Os Biblistas Mineiros e a necessidade do método

Bíblia: Teoria e Prática – Leituras de Rute. Qual é o enfoque de cada artigo? Para que o leitor saiba o que lhe oferecemos, transcrevo aqui algumas linhas de cada um dos nove artigos que compõem esta número da Estudos Bíblicos 98, que acaba de ser publicada.

Editorial: Telmo José A. de Figueiredo

PARTE I

:: Agenda para o estudo de um texto bíblico – p. 11-32
Johan Konings – Mestre em Filologia Bíblica, 1968, e Doutor em Teologia pela Katholieke Universiteit Leuven, Bélgica, 1972.
Súsie Helena Ribeiro
Apresentamos aqui a agenda daquilo que parece fundamental para a leitura atenta de um texto bíblico. Leitura que faça jus ao texto, não mera leitura de consulta para satisfazer a curiosidade, fundamentar um dogma ou dar autoridade a uma ideologia; mas empenho em ler o texto como texto, como uma entidade, quase uma pessoa que se apresenta a nós face a face (…) Ora, se Carlos Mesters chamou a Bíblia de “livro feito em mutirão”, pode-se dizer que também a leitura e o estudo melhor se fazem em mutirão. Determinadas tarefas podem ser realizadas pela comunidade (…) outras (…) exigirão algum “engenheiro”, que, no seu gabinete, estude os assuntos mais especializados. O resumo final deste artigo (…) visualiza essa organização de tarefas.

:: Aprenda a enxergar com o cego Bartimeu, ou… Por que é necessário um método para ler a Bíblia? – p. 33-45
Cássio Murilo Dias da Silva – Doutor em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico, Roma, Itália, 2005.
Como é possível aprender a enxergar com um cego? Na verdade, o relato da cura do cego Bartimeu (…) servirá de exemplo concreto para (…) demonstrar a necessidade de ler a Bíblia com um bom método (…) Caso leiamos a Bíblia (…) sem um método (…) muito da riqueza do texto bíblico passa despercebida aos nossos olhos e corremos o risco de nos contentar com o que não é importante. Ou, o que é pior, corremos o risco de pensar que o texto bíblico diz algo que ele não diz (…) Quem lê a Bíblia com um método adequado (…) conhece os passos para percorrer o universo do texto, tem os olhos e os ouvidos atentos para perceber nuanças e detalhes, consegue deleitar-se com o estilo de cada autor, pode apreender com mais largueza e profundidade a mensagem, sabe que não pode obrigar o texto a dizer o que ele não diz, sabe quais informações pode (e quais as que não pode) buscar no texto bíblico, sabe o que pode (e o que não pode) perguntar à Bíblia.

:: Bíblia: Mito? Realidade? – p. 45-61
Telmo José Amaral de Figueiredo – Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico, Roma, Itália, 1997.
Os métodos de análise bíblica terminam por levantar, de modo direto ou indireto a questão se os fatos narrados pela Bíblia são históricos, ou seja, verdadeiros, ou invenções, lendas e fantasias de seus autores (…) Afinal, a Bíblia é formada por um conjunto de mitos ou ela narra a verdade dos fatos? A resposta a essa questão acabará por ser encontrada na clarificação dos termos que a compõem, isto é, o que é mito, o que vem a ser história? (…) Telmo José exemplifica a sua explicação com a análise de Gênesis 1 e trechos do poema babilônico Enuma Elish e o hino egípcio a Aton sobre a criação do mundo [texto extraído do Editorial, p. 8-9]

:: Como ler os apócrifos do Segundo Testamento – p. 62-71
Jacir de Freitas Faria – Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico, Roma, Itália, 1996.
Como ler os apócrifos? Essa é uma boa pergunta. A Igreja ensinou ao longo de sua história que esses livros não deveriam ser lidos. Muitos deles foram enviados para o catálogo dos livros proibidos e até queimados (…) Ler os apócrifos exige um acurado estudo histórico da época de cada apócrifo. O contexto é importante para compreender o porquê da expressão de fé transformada em livros apócrifos (…) A tradição popular perpetuou na memória oral e escrita os ensinamentos de fé dos apócrifos (…) A literatura apócrifa do Segundo Testamento contribuiu sobremaneira para manter a fé no imaginário popular. São histórias de piedade que se transformaram em poesia, canto, pinturas, músicas e expressões devocionais.

PARTE II

:: Releituras rabínicas do livro de Rute – p. 72-76
Leonardo Alanati – Mestre em Língua Hebraica pelo Hebrew Union College, Jewish Institute of Religion, Cincinnati, USA – Rabino da Congregação Israelita Mineira
Este artigo apresenta alguns dos principais temas desenvolvidos na tradição judaica de exegese do livro de Rute através de comentários rabínicos entre os séculos II e VI no Talmude e em Rute Rabba, mas que foram ensinados e transmitidos oralmente por décadas ou até séculos antes da redação destas obras. Até o século XIX estes comentários dominaram a maneira judaica de ler o livro. Nos dois últimos séculos, judeus de correntes religiosas modernas adotaram e desenvolveram outras interpretações e leituras do mesmo (…) [Rute] aquela mulher solidária, corajosa, decidida, verdadeiramente admirável, permanecerá sempre no coração judaico como ancestral não apenas de líderes ilustres do passado, mas também do líder que levará a humanidade a uma nova era de paz, solidariedade, justiça e amor ao próximo.

:: Rute à luz do método histórico-crítico – p. 77-84
José Luiz Gonzaga do Prado – Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico, Roma, Itália, (data?)
O documento da Pontifícia Comissão Bíblica, A interpretação da Bíblia na Igreja, de 1993, aponta o método histórico-crítico como indispensável para o estudo sério da Bíblia. Fala das origens do método, de sua evolução e dá-lhe também uma descrição simples e clara. Esta descrição vai guiar nossa busca. Analisaremos o livro de Rute por cada uma das oito etapas em que o Documento descreve o método. Assim esperamos chegar a algumas conclusões que fundamentem a abertura para as diferentes e possíveis hermenêuticas, abordagens ou leituras (…) [Há muitas] perguntas [sobre nossa realidade] que devemos levantar hoje e para as quais podemos encontrar respostas no livro de Rute. Basta lê-lo com os dois olhos, um na Bíblia e outro na vida.

:: A narratividade do livro de Rute – p. 85-106
Jaldemir Vitório – Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico, Roma, Itália, 1986. Doutor em Teologia pela PUC-RJ, 1995.
O objetivo deste artigo consiste em aplicar o método de análise narrativa ao livro de Rute. Este se presta muito bem para a finalidade por se tratar de uma narrativa breve e, ao mesmo tempo, como se verá, portadora de inesgotável riqueza literária (…) A análise narrativa oferece uma chave de interpretação que permite ao leitor entrar em sintonia com o texto, pelo conhecimento dos recursos literários empregados pelo narrador no processo de produção (…) O método da análise narrativa e os demais métodos de interpretação supõem de quem se avizinha dos textos bíblicos uma postura de leitor-intérprete. A ausência de atitude hermenêutica tem como resultado cair na armadilha do fundamentalismo ou do historicismo. A análise narrativa tem o mérito de aproximar o texto bíblico do leitor-intérprete atual ao mostrar como os autores bíblicos trabalharam de forma idêntica como trabalham os narradores atuais, tão distantes no tempo e no espaço.

:: Leitura socioantropológica do Livro de Rute – p. 107-120
Airton José da Silva – Mestre em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana, Roma, Itália, 1976.
Qual seria a contribuição específica da leitura socioantropológica? Penso que pode ser o fato desta abordagem examinar não somente a literatura bíblica, mas também as forças sociais subjacentes à produção desta literatura, onde se distingue a sociedade que está por trás do texto da sociedade que aparece dentro do texto (…) Vou utilizar o livro de Rute para visualizar esta proposta. Este livro é uma estória que usa lugares reais e pessoas fictícias situadas em determinado espaço e tempo para construir a sua narrativa (…) [A partir desta perspectiva] deveria ser possível mostrar que o modo como os personagens organizam sua visão de mundo são, na verdade, ferramentas literárias utilizadas pelo autor/a na construção de uma estória totalmente fictícia, mas que, sem dúvida, produz uma mensagem que é considerada pelo autor/a de Rute como um caminho a ser buscado, estruturando o livro como uma narrativa orientada por uma proposta séria. {Por isso], 1. Olhando a estória com os olhos do autor/a, pergunto: o que diz o livro de Rute? 2. Olhando para além do livro, pergunto: o que é possível saber da época em que foi escrito o livro de Rute? 3. Olhando a estória com os olhos do leitor atual, pergunto: qual é a proposta do livro de Rute?

:: O protagonismo de uma sogra: a história de Noemi e Rute – Uma abordagem feminina sob o olhar da psicologia – p. 121-129
Maria Aparecida Duque e Rosana Pulga
O livro de Rute é cheio de personagens humanas. E onde há o humano, há também seus aspectos fenomenológicos, incluindo o psíquico. Não há, portanto, nenhum atrevimento literário de interpretá-lo por meio da ciência da Psicologia, onde essa história tão bem se adapta. Esse livro nos oferece uma riqueza de interpretações que podem ser lidas e refletidas nas mais diversas situações vivenciais (…) O dilema sogra-nora é analisado em pormenores, principalmente pela ótica do poder e da subserviência de uma pessoa a outra [Obs.: esta última frase está no Editorial, p. 10].

Observo que, infelizmente, não possuo informações completas sobre a formação acadêmica de 3 autoras: Súsie Helena Ribeiro (área de Letras), Maria Aparecida Duque (área de Psicologia) e Rosana Pulga (assessoria bíblica).

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