Perdeu o Ocidente a noção sobre o que é sagrado?

Ainda sobre a polêmica das charges:

O teólogo francês Sohaib Bencheikh se pronunciou contra a decisão dos jornais de confrontar os manifestantes islâmicos com as caricaturas. “É preciso encontrar as fronteiras entre a liberdade de expressão e a liberdade para proteger o que é sagrado”, escreveu ele numa coluna publicada ao lado das caricaturas no France-Soir. “Infelizmente, o Ocidente perdeu a noção sobre o que é sagrado.”



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Charges de Maomé levam à demissão de editor de jornal

Folha Online – BBC Brasil: 02/02/2006 – 07h50

O editor de um jornal francês que publicou uma charge com o profeta Maomé (ou Mohammed) usando um turbante em formato de bomba na primeira página foi demitido por “ofender os muçulmanos”. Jacques Lefranc foi demitido pelo dono do France Soir, após seu jornal ter sido envolvido em uma crescente polêmica entre os muçulmanos e a imprensa européia. Países islâmicos impuseram sanções contra a Dinamarca após um jornal dinamarquês ter sido o primeiro a publicar charges com a imagem de Maomé. Outros jornais europeus republicaram as imagens para mostrar apoio ao direito de livre expressão. Publicações na Alemanha, Itália, Holanda e Espanha republicaram as charges dinamarquesas. O France Soir publicou uma nova charge em sua primeira página mostrando figuras sagradas budistas, judaicas, muçulmanas e cristãs sentadas em uma nuvem, com a legenda: “Não se preocupe, Maomé, nós todos já viramos caricaturas aqui”. Porém o dono do jornal, Raymond Lakah, disse em um comunicado à agência France Presse que decidiu “demitir Jacques Lefranc como diretor-geral da publicação como um poderoso sinal de respeito pelas crenças e convicções pessoais de todos os indivíduos”. “Expressamos nossas desculpas à comunidade muçulmana e a todas as pessoas que ficaram chocadas com a publicação”, disse ele. A tradição islâmica proíbe representações de Maomé ou de Alá (Deus). As charges do jornal dinamarquês Jyllands-Posten incluíam, além do desenho de Maomé usando o turbante com o formato de uma bomba, uma que mostrava o profeta dizendo que o paraíso estava ficando sem virgens para os homens-bomba (cont.)



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Padre italiano vai ter que provar na justiça que Jesus existiu: comédia em quantos atos?

O caso relatado aqui continua. Veja o texto de Assimina Vlahou, da BBC Brasil, em Roma.

 

Italiano processa padre para que prove existência de Jesus

Pela primeira vez em 2000 anos, a existência de Jesus Cristo, depois de ter provocado guerras, disputas teológicas e conflitos religiosos, pode acabar num tribunal internacional.

É o que promete Luigi Cascioli, o homem que desafia um padre italiano a provar, na justiça, que Cristo existiu de verdade.

A primeira audiência do processo foi nesta sexta feira, na Itália.

“Primeira e última”, promete em entrevista à BBC Brasil o advogado do padre Enrico Righi, que está sendo acusado de “abuso da credulidade popular” e “substituição de pessoa”.

Filho de Judas

De acordo com o advogado Bruno Severino, o juiz dará uma resposta em poucos dias e pode arquivar o caso ou decidir que devem ser feitas outras investigações.

“Imagine uma perícia sobre a existência de Jesus!”, exclamou, incrédulo, o advogado.

O acusador é Luigi Cascioli, ex-agrônomo, aposentado, que se define como “ateu militante”.

Há três anos ele decidiu processar o pároco da cidadezinha de Bagnoreggio, perto de Roma, e através dele toda a Igreja Catolica. Estão sendo acusados de não ter provas sobre a existência de Cristo e de fazer com que as pessoas acreditem em algo que não existe.

A acusação de baseia em textos, escritos e distribuídos pelo sacerdote aos fiéis.

Além disso, segundo Cascioli, usaram uma outra pessoa, que existiu de verdade, para construir a identidade de Jesus.

Giovanni di Gamala, filho de Judas, o Galileu, da Casta dos Asmoneus, descendente da estirpe de Davi.

‘Destruir o Cristianismo’

Segundo o paroco de Bagnoreggio, que sozinho deve responder pela História da Igreja diante do tribunal italiano, Giovanni di Gamala é um desconhecido.

“Quem era e o que fez? Parece que apenas o senhor Cascioli sabe de sua existência”, escreveu na revista de sua paróquia, citando personagens históricos, não ligados ao cristianismo, que teriam comprovado a existência de Cristo, como Adriano, Marco Aurélio, Tácito.

O padre Enrico Righi coloca em dúvida a autoridade científica de seu acusador, que, segundo ele, não tem formação de historiador e nem conhece línguas antigas.

“Depois de 50 anos de sacerdócio, esperava ter um pouco de descanso e no entanto acabei no centro de uma disputa ridícula sobre a existência histórica do homem Jesus”, desabafou o padre.

O Vaticano, até agora, não se pronunciou sobre o caso.

Luigi Cascioli alega que seu objetivo é “mostrar a verdade e destruir o cristianismo”. E acredita na possibilidade de ganhar a causa com as provas que entregou ao tribunal.

Para provar que Jesus não existiu, escreveu até um livro, “A Fábula de Cristo”.

Haia

Baseando-se na análise de textos antigos e da Bíblia, ele afirma que as provas para demonstrar a existência de Cristo são a manipulação e falsificação de documentos que, na realidade, se referem a Giovanni di Gamala.

A repercussão do caso pode ajudar na divulgação do livro.

Mas Cascioli garante que este não é o seu objetivo.

“Podem dizer isto, não me importa. Não posso deixar de vender meus livros só para que não digam que quero vendê-los”, se defende.

De acordo com o advogado do padre Enrico Righi, Cascioli se acha no direito de poder expressar sua opinião e nega este direito ao sacerdote.

“Se não existe um crime de opinião, ele não pode ser acusado. Seria um caso único, ser considerado culpado porque cumpriu seu dever de ministro da Igreja Católica e exercitou seu direito de opinião, dizendo o que pensa. Nada que possa ser levado a um tribunal.”

Para o advogado Severino Bruno o caso está praticamente resolvido.

Não para Cascioli, que pretende insistir. E sempre contra o padre Righi, usado como representante da igreja e até do papa que, como chefe de Estado estrangeiro, não pode ser processado.

“Se a sentença não for satisfatória, vou recorrer. E se não der certo, estou disposto a ir até o Tribunal Internacional de Haia”, declarou Cascioli, na conversa com a BBC Brasil.

Fonte: Assimina Vlahou – BBC Brasil: 27/01/2006

Pastoralis: nova forma de pensar a comunidade cristã

Recebi hoje e-mail do ex-aluno e amigo da FTCR da PUC-Campinas, Pe. Rodrigo Catini Flaibam, atualmente pároco de São Cristóvão, Arquidiocese de Campinas, em Valinhos, SP.

Foi uma alegria visitar o site Pastoralis, do qual Rodrigo é o Pároco Virtual. E perceber que, com sua competente equipe, Rodrigo gerencia, não apenas uma página, mas uma nova forma de pensar a comunidade cristã, em perfeita sintonia com os poderosos recursos hoje oferecidos pela net. Parabéns, Rodrigo e equipe.

Claro, a página tem uma seção sobre Bíblia…

 

 

Padre Rodrigo Catini Flaibam nasceu no dia 27 de novembro de 1977, em Amparo.

Foi ordenado diácono em 16 de agosto de 2002 e sacerdote em 14 de fevereiro de 2003 na Catedral Metropolitana de Campinas por Dom Gilberto Pereira Lopes. Exerceu o ministério diaconal na Paróquia Nossa Senhora do Patrocínio, em Monte Mor, onde posteriormente, também, atuou como Vigário Paroquial.

Foi Administrador Paroquial, e posteriormente, Pároco da Paróquia São Cristóvão, de Valinhos. Foi Vigário Forâneo da Forania Santa Cruz (Valinhos e Vinhedo) e Vigário Paroquial da Paróquia Santa Rita de Cássia, em Campinas.

Padre Rodrigo foi Assessor de Imprensa da Arquidiocese de Campinas, e com as reformulações da Assessoria Arquidiocesana de Comunicação, criou um único departamento para os meios de comunicação diocesanos batizado de “Setor Imprensa”, do qual foi o primeiro Diretor, até 2016. Foi o responsável pela criação do “Ecclesia”, que interligou os dados pastorais e contábeis de todas as Paróquias e Cúria. Participou do processo de aquisição da Rádio Brasil Sociedade Ltda. (AM 1270 kHz). Reformou os meios de comunicação oficiais existentes, transformando o centenário Órgão Oficial da Arquidiocese de Campinas “A Tribuna”, em um boletim gratuito e de maior tiragem para as paróquias. Criou a primeira revista exclusivamente digital da Igreja Católica no Brasil, chamada “Revista Digital Lumen”, para internet, tablets e dispositivos móveis (smartphones). Em dezembro de 2012 lançou um novo portal da Arquidiocese de Campinas interligado às principais redes sociais e ferramentas da rede mundial de computadores e dispositivos móveis.

Dado ao gosto pela arte, arquitetura e tradição, somado à facilidade com os programas de edição de imagens digitais, criou vários “logos” e selos, o brasão e bandeira oficiais da Arquidiocese de Campinas. Heraldista eclesiástico, desde 2003, recebeu a provisão com o Nihil Obstat e Aprovação Eclesiástica para esse trabalho por Dom Bruno Gamberini, em 05 de janeiro de 2010. Cria brasões e chancelas para dioceses, cardeais, bispos e organismos da Igreja Católica nacional e internacional. Em 08 de dezembro de 2010, lançou pela assessoria de comunicação diocesana, o livro “Armorial da Arquidiocese de Campinas”, reunindo o conjunto de brasões da Igreja Particular de Campinas: bispos, paróquias e principais organismos.

Em 05 de janeiro de 2016, foi nomeado por Dom Airton José dos Santos, Vigário Paroquial da Paróquia São Sebastião de Valinhos, onde já atuava como colaborador desde julho de 2015.

Da página da Arquidiocese de Campinas – SP.

Fundamentalismo: um desafio ecumênico

A revista Concilium, em um fascículo um tanto datado (1992!), mas com um tratamento dado ao tema que me parece ainda atual, aborda a questão do fundamentalismo como um desafio ecumênico. É claro que há questões novas, que devem ser lidas em outras obras, porém, transcrevo aqui pequenos trechos da Concilium, que acredito dignos de reflexão, especialmente quando vejo, nestes dias, as notícias sobre as atitudes fundamentalistas, tanto de um conhecido pregador norte-americano, quanto de radicais judeus que, ancorados no texto bíblico e/ou em suas tradições, vêem a doença de Sharon como castigo divino por ter retirado os colonos judeus da faixa de Gaza e ter entregue aos palestinos terra que, segundo eles, pertencia a Deus… o qual, por sua vez, a dera a Israel!

KÜNG, H.; MOLTMANN, J. Fundamentalismo: um desafio ecumênico. Concilium, Petrópolis, v. 241, n. 3, 1992, 165 p.

Para complementar a Concilium podem se lidos:
MARTY, M. E; APPLEBY, R. S.(eds.) Accounting for Fundamentalisms: The Dynamic Character of Movements. Chicago: University of Chicago Press, 2004, 862 p.
MARTY, M. E; APPLEBY, R. S.(eds.) Fundamentalisms Comprehended. Chicago: University of Chicago Press, 2004, 528 p.
PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA. A Interpretação da Bíblia na Igreja. São Paulo: Paulinas, 1994 (Leitura fundamentalista: p. 82-86).

What is Biblical Fundamentalism All About?

[Uma definição do fundamentalismo pelos fundamentalistas da Fundamental Evangelistic Association:] Biblical fundamentalism is neither a political movement nor an adherence to the culture of a bygone era. Rather, it is a movement of men and ministries who, recognizing God’s Word as completely authoritative in every area of which it speaks, are dedicated to theological orthodoxy and an attitude of disdain for unbelief as well as theological, ecclesial or ministerial compromise. Biblical fundamentalism is a worldview put into action-a worldview that recognizes man’s need to honor and glorify God in every area of life as revealed through His written Word, the Bible. The Biblical fundamentalist lives out his worldview by manifesting his beliefs through action-particularly, through his love for others, his obedience to God’s Word and his loyalty to God Himself. Biblical fundamentalism, then, is all about love, obedience and loyalty!

COLEMAN, J. A. Fundamentalismo global: perspectivas sociológicas. Concilium, o. c., p. 55-56:

Entre muitas definições conflitantes e – às vezes – puramente convencionais, proponho, como base útil para o estudo comparado dos fundamentalismos, a seguinte definição e explicação de fundamentalismo dada pelos sociólogos Anton Shupe e Jeffrey Hadden (Secularization and Fundamentalism Reconsidered, vol. III. New York: Paragon House, 1989, p. 111): “Em termos extremamente simples, definimos o fundamentalismo como um movimento que visa recuperar a autoridade sobre uma tradição sagrada que deve ser reintegrada como antídoto contra uma sociedade que se soltou de suas amarras institucionais. Do ponto de vista sociológico o fundamentalismo implica: 1) repúdio à radical separação entre sagrado e secular, que foi se impondo sempre mais com a modernidade; e 2) um plano para anular esta bifurcação institucional e com isso trazer a religião de volta para o centro do palco, como importante fator ou parte interessada nas decisões relativas ao interesse público”. O fundamentalismo visa recuperar a autoridade sobre uma tradição sagrada. Distingue-se dos apelos utópicos a criar uma ordem social nova, até agora apenas sonhada. Os fundamentalistas conclamam as pessoas a voltar a uma tradição perdida. Exigem a recuperação dos valores de uma época anterior, presumivelmente mais pura e mais íntegra. Buscam, assim, reorientar a sociedade e a cultura para um futuro mais desejável. Essa época anterior reconstruída pode, evidentemente, padecer de uma idealização em alto grau ou depender de uma ênfase exagerada, mas muito criativa, dada a um ou outro traço da época anterior imaginada. Os historiadores que prezam a exatidão científica terão grande dificuldade em descobrir as provas do pretenso passado idealizado, agora recuperado de forma seletiva. Se numa época anterior existiu uma sociedade mais perfeita e mais honesta, devem necessariamente os fundamentalistas explicar como essa ordem social se desencaminhou. As ideologias ou cosmovisões fundamentalistas apontam, então, símbolos do mal. Apontam e condenam várias ideologias, movimentos sociais e forças ou indivíduos que desencaminharam a sociedade do antigo estado moral idealizado. Conceitos relacionados com ‘colapso moral’ e corrupção dos valores abundam no discurso fundamentalista. Às vezes esses conceitos vêm ligados a supostas conspirações de inimigos tachados de ‘modernistas’ ou ‘humanistas seculares’. Os fundamentalistas procuram apresentar elos de continuidade entre seu movimento fundamentalista e a tradição de fé que este afirma desejar recuperar. Os símbolos centrais evocados pelas reações fundamentalistas ocupam geralmente também um lugar central na ortodoxia da religião. Assim, por exemplo, a sola scriptura transformada em Escritura inerrante ou o primado papal transformado em fundamentalismo papal unem os fundamentalistas à corrente ortodoxa do Protestantismo ou do Catolicismo onde possuem aliados potenciais. Evidentemente, os integristas católicos e os fundamentalistas protestantes tendem a manipular desproporcionalmente os símbolos ortodoxos e a apresentar uma caricatura dos mesmos. Ainda assim, muitas vezes os fundamentalismos retroalimentam a corrente ortodoxa e são, por sua vez, alimentados por aliados na corrente ortodoxa. Às vezes é difícil traçar limites nítidos entre os fundamentalistas e os tradicionalistas ou conservadores mais nuançados. Esta ambigüidade confere ao fundamentalismo uma força que ultrapassa os grupos marginais radicais que o adotam integralmente.

VOLF, M. O desafio do fundamentalismo protestante. Concilium, o. c., p. 127;129-130:

Historicamente, o fundamentalismo protestante foi uma tardia reação religiosa à modernidade. Mais precisamente: foi uma reação à reação do cristianismo liberal à modernidade. O livro de um estudioso do Novo Testamento, J. Gresham Machen, de Princeton, que é provavelmente a melhor expressão do programa teológico fundamentalista, sugere isto através de seu título: Christianity and Liberalism (1923). Na seção histórica do presente artigo, tratarei de Machen como sendo o ‘fundamentalista padrão’ (…) A obra de Machen, Christianity and Liberalism, consiste principalmente de contraposições entre doutrinas bíblicas e as pretensões teológicas do liberalismo. A Bíblia exalta a ‘terrível transcendência de Deus’; o liberalismo aplica o nome de Deus ao ‘processo do mundo’. A Bíblia ensina que ‘o homem é um pecador sob a justa condenação de Deus’; o liberalismo acredita que ‘sob as grosseiras feições exteriores do homem… é possível descobrir a abnegação suficiente para servir de fundamento à esperança da sociedade’. A Bíblia proclama Jesus Cristo como objeto divino e humano da fé; o liberalismo vê nele um exemplo humano de fé. A mensagem central da Bíblia é a salvação da culpa do pecado pelo sacrifício expiatório de Cristo, o Filho de Deus; o liberalismo ensina que a salvação vem pelos próprios seres humanos, vencendo sua preguiça para fazer o bem (…) O ímpeto mais forte que está por trás do fundamentalismo americano se compara à força propulsora da neo-ortodoxia européia: é a crítica da adaptação da teologia liberal à modernidade, partindo da posição vantajosa de redescobrir a ‘terrível transcendência’ de Deus e a ação salvífica de Deus em favor da humanidade pecadora. O acento na Bíblia como Palavra de Deus em ambos os movimentos é parte e parcela desta descoberta.

MOLTMANN, J. Fundamentalismo e modernidade. Concilium, o.c., p.142-143:

Os fundamentalistas não reagem às crises do mundo moderno, mas às crises que o mundo moderno provoca em sua comunidade de fé e em suas convicções básicas. A convicção de fé se baseia na segurança da autoridade divina. Nas assim chamadas Religiões do Livro, é a autoridade divina do documento da revelação: a palavra de Deus é, como o próprio Deus, sem erro e infalível (…) As ciências históricas e empíricas do mundo moderno são reconhecidas enquanto concordarem com [o documento divino da revelação], mas são rejeitadas se questionarem esta autoridade intemporal (…) O documento divino da revelação não pode estar sujeito à interpretação humana mas, ao contrário, a interpretação humana deve estar sujeita ao documento divino da revelação. O fundamentalismo exclui todo juízo racional sobre a condicionalidade histórica de sua origem e sobre a diferença hermenêutica em relação às condições mudadas do presente. O conteúdo de verdade do documento da revelação é intemporal e não precisa ser constantemente explicado ou atualizado, mas apenas conservado intocável. O fundamentalismo baseado na revelação não argumenta, apenas afirma. Não pede compreensão, mas sujeição. Não se trata absolutamente de um problema hermenêutico mas de uma luta pelo poder: ou a palavra de Deus ou o ‘espírito da época’. O fundamentalismo também não é um fenômeno de retirada ou de defesa, mas de avanço sobre o mundo moderno para dominá-lo. Faz parte das várias estratégias teopolíticas atuais…

HEBBLETHWAITE, P. O fundamentalismo romano-católico… Concilium, o. c., p. 114:

Se considerarmos o fundamentalismo não como um corpo doutrinal mas como uma atitude em face da crença religiosa, atitude caracterizada pela canonização de um texto antigo, pelo apego ao seu sentido literal e pela convicção de que só um pequeno resto há de salvar o mundo pela fidelidade à inspiração original, então sem dúvida, existem fundamentalismos romano-católicos. Mas eles tendem a rejeitar essa qualificação, por causa de suas conotações protestantes. Os fundamentalistas católicos diferenciam-se de seus irmãos (e irmãs) protestantes pelo fato de substituir a Bíblia, que não apreciam tanto e nem lêem, pelos Concílios da Igreja, especialmente o Tridentino (Concílio anti-protestante) ou pelo Vaticano I (Concílio antimoderno). Ou então combinam os dois. Esses Concílios representam a ‘idade de ouro’, quando ‘a Igreja sabia para onde ia’.

NEUSNER, J. O desafio do fundamentalismo judaico contemporâneo. Concilium, o. c. p. 67-68:

O ‘fundamentalismo’, categoria teológica cristã protestante, não se aplica a nenhum dos judaísmos contemporâneos. Para nenhum judaísmo hoje – seja Reformista, Reconstrucionista, Conservador, Ortodoxo em qualquer uma das numerosas formas de Judaísmo Ortodoxo atualmente florescentes – a proposição da veracidade literal e inerrante da Escritura, lida segundo suas próprias condições e em seus próprios parâmetros, constitui uma opção. Isso porque todos os Judaísmos abordam as Escrituras hebraicas, conhecidas no Judaísmo como Torá escrita, pelo método estabelecido pela Torá oral, hoje conservada em forma escrita nos dois Talmudes e em várias compilações de Midrashes; e na leitura da Torá oral, embora a Torá escrita seja sempre verdadeira, ela nunca é lida de modo literal, como a hermenêutica fundamentalista protestante sustenta que deve ser. Por conseguinte, em sentido estrito não podemos falar de fundamentalismo no contexto de nenhum Judaísmo ou, portanto, do Judaísmo em geral. Mas, enquanto o fundamentalismo designa um fenômeno mais amplo do que dá a entender o fundamentalismo hermenêutico, podemos apontar pontos de concordância em recentes desdobramentos entre os Judaísmos e correlativos em vários Cristianismos e Islamismos. Pois entre os Judaísmos de hoje levantaram-se de forma intensa questões que, em geral, as pessoas supunham não estarem mais sujeitas a debate. E descobrimos que questões consideradas encerradas suscitam discussões intensas e violentas. Na medida em que podemos identificar como ‘fundamentalismo’ uma renovação do debate sobre as questões fundamentais de organização social da fé – a ordem social judaica – podemos afirmar que existe um fundamentalismo florescendo entre os Judaísmos contemporâneos, e que constitui um importante desafio à ordem social judaica, por um lado, e ao lugar ocupado pelo complexo religioso judaico entre os outros complexos religiosos, por outro.

Sharon “castigado” por Deus: dos danos políticos do fundamentalismo bíblico

Está na Folha Online – 05/01/2006 – 22h13: Pregador dos EUA sugere que derrame de Sharon foi “castigo divino”

O evangelista americano Pat Robertson causou polêmica nesta quinta-feira ao sugerir que o derrame cerebral sofrido pelo primeiro-ministro israelense, Ariel Sharon, 77, foi um “castigo divino” por “dividir a terra sagrada de Israel.” “Deus é inimigo daqueles que dividem sua terra. Deus considera que esta terra [Israel] é sua”, afirmou o pregador ultraconservador em seu programa de TV 700 Club. “A qualquer primeiro-ministro de Israel que decida dividi-la, Deus dirá: ‘Não, é minha'”, acrescentou Robertson. “Agora ele está à beira da morte”, disse o ainda pregador, referindo-se ao líder israelense. “E estava dividindo a terra de Deus” (continua…)


A notícia está em centenas de jornais… veja, por exemplo, The New York Times – January 6, 2006: Robertson Suggests Stroke Is Divine Rebuke

Norfolk, Va., Jan. 5 (AP) – The Protestant broadcaster Pat Robertson suggested Thursday that Ariel Sharon’s stroke was divine punishment for “dividing God’s land.” “God considers this land to be his,” Mr. Robertson said on “The 700 Club,” his television program. “You read the Bible and he says, ‘This is my land,’ and for any prime minister of Israel who decides he is going to carve it up and give it away, God says, ‘No, this is mine.’ ” Mr. Robertson said he had prayed about a year ago with Mr. Sharon, whom he called “a very tenderhearted man and a good friend.” He said he was sad to see Mr. Sharon in his current medical condition. But he also said that in the Bible, the prophet Joel “makes it very clear that God has enmity against those who ‘divide my land.’ ” Mr. Sharon “was dividing God’s land, and I would say woe unto any prime minister of Israel who takes a similar course to appease” the European Union, the United Nations or the United States, Mr. Robertson said.

Esta outra “maldição divina” foi noticiada pelo Jerusalem Post e colocada por Jim Davila no seu blog PaleoJudaica.com: Extremists boast they cursed Sharon By Yaakov Katz (Jerusalem Post)

Far-right activists took credit Thursday for the severe deterioration in Ariel Sharon’s health, claiming that a pulsa denura – Aramaic for “lashes of fire” – death curse they instigated against the prime minister in July was the real catalyst behind his current state of health (continua…)

Padre italiano vai ter que provar na justiça que Jesus existiu

É sério. Está no Times de Londres. Numa disputa entre um agrônomo aposentado ateu e o Pe. Enrico Righi, em Viterbo, ao norte de Roma, Itália, um juiz exigiu que o padre prove, perante a justiça, que Jesus existiu de fato… Veja:

The Times – January 03, 2006 Prove Christ exists, judge orders priestFrom Richard Owen in RomeAn italian judge has ordered a priest to appear in court this month to prove that Jesus Christ existed. The case against Father Enrico Righi has been brought in the town of Viterbo, north of Rome, by Luigi Cascioli, a retired agronomist who once studied for the priesthood but later became a militant atheist. Signor Cascioli, author of a book called The Fable of Christ, began legal proceedings against Father Righi three years ago after the priest denounced Signor Cascioli in the parish newsletter for questioning Christ’s historical existence. Yesterday Gaetano Mautone, a judge in Viterbo, set a preliminary hearing for the end of this month and ordered Father Righi to appear. The judge had earlier refused to take up the case, but was overruled last month by the Court of Appeal, which agreed that Signor Cascioli had a reasonable case for his accusation that Father Righi was “abusing popular credulity”. Signor Cascioli’s contention — echoed in numerous atheist books and internet sites — is that there was no reliable evidence that Jesus lived and died in 1st-century Palestine apart from the Gospel accounts, which Christians took on faith. There is therefore no basis for Christianity, he claims. Signor Cascioli’s one-man campaign came to a head at a court hearing last April when he lodged his accusations of “abuse of popular credulity” and “impersonation”, both offences under the Italian penal code. He argued that all claims for the existence of Jesus from sources other than the Bible stem from authors who lived “after the time of the hypothetical Jesus” and were therefore not reliable witnesses. Signor Cascioli maintains that early Christian writers confused Jesus with John of Gamala, an anti-Roman Jewish insurgent in 1st-century Palestine. Church authorities were therefore guilty of “substitution of persons”. The Roman historians Tacitus and Suetonius mention a “Christus” or “Chrestus”, but were writing “well after the life of the purported Jesus” and were relying on hearsay. Father Righi said there was overwhelming testimony to Christ’s existence in religious and secular texts. Millions had in any case believed in Christ as both man and Son of God for 2,000 years. “If Cascioli does not see the sun in the sky at midday, he cannot sue me because I see it and he does not,” Father Righi said. Signor Cascioli said that the Gospels themselves were full of inconsistencies and did not agree on the names of the 12 apostles. He said that he would withdraw his legal action if Father Righi came up with irrefutable proof of Christ’s existence by the end of the month. The Vatican has so far declined to comment.