A invasão de Judá por Senaquerib: as fontes

ELAYI, J. Sennacherib, King of Assyria. Atlanta: SBL, 2018, p. 69-70 diz:

Há uma notável variedade de fontes: as inscrições de Senaquerib registrando o episódio várias vezes com várias variantes, relatos bíblicos (2Rs 18,13-19,37; Is 36-37; 2Cr 32), representações em relevos assírios, descobertas arqueológicas, fontes egípcias e gregas e fontes problemáticas.

A principal dificuldade para o historiador é o fato de existirem várias contradições entre essas fontes e nenhuma delas ser totalmente confiável. No entanto, alguns autores parecem acreditar que as fontes relacionadas ao seu campo de pesquisa são as melhores; outros, estudando a história de Israel e Judá, consideram as inscrições reais assírias como fontes confiáveis ​​de informações históricas sobre os eventos dessa região. Como é sabido, as inscrições reais assírias são caracterizadas por intenções ideológicas e propagandísticas, que devem ser detectadas usando uma abordagem crítica. Os relatos bíblicos são ainda mais problemáticos porque o texto passou por uma elaborada história de redação e edição. As fontes assírias engrandecem a honra de Senaquerib, enquanto os relatos bíblicos sublinham a honra de Javé.

O melhor método seria considerar cada uma das fontes com uma abordagem crítica rigorosa e combiná-las todas para alcançar o melhor entendimento possível da fase judaica da terceira campanha de Senaquerib, mesmo que alguns autores tenham escrito que reconciliar todas as fontes é inaceitável ou impossível.

O número de monografias e artigos dedicados a esse assunto desde o século XIX até o presente é tão grande que nem todos podem ser considerados e analisados. As principais pesquisas úteis desta bibliografia são as de Brevard S. Childs, Lester L. Grabbe, William R. Gallagher e Nazek Khalid Matty.

 

Bibliografia em língua inglesa

:: Inscrições de Senaquerib
GRAYSON, A. K. ; NOVOTNY, J. The Royal Inscriptions of Sennacherib, King of Assyria (704–681 BC). 2 vols. RINAP 3.1–2. Winona Lake, IN: Eisenbrauns, 2012–2014. Online aqui. Cf. o texto sobre a invasão de Judá por Senaquerib aqui [clique em Sennacherib [261] > Sennacherib 022 – Chicago/Taylor Prism, leia a partir de (iii 18)].
LAATO, A. Assyrian Propaganda and the Falsification of History in the Royal Inscriptions of Sennacherib. VT 45, p. 198–226, 1995.

:: Relevos assírios
RUSSELL, J. M. Sennacherib’s Palace without Rival at Nineveh. Chicago: University of Chicago Press, 1991.
MATTY, N. K. Sennacherib’s Campaign against Judah and Jerusalem in 701 B.C.: A Historical Reconstruction. Berlin: de Gruyter, 2016.

:: Descobertas arqueológicas
GRABBE, L. L. (ed.) ‘Like a Bird in a Cage’: The Invasion of Sennacherib in 701 BCE. Sheffield: Sheffield Academic Press, 2003.

:: Fontes problemáticas
GALLAGHER, W. R. Sennacherib’s Campaign to Judah: New Studies. Leiden: Brill, 1999, p. 9-21.

:: Fontes bíblicas
BOSTOCK, D. A Portrayal of Trust: The Theme of Faith in the Hezekiah Narratives. Milton Keynes, UK: Paternoster, 2006.

Para saber onde consultar fontes assírias, clique aqui. Algumas dessas obras podem ser encontradas aqui.

 

Bibliografia consultada pela autora
CHILDS, B. S. Isaiah and the Assyrian Crisis. London: SCM, 1967.
GALLAGHER, W. R. Sennacherib’s Campaign to Judah: New Studies. Leiden: Brill, 1999.
GRABBE, L. L. (ed.) ‘Like a Bird in a Cage’: The Invasion of Sennacherib in 701 BCE. Sheffield: Sheffield Academic Press, 2003.
MATTY, N. K. Sennacherib’s Campaign against Judah and Jerusalem in 701 B.C.: A Historical Reconstruction. Berlin: de Gruyter, 2016.

ELAYI, J. Sennacherib, King of Assyria. Atlanta: SBL, 2018

There are a remarkable variety of sources: Sennacherib’s inscriptions recording the episode several times with a number of variants, biblical accounts (2 Kgs 18:13–19:37; Isa 36–37; 2 Chr 32), representations on Assyrian reliefs, archaeological discoveries, Egyptian and Greek sources, and problematic sources. The main difficulty for the historian is the fact that several contradictions exist between these sources and that none of them is entirely reliable. However, some authors seem to believe that the sources related to their field of research are the best; others, studying the history of Israel and Judah, consider the Assyrian royal inscriptions as reliable sources of historical information concerning the events of this region. As is well known, the Assyrian royal inscriptions are characterized by ideological and propagandistic intentions, which have to be detected using a critical approach. The biblical accounts are still more problematic because the text has gone through an elaborate history of writing and editing. The Assyrian sources were intended to enhance the honor of Sennacherib, while the biblical accounts seek to enhance the honor of Yahweh. The best method would be to consider each of the sources with an adapted critical approach and to combine them all in order to reach the best possible understanding of the Judean phase of Sennacherib’s third campaign, even if some authors have written that reconciling all the sources is unacceptable or impossible. The number of monographs and articles dedicated to this subject from the nineteenth century up to the present is so large that they cannot all be considered and analyzed. The main useful surveys of this bibliography are those of Brevard S. Childs, Lester L. Grabbe, William R. Gallagher, and Nazek Khalid Matty.

Francisco e a pandemia do coronavírus

Desde há semanas que parece o entardecer, parece cair a noite. Densas trevas cobriram as nossas praças, ruas e cidades; apoderaram-se das nossas vidas, enchendo tudo dum silêncio ensurdecedor e um vazio desolador, que paralisa tudo à sua passagem: pressente-se no ar, nota-se nos gestos, dizem-no os olhares. Revemo-nos temerosos e perdidos.

Caiu a maquilhagem dos estereótipos com que mascaramos o nosso «eu» sempre preocupado com a própria imagem; e ficou a descoberto, uma vez mais, aquela (abençoada) pertença comum a que não nos podemos subtrair: a pertença como irmãos.

As nossas vidas são tecidas e sustentadas por pessoas comuns (habitualmente esquecidas), que não aparecem nas manchetes dos jornais e revistas, nem nas grandes passarelas do último espetáculo, mas que hoje estão, sem dúvida, a escrever os acontecimentos decisivos da nossa história: médicos, enfermeiros e enfermeiras, trabalhadores dos supermercados, pessoal da limpeza, curadores, transportadores, forças policiais, voluntários, sacerdotes, religiosas e muitos – mas muitos – outros que compreenderam que ninguém se salva sozinho.

Nos apercebemos de que não podemos continuar estrada cada qual por conta própria, mas só o conseguiremos juntos.

Momento extraordinário de oração em tempo de epidemia presidido pelo Papa Francisco - Adro da Basílica de São Pedro - 27 de março de 2020

Assista ao vídeo.

 

Momento extraordinário de oração em tempo de epidemia

Presidido pelo Papa Francisco

Adro da Basílica de São Pedro – 27 de março de 2020

«Ao entardecer…» (Mc 4, 35): assim começa o Evangelho, que ouvimos. Desde há semanas que parece o entardecer, parece cair a noite. Densas trevas cobriram as nossas praças, ruas e cidades; apoderaram-se das nossas vidas, enchendo tudo dum silêncio ensurdecedor e um vazio desolador, que paralisa tudo à sua passagem: pressente-se no ar, nota-se nos gestos, dizem-no os olhares. Revemo-nos temerosos e perdidos. À semelhança dos discípulos do Evangelho, fomos surpreendidos por uma tempestade inesperada e furibunda. Demo-nos conta de estar no mesmo barco, todos frágeis e desorientados mas ao mesmo tempo importantes e necessários: todos chamados a remar juntos, todos carecidos de mútuo encorajamento. E, neste barco, estamos todos. Tal como os discípulos que, falando a uma só voz, dizem angustiados «vamos perecer» (cf. 4, 38), assim também nós nos apercebemos de que não podemos continuar estrada cada qual por conta própria, mas só o conseguiremos juntos.

Rever-nos nesta narrativa, é fácil; difícil é entender o comportamento de Jesus. Enquanto os discípulos naturalmente se sentem alarmados e desesperados, Ele está na popa, na parte do barco que se afunda primeiro… E que faz? Não obstante a tempestade, dorme tranquilamente, confiado no Pai (é a única vez no Evangelho que vemos Jesus a dormir). Acordam-No; mas, depois de acalmar o vento e as águas, Ele volta-Se para os discípulos em tom de censura: «Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?» (4, 40).

Procuremos compreender. Em que consiste esta falta de fé dos discípulos, que se contrapõe à confiança de Jesus? Não é que deixaram de crer N’Ele, pois invocam-No; mas vejamos como O invocam: «Mestre, não Te importas que pereçamos?» (4, 38) Não Te importas: pensam que Jesus Se tenha desinteressado deles, não cuide deles. Entre nós, nas nossas famílias, uma das coisas que mais dói é ouvirmos dizer: «Não te importas de mim». É uma frase que fere e desencadeia turbulência no coração. Terá abalado também Jesus, pois não há ninguém que se importe mais de nós do que Ele. De facto, uma vez invocado, salva os seus discípulos desalentados.

A tempestade desmascara a nossa vulnerabilidade e deixa a descoberto as falsas e supérfluas seguranças com que construímos os nossos programas, os nossos projetos, os nossos hábitos e prioridades. Mostra-nos como deixamos adormecido e abandonado aquilo que nutre, sustenta e dá força à nossa vida e à nossa comunidade. A tempestade põe a descoberto todos os propósitos de «empacotar» e esquecer o que alimentou a alma dos nossos povos; todas as tentativas de anestesiar com hábitos aparentemente «salvadores», incapazes de fazer apelo às nossas raízes e evocar a memória dos nossos idosos, privando-nos assim da imunidade necessária para enfrentar as adversidades.

Com a tempestade, caiu a maquilhagem dos estereótipos com que mascaramos o nosso «eu» sempre preocupado com a própria imagem; e ficou a descoberto, uma vez mais, aquela (abençoada) pertença comum a que não nos podemos subtrair: a pertença como irmãos.

«Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?» Nesta tarde, Senhor, a tua Palavra atinge e toca-nos a todos. Neste nosso mundo, que Tu amas mais do que nós, avançamos a toda velocidade, sentindo-nos em tudo fortes e capazes. Na nossa avidez de lucro, deixamo-nos absorver pelas coisas e transtornar pela pressa. Não nos detivemos perante os teus apelos, não despertamos face a guerras e injustiças planetárias, não ouvimos o grito dos pobres e do nosso planeta gravemente enfermo. Avançamos, destemidos, pensando que continuaríamos sempre saudáveis num mundo doente. Agora nós, sentindo-nos em mar agitado, imploramos-Te: «Acorda, Senhor!»

«Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?» Senhor, lanças-nos um apelo, um apelo à fé. Esta não é tanto acreditar que Tu existes, como sobretudo vir a Ti e fiar-se de Ti. Nesta Quaresma, ressoa o teu apelo urgente: «Convertei-vos…». «Convertei-Vos a Mim de todo o vosso coração» (Jl 2, 12). Chamas-nos a aproveitar este tempo de prova como um tempo de decisão. Não é o tempo do teu juízo, mas do nosso juízo: o tempo de decidir o que conta e o que passa, de separar o que é necessário daquilo que não o é. É o tempo de reajustar a rota da vida rumo a Ti, Senhor, e aos outros. E podemos ver tantos companheiros de viagem exemplares, que, no medo, reagiram oferecendo a própria vida. É a força operante do Espírito derramada e plasmada em entregas corajosas e generosas. É a vida do Espírito, capaz de resgatar, valorizar e mostrar como as nossas vidas são tecidas e sustentadas por pessoas comuns (habitualmente esquecidas), que não aparecem nas manchetes dos jornais e revistas, nem nas grandes passarelas do último espetáculo, mas que hoje estão, sem dúvida, a escrever os acontecimentos decisivos da nossa história: médicos, enfermeiros e enfermeiras, trabalhadores dos supermercados, pessoal da limpeza, curadores, transportadores, forças policiais, voluntários, sacerdotes, religiosas e muitos – mas muitos – outros que compreenderam que ninguém se salva sozinho. Perante o sofrimento, onde se mede o verdadeiro desenvolvimento dos nossos povos, descobrimos e experimentamos a oração sacerdotal de Jesus: «Que todos sejam um só» (Jo 17, 21). Quantas pessoas dia a dia exercitam a paciência e infundem esperança, tendo a peito não semear pânico, mas corresponsabilidade! Quantos pais, mães, avôs e avós, professores mostram às nossas crianças, com pequenos gestos do dia a dia, como enfrentar e atravessar uma crise, readaptando hábitos, levantando o olhar e estimulando a oração! Quantas pessoas rezam, se imolam e intercedem pelo bem de todos! A oração e o serviço silencioso: são as nossas armas vencedoras.

«Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?» O início da fé é reconhecer-se necessitado de salvação. Não somos autossuficientes, sozinhos afundamos: precisamos do Senhor como os antigos navegadores, das estrelas. Convidemos Jesus a subir para o barco da nossa vida. Confiemos-Lhe os nossos medos, para que Ele os vença. Com Ele a bordo, experimentaremos – como os discípulos – que não há naufrágio. Porque esta é a força de Deus: fazer resultar em bem tudo o que nos acontece, mesmo as coisas ruins. Ele serena as nossas tempestades, porque, com Deus, a vida não morre jamais.

O Senhor interpela-nos e, no meio da nossa tempestade, convida-nos a despertar e ativar a solidariedade e a esperança, capazes de dar solidez, apoio e significado a estas horas em que tudo parece naufragar. O Senhor desperta, para acordar e reanimar a nossa fé pascal. Temos uma âncora: na sua cruz, fomos salvos. Temos um leme: na sua cruz, fomos resgatados. Temos uma esperança: na sua cruz, fomos curados e abraçados, para que nada e ninguém nos separe do seu amor redentor. No meio deste isolamento que nos faz padecer a limitação de afetos e encontros e experimentar a falta de tantas coisas, ouçamos mais uma vez o anúncio que nos salva: Ele ressuscitou e vive ao nosso lado. Da sua cruz, o Senhor desafia-nos a encontrar a vida que nos espera, a olhar para aqueles que nos reclamam, a reforçar, reconhecer e incentivar a graça que mora em nós. Não apaguemos a mecha que ainda fumega (cf. Is 42, 3), que nunca adoece, e deixemos que reacenda a esperança.

Abraçar a sua cruz significa encontrar a coragem de abraçar todas as contrariedades da hora atual, abandonando por um momento a nossa ânsia de omnipotência e possessão, para dar espaço à criatividade que só o Espírito é capaz de suscitar. Significa encontrar a coragem de abrir espaços onde todos possam sentir-se chamados e permitir novas formas de hospitalidade, de fraternidade e de solidariedade. Na sua cruz, fomos salvos para acolher a esperança e deixar que seja ela a fortalecer e sustentar todas as medidas e estradas que nos possam ajudar a salvaguardar-nos e a salvaguardar. Abraçar o Senhor, para abraçar a esperança. Aqui está a força da fé, que liberta do medo e dá esperança.

«Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?» Queridos irmãos e irmãs, deste lugar que atesta a fé rochosa de Pedro, gostaria nesta tarde de vos confiar a todos ao Senhor, pela intercessão de Nossa Senhora, saúde do seu povo, estrela do mar em tempestade. Desta colunata que abraça Roma e o mundo desça sobre vós, como um abraço consolador, a bênção de Deus. Senhor, abençoa o mundo, dá saúde aos corpos e conforto aos corações! Pedes-nos para não ter medo; a nossa fé, porém, é fraca e sentimo-nos temerosos. Mas Tu, Senhor, não nos deixes à mercê da tempestade. Continua a repetir-nos: «Não tenhais medo!» (Mt 14, 27). E nós, juntamente com Pedro, «confiamos-Te todas as nossas preocupações, porque Tu tens cuidado de nós» (cf. 1 Ped 5, 7).