Nomeado novo bispo de Patos de Minas

Frei Cláudio Nori é nomeado bispo da diocese de Patos de Minas

O papa Bento XVI nomeou, nesta quarta-feira, 8, o Frei Cláudio Nori Sturm, bispo da diocese de Patos de Minas, vacante desde 30 de maio do ano passado, por causa da transferência de seu bispo, dom João Bosco Oliver de Faria, para a arquidiocese de Diamantina.

Frei Cláudio, 55, pertence à Ordem dos Frades Menores Capuchinhos (OFMCap) e, atualmente, é Ministro Provincial da Província de São Lourenço Brindes do Paraná e Santa Catarina.

Nascido em Giruá, no Rio Grande do Sul, em 12 de maio de 1953, o novo bispo começou seus estudos no seminário dos Frades Menores Capuchinhos em 1968, em Ouro (SC), e completou o o ensino médio no seminário de Irati (PR). Fez o noviciado em Curitiba (PR), em 1974, emitindo os votos temporários no ano seguinte. Cursou Filosofia e Teologia entre 1975 e 1980 em Ponta Grossa (PR), no Instituto dos Frades Menores Capuchinhos, sendo ordenado presbítero no dia 6 de janeiro de 1980, em Ponta Grossa (PR). Em Roma, fez o mestrado em filosofia no período de 1983 a 1985.

Como presbítero, frei Cláudio foi professor no seminário dos Capuchinhos, em Irati (1980-1982) e Ponta Grossa (1986-1994). De 1987 a 1994, foi mestre de postulantes no Convento Bom Jesus, em Ponta Grossa, e diretor do Instituto Superior de Filosofia dos Capuchinhos na mesma cidade. Em Roma, foi reitor do Colégio Internacional São Lourenço de Brindes, de 1995 a 1999.

Exerceu ainda a função de Visitador apostólico da Congregação das Irmãs de São Pedro Canísio (2000-2002); foi pároco da paróquia Imaculada Conceição, em Ponta Grossa (2002-2005) e Vigário Provincial da Província São Lourenço Brindes, dos Frades Menores Capuchinhos, do Paraná e Santa Catarina em 2005 e 2006.

Fonte: CNBB – 08/10/2008

O Mino voltou

O Blog do Mino Carta está de volta… Depois de breve aparição, sumiu de novo. Mas o Mino está aí, vivíssimo.

 

Uma entrevista

Mino Carta: De Veja à CartaCapital, um olhar sobre comunicação – Portal Vermelho Dia: 13/05/2013

Aos 80 anos, o homem que comandou a criação da Veja e hoje dirige a CartaCapital não baixa a guarda. Ataca as novas gerações de jornalistas e diz que a grande mídia perdeu o poder de influenciar a opinião pública nacional. Leia a seguir a íntegra da entrevista do jornalista concedida ao jornal O Povo e publicada nesta segunda-feira (13).

O jornalista Mino Carta esconde, involuntariamente, as oito décadas de vida com um entusiasmo quase juvenil na defesa de suas ideias. O mesmo tom agitado que o move nos ataques ao que considera “imbecilização” brasileira contemporânea acompanha sua análise sobre a desperdiçada vocação natural do País para ser um “paraíso terrestre”. Efeito, avalia, da herança da longa escravidão que até hoje mantém vivo entre nós o clima de Casa Grande e Senzala.

O olhar dele sobre o momento nacional é duro, especialmente quando visto sob a ótica do jornalismo e da política. A justiça vai na mesma linha. A conversa é permeada por termos como “imbecil”, “idiota”, “calhorda” acompanhando suas apreciações sobre personagens, públicos ou de sua convivência pessoal, uma ênfase que muitas vezes parece desnecessária diante de um diálogo que o tempo todo flui sob a artilharia verbal de um genovês que vive no Brasil desde 1946.

Confira os trechos principais da conversa com Mino, que aconteceu na manhã do dia 17 de abril deste ano, quando de sua passagem por Fortaleza para lançar o mais novo livro “O Brasil”.

Depois de tudo que o senhor viveu, das experiências boas e ruins que vivenciou, seria jornalista se lhe fosse dada uma segunda chance?
(risos) Não sei, sinceramente, não sei. Vou lhe dizer, com toda sinceridade, que eu não queria ser jornalista, embora sendo neto e filho de jornalista.

O senhor resistiu inicialmente à ideia, então?
É que não era meu objetivo. Eu teria gostado de ser escritor ou pintor.

O senhor diz que não queria, mas acabou sendo jornalista, com sucesso, inclusive. O exemplo mostra que a profissão prescinde da vocação ou é o contrário?
Não, não prescinde, absolutamente. A vocação é absolutamente necessária e começa pelo fato de você ter de lidar com desembaraço com a escrita. Fazendo referência à minha geração de jornalista, quando tínhamos que ter, independente da formação acadêmica, um ótimo conhecimento da língua e precisávamos ter, portanto, leituras frequentes e profundas, texto impecável. Agora, só para completar aquela ideia inicial, não queria ser jornalista, mas acabei sendo jornalista, acabei até, num primeiro movimento, dirigindo uma revista especializada em carros mesmo sem entender nada de carro….

O senhor não dirige, inclusive…
Não, não dirijo. No entanto, acabei comandando a revista e foi um sucesso. Era, então, um jornalista a serviço de uma ideia que não era necessariamente a minha. Quando fui trabalhar no Estadão, e fui muito bem tratado, até pelo fato de o meu pai já ter trabalhado lá e ser uma pessoa muito querida. Ele, que morreu apenas dois meses depois que comecei a trabalhar no jornal, era uma pessoa muito querida e eu terminei herdando um pouco essa condição que havia deixado lá após 17 anos. Bom, fui muito bem tratado e tal, mas, evidentemente, as ideias dos senhores Mesquita não batem com as minhas, algo que não me impedia de ser leal no desempenho da minha função. O que realmente mudou a minha visão do jornalismo foi a ditadura, com a chegada da censura. Isso corresponde à minha ida para a revista Veja, que foi submetida a uma censura feroz. Foi quando me dei conta da importância do jornalismo, me dei conta da serventia dele.

Ainda é?
Sem dúvida, claro. O jornalismo é de uma enorme utilidade, no Brasil, então, nem se fala. No Brasil ainda estão de pé as casas grandes e as senzalas, então, contribuir de alguma forma para a demolição delas, algo que não enxergo como uma coisa próxima, me parece ser uma tarefa brilhante, que a mídia brasileira não cumpre.

O senhor entende, então, que o papel da mídia seria fundamental dentro do contexto. Na sua avaliação, os interesses, a carga opinativa, tudo isso está contaminando o noticiário atualmente?
Ah, sem dúvida. Primeiro, inventa-se. O caso do tomate é um exemplo clássico, já que foi uma invenção, uma coisa sem base alguma. O que é grave, pois o jornalista não tem que inventar. Pior ainda é quando você mente, ou, omite. Olha, eu fundei tudo que de mais importante aconteceu nesse Brasil em termos de imprensa nos últimos 40 anos, escrevo um livro e, em qual país do mundo um livro deste seria ignorado pela mídia? Não existe, só aqui! É o único lugar do mundo onde os jornalistas chamam o patrão de colega. Patrão é patrão, jornalista é jornalista. Quando fui trabalhar na Itália, com meus 22 anos, existia uma lei, que até hoje perdura, pela qual o dono não pode ser diretor de Redação. Diretor de Redação pelo direito divino não existe! Só no Brasil!

O que seria diferente, então, na Carta Capital, onde o senhor é dono e diretor de Redação?
(risos) É que a Carta Capital é uma tentativa literal de sobrevida, de sobrevivência. Digo-lhe mais: não tenho interferência alguma na administração da empresa, nenhuma. Faço o meu trabalho, dirijo a Redação. E, claro, ganho meu salário que, comparado ao dos rapazes que dirigem redações por ai, sequer falo do pessoal das televisões, chega a ser ridículo. Trata-se da única coisa que ganho, dividendos nunca vi.

Voltando à questão do livro que está sendo lançado, o senhor diz que há uma deliberada opção da grande mídia por ignorá-lo.
É a realidade dos fatos. Mesmo assim, o livro já chegou à terceira edição, tiragem de dez mil exemplares, passados apenas 45 dias desde o lançamento em São Paulo.

O público não percebe isso? Qual, na avaliação do senhor, é a percepção das pessoas, dos leitores sobre o papel da mídia hoje?
Quanto à chamada classe média, que não é média coisa nenhuma, claro que há influência sobre ela. Quanto ao povo, não! O povo, apesar de tudo isso (em relação ao governo), se a eleição fosse hoje a Dilma (Rousseff) ganharia. Apesar do tomate, apesar dos juros, apesar de tudo, assim como o Lula ganha, e ganhou. Essa mídia não chega ao povo brasileiro, à senzala. A senzala, eventualmente, vê o Faustão, uma coisa do tipo, mas ao “Jornal Nacional” não. Ela não lê o editorial do Estadão, não lê a revista Veja, diferente da classe A, B, que acredita naquilo, repete as mesmas frases. Além de tudo, a ofensa diária contra a língua portuguesa é inominável, as pessoas não sabem falar, orgulham-se de usar 100 palavras, os próprios jornais. É a regra dentro da Folha de S. Paulo, por exemplo: diga tudo com cem palavras. Esta é a situação!

Parece que no Brasil não há espaço para uma mídia que manifeste de maneira mais clara e aberta suas posições. Até pelo fato de, na prática, inexistir direita e esquerda na própria política…
O problema é exatamente este. Temos uma mídia que funciona de um lado só e que se destina, em última análise, a um público muito restrito. Pensemos na imprensa dos países mais democráticos, onde há jornal de direita, de esquerda, de meia-direita, de meia-esquerda, de todas as tendências possíveis representadas na mídia. Isso cria um debate natural. Aqui é tudo de um lado só. Moro num prédio em que sou olhado como um perigosíssimo subversivo!

Por que não existem órgãos com tais características, com posições claras e definidas. É o mercado publicitário que rejeita? É o leitor?
Se a The Economist escolheu a CartaCapital para ser sua parceira no Brasil, escolheu, não em nome de uma identidade, de uma afinidade ideológica, porque temos posições diferentes. A escolha foi em função da seriedade e da qualidade. Eles acham a imprensa brasileira uma tragédia e têm razão. Eles nos escolheram, mesmo que eu não tenha as mesmas posições da The Economist, nem a CartaCapital tenha essas posições. A Economist, por exemplo, pede a demissão de (Guido) Mantega porque mexe com os interesses deles, de quem cujas causas advoga. Se a The Economist fosse brasileira estaria perdida, coitada, porque na Inglaterra distribui 200 mil exemplares, menos do que distribui no Brasil a revista Isto É. Muito menos do que distribui a Época e infinitamente menos do que a Veja. Os publicitários brasileiros aplicam febrilmente, e safadamente, critérios que chamam de técnicos. Nós temos uma revista que tira 70 mil exemplares por edição e, acho, se conseguirmos aplicar um pouco em autopromoção, poderemos sim multiplicar essa tiragem. Mas, qual é o limite extremo? Dobrar a tiragem? Seria sucesso total porque praticamos um vernáculo decente, porque não é fácil ler a CartaCapital. É uma revista séria, embora às vezes se permita lances de ironia. Razão pela qual será lida sempre por um público reduzido, como na Inglaterra, que é um país onde os índices de leitura são superiores aos nossos e você vê que a The Economist distribui 200 mil exemplares.

O mensalão do PT, para o senhor, está recebendo um tratamento diferenciado, da Justiça e da imprensa?
Sejamos honestos, a Justiça foi pressionada violentamente. Não houve isenção alguma e muitas condenações foram injustas.

Quando o senhor fala que a Justiça agiu pressionada pelo noticiário expõe, de qualquer maneira, uma fragilidade que ela não deveria ter, não é?
Claro. Basta olhar para o ministro Luiz Fux para logo concluir que se trata de um imbecil. Há pessoas que trazem no rosto a consistência moral e intelectual, a mostram de uma maneira desabrida. Pensa no caso (Cesare) Battisti e como se portou esse Supremo Tribunal Federal… Coisa grotesca, mostrando uma ignorância das coisas do mundo total.

Um erro, então, que começou dentro do próprio governo Lula.

Total, começa no Tarso Genro e chega ao Lula, que cometeu um erro gravíssimo. Não tem nada a ver comparar Battisti com aqueles nossos poucos, mas certamente corajosos, guerrilheiros. Battisti queria derrubar um Estado de Direito, enquanto os nossos queriam devolver o Brasil a um Estado de Direito. Exatamente o caminho oposto.

O questionamento, me parece, foi à forma como se deu o julgamento dele na Itália.
Imagine, ele teve os melhores juristas italianos. É que os franceses tiveram um idiota que se chamava François Miterrand, inventor de uma lei pela qual quem fosse terrorista encontraria guarida na França. Uma besteira! Além de tudo, ele, Miterrand, era outro hipócrita, um socialista de fancaria, de mentira.

Voltando à questão de sua trajetória como criador de alguns dos principais veículos impressos do País, um marco, sem dúvida, foi a criação da revista Veja..
Sim, mas a minha Veja…

Hoje, o senhor lê a Veja?
Não. Às vezes me divirto olhando a capa e sempre tem quem me informa sobre um editorial, algo assim.

Mudou, em relação à época do senhor, inclusive quanto ao estilo?
É um delírio, um delírio absoluto. Havia um contrato com os Civita, na minha época, no qual constava que eles definiam o tipo de revista que queriam, mas depois seriam leitores da revista. A discussão seria sempre a posteriori, nunca a priori, ou seja, não poderiam influenciar a pauta e coisa e tal. O Victor Civita cumpriu essa cláusula durante todo o tempo, ele tinha sua falta de escrúpulo, eventualmente, mas, ao mesmo tempo, era um fazedor, era um homem de realizações, um empresário dedicado. Quanto aos filhos, um era bastante claro em relação às suas pretensões, mas não se metia, enquanto o outro, o Roberto, era metidíssimo e calhorda.

Com relação à Isto É, outra revista que o senhor criou, qual o sentimento que há ainda hoje?
A Isto É tenta sobreviver, mas a editora Três está carregada de dívidas, uma coisa monstruosa.

Com efeitos sobre a qualidade editorial?
Sem dúvida, sem dúvida, afeta muito. A Isto É tem uma posição ambígua, digamos, não é o delírio da Veja, não é a mesma coisa. Mais próxima da Veja tem a Época, como postura ideológica.

O senhor avalia que o Brasil vive um processo de imbecilização. No que é que consiste isso e, por outro lado, o fenômeno é nosso, nacional, ou tem âmbito mundial?
É um fenômeno mundial, acho, embora aqui seja mais acentuado porque a senzala continua de pé e os moradores da senzala apresentam uma certa diferença, em termos culturais. Nosso povo é especialmente ignorante. Não existem povos melhores ou piores e, lhe digo mais, a tragédia é que o Brasil poderia ser o paraíso terrestre. Acho, sinceramente, porque não existe no mundo um País tão favorecido pela natureza. A nossa elite é culpada, sim, muito culpada, pelo atraso que começa nesse ponto, exatamente, na permanência da Casa Grande e da Senzala, que é a herança de três séculos e meio de escravidão. Uma herança terrível, visível, tangível, você toca nisso diariamente. É doloroso porque o Brasil poderia ser o paraíso terrestre. As nossas circunstâncias históricas sempre foram ruins por causa de uma elite calhorda, prepotente, feroz, vulgar, ignorante, primária. É isso.

Produção literária
“O que realmente mudou minha visão do jornalismo foi a ditadura, com a censura”

No total, já são cinco livros de autoria do escritor Mino Carta. O primeiro deles, “Histórias da Mooca, Com as Bênçãos de San Gennaro”, é de 1982. Depois, na sequência, vieram “O Restaurante Fasano e a Cozinha de Luciano Boseggia”, de 1996,”O Castelo de Âmbar”, de 2000, “A Sombra do Silêncio “, de 2003, e, agora em 2013, “O Brasil”. Como estilo, nos romances, mistura ficção e realidade sem grande esforço para esconder a possível inspiração de muitos dos seus personagens.

Perfil
Demetrio Giuliano Gianni Carta nasceu na cidade italiana de Gênova, em 6 de setembro de 1933, filho de Gianino Carta, jornalista e professor de História da Arte, e de Clara Carta, escritora. Vestia calças curtas quando, em 1946, chegou a São Paulo com os pais. Chegou a cursar Direito da Universidade de São Paulo (USP), mas não concluiu o curso. Dirigiu as equipes de criação da Quatro Rodas (1960), Jornal da Tarde (1966), Veja (1968) e CartaCapital (1994). Foi, ainda, diretor de redação das revistas Senhor (1982), IstoÉ/Senhor (1988) e IstoÉ (1989). O único jornal que ajudou a fundar e não prosperou foi o Jornal da República (1979). É autor dos livros “O Castelo de Âmbar” (2000), “A Sombra do Silêncio” (2003), “Histórias da Mooca, Com as Bênçãos de San Gennaro” (1982), “O Restaurante Fasano e a Cozinha de Luciano Boseggia”, em parceria com Rogério Fasano (1996) e “O Brasil” (2013). Ganhou dois Prêmios Esso de Jornalismo, em 1964 e 1968. Dedica-se também à pintura, desde 1954.

Cerca de 150 pessoas foram ao lançamento do novo livro de Mino Carta em Fortaleza, em abril, no auditório do Centro Cultural Dragão do Mar.

Uma demonstração, para ele, de que o boicote da grande mídia à obra não tem sido suficiente para evitar seu sucesso. A apresentação de “O Brasil” foi feita pelo ex-governador e ex-ministro Ciro Gomes.

O livro “O Brasil” é definido como uma autoficção (mistura de autobiografia com ficção). Nele, o personagem Abukir, alterego de Mino, repassa três décadas da história nacional, da morte de Getúlio Vargas ao fim da ditadura militar. Faz-se uma crítica ao País e ao jornalismo brasileiro, especialmente a partir de sua relação com o poder político.

História de um rompimento
A editora Abril tinha contraído dívidas no exterior e queria consolidá-las no Brasil através de um empréstimo de 50 milhões de dólares (junto à Caixa Econômica Federal). Eu estava muito por dentro da situação porque não somente era diretor de Redação da revista Veja, mas, também, integrava o Conselho Diretor da editora, composto pelo presidente, Victor Civita, pelos dois filhos dele, pelo sócio-minoritário, que se chamava Gordiano Rossi, e pelo genro deste, que funcionava como editor-responsável da editora. O Carlos Rischbieter (presidente da CEF na época) aprovou o pedido, mesmo porque a Abril oferecia garantias que ele considerava tecnicamente perfeitas.

O negócio marchou por várias mesas até chegar à do Armando Falcão, então ministro da Justiça. O partisse desta crise se deu em julho de 1975, quando o Falcão comunicou que o empréstimo não sairia porque a editora Abril produzia uma revista que era inimiga do regime. Tudo isso era discutido abertamente no Conselho e eu fiz a seguinte proposta: seu Victor, eu saio da direção da revista, fico nos bastidores por uns três meses para garantir uma transferência interna de poderes e, por exemplo, a editora me nomeia diretor das sucursais europeias e vou morar em Roma, que tal? Ele, ficou de pensar, conversar com os filhos etc e, uma semana depois, disse que ‘não’. Disse que tudo bem, mas enquanto estivesse lá faria a coisa funcionar da mesma maneira.

Depois, veio o imbecil do filho dele, uma das mais refinadas bestas que conheci na minha vida, o Roberto Civita, e perguntou: ‘por que você não tira férias?’ Ele sugeriu meio ano, mas recusei, lembrando que tinha férias vencidas, três meses etc e tal. Mas, perguntei: saio três meses e vocês vão fazer o quê enquanto eu estiver fora? Vão se esbaldar em porcarias? ‘Não’, disseram eles, ‘vamos assinar um procolo’. O tal protocolo estabelecia, basicamente, que os redatores-chefes, que eram dois, me substituiriam em gênero, número e grau. Outro ponto do protocolo, previa que ninguém seria demitido por razões políticas. Ninguém, nem colaboradores, nem, claro, funcionários. Muito bem, sai no dia 27 de dezembro para um período de três meses de férias, o protocolo foi assinado com validade até 1º de abril. Fui à Europa e, de volta no finzinho de janeiro, o Victor Civita me acha e pede que vá visitá-lo. Fui e ele me disse que o Roberto tinha estado no dia anterior com o Falcão e eu tinha que mandar embora o Plínio Marcos. Disse que não iria mandar embora ninguém, porque existia o protocolo. Ele disse que até o Tratado de Versailles tinha sido jogado no lixo e tal. Respondi que da minha parte não rasgaria nem o Tratado de Versailles e nem o protocolo. Ele insistiu mais e eu peguei um cinzeiro e atirei no peito dele. E fui embora.

Houve antes um encontro com o Roberto Civita que me disse que o Falcão havia pedido minha cabeça. Eu disse: pois é, eu sei, mas, e daí? O que é que você diz? Ele disse ‘não sei, o que é que eu posso dizer?’ Falei, então, estávamos conversando na minha casa, que iria contar até três e se você estiver ainda diante de mim te quebro os dentes. Ele levantou e saiu correndo para dentro do elevador.

Fui ao Falcão, que me disse: ‘Mino, você está nervoso, o que é isso? Tenho uma fazenda em Quixeramobim, com redes entre as árvores frondosas, bate uma brisa ótima, água de coco, vai lá!’ Fiquei até de ir em outra oportunidade, mas perguntei como é que tinha sido a história da Veja. Ele falou que era muito simples: Vem aqui o Roberto Civita, o Victor Civita, o diretor responsável, um tal de Edgar, e dizem que você é o culpado. O próprio diretor da Redação em Brasília, o Pompeu de Souza, diz que você é o culpado, então, o que é que me cabe fazer? Pedir sua cabeça, não é não? Então, disse que tinha entendido tudo, passar bem, maravilha, até logo… Sai dali e pedi aos redatores-chefes que entregassem minha carta de demissão.

Fonte: O Povo

 

Uma frase bem feita

A chance de o ex-capitão ser apeado pelos generais já arrepiou os comentaristas, embora significasse o tombo da panela para a brasa.

 

Sua opinião

Anule-se tudo que aconteceu a partir da criação da Lava Jato – Mino Carta – CartaCapital: 17 de junho de 2019

As revelações do Intercept confirmam a nossa cobertura da farsa trágica dos últimos cinco anos: Lula era o alvo

Depois das revelações do Intercept, a conclusão haveria de ser anular tudo que aconteceu a partir da criação da Lava Jato. O projeto golpista visava, com a bênção agradecida do Departamento de Estado, alijar Lula da eleição de 2018, graças a uma tramoia pretensamente jurídica sem paralelos para condená-lo e prendê-lo sem provas. Moro e Dallagnol, lacaios de Washington, cumpriram a tarefa a contento e Jair Bolsonaro elegeu-se com folga maior do que aquela conseguida por Dilma Rousseff em 2014. Assim se deu, o entrecho é claro, o resultado de um golpe inédito perpetrado pelos próprios poderes da República, a começar pelo Judiciário, que permitiu o impeachment e as falcatruas do torquemadazinho de Curitiba. Os guardiões da lei preferiram rasgar a Constituição. Não faltou o aval militar, assegurado pelo general Villas Bôas, então comandante do Exército, ao pressionar o STF a manter a prisão de Lula sem alterar a decisão tomada à última hora pelos supremos togados por ser bastante, na visão a favor da fraude, a condenação em segunda instância.

A lógica no caso é implacável: diante das revelações do site Intercept, de Glenn Greenwald, obviamente de absoluta veracidade, tornam automaticamente nulos todos os atos da farsa trágica, e o derradeiro é a eleição do ex-capitão. A compreensão deste jogo de dominó deveria ser acessível a qualquer brasileiro consciente da cidadania. Estamos, porém, no Brasil medieval da casa-grande e da senzala, onde a minoria faz o que bem entende e o resto é tangido como um rebanho acossado pelos lobos. Penosas e mesmo patéticas as reações de uma boa fatia da mídia nativa, desta vez dividida nas suas avaliações.

O “conjo” de dona Leonor não é de se demitir, como pede o Estadão no editorial de terça-feira 11, tanto mais agora: Bolsonaro na semana o premiou com a Medalha do Mérito Naval, embora o mérito do ministro da Justiça aos olhos presidenciais seja outro. Talvez o ex-capitão homenageie quem iniciou o processo que leva ao naufrágio, daí a metáfora náutica. De todo modo, a condecoração nos dias seguintes à divulgação do Intercept coincide, com encaixe ao rabo de andorinha, manda o ebanista feliz, ao estilo truculento do bolsonarismo, como resposta às reações indignadas da mídia dos países civilizados e democráticos. Uma pergunta assoma espontânea: se temos de procurar culpados, será que a culpa não é do Brasil? Houvesse um pelotão de fuzilamento, nenhuma bala seria perdida.
Só a tomada da Casa-Grande muda o Brasil e recupera o tempo perdido

Outra questão me assalta: há como comparar os golpistas fardados atuais com aqueles de 1964? Outras eram as circunstâncias, que diferem profundamente. Havia entre aqueles fardados golpistas alguns que se ririam da comicidade involuntária de Bolsonaro & filhos, parece-me colher no rosto do general Golbery um sorriso de Gioconda.

Estavam afeitos a um país muito melhor do que o de hoje, o Brasil contava com círculos intelectuais de peso, com pensadores, escritores, artistas reconhecidos mundialmente, com alguns políticos desassombrados, com jornalistas que conheciam a diferença entre as insopitáveis verdades que habitam a cabeça de qualquer um e a verdade factual, conforme a definição de Hannah Arendt. Ainda não havia chegado o tempo desenfreado das notícias falsas, dos celulares e das selfies, do uso político da internet, da progressiva imbecilização geral.

Vários generais da ditadura jamais fariam continência diante da bandeira dos EUA e com fé sincera, conquanto malposta, acreditavam na consigna inicial do golpe: pôr a casa em ordem e, cumprida a missão, devolver o poder aos civis. Na crença, uma nítida prova de ingenuidade: no país da casa-grande e da senzala, o poder sempre retorna às mãos dos senhores da mansão. Foi o que se deu com a chamada redemocratização, como sempre ao sabor das tradicionais hipocrisia e ignorância de marca tipicamente nativa.

O alívio veio com Lula, pelo seu combate à miséria e sua política exterior independente. A quem não interessa esta insólita atuação? À casa-grande e aos EUA, a bem do seu império, como é do conhecimento até do mundo mineral. A Lava Jato é o primeiro motor do golpe que atende às demandas da mansão senhorial e de Tio Sam. E aqui me permito enveredar pelo vitupério. As revelações do Intercept espantam o mundo civilizado, mas o Brasil as engole mansamente, quando não as ignora, com a exceção ao menos dos leitores de CartaCapital, alertados desde quando esta bola saiu dos pés de Sérgio Moro no campinho da República de Curitiba.

Já sabíamos de tudo, a conivência dos poderes da República na execução do golpe de 2016, desfechado para expulsar Lula do páreo presidencial, com o resultado final, conscientes ou não os golpistas do iminente tropeço na figura execrável de Bolsonaro. Tudo se justifica, a casa-grande empenha-se em tempo integral para manter de pé a senzala. A miséria não comove os senhores, tampouco a falta de educação e saúde. Pelos salões medraram os ódios social e de classe, heranças de três séculos e meio de escravidão, de fato até o momento não encerrada. Bolsonaro serve ao jogo, do alto de sua demência presta-se a qualquer serviço sujo.

CartaCapital é a única publicação em papel impresso que nos últimos cinco anos desenrolou o enredo e ganha hoje a confirmação do acerto das suas informações a respeito dos andamentos da peça e dos seus protagonistas. Trata-se da consequência da prática do jornalismo. Pretendia um redator-chefe do New York Times o acompanhamento de um adjetivo, honesto. Penso que a honestidade há de ser intrínseca, própria, insubstituível.

Quanto aos desenvolvimentos da situação, por ora o vaticínio não é recomendável. O problema insolúvel está na natureza de um país digno da Idade Média mais obscura. Culpado é o Brasil, já disse, involuntária a responsabilidade se nos referimos à senzala. O que teimamos em não entender, inclusive a chamada impropriamente esquerda, que o recurso à resignação de quem guarda nos lombos a chibatada do capataz não gerou apenas uma série insuportável de golpes, mas também impediu ao País atingir a contemporaneidade do mundo. Para mudar o Brasil, é preciso tomar a casa-grande.

Deus mercado virou diabo

A teologia do livre mercado dos Chicago Boys

Recentemente vários acadêmicos receberam uma petição assinada por 111 membros da Universidade de Chicago, explicando que “sem qualquer comunicado a sua própria comunidade, [a Universidade] contratou uma firma de Boston, a Ann Beha Architects, para reformar o prédio do Seminário Teológico Chicago, transformando-o no espaço para o Instituto Milton Friedman de Pesquisa em Economia (MFIRE) e levantou uma agressiva campanha de arrecadação de fundos para o controverso instituto”.

Seria difícil encontrar uma metáfora mais adequada do que aquilo que o comunicado à imprensa caracteriza como “conversão do prédio do Seminário num templo do neoliberalismo econômico”. Até o acrônimo MFIRE parece simbolicamente apropriado. O M pode bem servir para Money, na equação do Prof. Friedman MV =PT (Money x Velocity = Price x Transactions). E o setor Fire compreenderia finanças, seguros e investimentos imobiliários – o setor do “almoço grátis” cuja acumulação os monetaristas de Chicago celebram.

Economistas clássicos caracterizaram a renda e o acúmulo de lucros no setor FIRE como “renda não recebida”, liderada pelos ganhos de capital, que John Stuart Mill descreveu como o que os senhores da terra fazem “quando estão dormindo”. Milton Friedman, por outro lado, insistiu que “não existe almoço grátis” – como se a economia não dissesse afinal respeito ao almoço grátis e a como obtê-lo. E a principal maneira de ganhá-lo é desmantelando o papel do governo e vendendo o patrimônio público a crédito.

Como disse ironicamente Charles Baudelaire, o demônio vence quando convence o mundo de que ele não existe. Parafraseando isso podemos dizer que a vitória econômica dos rendimentos do almoço grátis obtém-se na medida em que os reguladores governamentais e os economistas acreditam que seu retorno não existe – e então, não precisam ser taxados, regulados ou subjugados.

Com “livre mercado” os Chicago Boys querem dizer conceder livre trânsito ao setor financeiro – na direção oposta à ideia dos economistas clássicos de libertar os mercados do rentismo e dos juros. Enquanto a religião tradicional buscou estabelecer preceitos de regulação, o Instituto Friedman vai promover a desregulação. Substituir fisicamente a escola de teologia por um “templo do neoliberalismo econômico” é irônico se se considera que, em princípio, aquilo que todas as grandes religiões têm em comum em um ponto ou no outro for a oposição à cobrança de juros. O judaísmo chamou a isso de “começar do zero” (Levítico, 25) e o Cristianismo baniu completamente o juro, citando as leis do Êxodo e do Deuteronômio (Michael Hudson, 2010)

 

A crise do sistema financeiro derruba o dogma da imaculada concepção do livre mercado como única panaceia para o bom andamento da economia

O apocalipse ideológico no Leste Europeu, jamais previsto pelos analistas, fortaleceu a ideia de que fora do capitalismo não há salvação. Agora, a crise do sistema financeiro derruba o dogma da imaculada concepção do livre mercado como única panaceia para o bom andamento da economia. Ainda não é o fim do capitalismo, mas talvez seja a agonia do caráter neoliberal que hipertrofiou o sistema financeiro. Acumular fortunas tornou-se mais importante que produzir bens e serviços. A bolha especulativa inflou e, súbito, estourou. Repete-se, contudo, a velha receita: após privatizar os ganhos, o sistema socializa os prejuízos. Desmorona a cantilena do “menos Estado e mais iniciativa privada”. Na hora da crise, apela-se ao Estado como boia de salvamento na forma de US$ 700 bilhões (5% do PIB dos EUA ou o custo de todo o petróleo consumido em um ano naquele país) a serem injetados para anabolizar o sistema financeiro (Frei Betto, 2008).

O Buteco do Biu e o atual tsunami financeiro

Para compreender o atual tsunami financeiro, existe um texto que está espalhado por aí, em mais de uma versão, e que é bem didático. É o caso do Buteco do Biu, talvez, nas origens, um certo Pendura, Sebastião

Mas tem um porém: ando achando que este texto explica só o começo, porque vivo escutando que o pior ainda virá

Uma das versões diz assim:

O seu Biu tem um bar, na Vila Carrapato, e decide que vai vender cachaça “na caderneta” aos seus leais fregueses, todos bêbados, quase todos desempregados. Porque decide vender a crédito, ele pode aumentar um pouquinho o preço da dose da branquinha (a diferença é o sobrepreço que os pinguços pagam pelo crédito).

O gerente do banco do seu Biu, um ousado administrador formado em curso de emibiêi, decide que as cadernetas das dívidas do bar constitui, afinal, um ativo recebível, e começa a adiantar dinheiro ao estabelecimento tendo o pindura dos pinguços como garantia.

Uns seis zécutivos de bancos, mais adiante, lastreiam os tais recebíveis do banco, e os transformam em CDB, CDO, CCD, UTI, OVNI, SOS ou qualquer outro acrônimo financeiro que ninguém sabe exatamente o que quer dizer.

Esses adicionais instrumentos financeiros alavancam o mercado de capitais e conduzem a que se façam operações estruturadas de derivativos, na BM&F, cujo lastro inicial todo mundo desconhece (as tais cadernetas do seu Biu ).

Esses derivativos estão sendo negociadas como se fossem títulos sérios, com fortes garantias reais, nos mercados de 73 países.

Até que alguém descobre que os bêubo da Vila Carrapato não têm dinheiro para pagar as contas, e o Bar do seu Biu vai à falência. E toda a cadeia sifu.