EUA endossam Israel, mas temem guerra regional
De Teerã ao Mediterrâneo, as crises do Oriente Médio avançam em alta e cada vez mais perigosa velocidade.
Na distante quinta-feira passada, a secretária de Estado Condoleezza Rice disse que não queria “especular sobre cenários apocalípticos”, em referência à escalada de violência que recolocou o Líbano velho de guerra no epicentro dos conflitos no Oriente Médio.
A escalada de violência permite especular sobre cenários apocalípticos, como uma guerra regional em larga escala, mas por ora a estratégia americana é reafirmar constantemente seu apoio quase incondicional a Israel nesta crise (sintetizado no argumento de que os israelenses têm o direito à autodefesa), enquanto o presidente George W. Bush subscreve apelos multinacionais, como o comunicado do G-8 divulgado no domingo em São Petersburgo, pelo fim das hostilidades, mas não um cessar-fogo imediato.
Existem os recados específicos do governo Bush para os israelenses tomarem cuidado com “os danos colaterais” na ofensiva libanesa e não provocarem o colapso do governo local.
Mas Washington concorda com o que parece ser a estratégia israelense: punir, conter e, na medida do possível, estrangular o grupo militante xiita Hezbollah. Essa estratégia provavelmente deverá incluir por semanas os bombardeios no Líbano, embora uma invasão por terra seja improvável.
A crise no Líbano, com seus desdobramentos regionais, anda de mãos dadas com o conflito mais localizado em Gaza (envolvendo Israel e o grupo islâmico Hamas).
Para Washington, ainda não é o momento de frear as ofensivas israelenses, pois elas atendem ao objetivo mais amplo de enfraquecer uma espécie de novo “eixo do mal” integrado pelo Hezbollah, Hamas e os dois países que os apoiam, Irã e Síria.
No domingo, Condoleezza RIce sugeriu em entrevista à televisão americana que Israel talvez precise prolongar a ofensiva no Líbano para reduzir a ameaça do Hezbollah.
Países árabes
Robin Wright, a correspondente diplomática do jornal Washington Post revela que, apesar do coro de indignação contra Israel “nas ruas árabes”, o governo Bush estima que existe um apoio tácito dos regimes conservadores árabes (em particular Egito e Árabia Saudita) à “feroz ofensiva” israelense (termo da agência de notícias Associated Press) para conter o populismo islâmico, em particular na sua versão xiita.
Já o conselheiro politico da Casa Branca, Dan Bartlett, ressalta que a indignação europeia com Israel tem sido mais contida do que no passado.
Obviamente não há garantias que a estratégia israelense seja bem-sucedida, especialmente se perdurar por muito tempo, com “danos colaterais” intoleráveis. O Hezbollah poderá sair fortalecido, o regime sírio ganhar uma sobrevida e o Irã se consagrar como o campeão dos interesses islâmicos (e não apenas xiitas).
Tais desdobramentos seriam reveses significativos para o governo Bush, que já viu murcharem seus argumentos no sentido de que a invasão do Iraque tornaria mais segura a vida de Israel e dos aliados árabes dos EUA. Uma relativa vulnerabilidade americana no Oriente Médio talvez tenha estimulado as provocações do Hezbollah com o impulso de Damasco e Teerã.
Ademais, a espiral de violência pode simplesmente fugir ao controle (como se agora já pudesse ser coreografada). Uma preocupação essencial do governo Bush é evitar um confronto direto com os iranianos no momento em que investe em lances diplomáticos multilaterais para coibir as ambições nucleares de Teerã.
A ofensiva israelense contra o Hezbollah pode complicar ainda mais os esforços americanos para pacificar o Iraque e criar um governo estável sob batuta xiita naquele país. Existe, portanto, o interesse dos EUA em radicalizar os conflitos no Oriente Médio através das ações de Israel, mas também impedir a construção dos cenários apocalípticos.
Fonte: Caio Blinder – BBC Brasil: 17/07/2006
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