presente no seio da teologia cristã, embora soterrada sob tradição e sectarismos. “Nosso senso de justiça transcende nossa visão sectária da ciência, do mundo e da espiritualidade’, sentenciou.

As observações do teólogo indiano fizeram eco à primeira apresentação do painel, na qual Mercy Odudoye apontou para o aspecto da unidade visível da Criação de Deus. “A Terra e as pessoas são fruto do mesmo ato criador de Deus. A vida é forte e frágil ao mesmo tempo, tanto para a natureza como para as pessoas”, afirmou.
Responsável no Conselho Mundial de Igrejas (CMI) pelo programa que lida com o tema da mudança climática, Guillermo Kerber ofereceu uma análise sistemática do mesmo a partir da centralidade da justiça na Bíblia.

Partindo da clareza quase uníssona de dados científicos acerca da realidade das mudanças climáticas, Kerber frisou que elas também trazem em seu bojo dimensões política, econômica e social que, em última análise, têm a ver com a justiça. “O ‘kairós’ dos refugiados climáticos pode ser resumido no seu direito, a saber, à justiça e à reparação”.

O FMTL foi encerrado com um momento religioso baseado nos elementos terra, fogo, água e ar, mas ainda se desdobra dentro da programação do Fórum Social Mundial, através de uma oficina na Tenda da Coalizão Ecumênica, que avalia a caminhada do FMTL desde 2005.

Fonte: ALC – 26 de janeiro de 2009

Fórum Social Mundial 2009

Um balanço do FSM de Belém não deve ser feito em função de si mesmo. Ele não nasceu como um fim em si mesmo, mas como um instrumento de luta para a construção do “outro mundo possível”. Nesse sentido, qual o balanço que pode ser feito do FSM de Belém, do ponto de vista da construção desse “outro mundo”, que não é outro senão o de superação do neoliberalismo, de um mundo pós-neoliberal?

Veja o Especial Fórum Social Mundial 2009 da Carta Maior.

 

Uma breve história do Fórum Social Mundial – Emir Sader: Carta Maior – 01/02/2011

O Fórum Social Mundial já tem história. Uma história que não pode ser entendida separada daquilo que lhe deu nascimento e a que ele está intrinsecamente vinculado: a luta contra o neoliberalismo e por um mundo pós-neoliberal – que é o sentido de seu lema central “Um outro mundo possível”.

Nas suas origens está o “grito zapatista” de 1994”, conclamando à luta global contra o neoliberalismo. Em seguida, veio o editorial do Le Monde Diplomatique, de Ignacio Ramonet, chamando à luta contra o “pensamento único”, seguida pelas manifestações em Seattle, que impediram a realização da reunião da OMC e as outras, em tantas cidades do mundo. Enquanto isso, se realizavam anualmente manifestações na Suiça, chamadas de anti-Davos.

Até que, com o crescimento da resistência ao neoliberalismo, se pensou no projeto de organizar um Forum Social Mundial em oposição ao Forum Economico de Davos. A idéia foi de Bernard Cassen, jornalista francês que naquele momento dirigia a Attac, que ao mesmo tempo propôs que a sede fosse na periferia do sistema – onde residem as vitimas privilegiadas do neoliberalismo -, na América Latina – onde se desenvolviam os principais movimentos de resistência, no Brasil – que tinha a esquerda mais forte naquele momento – e, em particular, em Porto Alegre – pelas políticas dos governos do PT, de Orçamento Participativo.

Depois do primeiro Fórum se constituiu um Conselho Internacional, com participação de todas as entidades que quisessem se incorporar, porém a direção continuou em um estrito grupo de entidades brasileiras, dominadas por ONGs. Este foi um limitante original do FSM, dado que o movimento se apoiava centralmente em movimentos sociais – de que a Via Campesina agrupa a parte significativa deles -, enquanto as ONGs – cujo caráter ambíguo, até mesmo neoliberal pela sua definição anti-governamental, mas também com várias delas com ações obscuras no seu sentido, no seu financiamento e nas suas alianças com grandes empresas privadas – se apoderava do controle da organização, imprimindo-lhe um caráter restrito.

Restrito, porque limitado a um suposta “sociedade civil”, o que já lhe imprimia um caráter liberal, oposto a governos, a partidos, a Estados, bloqueando a capacidade de construção de “um outro mundo possível”, que teria que ser um mundo global, com transformação das relações de poder, do Estado e da sociedade no seu conjunto. Também ficava fora um tema que passou a ser central no mundo conforme os EUA adotavam sua política de “guerras infinitas” – a luta pela paz -, que no entanto representou o momento de maior capacidade de mobilização dos novos movimentos populares no mundo, com as mobilizações de resistência à guerra do Iraque, em 2003.

O Conselho Internacional decidiu a alternância de sedes do FSM, que passou a se realizar em outros continentes, com o que se realizaram encontros na Índia e no Quênia. Também decidiu que os FSM seriam realizadosa cada dois anos, alternados por FSM regionais. No entanto o FSM passou realmente a girar em falso conforme a definição inicial de se limitar um espaço de troça de experiências entre entidades da “sociedade civil” foi limitando suas temáticas e sua capacidade de formular alternativas. Nem sequer balanços das maiores mobilizações populares jamais havidas, as contra a guerra do Iraque, foram feitas, para definir a continuidade da luta.

A fragmentação dos temas se acentuou conforme foi decidido que as atividades dos FSM seriam “autogestionadas”, sem definição política dos temas fundamentais, que deveriam ser financiados centralizadamente, promovendo um imenso privilegio das ONGs e outras entidades que dispõem de recursos contra os movimentos sociais – que deveriam ser os protagonistas fundamentais do FSM.

Hoje, o FSM tem em governos latino-americanos progressistas os agentes de construção da agenda proposta pelo movimento. Os movimentos sociais que souberam rearticular de maneira criativa suas relações com a esfera política – de que a fundação pelos movimentos bolivianos do MAS – e disputar a criação de novos governos e a construção de projetos hegemônicos alternativos, avançaram significativamente na criação do “outro mundo possível”. Enquanto que os que seguiram refugiados na chamada “autonomia dos movimentos sociais” – como os casos dos piqueteiros argentinos ou dos zapatistas – perderam peso ou até mesmo tenderam a desaparecer politicamente.

Em 2009, o Fórum voltou ao Brasil, sendo realizado em Belém, no Pará. O encontro foi marcado, entre outras coisas, pela presença de 5 presidentes latino-americanos – Evo Morales, Rafael Correa, Hugo Chavez, Fernando Lugo e Lula, líderes de governos que, em distintos níveis, colocam em prática políticas que identificaram, desde o seu nascimento, o FSM: a Alba, o Banco do Sul, a prioridade das políticas sociais, a regulamentação da circulação do capital financeiro, a Operação Milagre, as campanhas que terminaram com analfabetismo na Venezuela e na Bolívia, a formação das primeiras gerações de médicos pobres no continente, pelas Escolas Latinoamericanas de Medicina, a Unasul, o Conselho Sulamericano de Segurança, o gasoduto continental, a Telesul – entre outras. A cara nova e vitoriosa do FSM, nos avanços da construção do pós-neoliberalismo na América Latina.

O FSM 2009 foi marcado também pela forte presença d os povos indígenas e pelo Forum PanAmazonico, com os movimentos camponeses e a Via Campesina, os sindicatos e o Mundo do Trabalho, os movimentos feministas e a Marcha Mundial das Mulheres, os movimentos negros, os movimentos de estudantes, os de jovens.

O movimento anti-neoliberal passou da fase de resistência à fase de construção de alternativas. Este FSM demonstrará se permanece na fase de resistência, de fragmentação de temáticas, de limitação à “sociedade civil” ou se se coloca à altura da etapa atual de disputa hegemônica, já não mais a nível nacional ou regional, mas a nível global, quando a crise capitalista e o esgotamento do modelo neoliberal coloca para o FSM seu maior desafio: ser agente na construção concreta do “outro mundo possível” ou permanecer como espaço de testemunhos, ricos, mas impotentes.

O Fórum Social Mundial 2011, em Dakar, ganhou uma nova agenda com a onda de protestos populares que já atingiu a Tunísia, o Egito, o Iêmen e a Jordânia. O mais significativo de todos, sem dúvida, é o Egito, em função do que o país representa em termos geopolíticos no Oriente Médio. Egito e Arábia Saudita são dois pilares centrais da aliança EUA-Israel na região. Uma mudança de regime político em um desses dois países pode significar um terremoto geopolítico de grandes proporções.
A aplicação da consigna do FSM aos problemas dessa região coloca a seguinte questão: “Outro Oriente Médio é possível?”. O que está acontecendo no Egito mostra que o castelo das autocracias apoiadas e sustentadas pelos EUA é menos sólido do que parecia. Milhões de jovens, homens e mulheres, estão nas ruas dizendo que é possível, sim. E necessário.