No meu entender, a sacralização do cotidiano, antigo ou atual, sempre encontrou na Bíblia uma ferramenta eficaz, enquanto esta possibilita a leitura do real como subjetividade, espaço no qual a ação humana é reduzida à vivência intensa da emoção e do entusiasmo, constituindo a realidade total, até acabar assumindo o rótulo de história objetiva, momento em que perde seu fervor querigmático e se acomoda.
O mundo bíblico e o mundo atual se entrelaçam de tal maneira que o ressentimento pode ser legitimado, desde que seja lido como indignação moral, ao mesmo tempo em que vivências primitivas são literalmente recriadas, apresentando-se como panacéias para os malefícios da racionalidade ocidental.
Esse mecanismo social permite ao intelectual, entre outras coisas, desobrigar-se de um compromisso social efetivo, reduzindo os problemas do mundo a problemas morais…
Dia: 12 de março de 2007
Ribla: a África no imaginário israelita e cristão
O mais recente fascículo da RIBLA, o 54, que é o segundo de 2006, tem como tema as Raízes Afro-asiáticas no Mundo Bíblico. A revista traz 8 artigos e 3 resenhas em suas 136 páginas. Chegou na semana passada.
No editorial deste número da Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana, escreve Maricel Mena López, na p. 5, que
O presente número visa ampliar o horizonte de compreensão do Oriente Médio Antigo, a partir da inclusão de povos de origem afro-asiática (Egito, Cuch ou Etiópia, Sabá) na constituição da tradição judaico-cristã. Deste modo queremos resgatar os textos bíblicos da sua unilateral interpretação ocidental, que negligenciou a participação ativa da África no imaginário israelita e cristão. Partimos (…) da constatação de que há uma participação ativa e constante do mundo africano nas experiências antropológicas do Israel bíblico e pós-bíblico. Quando se vê a história do povo de Israel e de Judá a partir de óticas ocidentais, deixa-se de considerar a África como uma das perspectivas culturais e religiosas para a compreensão da Palestina.
Tal desafio lançado pelas autoras e autores de RIBLA, converte-se também em desafio para o leitor: verificar se os artigos conseguem, de fato, a quebra de paradigmas nos estudos bíblico-exegéticos que vigorou durante muito tempo em nome da ‘cientificidade acadêmica’ supostamente neutra que priorizou textos e culturas do mundo semita ocidental (Maricel Mena López, Editorial, p. 5).
Neste número assinam os artigos Nancy Cardoso Pereira (Porto Alegre, Brasil), Maricel Mena López (Bogotá, Colômbia), María Cristina Ventura Campusano (San José, Costa Rica), Sandro Gallazzi (Macapá, Brasil), Clemildo Anacleto da Silva (Porto Alegre, Brasil), José Luiz Izidoro (Iguape, Brasil) e Diana Rocco Tedesco (Buenos Aires, Argentina). As 3 resenhas foram escritas por Jorge Pixley, Maricel Mena López e Diego Agudelo.