Susin: III Fórum Mundial de Teologia e Libertação

Fórum Mundial de Teologia e Libertação e novos ‘lugares teológicos’

Em preparação ao Fórum Mundial de Teologia e Libertação, a ser realizado em Belém, PA, [de 21 a 25 de janeiro de 2009] iniciamos a publicação de uma série de artigos e entrevistas sobre o tema. Hoje publicamos o artigo de Luiz Carlos Susin, frei capuchinho, professor de Teologia da PUC-RS.

 

Para os primeiros que pensaram um Fórum Mundial de Teologia soava desafiante o slogan cunhado nas primeiras edições do Fórum Social Mundial: Outro Mundo é Possível. Em termos teológicos, trata-se de um desafio de ordem “escatológica”, que tem ressonâncias de esperança no Reino de Deus. Mas soaria como utópico castelo de cartas do desejo e da imaginação se não se pudesse ter algum lugar de seus sinais e alguém dedicado a esses sinais. Seriam os movimentos e organizações sociais presentes no Fórum Social Mundial, com os relatos de suas práticas, um “sinal” de outro mundo possível? Haveria algo de messiânico nesses sujeitos históricos frágeis, mas em muitos que se propunham a alternativas ao Fórum Econômico Mundial de Davos?

Essas perguntas começaram a ter caráter de afirmações quando uma pesquisa entre os participantes da terceira edição do Fórum Social Mundial revelou que em torno de 60% dos participantes portavam motivações de ordem espiritual, inclusive com raízes em tradições religiosas, para se dedicarem aos movimentos e organizações sociais. A partir de então o Fórum Social Mundial contou com um novo espaço, o de Cosmovisões e Espiritualidades.

Evidentemente, um Fórum é um tempo curto de encontros, de trocas, de debates. Não é ele mesmo um lugar para se deter. Mas é revelador, agregador e inspirador de muita energia e generosidade. Reflete as lutas por justiça, as aspirações de paz e convivência plural sem indiferença, enfim tem um sabor de “revelação”. De Deus mesmo todos os grandes místicos e teólogos nos avisaram que só se podem fazer afirmações indiretas, mediadas pela precariedade histórica de gente de carne e osso. O “lugar teológico” é o espaço indicador de Deus na precariedade humana. João, por exemplo, diz na forma de refrão: “Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele”. Ora, a experiência amorosa é, portanto, um “lugar teológico”. Quanto mais maduro é o amor, maior a experiência de Deus. O que dizer então desta generosidade sem exigência de reciprocidade, a fundo perdido, por um mundo justo e amoroso?

Isso nos coloca dentro da discussão atual sobre o método da Teologia da Libertação e seus lugares teológicos, de modo especial o “pobre”, um lugar evangelicamente privilegiado pela pureza do amor irrestrito e irrecíproco de Deus. Tradicionalmente, os lugares teológicos preferenciais foram a Escritura, portanto os textos sagrados e canônicos, e o Magistério eclesial, da hierarquia e dos grandes teólogos. Ora, o texto e a instituição, inclusive a instituição da doutrina, do dogma, fazem parte de um mundo chamado “Igreja” que teve plausibilidade nos séculos de cristandade, quando sociedade e Igreja coincidiam. Hoje não coincidem mais, e ao ficar com os lugares teológicos tradicionais, encurtamos o lugar de revelação divina e de redenção humana. Por isso, cresceu a consciência de que os lugares antes considerados secundários, como a história tecida de acontecimentos humanos, a sabedoria dos povos, enraizada em diferentes tradições, inclusive religiosas, tornam-se mais importantes como “lugar teológico”.

E assim estamos em pleno pluralismo: cultural, religioso, teológico. Um grande desafio é a conjugação da identidade com o pluralismo. Por isso, mesmo no interior da Teologia da Libertação, alguns teólogos avançam em direção ao pluralismo de forma decidida, enquanto outros chamam fortemente a atenção para o problema de identidade. Entre os últimos, no Brasil, contamos com Clodovis Boff. No entanto, “o círculo é a festa do pensamento” (Heidegger), e a circularidade pode evitar tanto o relativismo no interior do pluralismo como o fundamentalismo no interior da afirmação de identidade. De qualquer forma, é certo que um Fórum de diálogo e de debate é o lugar mais sadio para ensaiar a integração dos que logicamente parecem opostos.

Fonte: IHU On-Line: 06/01/2009

Comblin fala das acusações de Clodovis à TdL

As estranhas acusações de Clodovis Boff

José Comblin

Como vários amigos, fiquei estupefato quando li as acusações feitas por Clodovis Boff à teologia que ele chama de teologia de libertação. Não existe nenhuma instituição chamada teologia da libertação de tal modo que muitos podem perguntar-se se são da teologia da libertação ou não. A acusação feita à chamada teologia da libertação é totalmente indefinida. Clodovis não cita nomes e não dá nenhuma referência, nenhuma a obras de alguns autores que seriam incriminados. Não cita as páginas em que estão os erros. A acusação é a seguinte…

Leia o texto completo na Adital – dezembro de 2008

Leia Mais:
Teólogos em debate com Clodovis Boff
Quem é Comblin?

Falas de Moltmann no Brasil

:: Moltmann é doutor honoris causa pela UMESP

A Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) concedeu o título de Doutor Honoris Causa ao teólogo reformado alemão Jürgen Moltmann. A cerimônia foi presidida pelo reitor, Marcio de Moraes, e ocorreu no Salão Nobre, ontem à noite.

Fonte: ALC – Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação: 31 de outubro de 2008

:: Teólogo reformado critica fundamentalistas
O teólogo reformado alemão Jürgen Moltmann criticou os fundamentalistas que dizem testemunhar o evangelho, mas não se comprometem com a vida. A afirmação foi feita em entrevista concedida na Faculdade de Teologia da Igreja Metodista, em São Bernardo do Campo, região metropolitana da capital paulista, onde se realiza a Semana de Estudos da Religião.

Fonte: ALC – Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação: 30 de outubro de 2008.

:: Por uma antropologia e uma cristologia cósmicas
Para o renomado teólogo alemão Jürgen Moltmann, a teologia cristã precisa partir de uma cultura da vida e resistir ao barbarismo da matança. Para ele, “o mais importante resultado da neurobiologia moderna é a libertação da biogenética do feitiço ideológico do darwinismo social. A noção de luta pela existência e do direito do mais forte está biologicamente errada”. O teólogo acredita que o mero “prolongamento da vida” não é objetivo relevante em termos humanos. “O que importa é a humanidade da vida vivida”, diz ele.

:: Moltmann, o maior teólogo cristão vivo. Entrevista especial com Josias da Costa Junior
Quem participou do encontro com Moltmann e pôde conversar com ele [em sua recente viagem ao Brasil], entre outros, foi o teólogo e professor Josias da Costa Junior, do Centro Universitário Metodista Bennett, Rio de Janeiro. Especialista em Moltmann, Josias concedeu a entrevista que segue à IHU On-Line, por e-mail. Segundo ele, “a guerra e o pós-guerra, para Moltmann, foram oportunidades de se colocar seriamente a questão sobre Deus, que até então não o tocava. Nos campos de prisioneiros, experimentou o colapso de suas certezas, e a partir desse colapso encontrou uma nova esperança na fé cristã”, afirma Josias. Ele lembra que, para Moltmann, a pergunta era: “Como não falar de Deus depois de Auschwitz? Naquele contexto, ele conheceu Jesus abandonado e clamando por Deus, e percebeu que seria entendido por ele. Um Deus que conhece o sofrimento pode entender quem sofre”. E conclui enfatizando que “o pensamento teológico de Jürgen Moltmann é importante, entre outros motivos, por causa da abrangência temática (política, ecológica, étnica, gênero, ética etc.), por ser uma teologia que tem preocupação com a vida integral (humana e não humana) e principalmente por fazer teologia não apenas com a razão, mas também com o coração, com a alma”.

Etica Mundial abre escritório no Brasil

“A Fundação Ética Mundial está chegando na hora certa ao Brasil”

Moisés Sbardelotto

 

O vice-presidente da Fundação Ética Mundial internacional, Karl-Josef Kuschel, congratula a inauguração do primeiro escritório da fundação no Brasil, em parceria com o IHU

 

Quando, na noite da próxima quarta-feira, 29, o Escritório da Fundação Ética Mundial no Brasil for oficialmente inaugurado, a Fundação internacional, com sede na Alemanha, terá conquistado, pelo menos, dois grandes objetivos: instituir seu primeiro escritório no mundo de língua portuguesa e, acima de tudo, na maior nação de solo latino-americano. Essa é a opinião do teólogo e vice-presidente da Fundação, Prof. Dr. Karl-Josef Kuschel, em entrevista concedida por e-mail para a IHU On-Line.

Essa conquista ocorre graças à parceria entre o Instituto Humanitas Unisinos (IHU), a Fundação Ética Mundial internacional (Stiftung Weltethos, no alemão) e o Centro de Cooperação Internacional Brasil-Alemanha da Universidade Federal do Paraná (CCIBA-UFPR). O novo projeto, que fará parte do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, irá colaborar com a difusão da idéia de uma “ética mundial”, desenvolvida, primeiramente, na obra Projeto de ética mundial. Uma moral ecumênica em vista da sobrevivência humana (São Paulo: Paulinas, 1992), do teólogo suíço Hans Küng, um dos mais renomados professores universitários da cena intelectual alemã e atual presidente da Fundação.

Já tendo ultrapassado fronteiras e mares, a Fundação chegou a diversos países como Suíça, República Tcheca, Holanda, na Áustria, México, Colômbia e agora o Brasil. “Ela não quer dirigir-se apenas a pessoas religiosas, mas também a não-religiosas e seculares”, afirma Kuschel. Segundo ele, “sobre valores fundamentais, tanto pessoas crentes como não-crentes podem entender-se e cooperar para o bem da sociedade”. E afirma: “Neste sentido, em face do novo pluralismo no Brasil, a instituição da Fundação está chegando na hora certa”, também para dar orientação a “uma nova geração de pessoas de formação acadêmica, jovens, homens e mulheres”.

Karl-Josef Kuschel é teólogo e vice-presidente da Fundação Ética Mundial, atividade integrada à de seu antigo mestre e atual interlocutor, Hans Küng, de quem havia sido assistente científico por duas décadas, até 1989. Titular da cátedra de Teologia da Cultura e do Diálogo Inter-Religioso na Faculdade de Teologia Católica da Universidade de Tübingen, Alemanha, Kuschel é internacionalmente reconhecido na área do diálogo inter-religioso entre judeus, cristãos e muçulmanos e na relação entre teologia e literatura. Doutor honoris causa pela Universidade de Lund, na Suécia, é autor de mais de 40 livros, dentre os quais Os escritores e as escrituras (São Paulo: Loyola, 1999), Discordia en la casa de Abrahan. Lo que separa y lo que une a judíos, cristianos e musulmanes (Navarra: Verbo Divino, 1996) e Juden, Christen, Muslime. Herkunft und Zukunft (Düsseldorf: Patmos, 2007).

Kuschel também é autor de dois artigos publicados nos Cadernos Teologia Pública do Instituto Humanitas Unisinos – IHU intitulados Bento XVI e Hans Küng: contexto e perspectivas do encontro em Castel Gandolfo (n° 21, de 2006) e Fundamentação atual dos direitos humanos entre judeus, cristãos e muçulmanos: análises comparativas entre as religiões e problemas (n° 28, de 2007).

 

A entrevista

IHU On-Line – Qual a importância do novo escritório da Fundação Ética Mundial no Brasil?

Karl-Josef Kuschel – O significado nem pode ser apreciado com suficientes enaltecimentos. Até agora, só houve escritórios da Fundação Ética Mundial no âmbito europeu e no de língua espanhola. Por exemplo, na Alemanha e na Suíça, bem como no México e na Colômbia. Agora foi possível instituir também uma Fundação no mundo de língua portuguesa e acima de tudo na maior nação de solo latino-americano. Isso merece o máximo de consideração. Os amigos brasileiros merecem todo o apoio.

IHU On-Line – Este será o primeiro escritório no Brasil, considerado o “país mais católico do mundo”, com enormes diferenças econômicas, religiosas e sociais. Qual será a contribuição da Fundação para o debate ético entre as religiões e a sociedade brasileira?

Karl-Josef Kuschel – Você tem razão. O Brasil é um país profundamente marcado pelo catolicismo. Porém, ao mesmo tempo também uma nação ideológica e religiosamente plural, como muitos ainda acreditam na Europa. Desde o século XIX, há uma forte participação de secularismo e de laicismo, principalmente entre as elites cultas do país. Desde fins do século XX, igrejas carismáticas e movimentos de origem protestante conquistaram sempre mais adeptos. Ao mesmo tempo, a sociedade sofre sob fortes tensões sociais e econômicas. Nesta situação, apoiada em seu documento básico, a “Declaração sobre Ética Universal” do Parlamento das Religiões Mundiais de 1993, a Fundação pode dar impulsos para um discurso social baseado na ética. Porque o Projeto de Ética Mundial de modo expresso não quer apenas dirigir-se a pessoas religiosas, mas também a não-religiosas e seculares. Sobre valores fundamentais, tanto pessoas crentes como não-crentes podem entender-se e cooperar para o bem da sociedade. Neste sentido, em face ao novo pluralismo no Brasil, a instituição da Fundação está chegando na hora certa.

IHU On-Line – Quais são os principais desafios no Brasil com os quais a Fundação pode ajudar a responder com seus projetos e atividades?

Karl-Josef Kuschel – O grande desafio da Fundação Ética Mundial Brasil consistirá, através da formação e educação, em criar uma nova consciência no sentido de que vivemos num mundo não só econômica e ecologicamente, mas também ecumênica e inter-religiosamente amalgamado. As religiões mundiais compartilham valores comuns. Nenhuma religião tem pretensão de exclusividade. Esta ação formativa e educadora não se restringe às elites acadêmicas. Ela deve começar bem embaixo, na base das comunidades e das escolas. A Fundação Ética Mundial Alemanha realizou aqui uma grande atividade prévia. Foi elaborado um grande manual, “Ética mundial na escola”, com o qual professoras e professores podem transpor a temática da ética mundial a todos os tipos e níveis escolares. Será uma importante tarefa dos amigos brasileiros transferir esse manual para as condições e circunstâncias brasileiras. Cada professora e cada professor da nação devem saber que no tema da Ética Mundial não estão sozinhos e que podem receber introduções e materiais da Fundação em São Leopoldo.

IHU On-Line – Como pode a Fundação colaborar no debate ecumênico e inter-religioso no Brasil, de modo a se criar uma melhor relação entre nossas religiões?

Karl-Josef Kuschel – O Projeto de Ética Mundial, desde o começo, não foi um projeto confessional, mas ecumênico. Os valores, que são tornados conscientes na explicação sobre a ética mundial, são compartilhados por todos os cristãos e também por não-cristãos. A era do confessionalismo passou, mesmo que alguns desejem reinstaurá-la. Hoje, os cristãos devem dar respostas conjuntamente aos desafios da época. O papa Bento XVI reconheceu isso explicitamente. Em setembro de 2005, poucos meses após sua eleição ao papado, ele recebeu o professor Hans Küng, que ele também conhece pessoalmente muito bem desde períodos comuns no Concílio e na Universidade de Tübingen e que entrementes se tornara Presidente da Fundação Ética Mundial Alemanha/Suíça, para uma longa conversa em Castel Gandolfo. Num comunicado por ele próprio elaborado ele descreve o Projeto de Ética Mundial com as seguintes palavras: “O professor Küng constatou que no ‘Projeto de Ética Mundial’ de nenhum modo se trata de uma construção intelectual abstrata. Antes são trazidos à luz os valores morais, nos quais as grandes religiões do mundo convergem apesar de todas as diferenças e que, a partir de sua convincente significância também podem apresentar-se à razão secular como padrões válidos”. O papa apreciou positivamente o esforço do professor Küng de, “no diálogo das religiões como também no encontro com a razão secular, contribuir para um reconhecimento renovado dos valores morais essenciais da humanidade”.

IHU On-Line – O que a Fundação internacional espera do debate ético no Brasil, por meio de sua presença na Unisinos e na comunidade acadêmica?

Karl-Josef Kuschel – A Fundação Brasil tem agora a grande chance de incentivar no Brasil novos discursos em questões éticas – partindo das elites acadêmicas, com o olhar nos desafios que provêm através das Ciências Naturais, da Técnica, Economia, Ecologia. Esses discursos podem, agora, receber nova força com base nos valores do Projeto de Ética Mundial. É preciso conseguir conquistar pensadores brasileiros que saibam conectar teoria e prática para a situação específica no Brasil. Pesquisa científica básica e discursos públicos se interconectam. O Brasil é uma nação “jovem”. Uma nova geração de pessoas de formação acadêmica, jovens homens e mulheres buscam orientação. Dar-lhes esta orientação é um grande desafio à Fundação Ética Mundial Brasil. Nós, da Fundação Ética Mundial Alemanha apoiaremos nossos amigos brasileiros dentro de nossas forças.

Sínodo dos Bispos – Synod of Bishops in Rome

Sinodo dei Vescovi – Bollettino – Sala de Imprensa da Santa Sé

O Sínodo dos Bispos foi instituído por Paulo VI com o Motu proprio “Apostolica sollicitudo” de 15 de setembro de 1965. Na Oração do Angelus Domini de domingo 22 de setembro de 1974, o próprio Paulo VI deu a definição do Sínodo dos Bispos: “É uma instituição eclesiástica, que nós, interrogando os sinais dos tempos, e ainda mais procurando interpretar em profundidade os desígnios divinos e a constituição da Igreja católica, estabelecemos após o Concílio Vaticano II, para favorecer a união e a colaboração dos Bispos de todo o mundo com essa Sé Apostólica, através de um estudo comum das condições da Igreja e a solução concorde das questões relativas à sua missão. Não é um Concilio, não é um Parlamento, mas um Sínodo de particular natureza”.

XII ASSEMBLEIA GERAL ORDINÁRIA (5-26 OUTUBRO 2008)
“A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja”

 

Livro digital com os textos da SOTER 2008

21º Congresso Anual da Sociedade de Teologia e Ciências da Religião – SOTER
“O presente livro vem a público no formato digital (e-book) e consiste no mais recente fruto desse trabalho a muitas mãos de cientistas sociais e intelectuais teologicamente gabaritados. Ele recolhe as contribuições teóricas que tornaram possível o 21º Congresso Anual da Sociedade de Teologia e Ciências da Religião (SOTER), sediado em Belo Horizonte de 7 a 10 de Julho, cujo tema foi Sustentabilidade da Vida e Espiritualidade. Estes textos tinham ficado de fora do primeiro volume, que saiu em formato de livro impresso poucas semanas antes do evento. Nosso objetivo foi reunir pesquisadores que fornecessem dados e categorias de análise para, num debate interdisciplinar, do ponto de vista teológico e das ciências sociais da religião, repropor de forma ampla a questão da sustentabilidade integral da vida no planeta e suas implicações nas culturas e religiões de nossos povos. Um tema grave e urgente que foi abordado de maneira ecológica e plural, acolhendo contribuições do âmbito das religiões, da política, das ciências da vida e da saúde, numa discussão atenta à complexidade que o assunto comporta. Apenas para que o leitor se localize, informamos a seguir os textos que já forampublicados na versão impressa do livro da Soter de 2008 (…) Esse rico material agora é completado, na presente edição digital (e-book) pelas Mesas de Estudo oferecidas pelas Universidades e demais Programas de Pós-graduação convidados, com temas que gravitaram em torno da temática geral do Congresso. A organização dessas mesas coube à PUC-SP(com apoio da UCG), PUC-Campinas, PUCRS, PUC-Minas, PUC-Rio, ISTA e FAJE. Também estão disponíveis neste livro as comunicações científicas apresentadas nos respectivos Grupos de Trabalho (GTs) organizados para o Congresso. Foram eles: GT Ecologia, trabalho e economia sócio-solidária; GT Religiões, Ecofeminismo e sustentabilidade; GT Ensino Religioso; GT Filosofia da Religião; GT Ecologia, Pastoral e Sociedade; GT Teologia e Sociedade; GT Protestantismo ontem e hoje; e GT Religiões afro-brasileiras e Teologia Negra”(Trecho da Apresentação do livro, feita por Afonso Maria Ligorio Soares, Presidente da SOTER) .

Faça o download do livro, publicado pelas Paulinas, que está em formato pdf e é gratuito:

SOTER (org.) 21º Congresso Anual da Sociedade de Teologia e Ciências da Religião – SOTER. Edição digital – ebook. São Paulo: Paulinas, 2008, 541 p. – ISBN 9788535623031.

 

Agradeço à Prof. Cláudia Andréa Prata Ferreira, que deu a notícia em seu blog Estudos Bíblicos.

A conservadora teologia da prosperidade

Doutrina da prosperidade é conservadora, diz IECLBA

A doutrina da prosperidade, proclamada por igrejas neopentecostais, supervaloriza o cumprimento do dízimo, faz da bênção um direito do crente, exalta de modo indevido a prosperidade material, é individualista, não-profética e politicamente conservadora.

Ela “não procura ver as raízes estruturais da pobreza e do desemprego, muito menos os interesses gananciosos por detrás da concentração de renda”, aponta pronunciamento da presidência da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) a respeito da doutrina da prosperidade.

O documento admite que a prosperidade na Bíblia é uma promessa divina, externada de diversas maneiras e em diferentes épocas da vida do povo de Deus. Essa promessa não se limita, contudo, à prosperidade material, abrange todas as esferas da vida, também a dimensão espiritual.

A Bíblia dá conta da existência de pessoas prósperas, mas cuja abundância não provém do temor e da obediência a Deus. Trata-se, informa o documento da IECLB, da prosperidade dos perversos e dos ímpios, que vem associada, muitas vezes, à violência e opressão.

Assim, há limites para a prosperidade material. O limite está dado “quando não serve mais às necessidades reais, mas, em função do acúmulo, cria sempre novas e diferentes ‘necessidades’ adicionais”.

Textos bíblicos confirmam dois importantes princípios. O primeiro, que a natureza última da prosperidade é coletiva. “Deus a deseja para todo o seu povo, mesmo que (Ele) seja sensível a petições individuais”. O segundo, que ela leva à prática do bem. “A partilha dos bens, a sua distribuição mais eqüitativa, é a finalidade última das bênçãos advindas da prosperidade material”, afirma o documento da IECLB.

A doutrina da prosperidade entende que todas as pessoas crentes devem e podem prosperar, desde que “se tornem plenamente cientes dos seus direitos de prosperidade, assegurados pelo próprio Deus em sua Palavra”, “saibam exigir e reivindicar junto a Deus a validade e o cumprimento desses direitos ‘em nome de Jesus’, isso porque ‘direito não reclamado é direito não existente’”.

Tal compreensão contraria frontalmente a justificação por graça e ignora as diferenças entre Deus, Criador, e os seres humanos, criaturas. Só a Deus cabe, em última análise, o governo do mundo. “Também não cabe a uma criatura tirar de Deus a liberdade para decidir a hora e o lugar para derramar as suas bênçãos”, sustenta o documento.

O crente também não pode vacilar do cumprimento da promessa de Deus e deve estar liberto de influências ou possessões demoníacas. Na análise da IECLB, a doutrina da prosperidade combate o mal da pobreza apelando “para uma mágica transformadora de palavras ditas com determinação, ao invés de se empenhar pela correção de estruturas de injustiça e das leis que a facultam”.

O documento foi preparado pelo professor Uwe Wegner, da Escola Superior de Teologia (EST), e assumido pelo pastor presidente da IECLB, Walter Altmann. O parágrafo final do documento alerta:

– Não devemos permitir que os interesses econômico-financeiros que hoje determinam o processo de globalização sujeitem também a nossa fé a uma visão estreita de prosperidade individual e material.

Fonte: ALC – 12 de setembro de 2008

Libânio fala sobre Teologia e Igreja na atualidade

Leia a entrevista do teólogo João Batista Libânio à IHU On-Line, publicada hoje, 16/08/2008.

Libânio fala sobre vários temas atuais da Teologia e da Igreja.

‘A Teologia não se dá mal com o discurso não metafísico, por isso ela pode falar muito bem na pós-modernidade’. Entrevista especial com João Batista Libânio

SOTER rejeita Projetos para Teólogos

Nota Pública contra Projetos em tramitação na Câmara e no Senado

A SOTER, Sociedade Civil fundada em 1985, que congrega hoje 550 associados de diversas regiões do Brasil, em sua grande maioria profissionais inseridos em Instituições de Ensino Superior e Programas de Pós-graduação reconhecidos pela CAPES/MEC, vem a público posicionar-se em relação aos projetos de lei PLS 114/2005 e PLS 2407/07 em tramitação no Senado Federal e na Câmara dos Deputados.

1. Os dois projetos ferem frontalmente a liberdade religiosa e o princípio constitucional de separação Igreja e Estado; Cabe às diferentes tradições religiosas e não ao Estado definir quem é em cada uma delas Teólogo e Teóloga. A regulamentação da profissão transferiria ao Estado ou a uma autarquia federal o poder de definir quem é e quem pode exercer essa profissão e ministério.
2. Por outro lado, o reconhecimento civil dos diplomas de teologia já em vigor e que tem sido apoiado por nossa Sociedade dá suficiente espaço à liberdade religiosa, sendo uma opção possível não impositiva que oferece suficientes garantias legais aos seus portadores.
3. O reconhecimento civil do diploma não implica necessariamente regulamentação da profissão. Inúmeras profissões têm diplomas reconhecidos e não estão regulamentadas (filósofos, sociólogos, historiadores, físicos, matemáticos, etc).

Por essas razões, julgamos os dois projetos de Lei não apenas inconvenientes, mas nocivos aos profissionais de teologia. Também aproveitamos a oportunidade para declarar que a Diretoria da Soter e seus 550 associados não apoiam nem reconhecem a organização que vem sendo chamada de “Conselho Federal de Teólogos”. Tal “Conselho” não tem respaldo de nossa entidade nem das principais Universidades e Programas de Pós-graduação em Teologia do país.

A Carta aprovada na Assembleia Ordinária da SOTER, do dia 9 de julho de 2008, segue assinada pela atual Diretoria e seus ex-Presidentes.

Fonte: SOTER – Sociedade de Teologia e Ciências da Religião: 17/07/2008

Entrevista: Gustavo Gutiérrez, um dos pais da TdL

Muitos teólogos ainda pensam a Teologia como uma espécie de metafísica religiosa… Entretanto, a Teologia deveria ser uma reflexão crítica sobre a práxis à luz da fé…

La teología como carta de amor: Entrevista a Gustavo Gutiérrez

Pocos son los creadores de una ruptura epistemológica. En el campo de la filosofía occidental moderna fueron creadores Descartes, Kant, Hegel, Marx, Heidegger.

En teología destacaron Tomás de Aquino, Lutero, Bultmann, Rahner. Gustavo Gutiérrez abrió un camino nuevo y prometedor para el pensamiento teológico, descubrió una nueva manera de hacer teología’. Son palabras certeras del teólogo Leonardo Boff.

La teología en América Latina y el Caribe se caracterizaba por repetir o sintetizar pensamientos foráneos. Gutiérrez crea a finales de los años sesenta un método teológico desde y para la América Latina pobre y oprimida. Dio a esta reflexión de la fe desde el reverso de la historia el nombre de teología de la liberación.

Su radio de proyección ha sido verdaderamente impresionante: desde la teología negra, india, asiática, feminista, ecológica y de las religiones hasta la teología judía y palestina de la liberación. Gustavo es el primer latinoamericano en situarse de tú a tú entre los grandes creadores dentro de la historia de la teología.

El pasado 28 de mayo, la Universidad Central de Bayamón que dirigen los Padres Dominicos se unió a una pléyade de reconocimientos internacionales, entre ellos el prestigioso Premio Príncipe de Asturias, otorgándole un Doctorado Honoris Causa. El padre Gustavo Gutiérrez llegó así por primera vez a Puerto Rico en la antesala de sus ochenta años de vida y del cuarenta aniversario del emblemático documento eclesial latinoamericano, Medellín.

—¿Cuándo comienza a asumir, como punto de partida de la teología, la realidad de la violencia y de la pobreza en Latinoamérica y el Caribe?

—Comencé a trabajar en marzo del 64. Hubo una reunión convocada por Iván Illich. Lo conocí cuando estaba todavía en Puerto Rico en el año 60. Fue Iván quien citó a una reunión muy informal en Petrópolis para que dijéramos cómo veíamos el trabajo de la teología en América Latina.

¿Y cuál fue su aporte?

—Hablé de teología como una reflexión sobre la pastoral y sobre la
vida cristiana. Eso que formulé más tarde como reflexión crítica sobre la praxis a la luz de la fe.

—¿Lo primero que surge es el establecimiento de un método que parte de la vida real para iluminarla a la luz de la Palabra y abrir caminos concretos de liberación?

—Así es. Yo me pasé prácticamente todos mis estudios de teología sumamente preocupado en la cuestión del método. De ahí la frase: ’nuestra metodología es nuestra espiritualidad’.

—El tema de la cercanía a los pobres no es nuevo, pero sí la indagación en las causas de la pobreza y la lucha contra la pobreza como parte de la identidad cristiana. ¿Cuándo comienza esta transición?

—Me invitaron a hablar sobre la pobreza en Montreal en el año 67.Quería tomar distancia de Voillaume, el autor de ’En el corazón de las masas’, porque él evitaba cualquier perspectiva demasiado social en torno a la pobreza; pero la verdad es que no se puede evitar el hecho social. Hablé de tres nociones bíblicas sobre la pobreza: primero la pobreza real o material, vista siempre como un mal.

La segunda es la pobreza espiritual, como sinónimo de infancia espiritual. La pobreza espiritual es poner mi vida en las manos de Dios. El desprendimiento de los bienes es consecuencia de la pobreza espiritual. Y la tercera dimensión es la solidaridad con los pobres contra la pobreza. Voillaume hablaba de que había que ser pobre. Sí, muy bien, ¿pero paraqué? ¿Qué sentido tiene? No es únicamente para santificarme yo. Había que plantearse lo que significa para el otro.

—¿Algún otro elemento importante de esta arquitectónica inicial?

—Una preocupación: ¿cómo anunciar el evangelio hoy? La teología se hace para anunciar el evangelio, al servicio de la Iglesia, de la comunidad. Tantas facultades piensan en la teología como una metafísica religiosa, no como anuncio histórico de liberación.

—¿Cuándo comienza a llamarse ’teología de la liberación’ a este nuevo modo de pensar la fe desde la perspectiva del pobre y del excluido?

—Esto será el 22 de julio de 1968 en Chimbote, Perú. Me pidieron hablar de ’teología del desarrollo’ y me negué. Les dije que hablaría de teología de la liberación, que era más pertinente a nuestro contexto. Otra cosa que estaba de moda era la ’teología de la revolución’, de la cual también tomé distancia. El peligro de la misma era que pretendía cristianizar un hecho político.

—A diferencia de otros, usted nunca estuvo de acuerdo con partidos o grupos como la Democracia Cristiana ni con Cristianos por el socialismo aunque acentuaba la dimensión política de la fe. ¿Por qué?

—Nunca me gustó que se usara lo cristiano como adjetivo. Lo cristiano es un sustantivo. Siempre dije: ’soy cristiano por Cristo, no por el socialismo’. Que como cristiano alguien haga una opción por el socialismo, es otra cosa, pero no puedo deducir el socialismo por el camino de la Biblia. Dela Biblia deduzco la opción por la justicia, la opción por el pobre. La gente cuando no entiende esto dice: ’oye, pero tú niegas la política, estás del lado contrario’. Yo respondo que también creo en la autonomía de lo social y lo político.

—¿Cuándo comienza la idea de formar el libro que se convertirá en el texto fundacional de la teología latinoamericana contemporánea: ’Teología de la liberación. Perspectivas’?

—En realidad no pensé escribir un libro propiamente. Uno trabaja en los temas que le interesan a uno y poco a poco va saliendo. Al comienzo de1969, poco después de Medellín, una comisión ecuménica sobre temas de desarrollo me invitó a Ginebra. Entonces retrabajé la ponencia que había dado en Chimbote y así lo seguí ampliando.

—¿Tuvo oferta de alguna editorial concreta?

—No, pero pasó Miguel d’Escoto, de Maryknoll, que acababa de fundar Orbis Books. Vio el libro y me dijo: ’lo publico’. Fue el primer libropublicado por esta editorial. Lo hizo traducir y lo publicó en 1973 y ha sido el libro más vendido de esa editorial. Luego pasa el editor de Sígueme, de España, y lo mismo. Otro que se interesó fue Gibellini. La edición italiana es incluso anterior a la española. Ya está traducido como a diez o doce lenguas, también al vietnamés y al japonés.

—¿Cuál es la oposición principal que recibe el libro?

—Yo diría que más que al libro, era ya a la teología de la liberación. Ya mucha gente estaba escribiendo. Se criticaba el enfoque marxista del análisis de la realidad, pero yo no me sentía aludido. Ahora bien, la oposición más fuerte que hemos tenido no ha sido dentro de la Iglesia, sino en algunos componentes de la sociedad civil, en los poderes fácticos, económicos, militares, políticos.

—La discusión abierta es signo de una teología que dice algo al hombre y a la mujer de hoy, que genera diálogo crítico no sólo al interior de la iglesia sino con la sociedad.

—Buena parte de las reacciones vienen de la acogida que tuvo. Si me hubiera quedado en un ambiente de intelectuales no hubiera tenido ese impacto. Hubo una acogida de la base, incluso con expresiones que a mí nunca me han convencido, pero que nacen de la buena voluntad, que dicen: ’yo soy de la teología de la liberación’. Pero la teología de la liberación no era ni es un club en el que uno se inscribe, ni un partido. Se cantaban miembros y luego decían lo que querían y no siempre correspondía con lo que uno pensaba. Son cosas inevitables.

—Pero también hay una necesidad de encontrar fallas a una teología que provenía del Sur.

—Un periodista norteamericano me preguntó: ’¿qué piensa la teología dela liberación de este problema mundial?’. Le dije: ’usted cree que esto es un partido político y que yo soy el Secretario General. Pues no’. También le dije: ’a que usted no le pregunta a Metz (Juan Bautista): ¿qué piensa la teología política europea de este problema mundial? A él no, pero a esta teología sí. Claro, porque aquello sí es teología. Metz es alemán’. Alguna gente reaccionaba de este modo porque piensan que algo que viene de América Latina tiene que tener fallos grandes. Tienen que encontrarlas a como dé lugar. Si es latinoamericano tiene que haber alguna posición rara. Lo que quieren es cosificar una teología.

—Si uno se deja llevar sólo por lo que está escrito en la prensa tal parece que usted ha sido condenado por la Iglesia. Y no es cierto.

—Es curioso. En mi caso nunca hubo condena, ni siquiera hubo un proceso, sí hubo un llamado diálogo, preguntas que siempre estuve dispuesto a contestar.

—¿Le parece válido este tipo de diálogo?

—Siempre he creído que la teología se hace al interior de la Iglesia. En la Iglesia hay carismas distintos. A uno que escribe teología le pueden preguntar que dé razón de su fe, así como damos razón de nuestra esperanza. A ese nivel de preguntas no hay que ofenderse.

—¿Cuánto duró el diálogo?

—Comenzó en 1983 y concluyó de varias maneras, pero con papel oficial hace cinco años. Durante mucho tiempo todo estuvo en silencio. No hubo nada conmigo.

—¿Qué dice el texto oficial?

—La expresión es que todo concluyó satisfactoriamente.

—¿Tuvo varios encuentros cara a cara con el Cardenal Joseph Ratzinger?

—Sí, para gran parte de ellos no fui convocado, sino que yo mismo tomé la iniciativa. Ratzinger es un hombre inteligente, educado y, dentro de su propia mentalidad, ha evolucionado, ha entendido muchas cosas. En una ocasión en Roma me dijo que había leído mi libro sobre Job. Yo mismo le enviaba mis libros. Siempre he creído que la distancia crea fantasmas. Me dijo que le había gustado y que los teólogos del Sur teníamos poesía, que la teología europea era más fría.

—Su modo de proceder ha sido siempre poco conflictivo, enormemente dialógico y carente de dramatismo. Algunos creen que corresponde a su personalidad, pero creo que hay aquí algo profundamente eclesial.

—Exacto. Todo viene de que el mundo que más dice a mi vida no es el mundo intelectual. No es la defensa de mis ideas porque son mis ideas. Me interesa la vida de la Iglesia, el anuncio del Evangelio y la vida de las Conferencias Episcopales.

—La teología carga la huella de su tiempo. Estamos claramente entrando a otro tiempo en el que no se siente la misma urgencia y se abren otras rutas a la fe.

—Hasta los 40 años nunca hablé de la teología de la liberación y creo que era un cristiano de verdad. Así que seré cristiano después de la teología de la liberación. Cuando me hablan de que ya murió la teología de la liberación yo digo: ’pues mira, a mí no me invitaron al entierro y creo que tenía algún derecho’. Luego les digo: ’pues fíjate, creo que un día sí va a morir’. Entiendo por morir el hecho de que no tenga la misma urgencia que antes. Eso me parece normal, fue un aporte a la Iglesia en un determinado momento.

—Creo que se cuida bien de no convertir a la teología en un ídolo, en una ideología a la defensiva.

—No hay que hacer de una teología una nueva religión. Es la tendencia de la sociedad civil. Algunos piensan que la teología de la liberación es una especie de cristianismo distinto, el mío. Y hasta lo dicen elogiosamente, no por criticar. No creen en el cristianismo, pero sí en la teología de la liberación. Pues lo siento, lo importante es el cristianismo, no la teología de la liberación. La teología de la liberación sólo se entiende al interior del cristianismo.

—¿No cree que antes se hablaba de pluralismo teológico, pero era en realidad un pluralismo limitado, es decir, dentro de una mentalidad casi exclusivamente europea?

—Sí, y todavía en la academia teológica se habla de nosotros como teología contextual, un pensar que mantiene una estrecha relación con la realidad. Cuando me dicen esto, yo les digo para molestar: ’ay, usted tiene una idea muy mala de la teología europea. Me está diciendo que no son contextual es. Me está diciendo que es una teología que no tiene relación con la realidad. Una teología en el aire. Yo no creo eso’.

—¿Ha tenido que luchar contra cierta pretensión de superioridad?

—Muchísimo. Llamar contextual a una y no contextual a la otra es un ejemplo. Todo pensar corresponde a un contexto. Más que un rechazo a la teología de la liberación, es una comunicación con un punto menor, como si fuéramos algo subalterno. Ha habido muchas cosas en este estilo. Se aceptaban las ideas, pero se criticaba la teología de la liberación. ¿Qué es eso?

—Estábamos acostumbrados a que la teología sólo dialogara con la filosofía y no con las ciencias sociales. Es una novedad que costó aceptar al principio.

—Curioso, porque hoy las ciencias sociales están de lleno dentro de la teología. Esa crítica a la teología de la liberación ya prescribió. Y todo esto ocurre a pesar de que nunca dijimos que las ciencias sociales reemplazaban a la filosofía en la teología, sino que ampliábamos el abanico de luces y disciplinas humanas para trabajar el misterio cristiano.

—Además toda teología verdaderamente creadora genera resistencias. Es la prueba de fuego de su valía.

—Evidente. Mira la reacción ante el diálogo de Teilhard de Chardin con las ciencias naturales. Y el ejemplo clásico de Santo Tomás de Aquino. Hablo de un gigante frente a esta teología tan enana como la teología de la liberación. Tuvo resistencias enormes, fue condenado por la Universidad de París y tomó siglos poder ser reconocido. Él incorporó una filosofía que provenía de un pagano, la repensó, la retomó, la mezcló.

—¿Cree que estamos ya en un nuevo y mejor momento?

—La cosa más dura y polémica ha quedado atrás. Debe quedar para los historiadores. Y es muy bueno decir que ya pasó. Si algo ha muerto realmente es esta polémica. Yo creo que ya es tiempo de bajar el tono.

—Hay un texto en el que usted se mueve reflexivamente hacia el contexto actual de la globalización y de la postmodernidad y hacia los retos que plantea a la teología. Me refiero al ensayo ’¿Dónde dormirán los pobres?’. Allí comienza a hacer una crítica a la tentación de hacer de la teología misma un ídolo.

—Cuando hago de alguna cosa que no sea Dios un absoluto, caigo en la idolatría. He oído decir: ’teología de la liberación o nada’. Nunca he dicho: ’si usted quiere comprender a Cristo lea la teología de la liberación’. Ahora, si alguien me pregunta si creo que leyendo sobre teología de la liberación va a comprender algo importante del cristianismo, pues sí.

Es provocador decirlo, pero también la justicia puede convertirse en un ídolo. He visto maltratar a los pobres por personas que se creen mucho más claras políticamente que ellos. Estoy muy marcado por una cosa que leí a los quince años de Pascal: ’el abuso de la verdad es peor que la mentira’. Uno puede tener la verdad y abusar de ella. La persona es siempre más importante.

—Su reflexión más reciente ha advertido también sobre la tentación de hacer del pobre mismo un ídolo.

—Eso viene del romanticismo de algunos. Hay gente que me dice: ’todo lo he aprendido del pobre, el pobre es tan bueno’. A veces bromeando les digo: ’usted cree que todos los pobres son buenos y generosos, pues yo no les aconsejo que vayan a mi barrio a las dos de la mañana porque se quedarán como cuando nacieron, sólo que más viejitos’.

Es una manera de hacer entender que la opción no se hace porque el pobre sea bueno, sino porque Dios es bueno. Si el pobre no es bueno, pues también. Mucha gente se decepcionó del compromiso porque creían que el pobre era bueno. Si hubiesen entrado porque Dios es bueno todavía estarían comprometidos.

—De hecho, en un artículo suyo titulado ’San Juan de la Cruz en América Latina’ deja apuntado que lo que podría ayudarnos a evitar este camino idolátrico (que aunque habla de liberación no libera) sería abrirnos a la dimensión más mística de la fe.

—Si algo tiene la mística es la capacidad de ayudarnos a depurar la noción de Dios. Si vemos el dibujo de San Juan de la Cruz, hay un momento, a partir de la mitad de la falda del monte, en el que dice que a partir de ahí no hay camino. Eso es la mística. Un caminar hacia el Señor. Seguir haciendo de Él, conforme avanza nuestra vida, nuestro único absoluto.

Sin esta dimensión mística no hay verdadero compromiso con los pobres. Ahora bien, hay que cambiarla noción de mística. No es como se dice por ahí: salir de este mundo. No se trata de transmitir un mensaje, sino de ’transmitir lo contemplado’. A esto hay que añadir la intuición de Nadal: ser ’contemplativos en la acción’.

—Lo que a veces se anuncia como mística, incluso en importantes teólogos o estudiosos, todavía tiene excesivas reminiscencias neoplatónicas negadoras del cuerpo de la historia.

—La mística no es un desinteresarse de este mundo. Todavía hay gente que encuentra muy místico a alguien que no pisa tierra. Si no le importa el pobre no estoy seguro de que se trate de una experiencia mística. Es interesante que una mística, Teresita de Lisieux, sea patrona de las misiones.

—Progresivamente parece que usted ha ido insistiendo en la poesía como el mejor lenguaje para hablar de Dios. ¿Es así?

—La poesía es el mejor lenguaje del amor. Y Dios es amor. El mejor lenguaje para hablar de Dios es la poesía. Un lenguaje profundo que ve el mundo y ve la relación con el otro desde una dimensión y una hondura que el concepto no ofrece. Aunque no escribamos poesía, la teología misma debe ser siempre una carta de amor a Dios, a la Iglesia y al pueblo que servimos.”

Entrevista exclusiva al padre de la teología de la liberación, Gustavo Gutiérrez, en su 80 aniversario. Esta entrevista, fue publicada originalmente en La Revista del periódico El Nuevo Día (Puerto Rico) el 22 de junio de 2008. Por Ángel Darío Carrero.

Fonte: Adital: 17/07/2008

 

A teologia como carta de amor: Entrevista com Gustavo Gutiérrez

Poucos são os criadores de uma ruptura epistemológica. No campo da filosofia ocidental moderna, foram criadores Descartes, Kant, Hegel, Marx, Heidegger. Na teologia, se destacaram Tomás de Aquino, Lutero, Bultmann, Rahner. Gustavo Gutiérrez abriu um caminho novo e promissor para o pensamento teológico, descobriu “uma nova maneira de fazer teologia”. São palavras certeiras do teólogo Leonardo Boff.

A teologia na América Latina e no Caribe se caracterizava por repetir ou sintetizar pensamentos estrangeiros. Gutiérrez cria, no fim dos anos sessenta, um método teológico desde e para a América Latina pobre e oprimida. Deu a essa reflexão da fé a partir do reverso da história o nome de Teologia da Libertação. Seu raio de projeção tem sido verdadeiramente impressionante: desde a teologia negra, índia, asiática, feminista, ecológica e das religiões até a teologia judaica e palestina da libertação. Gustavo é o primeiro latino-americano a se situar de igual para igual entre os grandes criadores dentro da história da teologia.

No último dia 28 de maio, a Universidade Central de Bayamón, dirigida pelos Padres Dominicanos, uniu-se a uma plêiade de reconhecimentos internacionais, entre eles o prestigiado Prêmio Príncipe de Astúrias, outorgando-lhe um Doutorado Honoris Causa. O padre Gustavo Gutiérrez chegou assim pela primeira vez a Porto Rico, na véspera de seus oitenta anos de vida e do quadragésimo aniversário do emblemático documento eclesial latino-americano, Medellín.

A entrevista.

Quando o senhor começa a assumir a realidade da violência e da pobreza na América Latina e no Caribe como ponto de partida da teologia?

Comecei a trabalhar em março de 1964. Houve uma reunião convocada por Iván Illich. Eu o conheci ainda quando estava em Porto Rico, em 1960. Foi Iván quem convocou uma reunião muito informal em Petrópolis para que disséssemos como víamos o trabalho da teologia na América Latina.

E qual foi a sua colaboração?

Falei de teologia como uma reflexão sobre a pastoral e sobre a vida cristã. O mesmo que formulei mais tarde como reflexão crítica sobre a práxis à luz da fé.

O primeiro que surge é o estabelecimento de um método que parte da vida real para iluminá-la à luz da Palavra e abrir caminhos concretos de libertação?

Isso mesmo. Eu passei praticamente todos os meus estudos de teologia extremamente preocupado com a questão do método. Daí a frase: “Nossa metodologia é nossa espiritualidade”.
O tema da proximidade aos pobres não é novo, mas sim a indagação sobre as causas da pobreza e a luta contra a pobreza como parte da identidade cristã. Quando começa essa transição?
Convidaram-me para falar sobre a pobreza em Montreal, em 1967. Queria tomar distância de Voillaume, o autor de “En el corazón de las masas” (“No coração das massas”), porque ele evitava qualquer perspectiva muito social em torno à pobreza, mas a verdade é que não se pode evitar o fato social. Falei de três noções bíblicas sobre a pobreza: primeiro, a pobreza real ou material, vista sempre como um mal. A segunda é a pobreza espiritual, como sinônimo de infância espiritual. A pobreza espiritual é pôr minha vida nas mãos de Deus. O desprendimento dos bens é conseqüência da pobreza espiritual. E a terceira dimensão é a solidariedade com os pobres e contra a pobreza. Voillaume falava que se tinha que ser pobre. Sim, muito bem, mas para quê? Que sentido tem? Não é unicamente para eu me santificar. Tínhamos que pensar sobre o que isso significa para o outro.

Algum outro elemento importante dessa arquitetônica inicial?

Uma preocupação: como anunciar o Evangelho hoje? A teologia é feita para anunciar o evangelho, a serviço da Igreja, da comunidade. Tantas faculdades pensam a teologia como metafísica religiosa, não como anúncio histórico de libertação.

Quando esse novo modo de pensar a fé a partir da perspectiva do pobre e do excluído começa a se chamar “teologia da libertação”?

Isso foi em 22 de julho de 1968, em Chimbote, Peru. Pediram-me para falar da “teologia do desenvolvimento” e me neguei. Disse-lhes que falaria da teologia da libertação, que era mais pertinente ao nosso contexto. Outra coisa que estava na moda era a “teologia da revolução”, da qual também tomei distância. O perigo desta era que pretendia cristianizar um fato político.

Diferente de outros, o senhor nunca esteve de acordo com partidos ou grupos como a Democracia Cristã nem com o Cristãos pelo Socialismo, apesar de acentuar a dimensão política da fé. Por quê?

Nunca gostei que se usasse o “cristão” como adjetivo. O “cristão” é um substantivo. Sempre disse: “Sou cristão por Cristo, não pelo socialismo”. Que alguém faça, como cristão, uma opção pelo socialismo, é outra coisa. Mas não posso deduzir o socialismo pelo caminho da Bíblia. Da Bíblia, deduzo a opção pela justiça, a opção pelo pobre. As pessoas, quando não entendem isso, dizem: “Escute, mas você nega a política, está do lado contrário”. Eu respondo que também creio na autonomia do social e do político.

Quando começa a idéia de formar o livro que se converterá no texto que funda a teologia latino-americana contemporânea: “Teologia da libertação. Perspectivas”?

Na realidade, não pensei em escrever um livro propriamente. Alguém trabalha nos temas que lhe interessam e pouco a pouco vai saindo. No começo de 1969, pouco depois de Medellín, uma comissão ecumênica sobre temas de desenvolvimento me convidou a Genebra. Então, retrabalhei a palestra que havia dado em Chimbote e assim continuei ampliando.

Teve oferta de alguma editora concreta?

Não, mas passou Miguel d’Escoto, de Maryknoll, que acabava de fundar a Orbis Books. Viu o livro e me disse: “Vou publicá-lo”. Foi o primeiro livro publicado por essa editora. Ele o mandou traduzir e o publicou em 1973, e tem sido o livro mais vendido dessa editora. Depois, passou o editor de Sígueme, da Espanha, e aconteceu o mesmo. Outro que se interessou foi Gibellini. A edição italiana é inclusive anterior à espanhola. Já está traduzido para dez ou doze línguas, também para o vietnamita e para o japonês.

Qual é a oposição principal que o livro recebe?

Eu diria que, mais que ao livro, era oposição à teologia da libertação. Muita gente já estava escrevendo sobre o tema. Criticava-se o enfoque marxista da análise da realidade, mas eu não me sentia aludido. No entanto, a oposição mais forte que tivemos não veio de dentro da Igreja, mas de alguns componentes da sociedade civil, nos poderes jurídicos, econômicos, militares, políticos.

A discussão aberta é sinal de uma teologia que diz algo ao homem e à mulher de hoje, que gera diálogo crítico não somente no interior da Igreja, mas também com a sociedade.

Boa parte das reações vem da acolhida que teve. Se eu tivesse permanecido em um ambiente de intelectuais, não teria tido esse impacto. Houve uma acolhida da base, inclusive com expressões que nunca me convenceram, mas que nascem da boa vontade, que dizem: “Eu sou da teologia da libertação”. Mas a teologia da libertação não era e nem é um clube no qual alguém se inscreve, nem um partido. Declaravam-se membros e depois diziam o que queriam, e nem sempre correspondia ao que se pensava. São coisas inevitáveis.

Mas também há uma necessidade de encontrar falhas em uma teologia que provinha do Sul.
Um jornalista norte-americano me perguntou: “O que a teologia da libertação pensa desse problema mundial?”. Eu lhe disse: “Você crê que isto é um partido político e que eu sou o Secretário Geral? Pois não é assim”. Disse-lhe também: “Por que você não pergunta a [João Batista] Metz o que a teologia política européia pensa desse problema mundial? A ele não, mas a esta teologia sim. Claro, porque aquilo sim é teologia. Metz é alemão”. Algumas pessoas reagiam desse modo porque pensam que algo que vem da América Latina tem que ter falhas grandes. Tem que encontrá-las como der. Se é latino-americano, tem que haver alguma posição estranha. O que querem é coisificar uma teologia.

Se alguém se deixa levar somente pelo que está escrito na imprensa, parece que o senhor foi condenado pela Igreja. E não é verdade.

É curioso. No meu caso, nunca houve condenação, nem sequer houve um processo. Houve, sim, um chamado diálogo, perguntas que sempre estive disposto a responder.

O senhor acha válido esse tipo de diálogo?

Sempre acreditei que a teologia é feita no interior da Igreja. Na Igreja, há carismas distintos. Pode-se perguntar a alguém que escreve teologia que dê razão de sua fé, assim como damos razão de nossa esperança. Com esse nível de perguntas, não há por que se ofender.

Quanto tempo durou o diálogo?

Começou em 1983 e concluiu de várias maneiras, mas, oficialmente, faz cinco anos. Durante muito tempo, tudo esteve em silêncio. Não houve nada comigo.

O que diz o texto oficial?

A expressão é que tudo concluiu satisfatoriamente.

O senhor teve vários encontros cara a cara com o Cardeal Joseph Ratzinger?

Sim, para grande parte deles não fui convocado, mas eu mesmo tomei a iniciativa. Ratzinger é um homem inteligente, educado e, dentro de sua própria mentalidade, evoluiu, entendeu muitas coisas. Em uma ocasião em Roma, me disse que havia lido meu livro sobre Jó. Eu mesmo lhe enviava meus livros. Sempre acreditei que a distância cria fantasmas. Disse-me que tinha gostado e que os teólogos do Sul tinham poesia, que a teologia européia era mais fria.
Seu modo de proceder tem sido sempre pouco conflitivo, enormemente dialógico e carente de dramatismo. Alguns crêem que corresponde à sua personalidade, mas acho que aqui há algo profundamente eclesial.

Exato. Tudo vem de que o mundo que mais fala à minha vida não é o mundo intelectual. Não é a defesa de minhas idéias porque são minhas idéias. Interessa-me a vida da Igreja, o anúncio do Evangelho e a vida das Conferências Episcopais.

A teologia carrega o rastro de seu tempo. Estamos entrando claramente em outro tempo, o qual não se sente a mesma urgência e se abrem outras rotas à fé.

Até os 40 anos, nunca falei da teologia da libertação e creio que era um cristão de verdade. Assim, serei cristão depois da teologia da libertação. Quando me falam que a teologia da libertação já morreu, eu digo: “Olhe, eu não fui convidado para o enterro e acho que tinha algum direito”. Depois, lhes digo: “Mas, veja, creio que um dia, sim, vai morrer”. Entendo por morrer o fato de que não tenha a mesma urgência que antes. Isso me parece normal. Foi uma colaboração à Igreja em um determinado momento.

Creio que se cuida bem para não converter a teologia da libertação em um ídolo, em uma ideologia à defensiva.

Não se deve fazer de uma teologia uma nova religião. É a tendência da sociedade civil. Alguns pensam que a teologia da libertação é uma espécie de cristianismo diferente, o meu cristianismo. E até falam isso como um elogio, não para criticar. Não crêem no cristianismo, mas sim na teologia da libertação. Mas, sinto muito: o importante é o cristianismo, não a teologia da libertação. A teologia da libertação só pode ser entendida no interior do cristianismo.
O senhor não acha que antes se falava de pluralismo teológico, mas, na realidade, era sobre um pluralismo limitado, isto é, dentro de uma mentalidade quase exclusivamente européia?
Sim, e, todavia, na academia teológica se fala de nós como teologia contextual, um pensar que mantém uma estreita relação com a realidade. Quando me dizem isso, eu lhes digo para incomodar: “Ah, você tem uma idéia muito ruim da teologia européia. Está me dizendo que não são contextuais. Está me dizendo que é uma teologia que não tem relação com a realidade. Uma teologia no ar. Eu não acho isso”.

O senhor teve que lutar contra uma certa pretensão de superioridade?

Muitíssimo. Chamar “contextual” a uma e “não contextual” à outra é um exemplo. Todo pensar corresponde a um contexto. Mais do que uma rejeição à teologia da libertação, é uma comunicação com um ponto menor, como se fôssemos algo subalterno. Tem havido muitas coisas nesse estilo. Aceitavam-se as idéias, mas se criticava a teologia da libertação. O que é isso?
Estávamos acostumados a que a teologia dialogasse somente com a filosofia e não com as ciências sociais. É uma novidade que custou a ser aceita no princípio.

Curioso, porque hoje as ciências sociais estão de cheio dentro da teologia. Essa crítica à teologia da libertação já caducou. E tudo isso ocorre apesar de que nunca dissemos que as ciências sociais substituíam a filosofia na teologia, mas que ampliávamos o leque de luzes e de disciplinas humanas para trabalhar o mistério cristão.

Além disso, toda teologia verdadeiramente criadora gera resistências. É a prova de fogo de sua valia.

Evidente. Veja a reação ante o diálogo de Teilhard de Chardin com as ciências naturais. E o exemplo clássico de São Tomás de Aquino. Falo de um gigante frente a essa teologia tão anã como a teologia da libertação. Ele teve resistências enormes, foi condenado pela Universidade de Paris e levou séculos para ser reconhecido. Ele incorporou uma filosofia que provinha de um pagão, repensou-a, retomou-a, misturou-a.

O senhor crê que já estamos em um momento novo e melhor?

A parte mais dura e polêmica ficou para trás. Deve ficar para os historiadores. E é muito bom dizer que já passou. Se algo realmente morreu é essa polêmica. Eu creio que já é hora de baixar o tom.

Há um texto no qual o senhor se move reflexivamente em direção ao contexto atual da globalização e da pós-modernidade e aos desafios que a teologia apresenta. Refiro-me ao ensaio “Onde dormirão os pobres?”. Aí começa a fazer uma crítica à tentação de fazer da própria teologia um ídolo.

Quando faço de alguma coisa que não seja Deus um absoluto, caio na idolatria. Ouço dizer: “Teologia da libertação ou nada”. Eu nunca disse: “Se você quer compreender a Cristo, leia a teologia da libertação”. Agora, se alguém me pergunta se eu acho que lendo sobre teologia da libertação vai compreender algo importante do cristianismo, aí sim. É provocador dizer isso, porque a justiça também pode se converter em um ídolo. Vejo pobres serem maltratados por pessoas que se crêem mais claras politicamente que eles. Fiquei muito marcado por uma coisa que li aos quinze anos, escrito por Pascal: “O abuso da verdade é pior do que a mentira”. Alguém pode ter a verdade e abusar dela. A pessoa é sempre mais importante.

Sua reflexão mais recente advertiu também sobre a intenção de fazer do pobre um ídolo.
Isso vem do romantismo de alguns. Há gente que me diz: “Aprendi tudo com o pobre, o pobre é tão bom”. Às vezes, brincando, lhes digo: “Você acredita que todos os pobres são bons e generosos, mas eu não lhes aconselho a ir ao meu bairro às duas da madrugada, porque vão ficar como vieram ao mundo, só que mais velhinhos”. É uma maneira de dar a entender que a opção não se faz porque o pobre seja bom, mas porque Deus é bom. Se o pobre não é bom, também. Muita gente se decepcionou do compromisso porque acreditavam que o pobre era bom. Se tivessem entrado porque Deus é bom, ainda estariam comprometidos.

De fato, em um artigo seu intitulado “San Juan de la Cruz en América Latina” (“São João da Cruz na América Latina”), o senhor deixa indicado que o que poderia nos ajudar a evitar esse caminho idolátrico (que, ainda que fale de libertação, não liberta) seria abrir-nos à dimensão mais mística da fé.

Algo que a mística tem é a capacidade de nos ajudar a depurar a noção de Deus. Se virmos o desenho de São João da Cruz, há um momento, a partir da metade da base do monte, no qual ele diz que, a partir daí, não há caminho. Isso é a mística. Um caminhar em direção ao Senhor. Seguir fazendo d’Ele, conforme nossa vida avança, o nosso único absoluto. Sem essa dimensão mística, não há verdadeiro compromisso com os pobres. Pois bem, há que se mudar a noção de mística. Não é como se diz por aí: sair deste mundo. Não se trata de transmitir uma mensagem, mas de “transmitir o contemplado”. A isso temos que agregar a intuição de Nadal: ser “contemplativos na ação”.

O que às vezes se anuncia como mística, inclusive em importantes teólogos ou estudiosos, ainda tem excessivas reminiscências neoplatônicas negadoras do corpo e da história.

A mística não é um desinteressar-se por este mundo. No entanto, há pessoas que acham muito místico alguém que não tem os pés no chão. Se o pobre não lhe importa, não estou certo de que se trate de uma experiência mística. É interessante que uma mística, Teresinha de Lisieux, seja padroeira das missões.

Progressivamente, parece que o senhor tem insistido na poesia como a melhor linguagem para falar de Deus. É isso?

A poesia é a melhor linguagem do amor. E Deus é amor. A melhor linguagem para falar de Deus é a poesia. Uma linguagem profunda que vê o mundo e vê a relação com outro a partir de uma dimensão e de uma profundidade que o conceito não oferece. Mesmo que não escrevamos poesia, a própria teologia deve ser sempre uma carta de amor a Deus, à Igreja e ao povo a quem servimos.

Entrevista exclusiva com o pai da Teologia da libertação, Gustavo Gutiérrez, em seu 80o aniversário. Esta entrevista foi publicada originalmente em ‘La Revista’, do jornal El Nuevo Dia, de Porto Rico, em 22 de junho de 2008. Por Ángel Darío Carrero.

Fonte: Adital: 18/07/2008

 

Conheci Gustavo Gutiérrez na década de 70, em Roma, quando fez palestra para os estudantes dos Colégios Pio Brasileiro e Latino-Americano. Voltei a reencontrá-lo em julho de 2000, em Congresso da SOTER, em Belo Horizonte, quando o tema debatido foi Teologia na América Latina: Prospectivas. Estavam presentes 234 teólogos, teólogas e cientistas da religião, dos quais 77 vieram da Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica, México, Peru e Uruguai, além de convidados da Áustria, Canadá, Espanha, Estados Unidos e Itália. E entre eles, Gustavo Gutiérrez, do Peru.

De sua obra tomei conhecimento em 1972, quando cursava o terceiro ano de Teologia na Universidade Gregoriana e nosso extraordinário colega de Pio Brasileiro, Alphonso Garcia Rubio, doutorando em Teologia, orientou um seminário sobre Teologia da Libertação, o tema de sua tese, para brasileiros e colegas do Colégio Pio Latino-Americano, que, à época, tinha sua sede ao lado do nosso.

No dia 22 de outubro de 1972 – o ano letivo começou em 15 de outubro – comprei o livro de Gustavo Gutiérrez, Teologia della Liberazione. Prospettive. Brescia: Queriniana, 1972, 312 p., base de nosso estudo.

Gustavo Gutiérrez estudou Filosofia e Psicologia na Universidade Católica de Lovaina, na Bélgica, e Teologia na Universidade Católica de Lyon, França, na Universidade Gregoriana de Roma e no Instituto Católico de Paris. Gustavo Gutiérrez já foi homenageado com mais de vinte doutorados Honoris Causa, em Universidades de vários países.