“Como evento histórico, o Concílio [Vaticano II] é ponto de partida. Reinterpretações fazem parte da fidelidade aos seus documentos e da audácia da caminhada pastoral que a história exige. Podemos distinguir diferentes “convivências” com o Vaticano II:
1º: a não recepção pelo grupo em torno da chamada Fraternidade Pio X. Esse setor percebeu corretamente que o Vaticano II representa uma verdadeira reforma que inclui continuidade e ruptura;
2º: a recepção modernizante, porém essencialmente conservadora, sem assunção dos questionamentos do mundo moderno, que o Concílio fez;
3º: a recepção conclusiva, como se o Vaticano II fosse um ponto final ou uma trincheira que nos permite, em pleno inverno eclesial, esperar tempos mais favoráveis. Esse setor procura salvar afirmações fundamentais do Concílio – o “máximo” alcançável, o “sustentável” – sem a dinâmica histórica que o considera como ponto de partida;
4º: a recepção seletiva e estratégica pelo setor de movimentos pentecostais e fundamentalistas, que grosso modo dispensaram a “iluminação” conciliar, por confundirem com ilustração; sinais importantes deste setor são a emocionalidade, a visibilidade através de eventos de massa e o personalismo de um líder sedutor, popular e populista ao mesmo tempo. Sua presença maciça na mídia se explica pelo alinhamento sistêmico e político, por promessas milagrosas e pelo esquecimento da cruz. Esse setor reforça a alienação das massas populares e as afasta do mistério pascal;
5º: a recepção dinâmica na linha de uma pastoral de libertação e participação dos pobres, assumida por Medellín e as conferências seguintes. Bandeiras como Comunidades Eclesiais de Base – CEBs, inculturação, Igreja autóctone com teologias e liturgias diferenciadas, diálogo, liberdade religiosa, macroecumenismo só terão futuro e serão hasteadas nessa perspectiva da historicidade do evento Vaticano II. Quem quer “segurar” o Concílio como ponto de chegada destrói suas intenções profundas”.
Contexto da afirmação: Paulo Suess, no 50º aniversário do início do Concílio Vaticano II, narra a gênese, o desenvolvimento e o impacto de um dos importantes documentos deste evento eclesial que é o decreto Ad Gentes. Segundo ele, “somos uma Igreja de apóstolos e mártires, hoje com poucos profetas” e alerta: “Missas e ministros midiáticos, alinhados a padrões de marketing, podem destruir o sagrado” (Entrevista à IHU On-Line 398, de 13/08/2012).
Fonte: Revista IHU On-Line n. 398 – Ano XII – 13/08/2012
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