Etica Mundial abre escritório no Brasil

“A Fundação Ética Mundial está chegando na hora certa ao Brasil”

Moisés Sbardelotto

 

O vice-presidente da Fundação Ética Mundial internacional, Karl-Josef Kuschel, congratula a inauguração do primeiro escritório da fundação no Brasil, em parceria com o IHU

 

Quando, na noite da próxima quarta-feira, 29, o Escritório da Fundação Ética Mundial no Brasil for oficialmente inaugurado, a Fundação internacional, com sede na Alemanha, terá conquistado, pelo menos, dois grandes objetivos: instituir seu primeiro escritório no mundo de língua portuguesa e, acima de tudo, na maior nação de solo latino-americano. Essa é a opinião do teólogo e vice-presidente da Fundação, Prof. Dr. Karl-Josef Kuschel, em entrevista concedida por e-mail para a IHU On-Line.

Essa conquista ocorre graças à parceria entre o Instituto Humanitas Unisinos (IHU), a Fundação Ética Mundial internacional (Stiftung Weltethos, no alemão) e o Centro de Cooperação Internacional Brasil-Alemanha da Universidade Federal do Paraná (CCIBA-UFPR). O novo projeto, que fará parte do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, irá colaborar com a difusão da idéia de uma “ética mundial”, desenvolvida, primeiramente, na obra Projeto de ética mundial. Uma moral ecumênica em vista da sobrevivência humana (São Paulo: Paulinas, 1992), do teólogo suíço Hans Küng, um dos mais renomados professores universitários da cena intelectual alemã e atual presidente da Fundação.

Já tendo ultrapassado fronteiras e mares, a Fundação chegou a diversos países como Suíça, República Tcheca, Holanda, na Áustria, México, Colômbia e agora o Brasil. “Ela não quer dirigir-se apenas a pessoas religiosas, mas também a não-religiosas e seculares”, afirma Kuschel. Segundo ele, “sobre valores fundamentais, tanto pessoas crentes como não-crentes podem entender-se e cooperar para o bem da sociedade”. E afirma: “Neste sentido, em face do novo pluralismo no Brasil, a instituição da Fundação está chegando na hora certa”, também para dar orientação a “uma nova geração de pessoas de formação acadêmica, jovens, homens e mulheres”.

Karl-Josef Kuschel é teólogo e vice-presidente da Fundação Ética Mundial, atividade integrada à de seu antigo mestre e atual interlocutor, Hans Küng, de quem havia sido assistente científico por duas décadas, até 1989. Titular da cátedra de Teologia da Cultura e do Diálogo Inter-Religioso na Faculdade de Teologia Católica da Universidade de Tübingen, Alemanha, Kuschel é internacionalmente reconhecido na área do diálogo inter-religioso entre judeus, cristãos e muçulmanos e na relação entre teologia e literatura. Doutor honoris causa pela Universidade de Lund, na Suécia, é autor de mais de 40 livros, dentre os quais Os escritores e as escrituras (São Paulo: Loyola, 1999), Discordia en la casa de Abrahan. Lo que separa y lo que une a judíos, cristianos e musulmanes (Navarra: Verbo Divino, 1996) e Juden, Christen, Muslime. Herkunft und Zukunft (Düsseldorf: Patmos, 2007).

Kuschel também é autor de dois artigos publicados nos Cadernos Teologia Pública do Instituto Humanitas Unisinos – IHU intitulados Bento XVI e Hans Küng: contexto e perspectivas do encontro em Castel Gandolfo (n° 21, de 2006) e Fundamentação atual dos direitos humanos entre judeus, cristãos e muçulmanos: análises comparativas entre as religiões e problemas (n° 28, de 2007).

 

A entrevista

IHU On-Line – Qual a importância do novo escritório da Fundação Ética Mundial no Brasil?

Karl-Josef Kuschel – O significado nem pode ser apreciado com suficientes enaltecimentos. Até agora, só houve escritórios da Fundação Ética Mundial no âmbito europeu e no de língua espanhola. Por exemplo, na Alemanha e na Suíça, bem como no México e na Colômbia. Agora foi possível instituir também uma Fundação no mundo de língua portuguesa e acima de tudo na maior nação de solo latino-americano. Isso merece o máximo de consideração. Os amigos brasileiros merecem todo o apoio.

IHU On-Line – Este será o primeiro escritório no Brasil, considerado o “país mais católico do mundo”, com enormes diferenças econômicas, religiosas e sociais. Qual será a contribuição da Fundação para o debate ético entre as religiões e a sociedade brasileira?

Karl-Josef Kuschel – Você tem razão. O Brasil é um país profundamente marcado pelo catolicismo. Porém, ao mesmo tempo também uma nação ideológica e religiosamente plural, como muitos ainda acreditam na Europa. Desde o século XIX, há uma forte participação de secularismo e de laicismo, principalmente entre as elites cultas do país. Desde fins do século XX, igrejas carismáticas e movimentos de origem protestante conquistaram sempre mais adeptos. Ao mesmo tempo, a sociedade sofre sob fortes tensões sociais e econômicas. Nesta situação, apoiada em seu documento básico, a “Declaração sobre Ética Universal” do Parlamento das Religiões Mundiais de 1993, a Fundação pode dar impulsos para um discurso social baseado na ética. Porque o Projeto de Ética Mundial de modo expresso não quer apenas dirigir-se a pessoas religiosas, mas também a não-religiosas e seculares. Sobre valores fundamentais, tanto pessoas crentes como não-crentes podem entender-se e cooperar para o bem da sociedade. Neste sentido, em face ao novo pluralismo no Brasil, a instituição da Fundação está chegando na hora certa.

IHU On-Line – Quais são os principais desafios no Brasil com os quais a Fundação pode ajudar a responder com seus projetos e atividades?

Karl-Josef Kuschel – O grande desafio da Fundação Ética Mundial Brasil consistirá, através da formação e educação, em criar uma nova consciência no sentido de que vivemos num mundo não só econômica e ecologicamente, mas também ecumênica e inter-religiosamente amalgamado. As religiões mundiais compartilham valores comuns. Nenhuma religião tem pretensão de exclusividade. Esta ação formativa e educadora não se restringe às elites acadêmicas. Ela deve começar bem embaixo, na base das comunidades e das escolas. A Fundação Ética Mundial Alemanha realizou aqui uma grande atividade prévia. Foi elaborado um grande manual, “Ética mundial na escola”, com o qual professoras e professores podem transpor a temática da ética mundial a todos os tipos e níveis escolares. Será uma importante tarefa dos amigos brasileiros transferir esse manual para as condições e circunstâncias brasileiras. Cada professora e cada professor da nação devem saber que no tema da Ética Mundial não estão sozinhos e que podem receber introduções e materiais da Fundação em São Leopoldo.

IHU On-Line – Como pode a Fundação colaborar no debate ecumênico e inter-religioso no Brasil, de modo a se criar uma melhor relação entre nossas religiões?

Karl-Josef Kuschel – O Projeto de Ética Mundial, desde o começo, não foi um projeto confessional, mas ecumênico. Os valores, que são tornados conscientes na explicação sobre a ética mundial, são compartilhados por todos os cristãos e também por não-cristãos. A era do confessionalismo passou, mesmo que alguns desejem reinstaurá-la. Hoje, os cristãos devem dar respostas conjuntamente aos desafios da época. O papa Bento XVI reconheceu isso explicitamente. Em setembro de 2005, poucos meses após sua eleição ao papado, ele recebeu o professor Hans Küng, que ele também conhece pessoalmente muito bem desde períodos comuns no Concílio e na Universidade de Tübingen e que entrementes se tornara Presidente da Fundação Ética Mundial Alemanha/Suíça, para uma longa conversa em Castel Gandolfo. Num comunicado por ele próprio elaborado ele descreve o Projeto de Ética Mundial com as seguintes palavras: “O professor Küng constatou que no ‘Projeto de Ética Mundial’ de nenhum modo se trata de uma construção intelectual abstrata. Antes são trazidos à luz os valores morais, nos quais as grandes religiões do mundo convergem apesar de todas as diferenças e que, a partir de sua convincente significância também podem apresentar-se à razão secular como padrões válidos”. O papa apreciou positivamente o esforço do professor Küng de, “no diálogo das religiões como também no encontro com a razão secular, contribuir para um reconhecimento renovado dos valores morais essenciais da humanidade”.

IHU On-Line – O que a Fundação internacional espera do debate ético no Brasil, por meio de sua presença na Unisinos e na comunidade acadêmica?

Karl-Josef Kuschel – A Fundação Brasil tem agora a grande chance de incentivar no Brasil novos discursos em questões éticas – partindo das elites acadêmicas, com o olhar nos desafios que provêm através das Ciências Naturais, da Técnica, Economia, Ecologia. Esses discursos podem, agora, receber nova força com base nos valores do Projeto de Ética Mundial. É preciso conseguir conquistar pensadores brasileiros que saibam conectar teoria e prática para a situação específica no Brasil. Pesquisa científica básica e discursos públicos se interconectam. O Brasil é uma nação “jovem”. Uma nova geração de pessoas de formação acadêmica, jovens homens e mulheres buscam orientação. Dar-lhes esta orientação é um grande desafio à Fundação Ética Mundial Brasil. Nós, da Fundação Ética Mundial Alemanha apoiaremos nossos amigos brasileiros dentro de nossas forças.

As origens de Israel: polêmico artigo de Rainey

O Professor Emérito de Culturas do Antigo Oriente Médio e de Linguística Semítica da Universidade de Tel Aviv, Israel, Anson Rainey, tentou mostrar, em artigo recente na Biblical Archaeology Review (BAR), que os primeiros israelitas são pastores nômades originários da Transjordânia. Ele argumenta que a Bíblia é clara sobre este ponto e que os dados linguísticos lhe dão razão. Para ele toda a pesquisa dos últimos 46 anos, desde Mendenhall, em 1962, que mostra Israel surgindo a partir de Canaã, carece de fundamento e está equivocada.

Levou “cascudos” de tudo quanto foi lado. Merecidos. Incorreu em vários equívocos conhecidos e amplamente debatidos por dezenas de especialistas nesta área.

Vale a pena acompanhar a polêmica que o artigo suscitou. E vale a pena ler mais sobre o assunto em vários textos, em português, que estão em minha página e em meu blog.

O artigo de Anson Rainey:
:: Inside, Outside: Where Did the Early Israelites Come From? – By Anson Rainey – BAR 34:06, Nov/Dec 2008 – Reproduzido em Bibbiablog
Before they settled in the hill country of Canaan, where did the earliest Israelites come from and what was the nature of their society? The Bible is very clear. They were pastoral nomads who came from east of the Jordan. Much of the scholarship of the last part of the 20th century, however, has reached a far different conclusion. One might almost describe it as diametrically opposed to the Biblical account. According to this scholarship, the Israelites were originally Canaanites fleeing from the city-states of the coastal plain west of the hill country.

Algumas reações:
:: Anson Rainey, ‘East of the Jordan’ is not ‘The Rest of the Ancient Near East’ – Posted by ntwrong at October 23, 2008 – Blog N. T. Wrong
Anson Rainey’s article in the latest BAR (34:06, Nov/Dec 2008) is a confused and misleading piece of popular apologetics. The best to be said for it is that, in trying to prove a Transjordanian origin for ‘Israel’, it has managed to undermine its broader thesis (which argues that the biblical account of Israel’s origins are historically true).

:: Rainey’s Selective Use of Evidence For Israelite Origins – Posted by Douglas Mangum at October 25, 2008 – Blog Biblia Hebraica
I’ve only just had the time to read over Anson Rainey’s recent BAR article on Israel’s origins. I have to admit I was baffled by his selective use of evidence and his conflation of archaeological, historical, and biblical material unrelated to his primary claim. He starts off on the wrong foot and continues down the non sequitur path. I’m sure his argument made sense in his own mind, but what he’s presented is a jumble of selectively chosen facts, a false dichotomy of competing theories, and a caricature of the evidence and arguments for Israelites as native Canaanites. There are so many issues with his assumptions and use of evidence that I can’t imagine taking the time to offer a complete critique. Fortunately, I don’t need to do all the work on this one. Several others have pointed out some of the issues with Rainey’s article already.

:: On The Selective Use Of Linguistic Data – Posted by Duane Smith at October 25, 2008 – Blog Abnormal Interests
The other day I accused Anson Rainey of selectively using linguistic data to make a point about the origins of the Hebrew language and the people who spoke it. In an earlier post I listed most, if not all, of Rainey’s examples and gave a couple of counter examples of my own. I decided to do a little experiment. I make no claim of completeness. First, I when through Garr’s table, 206-214, of isoglosses between various North West Semitic languages and noted those where Hebrew agreeds with Phoenician, more or less unambiguously, over against Aramaic. I may have missed one or two but here is I what found.