Resenha de Croatto sobre o livro dos Biblistas Mineiros

Acho que andei meio distraído, mas só hoje é que li a resenha feita por J. Severino Croatto, o saudoso exegeta argentino, sobre o livro publicado pelos Biblistas Mineiros em 2003, História de Israel e as pesquisas mais recentes… Resenha bastante positiva, elogiosa até, em muitos aspectos.

Sobre o livro diz Croatto:

“Este livro, tendo como enfoque a problemática do histórico em seus diferentes sentidos, oferece um panorama tanto expositivo, quanto crítico do que os livros bíblicos ‘dizem’ e do que a ciência bíblica investiga”.

Sobre o meu capítulo, leio:

“Um ensaio sumamente útil para o leitor é o de Airton José da Silva (cap. 3) sobre ‘A história de Israel na pesquisa atual’ (p. 43-87). Os pontos essenciais da problemática histórica: patriarcas, história javista, diferença entre Canaã e Israel, existência de um império davídico-salomônico ou do exílio babilônico, assim como a questão do ‘Israel’ das origens, são tratados de forma muito sintética, mas clara. É excelente a referência aos mais recentes autores que estão discutindo estes assuntos, e valiosa a bibliografia utilizada, que, aliás, inclui dados informativos. Realmente, uma síntese inteligente do tema, tal como está sendo debatido nos círculos acadêmicos”.

A resenha foi publicada, em português e espanhol, no site do Frei Jacir, organizador do livro, mas infelizmente não está mais lá. Visite o site de Jacir de Freitas Faria, Bíblia e Apócrifos.

Livro de Liverani traduzido para o inglês

Saiu a versão inglesa do notável livro de Mario Liverani sobre a História de Israel, Oltre la Bibbia. Storia Antica di Israele, Roma-Bari, Laterza, 2003 [2005 – 4a. ed.]. Confira Israel’s History and the History of Israel, London, Equinox Publishing, 2005.

Na página da editora se lê:

One of Italy’s foremost experts on antiquity addresses a new issue surrounding the birth of Israel and its historic reality. Many a tale has been told of ancient Israel, but all tales are alike in their quotation of the biblical story in its narrative scheme, despite its historic unreliability. This book completely rewrites the history of Israel through the evaluation of textual and literary critiques as well as archaeological and epigraphic findings. Conceived along the lines of modern historical methodology, it traces the textual material to the times of its creation, reconstructs the temporal evolution of political and religious ideologies, and firmly inserts the history of Israel into its ancient-oriental context.

Gerd Luedemann polemiza sobre o Natal

O conhecido professor luterano Gerd Lüdemann, afastado anos atrás pela cúpula de sua Igreja da cátedra de Novo Testamento da Faculdade de Teologia da Universidade de Göttingen, Alemanha, por suas posturas consideradas hipercríticas em relação ao Novo Testamento, gera intensa polêmica às vésperas do Natal, com um press-release sobre o nascimento de Jesus e seu significado.

Gerd Lüdemann (1946-2021)

O texto foi publicado em sua Home Page e igualmente enviado a lista de discussão Biblical Studies ontem, dia 16 de dezembro de 2005.

São 10 itens, nos quais se mesclam afirmações históricas, exegéticas e teológicas. Algumas de suas afirmações são mais do que pacíficas para o mundo acadêmico, outras são permanente objeto de debate, e umas poucas são epistemologicamente complicadas por transitarem do histórico para o teológico, e vice-versa, sem maiores explicações. O resultado da mesclagem, em tom desafiador, é que aquece a polêmica.

Os interessados podem acompanhar o debate que se estabeleceu lendo alguns biblioblogs.

A melhor análise que vi até agora foi feita por Mark Goodacre, com o título de Lüdemann on Christmas.

Acrescento também o link para um livro publicado em 2002, editado por Jacob Neusner, e que documenta a expulsão de Gerd Lüdemann de sua cátedra.

Convém lembrar que o pesquisador foi, na verdade, transferido para a cadeira de História e Literatura do Cristianismo Primitivo na mesma Universidade, ficando proibido de lecionar Novo Testamento.

Gerd Lüdemann faleceu em 23 de maio de 2021, aos 74 anos de idade.

 

Transcrevo aqui o texto

The Christmas stories are pious fairy-tales

Press Release December 16, 2006

The biblical accounts of the birth of the Jesus, the supposed Son of God, are mere inventions and have little relation to what really happened. Historical research has demonstrated this once and for all. Ten unquestionable facts argue against their historical credibility:

1. Written centuries earlier, the quoted words of Old Testament prophets did not predict the coming of Jesus, but referred to events and persons in their past or immediate future. They would have been shocked by the notion that Jesus’ birth was the fulfillment of their prophecies.
2. The New Testament authors derived most events of the Christmas story from prophecies of the Old Testament and misrepresented their original intent in order to make them seem to point to Jesus.
3. The notion that Mary’s pregnancy did not result from intercourse with a male is a canard. The claim of a virgin birth has two sources: the mistranslation of “young woman” by “virgin” (in a passage that clearly did not refer to Jesus!), and the desire of Christians to place their revered leader on the same level as other ancient “sons of God” who were likewise born without participation of a male.
4. The reported worldwide census ordered by Caesar Augustus did not occur.
5. The reported murder of children in Bethlehem ordered by Herod the Great did not occur.
6. Jesus was born in Nazareth, not in Bethlehem.
7. The angels in the Christmas story derive from primitive mythology.
8. The shepherds who kept watch over their flocks are idealized representatives of the poor and outcast, persons emphasized by Luke. They do not appear in Matthew’s story.
9. The magicians from the East are idealized representatives of the Gentiles and of eternal wisdom. They do not appear in Luke’s story.
10. The story of the star of Bethlehem is a fiction intended to emphasize the importance of Jesus – and, of course, to provide an entrance cue for the magicians from the East.

The logical conclusion is unavoidable: the Christmas stories recounted by the Bible and those Christian churches that present them as actual events have lost all historical credibility. Surely Jesus of Nazareth would not wish Christians to spread lies about him!

Göttingen, December 16, 2005

Prof. Dr. Gerd Lüdemann.

 

A Teologia de Guimarães Rosa em Primeiras Estórias

Uma amiga, que está estudando Literatura Brasileira na Europa, enviou-me, nestes dias, um pedido que não consigo atender direito. Se algum especialista na área quiser dar alguma contribuição, por favor, sirva-se do espaço dos comentários deste post.

Estou estudando Guimarães Rosa e tenho que escrever um trabalho sobre a obra Primeiras Estórias. A obra fala do renascimento transcendental do homem, explica seu processo e tudo mais…. Na verdade o que Guimarães Rosa faz na sua obra é teologia… ele fala de morte e ressurreição através de uma linguagem popular mas mítica… exatamente como a Bíblia. Gostaria de escrever sobre isso. Conheceria você algum autor que já tenha abordado o assunto ou algum indício, uma orientação…?

Bibliografia Bíblica Latino-Americana

A Bibliografia Bíblica Latino-Americana

Um projeto a serviço da interpretação bíblica

Iniciada em 1988 pelo Prof. Milton Schwantes (in memoriam), como parte do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, a Bibliografia Bíblica Latino-Americana é um projeto que está ligado à área de Literatura e Religião no Mundo Bíblico. Tem como objetivo incentivar a pesquisa bíblica, facilitando o acesso ao material produzido na América Latina e no Caribe.

A Bibliografia Bíblica Latino-Americana surgiu em tempos que a Bíblia estava sendo descoberta, em meio às comunidades cristãs da América Latina e do Caribe, como fonte inspiradora de um novo jeito de ser igreja, como novo modo de formular religião à luz das experiências cotidianas e políticas.

Como bem nos ensinava o Prof. Milton Schwantes, “a Bíblia é de todos” e, embora não seja um livro novo, o uso que dela se faz é sempre inovador. Basta olhar para a grande quantia de edições da Bíblia e para o significativo número de novas traduções e já se percebe quão relevante a Escritura vem se tornando no cristianismo latino-americano e caribenho. Além disso, torna-se cada vez mais crescente a interpretação destes textos sagrados em que o nosso contexto ganha espaço e relevância interpretativa. Começa-se a conectar, com destaque, o sentido de seus textos às experiências da vida latino-americana. E, visando registrar na história este e outros fenômenos religiosos, relacionados à Bíblia, é que foi idealizada a Bibliografia Bíblica Latino-Americana.

Após um período de invernia, o projeto foi retomado em 2013 e é hoje coordenado pelo Prof. José Ademar Kaefer, que ocupa a cadeira do Prof. Milton Schwantes. O trabalho, contudo, é realizado em equipe com os alunos e as alunas de Bíblia do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião (UMESP) e da Faculdade de Teologia (FaTeo). É um trabalho feito em mutirão, no pleno sentido da palavra.

O projeto publicou 8 volumes, que reúnem as publicações bíblicas referentes a 1988 até 1995. Estas publicações também estão alocadas na internet e podem ser facilmente encontradas em nosso acervo bibliográfico. Os dados referentes aos anos de 1996 até 2012 só podem ser encontrados no presente site. As publicações de 2013 em diante estão em vias de catalogação, mas boa parte você também já pode acessar aqui.

Um exemplar de parte do material citado encontra-se disponível na Biblioteca Ecumênica da Universidade Metodista de São Paulo, campus Rudge Ramos.

Você também pode fazer parte desse mutirão enviando-nos suas produções bíblicas ou as da sua comunidade para bbiblicalatinoamericanams@gmail.com, e elas também serão incluídas no acervo da BBLAMS. Se possível, envie-nos também um exemplar no endereço acima, que ficará disponível na Biblioteca Ecumênica. Por favor, alerte-nos para algum site de interpretação bíblica ou alguma publicação que não tenham sido mencionados por nós.

Enfim, fazemos votos que o projeto Bibliografia Bíblica Latino-Americana Milton Schwantes seja de grande auxílio para sua pesquisa e uma contribuição para o movimento bíblico da América Latina e Caribe, na construção da Pátria Grande.

A historiografia no debate dos biblioblogueiros

Por falar em historiografia deuteronomista, ontem, Tyler F. Williams, Professor de Antigo Testamento no Taylor University College, Edmonton, Alberta, Canadá, fez, em seu blog Codex [blog descontinuado], um apanhado do debate atual sobre a historiografia bíblica, no contexto do acirrado confronto entre minimalistas e maximalistas.

Beyond Minimalism & Maximalism: Some Modest Observations on the Historiography Debate

A OHDtr em Estudos Bíblicos

O número 88 da revista Estudos Bíblicos, que será o último de 2005, está sendo finalizado pelos Biblistas Mineiros. O tema abordado: A Obra Histórica Deuteronomista, assunto espinhoso e sobre o qual temos pouca bibliografia publicada no Brasil. O meu artigo trata do Contexto da Obra Histórica Deuteronomista. Espero que este número de Estudos Bíblicos seja um recurso válido para os nossos alunos de Teologia e para os agentes de pastoral que precisarem estudar melhor o tema.

Meu artigo começa assim:

Königsberg, Alemanha, 1943: nesta ocasião, Martin Noth propõe, pela primeira vez, que os livros de Josué, Juízes, Samuel e Reis formam uma coletânea (Sammelwerk) de tradições, que deverá ser chamada de historiografia deuteronomista. Nome que lhe é atribuído por sua grande semelhança com as leis e os discursos exortativos do Deuteronômio. Livro este, que, por sua vez, em seus discursos iniciais, cumpre a função de introdução à coletânea. Para Noth, a OHDtr (= Obra Histórica Deuteronomista) teria sido redigida por um só autor, possivelmente na Palestina do século VI a.C., com o objetivo de explicar o fim do reino de Judá e o exílio babilônico então em curso como fruto da apostasia do povo (1).Hoje, mais de 60 anos após a “invenção” de Noth, dezenas de hipóteses sobre a OHDtr, espalhadas em milhares de estudos, são propostas pelos especialistas, destacando-se, entre elas, duas correntes: a de Cross e a de Smend.

Frank Moore Cross, em um artigo de 1968, reeditado em 1973, propõe duas edições da OHDtr: a primeira, elaborada na época de Josias (640-609 a.C.), é um escrito otimista que dá suporte e celebra a reforma político-religiosa deste rei de Jerusalém; a segunda, escrita durante o exílio, é marcada pela experiência da catástrofe de 586 a.C. e transforma o anterior escrito de propaganda em explicação teológica das causas da desgraça que atingiu Jerusalém e Judá. Seus discípulos R. D. Nelson e R. E. Friedman, além de muitos outros pesquisadores, seguem-no de perto (2).

Saindo de Harvard, nos Estados Unidos, para Göttingen, na Alemanha, encontramos a hipótese de Rudolf Smend, feita em 1971 e retomada em 1978, e de seus discípulos W. Dietrich e T. Veijola. Eles propõem três redações para a OHDtr, todas escritas no tempo do exílio. Para Smend, à semelhança de M. Noth, o objetivo da OHDtr seria o de explicar a catástrofe do exílio. Muitos pesquisadores, sobretudo nos países de língua alemã, aderiram às suas explicações (3).

É evidente que a maior parte das questões sobre a OHDtr ainda não foram satisfatoriamente respondidas. Como, por exemplo: quem escreveu esta obra? Quando? Quantas modificações sofreu? Onde começa? Qual o seu objetivo? E até: existe mesmo uma OHDtr? Também: não estaríamos atribuindo ao “deuteronomista” muitas coisas sobre as quais não conhecemos a origem? Existe, de fato, um “pan-deuteronomismo”? Uma “invasão” de teologia deuteronomista em vários livros bíblicos, como muitos sugerem, é aceitável?

A proposta deste artigo é apontar, apesar de todas estas questões, o contexto em que a OHDtr foi escrita. Esta tentativa talvez suscite mais questões do que ofereça respostas. Entretanto, um bom ponto para começarmos a pensar a situação é o seguinte: do século XII a.C. (época da chegada dos “Povos do Mar”) até 745 a.C. (época do rei assírio Tiglat-Pileser III), quase nenhuma interferência duradoura de grandes impérios pode ser detectada na região de Canaã, permitindo aos povos da região uma relativa estabilidade e a construção de sua independência (4) . Mas a partir de 745 a.C…. Assim começaremos a delinear nosso contexto a partir da metade do século VIII a.C.

NOTAS
(1). O livro de M. Noth chama-se Überlieferungsgeschichtliche Studien [Estudos de história das tradições]. Cf. DE PURY, A.; RÖMER, T.; MACCHI, J.-D. (éds.) Israël construit son histoire: l’historiographie deutéronomiste à la lumière des recherches récentes. Genève: Labor et Fides, 1996, p. 18-39.
(2). O artigo de CROSS, F. M. The Themes of the Book of Kings and the Structure of the Deuteronomistic History pode ser lido em seu livro Canaanite Myth and Hebrew Epic: Essays in the History of the Religion of Israel. Cambridge, Massachusetts: Harvard University Press, 1973, p. 274-289 (Reprint Edition: 1997).
(3). Cf. SMEND, R. Die Entstehung des Alten Testaments. Stuttgart: Kohlhammer, 1978 [1990].
(4). Autores tão diferentes como John Bright e Mario Liverani concordam neste ponto. Cf. BRIGHT, J. História de Israel. 7. ed. São Paulo: Paulus, 2003, p. 327; LIVERANI, M. Oltre la Bibbia: storia antica di Israele. Roma-Bari: Laterza, 2003 [4. ed.: 2005], p. 159

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Observatório Bíblico acolhido por Biblical Theology e PaleoJudaica.com

Agradeço aos “bibliobloggers” Jim West e James R. Davila pela gentil acolhida de meu blog na blogosfera, em posts escritos ontem, dia 12.

Diz Jim West em Biblical Theology, sob o título Observatório Bíblico:

Airton José da Silva, who runs a very nice web resource page for Biblical Studies which I have mentioned before, has joined the biblioblogging family with his new blog, Observatório Bíblico. Welcome! Expect good things – this is a sharp man.

Por sua vez, James R. Davila, em PaleoJudaica.com, diz que fui ASSIMILATED TO THE BLOGOSPHERE:

Here’s a fairly new Brazilian blog, Observatório Bíblico, run by Professor Airton José da Silva. Welcome!

Curso de hebraico atualizado

O curso Noções de Hebraico Bíblico passou hoje por pequenas atualizações. Confira o curso aqui.

O hebraico é uma língua semítica. As línguas semíticas constituem um ramo da grande família das línguas afro-asiáticas, anteriormente chamada camito-semítica. A família afro-asiática compreende seis ramos: semítico, egípcio, berbere, cuxita, homótico e chádico.

A família das línguas semíticas é bem antiga, documentada desde a metade do terceiro milênio a.C. com o acádico e o eblaíta, até os dias atuais com o árabe, o amárico e o hebraico.

Quando é que se começou a falar de “língua hebraica”?

Para nossa surpresa, o termo “hebraico”, para se referir à língua, aparece pela primeira vez só nos escritos gramaticais de Saadia ben Iossef, conhecido também como Saadia Gaon (882–942 d.C.), tendo, só mais tarde ainda, se tornado comum nos estudos gramaticais da língua. Saadia Gaon, que nasceu no Egito e morreu na Palestina, foi o mais versátil sábio judeu da diáspora árabe, com erudição enciclopédica e vasta cultura. Saadia dirigiu a grande Yeshivá (=academia rabínica) de Sura, na Babilônia.

Antes disso, como os israelitas e judeus chamavam a sua língua?

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Resenha do programa BibleWorks 6.0

BibleWorks 6.0: uma resenha extremamente positiva do programa foi feita por Jan Van Der Watt, da Universidade de Pretória, Pretória, África do Sul, e publicada em 26/11/2005 pela RBL – Review of Biblical Literature. Entre outras coisas, ele diz:

My overall impression of this program within its set limits is very positive. It is a highly refined and technologically advanced program that is a pleasure to use (…) This is a program that will never disappoint any user interested in analyzing the original languages of the Bible. On the contrary, the excellent features of this program, the speed and search capabilities, the quality of the database and fonts, and many other aspects not even touched on in this review make this program a joy to work with. Buy it and try it – you will not be disappointed.

Onde Encontrar: Ayrton’s Biblical Page > Links