Um blog é uma ferramenta democrática

Estava lendo no blog do Jim West sobre a Conferência de Duke – ver post anterior – quando encontro um assunto que já foi antes debatido algumas vezes por nós: Blogging: To What End? ou seja: Por que Blogar? se pergunta Jim.

Mas a questão foi levantada antes no Hypotyposeis por Stephen C. Carlson no post Academic Blogging: Publication or Service? E continuada por Mark Goodacre em seu NT Blog sob o título Academic Blogging: Publication, Service or Teaching? Repercutida também por Opus Imperfectum em Publishing For Dummies: Blogging as Research/Teaching/Service?

A discussão nestas postagens é toda voltada para o valor acadêmico do ato de blogar e de seus resultados: é esta uma forma de publicação que a academia deveria levar a sério na carreira do professor e pesquisador ou é muito mais um serviço, que, apesar de todo o seu rico conteúdo, não tem e nem deveria ter valor acadêmico?

Eu mantenho a mesma posição de três anos atrás, quando, escolhido como o biblioblogueiro do mês de setembro de 2006 e entrevistado por Jim West no Biblioblogs.com, respondi, entre outras coisas, sobre o que me levou a iniciar um blog e se eu considerava o blogar como um importante instrumento acadêmico [veja texto abaixo].

Embora deva acrescentar, desde então, duas coisas: meus alunos de Bíblia no curso de graduação em Teologia, mesmo com suas limitações na leitura do inglês e no acesso à Internet, apreciam o meu blog e sentem orgulho de ter um professor que escreve um blog. Isso eu vejo em suas atitudes e ouço nas conversas de corredor e nos diálogos em sala de aula. Tanto no CEARP quanto na PUC-Campinas [nesta última, até final de 2006, quando “fui saído” de lá].

Por outro lado, um dos meus colegas de Campinas teria dito em uma das muitas reuniões nas quais se tecia, com persistência, a trama que levaria ao meu “desligamento” da Universidade depois de 27 anos de docência, que o meu blog poderia até ser apreciado por pessoas de várias partes do mundo – até mesmo nos Estados Unidos, teria dito! -, mas de que nada acrescentava à academia.

Como deveria entender esta fala? Realista, pragmática, utilitarista, oportunista, invejosa, zelotípica, conspiratória, cínica?

What we do in life echoes in eternity… O que fazemos em vida ecoa na eternidade (Gladiator – O Gladiador).

Ora, considerada verídica tal postura deste colega, será o caso de julgar legítima a discussão dos colegas nas postagens de ontem e de hoje, 25 e 26 de maio de 2009.

Por fim, quero dizer que, apesar das muitas satisfações que o meu blog tem me proporcionado – senão por outra razão, pelo simples fato de que gosto de escrever, seja ou não lido – o que às vezes me deixa “com uma ruga na testa” é que a comunidade biblioblogueira, falando predominantemente a língua inglesa, ignora, em muitos casos, as outras línguas, e, sendo uma criação estadunidense… bem, que espaço ocupam os “outros”?

Cito abaixo os dois trechos da mencionada entrevista de 2006 a Jim West sobre o ato de blogar:

JW (Jim West): As a scholar of the Bible, what drew you to “blogging” about it?

AS (Airton Silva): Quando comecei a ler sistematicamente os biblioblogs de Mark Goodacre, James Davila e o seu, foi que surgiu a idéia de começar o meu próprio blog. Como tenho uma página dedicada a estudos acadêmicos de Bíblia desde 1999, percebi que um biblioblog poderia ser a solução para algumas coisas que estava querendo fazer com mais agilidade. Como, por exemplo, ter um espaço mais flexível para comentar a relação da Bíblia com o mundo atual, acompanhar o debate acadêmico sobre a “História de Israel”, noticiar descobertas arqueológicas importantes e/ou polêmicas, transmitir em português para meus visitantes – que nem sempre lêem inglês ou alemão – os temas mais significativos do debate bíblico atual, estabelecer contato com outros biblioblogueiros, comentar os atuais conflitos do Oriente Médio.

Assim, quando acompanhei, através dos biblioblogs, o debate de 2005 na SBL CARG – The Pleasures, Pains and Prospects for Biblioblogging — vi que era chegada a hora: o Observatório Bíblico foi criado no dia 07/12/2005 e neste dia escrevi: “Este biblioblog é uma ferramenta jornalística associada ao meu site, do qual faz parte. Quer oferecer ao visitante comentários recentes sobre as interpretações arqueológicas, históricas e exegéticas relevantes para o estudo da Bíblia (…) Para ficar sabendo o que está acontecendo no mundo dos estudos bíblicos, venha visitar, com freqüência, o Observatório Bíblico”.

JW: Do you think that blogging will continue to be an important instrument for scholarly work?

AS: Esta não é um pergunta fácil de ser respondida, pois implica em apostar em desconhecido futuro. Mas, em princípio, minha resposta é positiva. E cheia de esperanças. Acredito que este seja um espaço privilegiado para um debate aberto e franco sobre o trabalho acadêmico, desde que não seja um substitutivo do mesmo.

Percebo, contudo, vários riscos no blogar: pode tornar-se uma espécie de vício para quem gosta de escrever, tomando precioso tempo que poderia ser dedicado à leitura de livros e artigos e à pesquisa exegética, já que um computador ligado o tempo todo na Internet é uma séria ameaça a muitas outras atividades, porque é, de fato, muito envolvente; pode substituir as páginas tradicionais na web, coisa que eu não gostaria de fazer com a minha, porque creio que aquele é um espaço que possibilita maior profundidade acadêmica; de repente, todos nós podemos estar muito ocupados escrevendo sobre as mesmas coisas, sem acrescentar muita coisa ao conhecimento humano; podemos ficar envolvidos na leitura de feeds por várias horas diárias… e há mais riscos.

Mesmo assim, acredito que, sendo criteriosos, temos uma formidável ferramenta ao nosso alcance, coisa jamais sonhada quando eu era um estudante em Roma e lutava com uma máquina de escrever manual para fazer meus trabalhos que só eram acessíveis a dois ou três amigos. Um blog é uma ferramenta democrática.

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