As igrejas e a crise atual, segundo Leonardo Boff

Boff desafia a igreja frente à crise global

Em meio a um mundo em crise, “a missão importante e urgente da Igreja é ressuscitar a esperança”, missão que vai muito além dos dogmas ou das doutrinas, disse o teólogo brasileiro Leonardo Boff, ao falar, na sexta-feira, 6, para um templo lotado da Igreja Luterana de Quito, que comemora 50 anos de presença no Equador.

Segundo Boff, a Igreja não representa um fim em si mesma. “As igrejas não existem para si, elas existem para Deus e para a humanidade. Existem para a justiça, a dignidade, a paz e para manter a esperança. Existem para preservar e cuidar de toda a criação. A Igreja é um princípio de esperança”, frisou o teólogo.

O teólogo da libertação assinalou que uma ameaça significativa conta a humanidade é o produto da tecnociência, que favorece o surgimento de dois grupos emergentes: uma minoria que poderia viver “até os 130 anos” e está concentrando para si todos os benefícios e recursos, e outro grupo gigantesco que padece de sofrimento diário e morre de fome.

Nesta realidade, o desafio primordial para os cristãos “é manter a humanidade unida”, destacou Boff. Ao sistema do mercado capitalista globalizado não importa o humano ou o resto da criação. Somente importa o poder, o consumismo e a produção. Nele não funcionam amor, compaixão ou compreensão. Por isso, esse sistema é diretamente oposto ao Evangelho e as igrejas têm que assumir o desafio de pregar “o Evangelho,” comprometendo-se com os pobres e vulneráveis, enfrentando esse sistema.

Jesus, no contexto desse sistema, é um escândalo porque proclama que o primeiro mandamento é amar. “Como seguidores de Jesus temos que pregar e viver o amor e a compaixão como o principal e universal”, alertou.

A pobreza, afirmou, não é natural, não é ordenada nem ungida por Deus, mas é produto de um sistema e da situação atual. “Onde há um pobre, há um explorado, um oprimido,” disse Boff.

Como cristãos, “temos que assumir o escândalo do Evangelho no meio desta situação, e isso significa passar por três etapas principais. Primeiro, temos que encontrar Jesus na pessoa, tocar a realidade. Depois, temos que experimentar a indignação justa em frente à situação e denunciá-la profeticamente. Terceiro, temos que trabalhar para uma mudança na situação, que também implica mudar a si mesmo”, enumerou.

Boff apontou que o oprimido não é somente o ser humano, mas sim toda a criação. O sistema que cria o sofrimento humano também “está crucificando a terra”. Em meio a essa realidade, a Igreja tem o desafio e a responsabilidade bíblica de cuidar da criação. A Igreja tem “uma tarefa pedagógica, uma missão pedagógica” a cumprir, ao educar e ensinar a humanidade sobre a veneração e o respeito para toda a criação.

Ao concluir a exposição, Boff frisou a necessidade de uma leitura positiva da história. O que está ocorrendo com a humanidade e a terra inteira não é uma tragédia, mas uma crise, disse. A crise tem o potencial de purificar a pessoa e mudá-la de maneira positiva.

Esta crise ecológica e social não é dor de morte, mas de parto. “É claro que teremos que pagar um preço pelo que fizemos, mas por meio da crise podemos ser modificados e enriquecidos com capacidades maiores de espiritualidade, de amor e de compaixão, com mais sentido de fraternidade, unidade e solidariedade universal. Somos chamados não para lágrimas e morte, mas sim para a vida plena comunal e bem-estar integral para viver nos altos dos montes”, concluiu

Fonte: Chris Morck na ALC – Agencia Latinoamericana y Caribeña de Comunicación: 09/06/2008.

Um comportamento ecologicamente responsável

Em artigo publicado pelo Jornal do Brasil, em 09/06/2008, citado aqui a partir de Notícais do Dia – IHU On-Line – Agir rápido, agir juntos. Artigo de Leonardo Boff – o teólogo Leonardo Boff afirma, entre outras coisas:

Finalmente também as igrejas estão se mobilizando para enfrentar as mudanças climáticas da Terra. O secretário-geral da ONU Ban Ki-Moon visitou em março o Conselho Mundial das Igrejas em Genebra e disse: “um problema global exige uma resposta global: nós precisamos da ajuda das Igrejas”. E elas responderam prontamente com uma conclamação aos milhões de cristãos dispersos pelo mundo afora com estas palavras: “agir rápido, agir juntos porque não temos tempo a perder”. Citaram a Bíblia para enfatizar que Deus nos entregou a Terra como herança para administrar e não para dominar, pois esta palavra bíblica “dominar” significa cuidar e gerenciar. Acolheram os dois imperativos propostos pelo Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC) : a mitigação e a adaptação. A mitigação quer identificar as causas produtoras do aquecimento global que é o nosso estilo delapidador de produção e consumo ilimitado e individualista. A adaptação considera os efeitos perversos, especialmente nos países mais vulneráveis do Sul do mundo que demandam solidariedade pois se não conseguirem se adaptar, assistiremos, estarrecidos, a grandes dizimações (…) A Igreja Católica oficialmente ainda não propôs nada de relevante. Mas a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil em suas campanhas da fraternidade sobre a água e sobre a Amazônia ajudou a despertar uma consciência ecológica. Os bispos canadenses publicarem recentemente uma bela carta pastoral com o título: “a necessidade de uma conversão”. Atribuem à conversão um significado que transcende seu sentido estritamente religioso. Ele implica “encontrar o sentido do limite, pois, um planeta limitado não pode responder a demandas ilimitadas”. Precisamos, dizem, libertar-nos da obsessão consumista. “O egoísmo não é somente imoral, ele é suicida; desta vez não temos outra escolha senão uma nova solidariedade e novas formas de partilha” (…) A fé hebraico-cristã possui suas razões próprias para fundar um comportamento ecologicamente responsável. Parte da crença, semelhante àquela da moderna cosmologia, de que Deus transportou a criação do caos ao cosmos, quer dizer, de uma universo marcado pela desordem a um outro no qual vige a ordem e a beleza. E Deus disse: “Isto é bom”. Colocou o homem e a mulher no jardim do Éden para que o “cultivassem e o guardassem”. “Cultivar” implica cuidar e favorecer o crescimento e “guardar” significa proteger e assegurar a continuidade dos recursos, como diríamos hoje, garantir um desenvolvimento sustentável.