Para entender o Oriente Médio, segundo Robert Fisk

Para entender o Oriente Médio… tente algumas leituras

A maior dificuldade para escrever com consciência histórica é que a história não terminou. Seja como for, se quiser entender a Al-Qaeda, por exemplo, tente o parágrafo seguinte:

“O homem do deserto não merece crédito por sua fé (…). Ele alcançou essa intensa condensação de si mesmo em Deus porque fechou os olhos ao mundo e a todas as complexas possibilidades latentes nele, que só o contato com a riqueza e as tentações pode trazer à tona. Alcançou uma fé confiável e poderosa, mas em campo tão estreito! Sua experiência estéril roubou-lhe qualquer compaixão e perverteu sua generosidade humana para com a imagem da perda na qual se escondeu (…). Vem daí um gozo na dor, uma crueldade que vale mais para ele que quaisquer bens. (…) Encontrou luxúria na abnegação, na renúncia, na autocontenção. Fez a nudez da mente tão sensual quanto a nudez do corpo. É possível que tenha salvo a própria alma, e sem risco, mas num duro egoísmo.”

É de T.E. Lawrence, em Seven Pillars of Wisdom: a Triumph (1926) [Os Sete Pilares da Sabedoria: Um Triunfo, Rio de Janeiro: Record, trad. C. Machado] – e que perfeição! Sempre lembro dessa passagem quando assisto aos videoteipes de Bin Laden. O campo estreito. A abnegação. A crueldade. Não concordo necessariamente com Lawrence, mas em trechos como esse, percebo-me refletindo cada vez mais profunda e intensamente sobre suas palavras.

Digo isso porque, várias vezes por ano, leitores do Independent pedem-me que sugira “uma lista de leituras” de livros em inglês sobre o Oriente Médio. Não é fácil. A maior dificuldade para escrever com consciência histórica sobre o Oriente Médio é que a história não terminou. A guerra continua. Os dois “lados” – de fato há muitos, muitos lados – produzem narrativas conflitivas. E não aceito a ideia de que se possa oferecer uma lista equilibrada de livros. Há a versão de Israel. Há a versão dos árabes. Há a versão alucinada dos norte-americanos etc. O Oriente Médio é questão de injustiça. Quem contará melhor a história?

No que tenha a ver com a disputa árabes-israelenses, os dois incomparavelmente melhores livros são The Arab Awakening: the history of the Arab National Movement (Londres, 1938) de George Antonius, e The Gun and the Olive Branch (1977), de meu colega e amigo David Hirst. Antonius escreveu em 1938; Hitler já estava no poder há cinco anos – mas dez anos antes de os palestinos serem ativamente assaltados. – E escreveu que:

“O tratamento imposto aos judeus na Alemanha e em outros países europeus é uma desgraça para os autores e para a civilização moderna. A posteridade não perdoará nenhum país que não assuma a sua parcela de sacrifícios para aliviar o sofrimento e o desespero dos judeus. Impor toda a carga à Palestina árabe é miserável movimento de fuga ao cumprimento do dever moral que cabe a todo o mundo civilizado, além de ser moralmente vergonhoso. Nenhum código moral pode justificar a perseguição de um povo, como meio para aliviar a perseguição de outro. A cura para a expulsão dos judeus da Alemanha jamais será a expulsão dos árabes, de sua própria terra (…).”

Foi o primeiro sinal verdadeiramente eloquente do que estava para acontecer, e Hirst completou a narrativa das muito acuradas predições de Antonius, o primeiro autor, parece-me, a enfrentar o romance-lixo Exodus, com o qual Leon Uris agraciou o Estado judeu – para deleite de Ben Gurion, embora devesse ter pensado melhor –, ao desconstruir o “terrorismo”, sem romantizar os refugiados palestinos e seus movimentos de resistência.

Nesse mesmo contexto, deve-se lembrar o trabalho dos “novos historiadores” de Israel, que criaram uma narrativa complementar. Benny Morris foi o mais proeminente pesquisador israelense a provar que foi intenção de Israel expulsar os palestinos e arrancá-los de suas casas às dezenas de milhares em 1948. O fato de que, depois, Morris não tenha feito outra coisa além de reclamar que a limpeza étnica não tenha sido suficientemente eficaz e ampla não diminui a importância de seu trabalho anterior, seminal.

Dizem que F. R. Leavis, certa vez, iniciou um parágrafo com “Como qualquer leitor-que-preste de poesia sabe…”. Então, acho que podemos dizer que “qualquer leitor-que-preste” de livros sobre o Oriente Médio deve ler Edward Said. Um de seus melhores livros, aliás, é sobre música. Mas Orientalism [Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 2003] sempre será necessário em qualquer lista. Said fez filosoficamente e historicamente, pela narrativa do Oriente Médio, o que Antonius fez politicamente. Não estou subestimando o trabalho político de Said – embora vários críticos tenham anotado que Said talvez não tenha levado n a devida consideração a vasta literatura “orientalista” que brotou na Itália, na Alemanha e na Rússia. Mas não o estou condenando como o condenaram Al Dershowitz e sua gangue.

A União Soviética, claro, sempre teve problemas com o Profeta, porque Maomé foi comerciante e burguês. Jesus Cristo, pelo menos, nasceu em família de trabalhador, embora não se saiba se José, carpinteiro, possa ser dito Stakhanovita recomendável. Mas devo dizer que o fato de Maria e José terem tido de viajar até Jerusalém para pagar impostos é absolutamente otomano, de tão burocrático. E que nenhum hotel aceitasse hospedar uma mulher grávida, sim, tem sabor de Oriente Médio. Mas, não, não! Não vá eu, agora, virar “orientalista”!

E há também esse brilhante pensador e jornalista libanês, o saudoso Samir Kassir – muito saudoso, porque foi assassinado há quase cinco anos, e a última coisa que vi dele foi o sangue ao lado do carro explodido – cuja monumental história de Beirute, em inglês, estará nas livrarias esse ano (admito: estou escrevendo o prefácio).

Tudo que você algum dia quis saber sobre Beirute – e muito, receio, que você preferiria jamais saber – está no livro de Kassir. Ele lembra como, há cem anos, um jovem capo di capo cristão – um Costa Paoli – tinha o hábito de beijar o rosto dos cristãos libaneses recém assassinados, antes de que fossem sepultados. Era homem elegante – “uma rosa na lapela e lenço perfumado no bolso do paletó”, segundo o professor Edward Atiyah –, e um gângster; vingava-se dos muçulmanos. Naqueles dias, havia milícias e grupos armados de apoio às comunidades cristãs e muçulmanas, e às vezes, havia briga de rua.

Exatamente como o meu colega David McKittrick descobriu que, na Belfast do século 19, as primeiras lutas de rua ocorreram nos mesmos locais onde aconteceram as batalhas dos anos 70s, assim também já se sabe que, na Beirute do século 19, os conflitos entre as milícias armadas aconteceram nos mesmos locais onde eclodiria a Guerra do Líbano de 1975.

Kassir é o primeiro autor cujo único personagem humano é uma cidade, em cuja bela e terrível história vêem os homenzinhos girando em rodas de tortura. Eu não sabia que o subúrbio onde reina o Hizbollah, Ouzai, recebeu esse nome para homenagear o velho divino Imã Ouzai; ou que o Partido Social Nacionalista Sírio – uma tediosa sociedade pan-árabe – inspirou-se, para criar sua bandeira vermelha, branca e preta (com penas cruzadas), nos nazistas; ou que o palavrão (em árabe) sharmut ou sharmuta – “puta” – e que hoje se usa a torto e a direito, surgiu da tão mais gentil e suave “charmante”, francesa. Lawrence e demais autores, por favor, anotem.

O artigo é de Robert Fisk e foi publicado em The Independent, Londres, em 13 de março de 2010: Robert Fisk’s World: Try this reading list if you want to understand the Middle East. Publicado no Brasil pelo Instituto de Cultura Árabe.

Fonte: Carta Maior: 23/03/2010

Lula no Oriente Médio II

Lula recebe pedidos de encontro com Irã e fim de relações com Israel
O rabino Israel Lau, presidente do Memorial do Holocausto Yad Vashen e sobrevivente dos campos de concentração, pediu publicamente nesta terça-feira que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva promova um encontro do israelense com o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad (…) O rabino Lau foi liberado do campo de concentração em 1945, quando tinha oito anos. Ele foi grão-rabino de Israel entre 1993 e 2003, preside o memorial de Yad Vashem desde 2008, e mantém suas funções de grão-rabino de Tel Aviv (…) Já a ONG palestina “Stop the Wall” (Pare o Muro) pediu a Lula que corte as relações comerciais e militares com Israel, alegando que isso legitima o apoio brasileiro à ocupação israelense. A organização não-governamental critica ainda o TLC (Tratado de Livre Comércio) assinado entre o Mercosul e Israel.

Leia a notícia completa.

Fonte: Folha Online: 16/03/2010 – 14h23

Lula no Oriente Médio

AMORIM, C. Teerã, Ramalá e Doha: Memórias da Política Externa Ativa e Altiva. 2. ed. São José dos Campos: Benvirá, 2018, 520 p. – 9788557172074.

Durante os quase dez anos em que foi ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim mostrou como um chanceler pode ser muito mais que um assessor do Chefe de Governo e imprimir uma marca própria em sua área de atuação. Em Teerã, Ramalá e Doha: memórias da política externa ativa e altiva, o leitor poderá acompanhar a trajetória da política brasileira em relação aos países árabes, culminando no reconhecimento do Estado palestino. Ora no papel de político-diplomata, ora no de negociador comercial, Amorim conduziu o Brasil ao protagonismo na busca por uma solução pacífica e negociada para a questão nuclear iraniana – bem como nas negociações da Rodada Doha. Por meio de um relato de forte cunho pessoal e minucioso das negociações que conduziu ou das quais participou, Amorim mostra como agem as grandes potências e seus líderes e expõe o emaranhado de motivações que os impulsiona. Alargando a fronteira das discussões político-diplomáticas, o autor ainda abre espaço à narrativa de passagens emotivas, como a do resgate de brasileiros refugiados no Líbano; pitorescas, como a do pedido a um príncipe saudita para que intercedesse pela libertação de um brasileiro, preso por ter agredido um árbitro de futebol; ou intelectualmente estimulantes, como a de seu encontro com o escritor Amós Oz.

Celso Amorim nasceu em Santos (SP), em 1942. Depois de breve incursão pelo cinema, iniciou-se na carreira diplomática em 1963, formando-se pelo Instituto Rio Branco e fazendo pós-graduação na Academia Diplomática de Viena e na London School of Economics and Political Science. Foi presidente da Embrafilme, embaixador em Genebra e Londres, presidente do Conselho de Segurança da ONU, ministro das Relações Exteriores nos governos Itamar e Lula e ministro da Defesa no primeiro mandato do governo Dilma.

 

A diplomacia do Brasil no governo Lula – Por Carlos Azevedo – Portal Vermelho – 30/01/2017

O livro do ex-chanceler Celso Amorim, relatando o protagonismo alcançado pela política externa do Brasil durante os oitos anos do governo de Lula, foi escrito em 2014. Mostra que é possível ter uma diplomacia independente. Lido hoje, é um contraponto à diplomacia de Temer e José Serra, que voltou a ser subalterna ao império norte-americano.

Amorim destaca três grandes empreitadas do Itamaraty: um acordo sobre a questão nuclear do Irã, a rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) e a aproximação com os países árabes.

Teerã, Ramalá e Doha – memórias da política externa ativa e altiva, do ex-ministro de Relações Exteriores Celso Amorim, já seria um livro atual só por retratar exaustivamente os oito anos de política externa do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas está ainda mais na ordem do dia porque oferece oportunidade de comparação com a atual política externa submissa aos EUA. Durante aquele período o governo brasileiro se esforçou para traduzir na política externa o peso real do país na geopolítica mundial.

O ACORDO COM O IRÃ

Percorrendo as primeiras cem páginas do livro (“A Declaração de Teerã – a oportunidade perdida?”), o leitor mergulha numa teia de relações complexas, de viagens cansativas, discussões exaustivas, situações de suspense e até de humor, em que se descortina como fazem política as grandes potências.

Em 2006, durante conversa telefônica com Ângela Merkel, primeira-ministra da Alemanha, Lula disse que o Brasil tinha condições de ajudar na busca de um acordo com o Irã. Os dois países haviam intensificado muito suas relações comerciais (trocas anuais de 2,4 bilhões de dólares) e se aproximado diplomaticamente. Uma visita de Mahmoud Ahmadinejad, o presidente iraniano, ao Brasil, estava sendo planejada.

As negociações com o P5+1 (EUA, França, Reino Unido, Rússia, China – membros permanentes do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas – e Alemanha) estavam empacadas e sem propostas de lado a lado. Foi quando, em algum momento de 2009, o Irã solicitou a intermediação da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). O país persa queria adquirir no mercado internacional de pastilhas (ou varetas) contendo combustível com urânio enriquecido a 20% para seu reator de pesquisas (TRR) produzir isótopos para diagnóstico de tratamento de câncer. Ninguém poderia se opor a isso porque todo país tem direito a desenvolver produção nuclear para fins pacíficos. Além do que, depois de enriquecido a 20%, o urânio não pode ser revertido para fins militares.

A diplomacia dos EUA espertamente arquitetou um “plano de troca” para fazer avançar as negociações. Sabia-se que o Irã já havia produzido cerca de 2 mil quilos de urânio levemente enriquecido (LEU na sigla em inglês) a 4% ou 5%. A ideia era propor uma troca: para cada quilo de urânio enriquecido a 20% que fosse fornecido para o reator do Irã, este deveria entregar, em território estrangeiro, 10 quilos de LEU, num total de 1.200 quilos. Com isso, imaginavam os EUA, se atrasaria em pelo menos um ano o processo de produção de uma bomba nuclear iraniana (em que pese todo o tempo o Irã negar que seu programa nuclear tivesse fins militares). Feita a proposta, o Irã recusou por vários motivos, entre os quais os de não aceitar que seu urânio ficasse em outro país e, basicamente, por nutrir forte desconfiança das reais intenções dos proponentes.

Apesar de até então ter relação superficial e ser mais distante de Lula do que o ex-presidente George W. Bush, Obama pediu um encontro com o brasileiro em julho de 2009, durante uma conferência de chefes de Estado. Obama lamentou que sua mão estendida ao Irã havia sido recusada. Sugeriu que o presidente do Brasil procurasse ajudar no entendimento com o Irã. Pela mesma época fez sugestão semelhante aos dirigentes da Turquia.

Na véspera da chegada do presidente do Irã ao Brasil, em novembro de 2009, Obama enviou uma carta, com os mesmos dizeres, ao Brasil e à Turquia, detalhando os termos que a seu ver pareciam ajustados para um acordo.

Um pouco antes, um enviado especial da Casa Branca, Bill Burns, veio ao Brasil e fez notar a Amorim que o fato de o P5+1 propor receber o urânio (LEU) do Irã significava que passava a haver por parte dessas potências um reconhecimento tácito da realidade do programa de enriquecimento nuclear iraniano. Isso foi dito por Lula a Ahmedinejad durante a visita, mas o iraniano deixou passar batido. No entanto, seu ministro de Relações Exteriores, Manouchehr Mottaki, que o acompanhava, tomou nota.
Durante os seis meses seguintes, Brasil e Turquia se empenharam profundamente em estabelecer um clima de confiança com o Irã e discutir cada aspecto do acordo. Amorim se multiplicava em sucessivas reuniões com as partes, e Lula, muito empenhado, mantinha Obama informado.

Obama começou a ficar pessimista. Numa reunião pedida por Lula e Recep Erdogan, primeiro-ministro turco, o presidente americano mostrou-se pouco à vontade, agressivo até. Reclamou do Irã, qualificou de “ingênuas” as negociações puramente diplomáticas. E fez uma declaração que deixou Lula e Amorim perplexos. Disse que com essa demora, era iminente um ataque de Israel ao Irã. Amorim comentaria com Lula: é um raro caso em que o protegido e não o protetor é quem tem a chave das iniciativas.

Rússia e China, membros do P5+1, tradicionais defensoras do Irã no Conselho de segurança da Nações Unidas, a ONU, surpreendentemente, aceitaram dar apoio às sanções. Em reuniões com os russos e chineses Amorim percebeu o motivo dessa ambiguidade: os países detentores de armas nucleares não apreciam que outros venham se juntar a esse clube restrito. Além disso, obtiveram garantia dos EUA de que seus negócios com o Irã não seriam prejudicados pelas sanções. Assim atuam as grandes potências, reflete o ex-chanceler brasileiro.

Amorim desenvolveu delicadas negociações com os iranianos em um lento processo de avanço. Em 16 de maio de 2010, Lula chegou a Teerã. Encontrou-se com Ahmedinejad e depois com o Líder Supremo, aiatolá Ali Khamenei. Não era comum que o Líder Supremo se encontrasse com chefes de Estado de países não islâmicos.

Data histórica: 17 de maio de 2010. Irã, Brasil e Turquia anunciam a declaração conjunta. Editorial de diário francês Le Monde: “Os livros de História vão guardar esta data, segunda-feira, 17 de maio, quando Brasil e Turquia propuseram à ONU o acordo negociado com o Irã”. Os itens principais:

1. Todos os países (Irã explicitamente citado) têm direito ao uso da energia nuclear para fins pacíficos, inclusive atividades de enriquecimento de urânio;
2. Aceitação da troca de materiais como ponto de partida para maior cooperação nesse campo:
3. O acordo deve ensejar o abandono da estratégia baseada em sanções;
4. Os parágrafos 5 a 8 descrevem os procedimentos relativos ao depósito de 1.200 quilos de urânio do Irã na Turquia e a notificação que Teerã devia fazer à AIEA;
5. A garantia de que o Irã deve receber, “em não mais de um ano”, os 120 quilos de combustível para o seu reator de pesquisa;
6. Enquanto estiver na Turquia, o LEU continuará a ser do Irã (se as cláusulas não fossem respeitadas pelo P5+1, o LEU será devolvido ao Irã).

Lula e Erdogan podiam festejar um êxito que poucos consideravam possível. Até mesmo Amorim estava surpreso com o resultado. A assinatura motivou manifestações de entusiasmo dos negociadores, registradas pelos fotógrafos, mas logo criticadas pela mídia brasileira, que só via dois países democráticos se confraternizando com um “tirano truculento”.

Amorim telefonou para Hillary Clinton, então secretária de Estado americana, que recebeu muito mal a notícia, dizendo que os EUA iam continuar a buscar ampliar as sanções. “Não se pode confiar no Irã”. A rejeição in limine de Hillary causou surpresa até pela linguagem anti-diplomática. A imprensa internacional observou que a razão da acidez de Hillary estava na relação entre a força do lobby israelense e suas pretensões a se candidatar à presidência dos EUA.

Os EUA rejeitaram o acordo. Segundo artigo publicado pelo diário The New York Times, “Washington, ao criticar o acordo e julgá-lo insuficiente, teria ‘mudado a trave de lugar’. O Premio Nobel da Paz El Baradei disse que recusar o acordo era o mesmo que “não aceitar um sim como resposta”.

O dia 9 de junho de 2010 certamente será histórico, diz Amorim. Foi quando o Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas aprovou novas sanções contra o Irã. Brasil e Turquia, então membros temporários do CS, votaram contra. Expressaram assim sua indignação pela rasteira que haviam tomado dos EUA.

Em 2015, cinco anos depois, e diante do fato de que o P5+1 e o Irã firmaram um acordo praticamente igual ao obtido em 2010, crescem as avaliações de que aquela foi uma oportunidade perdida. Com o agravante de que nesse período a população iraniana passou por grandes privações por conta das sanções. E, pior para o P5+1, se o Irã havia produzido 2 mil quilos de urânio levemente enriquecido em 2010, em 2015 já produzira cerca de 10 mil quilos.

Tempos depois, durante almoço em Brasilia, Sergey Lavrov, ministro russo de Relações Exteriores, disse a Amorim: “Se lembra do acordo que Brasil e Turquia negociaram? Se tivesse sido aceito por Washington, teríamos ganhado muito tempo”.

APROXIMAÇÃO COM OS PAÍSES ÁRABES

A segunda das três partes do livro trata da ação diplomática do Brasil para ampliar as relações comerciais e aproximar os países do Oriente Médio na linha Sul-Sul defendida por Lula. Em 19 março de 2003, o ex-presidente praticamente inaugurou sua política diplomática ao fazer vigoroso pronunciamento condenando o bombardeio do Iraque e o uso da violência ilegalmente (sem aval do CS).

O ataque ao Iraque havia posto fim a ilusões de uma ordem internacional pacífica após a Guerra Fria. Lula propôs uma nova geografia econômica e política. O mundo é maior que EUA e Europa, ele disse. Promoveu um relacionamento inédito com árabes e africanos. Propôs uma reunião conjunta de chefes de Estado dos países da América do Sul e dos países árabes.

O presidente brasileiro estava quebrando paradigmas na relação com países diferentes. Relações comerciais à frente, Lula não fugiu dos temas políticos, como criação do Estado Palestino, colinas de Golan, reconstrução do Iraque destruído pela guerra, reforma do CS da ONU e Rodada Doha da organização Mundial de Comércio. Lula dizia em seus discursos que estava “no poder” dos países em desenvolvimento mudar a geografia econômica do mundo.

Como parte dessa ofensiva, Amorim fez um périplo pelos países árabes. Chegou a comentar: “Não se pode fazer politica externa ativa sem avião próprio”. Num só dia tomou café da manhã no Qatar, almoçou no Kuwait e jantou no Líbano (ele e sua comitiva de seis auxiliares). Viajavam num Legacy da FAB, fabricado pela Embraer.

Os frutos comerciais logo apareceram. Os negócios entre Emirados Árabes Unidos e o Brasil quintuplicaram entre 2003 e 2013, com as exportações passando de 550 milhões de dólares para 2,6 bilhões de dólares. As exportações para a Arábia Saudita, de 800 milhões de dólares em 2004, saltaram para 3,5 bilhões de dólares em 2011.

Amorim passou ao ano de 2004 em visitas e preparativos da Cúpula América do Sul e Países Árabes, que se deu em maio de 2005. Lula dava grande ênfase a esse processo de aproximação. Em todos os fóruns também era posta em discussão a candidatura do Brasil a uma vaga permanente no CS. Muitos países manifestavam apoio. A Argentina destoava, fazia corpo mole. Para agradar, o ex-presidente argentino Eduardo Duhalde foi incluído nas viagens. O que poderia melhorar a disposição da Argentina? Em 2005, Amorim fez uma anotação premonitória no seu caderninho: “Quem sabe se o novo papa fosse argentino? Mas isso é lá com o Espírito Santo…”.

A reunião de cúpula foi muito representativa, contou com as presenças de chefes de Estado e de governo e de 1.200 empresários. “Raramente se veem tantos líderes árabes juntos”, disse o chanceler da Tunísia. Grande repercussão internacional: Le Monde e o espanhol El País avaliam o evento como “histórico”, “inédito”.

Logo depois, a diplomacia de Lula teve oportunidade de se mostrar na prática. Em resposta a um ataque do Hezbollah, em julho de 2006, Israel provocou grande destruição no Líbano. Muitos brasileiros ali residentes foram atingidos, sete mortos. Em operação inédita da nossa diplomacia, 3 mil brasileiros foram retirados em meio aos combates em comboios para a Síria e a Turquia. Deu muito trabalho ao Itamaraty coordenar a operação-resgate, mobilizar caminhões para comboios, pedir a Israel para não bombardeá-los, prover abrigos no destino e aviões para virem ao Brasil.

Outro momento de tensão em que a diplomacia brasileira interveio deu-se em fins de 2008, quando tropas de Israel atacaram Gaza. Ataque desproporcional, que resultou em 200 mortos, a maioria mulheres e crianças. Lula se manifestou indignadamente com a omissão dos outros países diante da “carnificina”. Queria algo mais que “notas condenatórias”. Amorim passou a trabalhar em favor de um cessar-fogo imediato, envolvendo-se em reuniões com todos os lados, Israel, Autoridade Nacional Palestina (ANP), Síria, Jordânia e Egito.

Último lance: em 3 de dezembro 2010, em resposta a uma solicitação de Mahmoud Abbas, da ANP, Lula afirmou que “o Brasil, por meio desta carta, reconhece o Estado Palestino nas fronteiras de 1967”. Foi logo seguido por todos os Estados sul-americanos, com exceção da Colômbia. A revista mensal americana Foreign Policy comentou: “o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu reformador ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, continuam a criar fatos novos no seu último mês de governo…”.

A RODADA DOHA DA OMC

A terceira parte do livro relata as negociações da chamada Rodada Doha, da OMC. De um lado, os países em desenvolvimento pleiteavam a redução e até a extinção dos subsídios pagos pelos países desenvolvidos aos seus produtores agrícolas, o que inviabilizava a agricultura nos países mais pobres, provocando a miséria e a fome. De seu lado, os países desenvolvidos requeriam a redução das barreiras alfandegárias dos países em desenvolvimento para seus produtos industriais. Amorim esteve engajado nessa tarefa desde 2003, quando assumiu o ministério de Relações Exteriores, até julho de 2008, quando as negociações foram suspensas sine die.

Em maio de 2005 havia esperança. O Brasil conseguiu que a União Europeia recuasse parcialmente em suas posições protecionistas. Le Monde escreveu: “sob pressão do Brasil, União Europeia cedeu e jogou fora algum lastro. Não está mal”. A revista britânica The Economist avaliou: “progresso, enfim”.

Na Conferência de Hong Kong houve duríssimas negociações sobre redução de subsídios agrícolas, com forte resistência da União Europeia. Amorim chegou a anunciar sua retirada das negociações. Voltou, instado pelo representante dos EUA, que disse que algum avanço havia sido dado sobre a data em que os subsídios seriam reduzidos ou totalmente cortados – 2010 – ou até 2013.

Na reunião de Genebra, em julho de 2008, a Rodada Doha fracassou. As posições dos participantes se enrijeceram. Com isso, acabaram por derrubar qualquer solução para o impasse. Em 29 de julho, quatro dias depois do prazo previsto para o encerramento da reunião foi anunciado o colapso das negociações.

Amorim previu que seriam necessários três ou quatro anos para recompor um pacote que permitisse chegar a um acordo. “Com otimismo”, diz ele, já que as negociações não foram retomadas.

Em discurso na Assembleia Geral da ONU, em 2010, Amorim comentou que “os países desenvolvidos não haviam demonstrado o compromisso necessário com a estabilidade econômica global (…). Em nenhuma outra área isso é tão evidente quanto na Rodada Doha da OMC. Uma solução equilibrada nesse processo, que se estende por quase dez anos, favoreceria, com o fim dos subsídios distorcidos e das barreiras protecionistas, a expansão econômica e o desenvolvimento nos países mais pobres, as principais vítimas da visão estreita e mesquinha que ainda prevalece em relação ao comércio internacional”.

Assim se encerrou esse período em que o Brasil se inseriu no “grande jogo” da política internacional. Nas três grandes empreitadas em que se envolveu, apenas teve sucesso na aproximação com os países árabes. O fato é que a diplomacia do “poder suave” (soft power), o caminho das negociações, proposto por Lula, não foi capaz de mudar as relações internacionais. É o caso de perguntar, parafraseando Joseph Stálin: quantas bombas nucleares tem o Brasil?

Os biblistas e a Palestina ocupada

Todos conhecemos a gravidade da luta pela terra na Palestina.

Leia Biblical Scholarship and the Israeli-Palestinian Conflict, texto escrito por Julia M. O’Brien, do Lancaster Theological Seminary, Lancaster, PA, USA, na revista The Bible and Interpretation.

Ela se espantou com a intensidade da presença israelense nos territórios palestinos. E pergunta: What role do–and should–biblical scholars play in the Israeli-Palestinian conflict? Qual é o papel dos estudiosos de Bíblia no conflito Israel-Palestina?

Ela diz, no começo do texto:

Essa é uma das questões que enfrento depois de regressar de 17 dias de viagem pela Cisjordânia e Israel. Eu estava co-liderando um grupo de 21 estudantes de teologia da minha instituição em uma experiência transcultural internacional necessária do cristianismo em uma situação minoritária ou tênue. Não visitava a região desde 1999 e fiquei chocada com a deterioração da situação. Esta foi a minha primeira experiência com o “separation wall” e as “warrior fences”, e embora já tivesse visitado assentamentos israelenses na Cisjordânia, nunca tinha visto tantos ou testemunhado tantas construções ativas.

That’s one of the questions I face after returning from 17 days traveling in the West Bank and Israel. I was co-leading a group of 21 theological students from my institution on a required international cross-cultural experience of Christianity in a minority or otherwise tenuous situation. I had not visited the area since 1999 and was shocked by the deterioration of the situation. This was my first experience of the “separation wall” and “warrior fences,” and while I had visited Israeli settlements in the West Bank before I had never seen so many or witnessed so much active construction.

E quase no final:

E, no entanto, esta viagem convenceu-me ainda mais de que é também a minha missão como educadora teológica desafiar uma identificação acrítica do Israel bíblico com as políticas do Estado israelita moderno. A situação atual é o produto de impérios e de respostas pós-coloniais ao império, e não simplesmente uma continuação divinamente decretada do conflito entre Ismael e Isaac. Assim como o meu ensino sublinha a diferença entre as construções antigas e modernas de gênero, sexualidade e justiça econômica, também precisa estabelecer uma distância crítica entre o passado e o presente em termos de distribuição justa de terras.

And yet, this trip has further convinced me that it is also my mission as a theological educator to challenge an uncritical identification of biblical Israel with the policies of the modern Israeli state. The current situation is the product of empires and post-colonial responses to empire, not simply a divinely-decreed continuation of the conflict between Ishmael and Isaac. Just as my teaching underscores the difference between ancient and modern constructions of gender, sexuality, and economic justice, it also needs to establish a critical distance between past and present in terms of just distribution of land.

O Brasil e o conflito no Oriente Médio

“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quarta-feira [11/11/2009], depois de uma reunião com o presidente de Israel, Shimon Peres, que para construir a paz no Oriente Médio é necessário dialogar com todas as forças envolvidas. Questionado sobre o fato de o Brasil se dizer amigo de Israel, mas, ao mesmo tempo, estar se preparando para a visita do presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, Lula disse que vai receber o líder iraniano por ‘uma razão muito simples’. ‘Você não constrói a paz necessária no Oriente Médio se não conversar com todas as forças políticas e religiosas, que querem paz e que se opõem à paz’, disse. ‘Ou você transforma o processo de negociação em um clube de amigos em que todos estão concordando com uma coisa e os que discordam ficam de fora, portanto a paz não será possível nunca’, afirmou o presidente. ‘Não temos veto a conversar com quem quer que seja desde que daquela conversa você extraia uma palavra, ou apenas uma vírgula que possa contribuir para que a gente possa definitivamente construir uma paz duradoura e para sempre no Oriente Médio.’ Ahmadinejad, que é considerado um inimigo por Israel, chega ao Brasil no dia 23, menos de duas semanas depois da visita de Peres” (Folha Online – BBC Brasil: 11/11/2009 – 18h04)

“O presidente palestino, Mahmoud Abbas, chegou ao Brasil para uma visita oficial de três dias em que deverá buscar o apoio do governo brasileiro ao plano de declaração unilateral de independência da Palestina”, em Abbas chega ao Brasil em busca de apoio à independência palestina – Folha Online – BBC Brasil: 20/11/2009 – 07h28

“Em encontro com o líder da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, o presidente Lula foi econômico nas palavras e preciso na análise. Quanto mais tempo o governo de Israel persistir com as violações da lei humanitária internacional, mais distante fica a possibilidade de uma solução negociada para o conflito no Oriente Médio. Enquanto não for destruído o muro erguido na Cisjordânia para anexar ilegalmente terras, e não forem garantidos aos palestinos os direitos de propriedade, de ir e vir, e de buscar saúde, educação e emprego, qualquer enunciado sobre a paz será apenas uma ironia semântica. Um discurso que admite a realidade do que é virtual, mas que não pode ser colocado no plano lógico daquilo que já tenha adquirido existência concreta. É necessário, mais uma vez, reconhecer que, respaldado pelo imperialismo norte-americano na região, a construção incessante de assentamentos em território ocupado obedece a uma lógica clara. O governo israelense joga todo o seu peso em uma solução definitiva para o ‘problema palestino’: uma solução que vem contemplando o massacre e o apartheid”, diz Gilson Caroni em Israel: qual a arquitetura do muro? (Carta Maior: 20/11/2009)

“A posição da administração Obama sobre as colônias é clara e inequívoca. Não mudou: os Estados Unidos não aceitam como legítimo continuar com os assentamentos israelenses”, disse Hillary Clinton, segundo a Folha Online: 02/11/2009 – 19h29.

A guerra contra o terrorismo e os cristãos

Uma entrevista de Stanley Hauerwas, Professor de Ética Teológica na Duke University Divinity School, Durham NC, USA, que se afirma como um cristão pacifista e é um especialista em teoria da guerra justa, me chamou a atenção.

A entrevista foi publicada pelo Religion News Service e reproduzida pelo National Catholic Reporter, em 10/11/2009. Traduzida para o português e reproduzida por Notícias – IHU On-Line em 14/11/2009.

Destaco quatro trechos, transcritos aqui em inglês e português a partir das fontes indicadas:


RNS: What should President Obama do about Afghanistan?
Hauerwas: Afghanistan was understood to be part of the war against terror, and that was a decisive mistake because as soon as you said we are at war, you gave Osama bin Laden what he wanted — he became a warrior, and not just a murderer. I would be much happier with a whole reconsideration of our involvement there — not as a war, but as a police function, and how the police might intervene to arrest bin Laden. I know that sounds utopian, but just try thinking you’re going to win a war in Afghanistan. I can’t imagine anything more utopian than that. Ask the British. Ask the Russians. It’s never going to happen.

O que o presidente Obama deveria fazer com relação ao Afeganistão?
O Afeganistão foi entendido como parte de uma guerra contra o terrorismo, e esse foi um erro decisivo, porque, tão logo se disse que estávamos em guerra, demos a Osama bin Laden o que ele queria – ele se tornou um guerreiro, não apenas um assassino. Eu ficaria muito mais feliz com uma reconsideração total de nosso envolvimento lá – não apenas como uma guerra, mas como uma função política e como essa política pode intervir para prender Bin Laden. Eu sei que isso parece utópico. Mas tente apenas pensar que vamos vencer a guerra no Afeganistão. Eu não posso imaginar nada mais utópico do que isso. Pergunte aos britânicos. Pergunte aos russos. Isso nunca vai acontecer.

How would you assess the church’s response to the Iraq war?
Awful. Christians — and it started with Sept. 11, as soon as we said we are at war — Christians said, “That’s us.” We never asked the hard questions about the war on terror, and that is, I think, why Iraq happened. It has everything to do with the inability to distinguish between the Christian “we” and the American “we.”

Como você avalia a resposta da Igreja à guerra do Iraque?
Terrível. Os cristãos – e eu comecei com o 11 de setembro, assim que dissemos que estávamos em guerra – disseram: “Somos nós”. Nunca nos fizemos as difíceis questões sobre a guerra contra o terror, e foi por isso, acredito eu, que a guerra do Iraque aconteceu. Tem tudo a ver com a inabilidade de distinguir entre o “nós”, cristãos, e o “nós”, norte-americanos.

So does the church need a service of repentance?
The church has lost its ability to be a disciplined community because we’re now, religiously, in a buyer’s market. Christianity has to bill itself as very good for your self-realization, and that’s killing us because we’re not very good for your self-realization. We’re good for your salvation, which is not the same thing.

Então a Igreja precisa de um ato de arrependimento?
A Igreja perdeu sua habilidade de ser uma comunidade disciplinada porque nós agora, religiosamente, somos um mercado de compras. O cristianismo tem que se vender como algo muito bom para a autorrealização das pessoas, e isso está nos matando, porque não somos muito bons para a autorrealização das pessoas. Somos bons para a salvação das pessoas, o que não é a mesma coisa.

If Obama were to call you for advice on Afghanistan, what would you say?
I’d say you have to tell the American people some really hard truths, namely that the war on terror was a mistake and we’ve got to start, as Americans, learning to live in a world that we don’t control. That’s not going to make you very popular.

Se Obama o chamasse para aconselhá-lo sobre o Afeganistão, o que você lhe diria?
Eu diria: “Você precisa dizer ao povo norte-americano algumas verdades realmente duras, a saber, que a guerra contra o terrorismo foi um erro e que precisamos começar, nós, norte-americanos, a aprender a viver em um mundo que não controlamos. E isso não vai fazer com que você seja muito popular”.

Leia Mais:
Homem que planejou ataques de 11 de Setembro será julgado em NY – Folha Online: 13/11/2009 – 10h48
Procurador-geral dos EUA pede pena de morte para mentores do 11 de Setembro – Folha Online: 13/11/2009 – 14h34

Crimes de guerra em Gaza: por que Israel podia?

Os soldados israelenses que lutaram durante os 22 dias da recente ofensiva contra o movimento islâmico radical Hamas, na faixa de Gaza, admitiram que mataram civis [ao menos 900, segundo números do ministério palestino] que não representavam ameaça às tropas e destruíram intencionalmente suas propriedades, “simplesmente porque podiam”. As declarações foram divulgadas em reportagem publicada nesta quinta-feira pelo jornal israelense “Haaretz”…

Clique nos links abaixo:

:: Soldados de Israel relatam assassinatos de crianças e vandalismo em Gaza – Folha Online: 19/03/2009 – 10h50

:: Soldado israelense denuncia que rabinos incitaram “guerra religiosa” em Gaza – Folha Online: 20/03/2009 – 14h15

:: Exército de Israel ordenou ataque contra equipes de resgate em Gaza, diz “Haaretz” – Folha Online: 23/03/2009 – 12h37

:: General israelense admite que tática usada em Gaza provocou morte de civis – Folha Online: 24/03/2009 – 09h16

Podres poderes: da semântica à hermenêutica

Software israelense manobra opiniões na internet

Uma arma… se destacou pela eficiência… continuará sendo usada mesmo após o cessar-fogo [em Gaza]… nos bastidores da internet, modificando resultados de enquetes on-line, entupindo caixas de e-mails… e ajudando a protestar contra notícias desfavoráveis à comunidade israelense. O nome da ferramenta é Megaphone, um software… O programa serve para mobilizar internautas pelo mundo dispostos a manobrar… opiniões na rede… O internauta disposto a fazer parte do arrastão cibernético [sublinhado meu] precisa baixar um programa… Instalada a plataforma, aparecem no computador alertas em tempo real sobre notícias, enquetes, artigos, vídeos ou blogs que estejam com visões “a favor ou contra” a comunidade… O internauta é convidado, a partir daí, a “agir por Israel” – enchendo os alvos de críticas, elogios ou votos… Esse tipo de estratégia, que recebeu o apoio do Ministério das Relações Exteriores de Israel… O que se destaca neste caso, no entanto, é o modo de atuação do programa, que institucionaliza a manipulação de informação de forma coordenada e colaborativa [sublinhado meu].

Fonte: Diógenes Muniz, editor de Informática da Folha Online – 19/01/2009 – 12h06

Manipular: do francês manipuler (1765) ‘manejar uma substância ou um instrumento para fins científicos ou técnicos’, (1842) ‘exercer influência sobre alguém’; cf. latim medieval manipulo, as, ávi, átum, áre ‘conduzir pela mão’ (Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa – Versão 1.0 – Dezembro de 2001, verbete manipular).

Teocracias

Intelectuais criticam desobediência de Israel às leis internacionais

O permanente desrespeito ao Direito Internacional e ao Direito Internacional Humanitário por Israel em relação aos territórios e à população palestina esteve no centro do debate promovido nesta terça-feira (13) pela Comissão Teotônio Vilela de Direitos Humanos no Memorial da América Latina.

A conferência contou com a presença de intelectuais e políticos que expressaram o desejo da sociedade civil brasileira em assistir ao fim imediato dos ataques sobre a Faixa de Gaza. Outro objetivo do encontro foi instar o Itamaraty a posicionar-se de maneira contundente em favor de uma solução definitiva para a disputa. Mais de 900 palestinos já morreram vítimas da ofensiva israelense iniciada no dia 27 de dezembro. O número de feridos gira em torno de 4 mil.

“Julgamos urgente e imperativo o cessar-fogo imediato, a suspensão dos bombardeios e dos ataques por terra a Gaza e a proibição do lançamento de foguetes do Hamas sobre território israelense”, diz o documento conjunto assinado pela Comissão. “Deve ainda haver a retirada completa das tropas de Israel, a reabertura dos pontos de acesso para a entrada da ajuda humanitária e a pronta retomada do diálogo pacífico.”

Nesta segunda-feira (12) o Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou por 33 votos a favor e um contra – proferido pelo Canadá – uma resolução em que “condena fortemente” as operações militares israelenses por empreenderem “violações massivas” dos direitos humanos e destruírem “sistematicamente” a infraestrutura palestina. Coreia do Sul, Japão e mais 11 países europeus se abstiveram da votação.

“Ficamos decepcionados pela resolução não ter sido aprovada por consenso”, diz Sílvio Albuquerque, chefe da divisão de Temas Sociais do Itamaraty. O diplomata demonstra preocupação com a aplicação dos pontos aprovados pelas Nações Unidas, uma vez que Israel desqualificou as novas exigências do Conselho de Direitos Humanos da mesma maneira que fez com as anteriores. Na semana passada o governo israelense desconsiderou o pedido de cessar-fogo enviado pelo Conselho de Segurança.

“O périplo do ministro Celso Amorim pelo Oriente Médio faz parte de um esforço diplomático para a realização de uma convenção pela paz com a participação de países que extrapolem o quarteto Estados Unidos, União Européia, ONU e Rússia”. Albuquerque acredita que as negociações realizadas apenas com as principais potências mundiais até agora não conseguiram promover avanços permanentes na questão palestina.

Impunidade
O jurista Fábio Konder Comparato acredita que Israel comete crimes contra a humanidade em Gaza e que se beneficia do fato de não estar vinculado ao Tribunal Penal Internacional. “Isso não pode ser admitido. Gostaria que o Brasil apresentasse uma proposta ao Tribunal para que os Estados que não fazem parte do estatuto possam ser alvo de um inquérito criminal preliminar que apure suas responsabilidades”, explica o jurista.

Caso o governo israelense siga descumprindo a legislação humanitária e as exigências da ONU, Comparato acredita que a comunidade internacional deve agir da mesma maneira como procedeu com o regime do apartheid na África do Sul. “Uma medida que nos resta é o boicote econômico. E isso diz respeito diretamente ao Brasil, uma vez que Israel é parceiro preferencial do Mercosul.”

O deputado federal Fernando Gabeira, membro da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, acredita que o governo brasileiro deve ouvir tanto os parlamentares como a sociedade civil no momento de posicionar-se sobre os ataques israelenses. “Como deputado, quero ajudar na evacuação de brasileiros residentes em Gaza, além de estimular a continuidade da ajuda humanitária que o Brasil tem enviado à Palestina e intervir da melhor maneira possível nas longas negociações de paz que virão.”

Gabeira lembra que o mundo deve estar atento ao surgimento de um novo ator político internacional no dia 20 de janeiro: Barack Obama, que assume a presidência dos Estados Unidos dizendo-se “preocupado” com a morte de civis no conflito.

Paulo Sérgio Pinheiro, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, concorda com a avaliação e acredita que “não haverá nenhuma mudança relevante na postura israelense antes da posse de Obama”.

Teocracias
A filósofa Marilena Chauí analisa que o mundo assiste no Oriente Médio à perda do referencial republicano, laico e democrático na política. “Existe uma forte concepção teológica em ambas as partes envolvidas na questão palestina.”

Segundo a professora da USP, quando a política é vista como extensão de uma divindade, não há nada que os homens possam fazer senão matar e morrer em seu nome. “A disputa para saber quem é o verdadeiro eleito por deus para ocupar a Palestina é uma ideia que justifica razões militares, econômicas e sociais”, analisa.

Marilena Chauí cita o pensador judeu Baruch de Espinoza – excomungado em 1656 devido a seus escritos sobre deus – para dizer que a paz não é a ausência de guerra, mas a virtude política por excelência. “Toda paz unilateral é na verdade a imposição da vontade do vencedor sobre o vencido.”

Chauí acredita que a ideia mesma de “território ocupado” e de “refugiados” tem que desaparecer porque não pode haver paz entre ocupante e ocupado. “Nosso programa mínimo tem que ser a constituição de dois estados na Palestina.”

Fonte: Tadeu Breda – Carta Maior – 13/01/2009

Sombração

Lá em Minas, minha terra, se alguém fizer uma barbaridade destas, será atormentado por assombrações todas as noites, costumamos dizer.

Até virar uma.

Será que vale só em Minas?

Tomara que não!