A arqueologia enterrou a Bíblia?

Li alguns capítulos do livro Has Archaeology Buried the Bible? de William G. Dever e percebi que ele faz uma clara e agradável síntese da História de Israel considerando as perspectivas arqueológicas das últimas décadas. Pode ser uma leitura proveitosa para muitos.

Resenha do livro de William G. Dever, Has Archaeology Buried the Bible? [A arqueologia enterrou a Bíblia?] por Jennie Ebeling, publicada em Bible History Daily em 12 de janeiro de 2022.

DEVER, W. G. Has Archaeology Buried the Bible? Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2020, X + 158 p. – ISBN ‎ 9780802877635.DEVER, W. G. Has Archaeology Buried the Bible? Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2020, X + 158 p.

Desde a morte de William F. Albright, o “pai” da arqueologia bíblica norte-americana, há cinquenta anos, os objetivos da pesquisa arqueológica em Israel e países vizinhos mudaram de modo radical. Isso se deve menos aos muitos desenvolvimentos tecnológicos na arqueologia de campo, eu argumentaria, e mais ao fato de que pouquíssimos arqueólogos profissionais que trabalham em Israel, Jordânia e em outros lugares hoje afirmam escavar com a Bíblia em uma mão e uma pá na outra. Albright e seus contemporâneos – a maioria deles estudiosos bíblicos protestantes e ministros ordenados – acreditavam que o valor principal (se não o único) do trabalho arqueológico na Terra Santa era fornecer confirmação física de eventos e personagens bíblicos. Os arqueólogos do século XXI, no entanto, se envolvem com uma ampla gama de questões históricas e antropológicas de maneira semelhante a seus colegas que trabalham em outras partes do mundo, onde a historicidade da Bíblia não entra na equação.

Como muitos estudiosos notaram, a arqueologia bíblica de estilo albrightiano começou a desaparecer na segunda metade do século XX, quando seus praticantes adotaram os padrões dos arqueólogos profissionais na América do Norte e na Europa. Além disso, muitos perceberam que a arqueologia falhou em oferecer evidências para a historicidade de certos eventos bíblicos cruciais que Albright e seus contemporâneos disseram que deveriam, como a migração de Abraão e Sara da Mesopotâmia para Canaã, a entrega da lei e da aliança a Moisés no Monte Sinai, o êxodo e a conquista israelita de Canaã, o estabelecimento da realeza divina em Israel e o desenvolvimento único e divinamente ordenado da religião e cultura do antigo Israel. Como a fé (para alguns) dependia da ocorrência ou não desses eventos, a incapacidade da arqueologia de fornecer provas físicas desses eventos levou à desilusão. Como, muitos se perguntavam, a arqueologia poderia informar sobre questões teológicas, dada a sua incapacidade de lançar luz sobre esses eventos centrais?

No entanto, o público continua profundamente interessado em saber como a arqueologia pode nos informar sobre o mundo da Bíblia. Os arqueólogos aproveitam esse interesse para aumentar o apoio financeiro e a conscientização, ao mesmo tempo em que se distanciam do tipo míope de arqueologia bíblica praticado há um século. E embora alguns arqueólogos americanos que trabalham na região possam apoiar suas crenças pessoais a partir de suas pesquisas, poucos provavelmente admitiriam escavar com o objetivo explícito de revelar lições morais e verdades pelas quais viver no século XXI. É isso o que torna o livro de William G. Dever “A arqueologia enterrou a Bíblia?” tão surpreendente.

Neste livro, o prolífico e franco arqueólogo, que desempenhou um papel importante na independência da arqueologia bíblica das preocupações confessionais de seus primeiros praticantes, afirma corajosamente que as descobertas arqueológicas podem servir como guias morais. Além de seu valor para iluminar o mundo bíblico em geral e o antigo Israel em particular, argumenta William G. Dever, a arqueologia pode ajudar os leitores modernos a “encontrar coisas em que ainda podem acreditar ao ler a Bíblia – coisas pelas quais não precisam oferecer desculpas” (p. 144).

Em vez de relatar o fracasso da arqueologia em revelar a verdade bíblica, como o título sugere de maneira divertida, William G. Dever valoriza o perfil da arqueologia na interpretação bíblica e na crença religiosa. Neste volume conciso e claramente escrito, William G. Dever tem o cuidado de não afirmar que a Bíblia Hebraica é uma base essencial para os valores morais, mas também argumenta que continua a ser a principal fonte de autoridade para a maioria no mundo ocidental. A meu ver, se não devemos rejeitar a Bíblia por completo como fonte de lições morais devido aos seus muitos elementos problemáticos (genocídio, misoginia, racismo, homofobia etc.), devemos lê-la criticamente com novos olhos usando o conhecimento desenterrado por arqueólogos da geração recente.

William G. Dever (nascido em 27 de novembro de 1933 em Louisville, Kentucky)Dever ilustra ao longo do livro como as descobertas arqueológicas oferecem um retrato mais autêntico do antigo Israel em toda a sua complexidade e diversidade, lançando luz sobre a vida cotidiana dos não-elites, que compunham 99% de sua população – dando voz àqueles “que dormem na terra poeirenta” (Dn 12,2). As descobertas arqueológicas, argumenta William G. Dever, revolucionaram nossa compreensão da Bíblia, embora não da maneira que Albright e outros imaginaram um século atrás. Os leitores podem determinar por si mesmos se esse novo entendimento enriquece suas vidas espirituais, oferecendo respostas a perguntas que os primeiros arqueólogos bíblicos nem pensariam em fazer.

Jennie Ebeling é Professora Associada de Arqueologia na Universidade de Evansville. Sua pesquisa se concentra em tecnologias alimentares antigas e mulheres em Canaã e no antigo Israel. Ela codirigiu a Expedição Jezreel.

 

Fifty years since the death of William F. Albright, the “father” of American biblical archaeology, the aims of archaeological research in Israel and the surrounding areas have changed almost beyond recognition. This is due less to the many technological developments in field archaeology, I would argue, and more to the fact that very few professional archaeologists working in Israel, Jordan, and elsewhere today claim to dig with the Bible in one hand and a spade in the other. Albright and his contemporaries—most of them Protestant biblical scholars and ordained ministers—believed that the primary (if not sole) value of archaeological work in the Holy Land was to provide physical confirmation of biblical events and people. Twenty-first century archaeologists, however, engage with a broad range of historical and anthropological questions in a similar way to their colleagues working in other parts of the world, where the historicity of the Bible doesn’t enter the equation.

As many scholars have noted, Albrightian-style biblical archaeology began to fade away in the second half of the 20th century, as its practitioners adopted the standards of professional archaeologists in North America and Europe. In addition, many came to realize that archaeology had failed to offer evidence for the historicity of certain pivotal biblical events that Albright and his contemporaries had said it would: the migration of Abraham and Sarah from Mesopotamia to Canaan, the giving of the law and covenant to Moses at Mt. Sinai, the Exodus and Israelite conquest of Canaan, the establishment of divine kingship in Israel, and the unique and divinely ordained development of ancient Israel’s religion and culture. Since faith (for some) was dependent upon whether or not these events had actually occurred, archaeology’s inability to provide physical proof of these events led to disillusionment. How, many wondered, could archaeology inform on theological questions given its failure to shed light on these central events?

Meanwhile, the public remains keenly interested in how archaeology can inform on the world of the Bible. Archaeologists leverage this specialized interest to raise financial support and awareness while also distancing themselves from the narrow kind of biblical archaeology practiced a century ago. And although some American archaeologists working in the region might find their personal beliefs supported by their research, few would likely admit to digging with the explicit goal of revealing moral lessons and truths by which to live in the 21st century. This is what makes William G. Dever’s recent book Has Archaeology Buried the Bible? so surprising.

In this book, the prolific and outspoken archaeologist who played an important role in orienting biblical archaeology away from the concerns of its early parochialJennie R. Ebeling practitioners boldly asserts that archaeological discoveries can serve as moral guides. In addition to its value for illuminating the biblical world in general and ancient Israel in particular, Dever argues, archaeology can help modern readers “find things that they can still believe in reading the Bible—things for which they need to offer no apologies” (p. 144).

Rather than recount archaeology’s failure to reveal biblical truth as the title playfully suggests, Dever elevates archaeology’s profile in biblical interpretation and religious belief. In this concise and clearly written volume, Dever is careful not to claim that the Hebrew Bible is an essential basis for moral values, but he also argues that it remains the primary source of authority for most in the Western world. In my view, if we are not to reject the Bible altogether as a source of moral lessons due to its many problematic elements (genocide, misogyny, racism, homophobia, etc.), then we must read it critically with new eyes using knowledge unearthed by archaeologists of the recent generation.

Dever illustrates throughout the book how archaeological discoveries offer a more authentic portrait of ancient Israel in all its complexity and diversity by shedding light on the everyday lives of the non-elites, who comprised 99 percent of its population—giving voice to those “who sleep in the dust” (Daniel 12:2). Archaeological discoveries, Dever argues, have brought about a revolution in our understanding of the Bible, although not in the way that Albright and others envisioned a century ago. Readers can determine for themselves if this new understanding enriches their spiritual lives by offering answers to questions that early biblical archaeologists would not have even thought to ask.

Jennie Ebeling is Associate Professor of Archaeology at the University of Evansville. Her research focuses on ancient food technologies and women in Canaan and ancient Israel. She co-directed the Jezreel Expedition.

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