Eleições 2014: quem ganhou e quem perdeu?

Tão importante quanto dizer quem ganhou e quem perdeu é dizer quem saiu ganhando e quem saiu perdendo. Nem sempre estas coisas coincidem, como se verá.

 

Quem ganhou e quem perdeu na eleição presidencial – Flávio Aguiar: Carta Maior 28/10/2014

Dilma Rousseff – ganhou e saiu ganhando. O sucesso de sua candidatura dependeu muito de seu estoicismo (ao enfrentar os insultos no Itaquerão), da sua firmeza (ao responder de modo duro às acusações de Aécio nos debates), de sua capacidade de se comprometer com a manutenção (salário, empregos) e com a mudança (eventual correção no caso Petrobras) de rumos. Provou e comprovou que tem luz própria e estofo de estadista.

Aécio Neves – perdeu e saiu perdendo. Provou que sua habilidade retórica não o protege de ataques porque não está preparado para isto. Achou que podia ganhar no grito, isto é, só atacando uma pauta negativa, sem se comprometer ou revelar seu verdadeiro programa para o país. Tergiversou. Conseguiu mais votos pelo antipetismo do que por si próprio. Não tem luz própria, e agora está ameaçado em seu arraial. José Serra já afia os caninos e Geraldo Alckmin planta seus chuchus na cerca de São Paulo para aprimorar seu picolé, ambos tendo em vista 2018. A vida de Aécio não será fácil.

Armínio Fraga – perdeu, mas se saiu perdendo é outra história. Cometeu um erro fatal. No debate com Guido Mantega, ao falar das dificuldades do cidadão brasileiro…

Marina Silva – perdeu e saiu perdendo. Cresceu nas pesquisas depois da tragédia de Eduardo Campos e seus companheiros de voo, mas se confundiu com o próprio crescimento. Atirou para todos os lados em busca de votos, rolou e enrolou, disse e desdisse, contradisse e entrou na dança e na contradança, mas o que ficou na lembrança é que quem tem poder sobre ela é o pastor Malafaia. Quem se curva à chantagem de pastor jamais vai chegar à presidência. De quebra, apresentou uma lista de reivindicações a Aécio para apoiá-lo, não viu nenhuma atendida e apoiou assim mesmo. Eu não votaria nela nem pra Associação de Pais e Mestres. Comprometeu a credibilidade de sua futura Rede, que pode virar uma rede para pescar goiabas. É pena. O Brasil precisa de um partido ambientalista forte.

PT – Empate técnico, graças à atuação e à vitória de Dilma Rousseff. Na verdade saiu perdendo. Perdeu cadeiras no Parlamento, mas não só isto. Em alguns momentos, em alguns lugares…

PSDB – Desastre. Perdeu e saiu perdendo. Na mídia internacional, que pode ser conservadora em grande parte mas sempre chama os bois pelo seu nome verdadeiro, e não o de fantasia, o PSDB brasileiro é descrito como “business friendly”, o que deve ser traduzido por “amigo do mercado”…

Geraldo Alckmin – ganhou, mas saiu perdendo. Sua gestão da água em São Paulo foi, é e será um desastre…

Lula – não ganhou porque não concorria. Mas saiu ganhando: continua sendo a principal referência de unidade do PT e seu maior cabo eleitoral…

Fernando Henrique Cardoso – não perdeu, porque não concorreu. Mas saiu perdendo feio, sobretudo por ter perdido várias oportunidades de ficar quieto e não dizer nada. As mais evidentes foram…

Luciana Genro – perdeu, mas saiu ganhando. Os elogios à sua campanha superaram as hostes pssolistas. Deu demonstração de coerência e consistência…

Eduardo Jorge e o Partido Verde – que vergonha! Apoiar o Aécio no segundo turno! Viraram um puxadinho, o biocapitalismo do capitalismo selvagem. Bom, muitas cúpulas do PV aqui na Europa se comportam assim…

Extrema-direita – saiu ganhando. Malafaia chantageou Marina com sucesso. Feliciano e Bolsonaro tiveram votações consagradoras. Levy Felix, o candidato do conduto excretor, triplicou seus votos. O Pastor Everaldo tanto latiu…

PMDB – Empate técnico, o que para ele é vitória. Saiu ganhando. Continua sendo um partido-esponja, que tudo absorve. Parece um polvo, com tentáculos em toda a parte…

PIG e Veja em particular – perderam feio, a ver se saíram perdendo. Puseram todas as suas fichas em derrubar Dilma e o PT desta vez por todas. Não deu certo. Esqueceram de combinar com o povo brasileiro…

O camarote do Itaú no Itaquerão – perdeu, saiu perdendo, deu vexame internacional. Foi se roçar nas ostras, como se diz.

Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa e Sérgio Moro – não perderam, porque não concorriam. Mas saíram perdendo. Gilmar Mendes suspendeu um dos direitos de resposta conseguidos pelo PT… Joaquim Barbosa sumiu, depois de ser o grande herói do linchamento conhecido como processo 470…  Sérgio Moro vai se candidatar ao título de “Juiz Transparência”, tal é a quantidade de vazamentos em suas audiências. Deve ser coisa da National Security Agency, um caso para Snowden e Assange juntos.

O povo brasileiro – ganhou e saiu ganhando. Não precisa explicar.

Leia o texto completo. Onde há pontinhos … há mais.

Quem é Flávio Aguiar? Veja  aqui.

Texto bíblico: um processo ou um produto?

Brennan Breed, escrevendo sobre a história da recepção do texto bíblico, seus problemas e desafios [o que é teoria da recepção? o que é reader-response criticism?], diz no artigo Biblical Reception History: A Dangerous Supplement, publicado, em outubro de 2014, em The Bible and Interpretation:

Os estudiosos da Bíblia com frequência imaginavam o texto bíblico como algo estático, fechado em um contexto original, com uma forma ideal, que o tempo e mãos descuidadas alteraram, e que olhos e ouvidos negligentes entenderam  mal. Assim, uma das tarefas do estudioso da Bíblia foi fixar o texto original e salvá-lo dos acréscimos que sempre ameaçaram submergi-lo ou pervertê-lo.

Para gerações inteiras de estudiosos da Bíblia, a forma padrão de comunicação, em especial com o público leigo, foi a seguinte: “Isto é o que você pensa que a Bíblia diz, mas o texto original realmente diz isso. E aqui está o que você acha que isso significava, mas ele realmente quis dizer isso“. Para muitos, este é um argumento muito convincente. Texto e significado tinham perdido o rumo com o correr do tempo, mas existem estudiosos para colocá-los de volta em seu lugar. No entanto, se é verdade que toda a história textual e interpretativa da Bíblia é uma complementação, uma variação contínua, uma pluriformidade e uma heterarquia, então devemos conceber o texto bíblico como um processo e não um produto.

Leia o artigo.

E confira também o livro do autor: Nomadic Text: A Theory of Biblical Reception History. Bloomington, IN: Indiana University Press, 2014, 320 p. (ebook KIndle)

Diz a editora:
Brennan W. Breed claims that biblical interpretation should focus on the shifting capacities of the text, viewing it as a dynamic process rather than a static product. Rather than seeking to determine the original text and its meaning, Breed proposes that scholars approach the production, transmission, and interpretation of the biblical text as interwoven elements of its overarching reception history. Grounded in the insights of contemporary literary theory, this approach alters the framing questions of interpretation from “What does this text mean?” to “What can this text do?”

Brennan W. Breed is Assistant Professor of Old Testament at Columbia Theological Seminary.

E fica a pergunta: mesmo que a intenção do autor do texto seja algo irrecuperável para o estudioso atual, ainda existe, pelo menos para alguns textos bíblicos, um contexto no qual ele foi criado, um “mundo do texto”? Ou não?

Vejo mais proveito na abordagem socioantropológica