Rio+20, Cúpula dos Povos e Fórum Social Temático

O que é a Rio+20?

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (UNCSD), que está sendo organizada em conformidade com a Resolução 64/236 da Assembléia Geral (A/RES/64/236), irá ocorrer no Brasil de 20 a 22 de junho de 2012 marcando o 20º aniversário da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED), que ocorreu no Rio de Janeiro em 1992, e o 10º aniversário da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (WSSD), ocorrida em Johanesburgo em 2002. Com a presença de Chefes de Estado e de Governo ou outros representantes a expectativa é de uma Conferência do mais alto nível, sendo que dela resultará a produção de um documento político focado…

The United Nations Conference on Sustainable Development (UNCSD) is being organized in pursuance of General Assembly Resolution 64/236 (A/RES/64/236). The Conference will take place in Brazil on 20-22 June 2012 to mark the 20th anniversary of the 1992 United Nations Conference on Environment and Development (UNCED), in Rio de Janeiro, and the 10th anniversary of the 2002 World Summit on Sustainable Development (WSSD) in Johannesburg. It is envisaged as a Conference at the highest possible level, including Heads of State and Government or other representatives. The Conference will result in a focused political document…

O que é a Cúpula dos Povos na Rio+20?

Entre 15 e 23 de junho deste ano, ocorrerá no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, a Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental. A sociedade civil global, organizações, coletivos e movimentos sociais ocuparão o Aterro para propor uma nova forma de se viver no planeta, em solidariedade, contra a mercantilização da natureza e em defesa dos bens comuns.

A Cúpula dos Povos ocorrerá de forma paralela à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. A reunião oficial marca os vinte anos da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92 ou Eco 92). Nestas duas décadas, a falta de ações para superar a injustiça social ambiental tem frustrado expectativas e desacreditado a ONU. A pauta prevista para a Rio+20 oficial, a chamada “economia verde” e a institucionalidade global, é considerada pelos organizadores da Cúpula como insatisfatória para lidar com a crise do planeta, causada pelos modelos de produção e consumo capitalistas.

Para enfrentar os desafios dessa crise sistêmica, a Cúpula dos Povos não será apenas um grande evento. Trata-se de um processo de acúmulos históricos e convergências das lutas locais, regionais e globais, que tem como marco político a luta anticapitalista, classista, antirracista, antipatriarcal e anti-homofóbica.

A Cúpula dos Povos quer, assim, transformar o momento da Rio+20 numa oportunidade para tratar dos graves problemas enfrentados pela humanidade e demonstrar a força política dos povos organizados. “Venha reinventar o mundo” é o nosso chamado e o nosso convite à participação para as organizações e movimentos sociais do Brasil e do mundo. A convocatória global para a Cúpula será realizada durante o Fórum Social Temático, em 28 de janeiro, em Porto Alegre (RS). O Fórum deste ano é, aliás, preparatório para a Cúpula.

O que é o Fórum Social Temático 2012?

O Fórum Social Temático (FST) se inscreve no processo do Fórum Social Mundial e será uma etapa preparatória a Cúpula dos Povos na Rio+20. O evento acontecerá do dia 24 a 29 de janeiro de 2012 e será sediado por Porto Alegre e cidades da região Metropolitana – Gravataí, Canoas, São Leopoldo, e Novo Hamburgo. Como um espaço aberto e plural, a programação do Fórum será fundamentalmente constituída por atividades propostas e geridas por movimentos, coletivos e organizações da sociedade civil, relacionadas ao tema “Crise Capitalista, Justiça Social e Ambiental”. Além disso, o Fórum acolherá também o encontro de redes internacionais, articuladas em torno de Grupos Temáticos de reflexão sobre assuntos pertinentes ao Fórum. O diálogo no âmbito dos grupos já está em andamento, na Plataforma de Diálogos do Fórum Social Temático

O cerrado ameaçado

Cerrado. O pai das águas do Brasil e a cumeeira da América do Sul

Buscando conhecer um pouco mais a cumeeira da América do Sul e o pai das águas do Brasil, vários pesquisadores e pesquisadoras contribuem nesta edição. Pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, José Felipe Ribeiro explica didaticamente no que consiste o Cerrado, analisando por que é um mito a ideia de que no bioma Cerrado há apenas seca. Jorge Enoch Furquim Werneck Lima, pesquisador em Hidrologia da Embrapa Cerrados, afirma que esse bioma contribui para oito das 12 regiões hidrográficas brasileiras, além de ratificar que a água do Cerrado não é importante apenas para a manutenção do bioma, mas também para todas essas regiões. Para o professor titular da Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC Goiás, Altair Sales Barbosa, enquanto o desejo de explorar o Cerrado tiver raízes estrangeiras, a possibilidade de criação de um programa racional de desenvolvimento será nula. Já para a coordenadora do Laboratório de Sementes do Instituto do Trópico Subúmido – ITS da PUC Goiás, Marilda da Conceição Ribeiro e Barros, a flora do Cerrado é reconhecida por vários pesquisadores nacionais e internacionais como um grande celeiro na oferta de bioprodutos com aplicações em quase todos os setores da economia de modo direto e indireto. Enquanto isso, o engenheiro florestal César Victor do Espírito Santo alerta que nas últimas quatro décadas houve um advento da expansão da fronteira agrícola no Brasil e que o Cerrado passou a ser um local de grande importância no cenário nacional e mundial em termos de produção agrícola e pecuária. O debate conta também com a contribuição do “desbravador da soja no Cerrado”, Romeu Afonso de Souza Kiihl, que frisa que o Brasil central, hoje, é responsável por mais da metade da soja que produzimos no país… (Editorial)

Este é tema de capa da IHU On-Line 382, de 28.11.2011.

As entrevistas:
:: José Felipe Ribeiro: Cerrado: o grande potencial agrícola do Brasil?
:: Jorge Enoch Furquim Werneck Lima: O berço das águas no Brasil
:: Altair Sales Barbosa: Cerrado: “dor fantasma” da biodiversidade brasileira
:: Marilda da Conceição Ribeiro e Barros: Flora do Cerrado: caminho de descobertas
:: César Victor do Espírito Santo: O envolvimento da sociedade em prol do Cerrado
:: Romeu Afonso de Souza Kiihl: Soja do Cerrado: mercado promissor de exportação do Brasil?

A urgência de uma ética ecoantropocêntrica

Nós ainda estamos vivendo em conformidade com a ética antropocêntrica que, ao afirmar a premissa de ser o homem o centro de tudo o que existe, contribui para arraigar a convicção de que o mundo foi feito para a espécie humana”. O que é um equívoco.

 

“Precisamos nos livrar da palavra desenvolvimento, mesmo que ela venha acompanhada do adjetivo sustentável”. Entrevista especial com Carlos Alberto Pereira Silva

O conceito de decrescimento surge “diante do desafio da mudança nos rumos da civilização ocidental”, esclarece o pesquisador Carlos Pereira à IHU On-Line. Para ele, a superação do modelo desenvolvimentista ocidental está imbricada na incorporação do “princípio de responsabilidade”. Pensar outro modelo de desenvolvimento econômico, social e político requer transformações de hábitos adquiridos há séculos e intensificados desde o surgimento do capitalismo.

Na entrevista a seguir, concedida por e-mail, Pereira argumenta que a lógica do desenvolvimento é “essencialmente errada porque em seu interior está contida a insensata promessa de continuidade do crescimento econômico num mundo em que as riquezas naturais são finitas”. Entretanto, enfatiza, a origem da compreensão de que o homem é o centro do universo e que deve explorar os demais seres vivos “está estampada na narrativa judaico-cristã sobre a criação do universo na qual, conforme o relato bíblico, Deus teria ordenado ao homem: “enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra’”.

Defensor da premissa ecoantropocêntrica, o pesquisador ressalta a necessidade de enxergarmos a “Terra e os outros seres vivos também como centro do mundo. A partir daí, ao interiorizarmos essa premissa ecoantropocêntrica, veremos que a nossa espécie é integrante de uma ampla comunidade de vida e terminaremos por concluir que o mundo não nos pertence”.

O decrescimento faz parte das discussões do Ciclo de Palestras: Economia de Baixo Carbono. Limites e Possibilidades, que é promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU. Na próxima terça-feira, 22-11-2011, o professor de Economia na Universidade de Paris XI – Sceaux/Orsay, Serge Latouche, ministrará a palestra Por outro modo de consumir: descrição de algumas experiências alternativas. Latouche estará na Unisinos até o dia 25-11-2011. A programação completa do evento está disponível nesta página.

Carlos Alberto Pereira Silva é graduado em História pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, mestre em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília – UnB e doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. Atualmente é professor Adjunto da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e Coordenador do Laboratório Transdisciplinar de Estudos em Complexidade.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Na audiência sobre “Decrescimento: Por que e como construir”, realizada no início do mês de setembro na Subcomissão Permanente de Acompanhamento da Rio+20 e do Regime Internacional sobre Mudanças Climáticas da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional – CRE, o senhor condenou o desenvolvimentismo que leva a um consumo de recursos naturais acima da capacidade do planeta. Que alternativas encontra e sugere para o consumo moderado dos recursos naturais ou até mesmo do reaproveitamento de recursos já utilizados?

Carlos Alberto Pereira Silva – Diante da crise civilizatória multidimensional, potencializada pela expansão do desenvolvimento, as alternativas para a emergência de um consumo parcimonioso das riquezas naturais estão vinculadas à superação da insensata aposta no crescimento econômico ilimitado. Para que haja a propagação de modos de vida frugais, faz-se necessário que ocorra o questionamento do desenvolvimento predatório, excludente e consumista. Para isso precisamos nos livrar da palavra desenvolvimento, mesmo que ela venha acompanhada do adjetivo sustentável. Portanto, a superação do consumismo desenfreado existente em nossa época, na qual quase tudo é efêmero, supérfluo e descartável, exige uma profunda mudança nos valores, ideias e atitudes ainda predominantes na cultura ocidental. E isso exige uma verdadeira metamorfose cultural. Podemos iniciar essa metamorfose insurgindo contra os estímulos ditados pelas grandes corporações desenvolvimentistas, que são indutoras da compulsiva conjugação dos verbos modernizar, desenvolver, competir, lucrar, consumir, crescer, ostentar, aparecer, acumular, substituir e descartar.

IHU On-Line – Na mesma audiência, o senhor discutiu formas de conduzir a humanidade a um padrão de redução de crescimento. Que padrão seria esse e qual a sua viabilização? Quais benefícios trariam para nossa sociedade?

Carlos Alberto Pereira Silva – Acredito que, na busca da superação do desenvolvimento, não devemos tentar estabelecer matematicamente um “padrão de redução do crescimento” para que possamos construir um mundo melhor. Para além do estabelecimento de qualquer padrão, é fundamental que incorporemos o “princípio responsabilidade”, esboçado por Hans Jonas, que diz: “aja de modo que os efeitos de sua ação sejam compatíveis com a permanência de uma vida autenticamente humana na Terra”. Assim, diante do desafio da mudança nos rumos da civilização ocidental, é que surge o decrescimento.

Descortinado como uma utopia concreta, o decrescimento, que não é nem receita nem fórmula, apresenta-se como um caminho necessário e viável para a construção de uma melhor e mais harmoniosa convivência, nunca isenta de conflitos, entre os homens, as mulheres, os outros seres vivos e a terra. Para que possamos sair da lógica ditada pelo crescimento econômico e entrarmos na era da civilização do decrescimento, a luta contra a indigna situação social a que estão submetidos incontáveis seres humanos assume particular importância. Com o questionamento da crença no crescimento econômico ilimitado, que tem transformado milhões de homens, mulheres e crianças em seres descartáveis, a aposta na erradicação da pobreza adquire relevância. Num mundo no qual a opulência de poucos entra em contraste com a miséria de muitos, é plenamente possível que os bens essenciais à vida, completamente distintos dos bens fúteis propagandeados através do rentável, poluidor e barulhento mercado publicitário, sejam acessíveis a todos. Nessa agenda, preenchida pela desafiadora tarefa da garantia de redistribuição dos bens socialmente produzidos, a redução da jornada de trabalho sobressai como uma imperiosa necessidade, porque a meta do decrescimento, como destaca Serge Latouche, “é uma sociedade em que se viverá melhor trabalhando menos”.

A aposta na construção de vivências baseadas no ideal da simplicidade voluntária compatibiliza-se também com a necessidade da redução do padrão de crescimento. Se, como já dizia Henry Thoreau no século XIX, “a maioria dos luxos e dos chamados confortos da vida não são só dispensáveis como também constitui até obstáculo à elevação da humanidade”, é vital, que haja contraposição à lógica da acumulação de bens materiais incitada pela cultura do desenvolvimento, geradora de um ilusório bem-estar. Por distinguir-se da moderna noção de riqueza, que define quem é rico pela posse de bens materiais, a simplicidade voluntária aponta para a possibilidade da construção de uma civilização na qual o ser prepondere sobre o ter.

IHU On-Line – Em sua opinião, a lógica desenvolvimentista da nossa cultura está assumindo uma posição errada? Por quê? Que pontos deveriam sofrer modificações?

Carlos Alberto Pereira Silva – A lógica apontada pelo desenvolvimento é essencialmente errada porque em seu interior está contida a insensata promessa de continuidade do crescimento econômico num mundo em que as riquezas naturais são finitas. Para iniciarmos uma mudança de rumos, compatível com os limites impostos pela biosfera, devemos descolonizar o nosso imaginário, ainda dominado pela crença nos supostos benefícios gerados pelo desenvolvimento. Para isso é necessário introjetarmos a ideia de que uma vida melhor independe do aumento da produção e do consumo de bens materiais. Certamente, ao interiorizarmos essa ideia, questionaremos as bases fundamentais do desenvolvimento e passaremos a adotar práticas socioambientais convergentes como os verbos redistribuir, reduzir, desmercadorizar, diminuir, reciclar, reutilizar, desmercantilizar, redistribuir, perenizar, reaprender e reencantar.

IHU On-Line – O senhor defende uma ética “ecoantropocêntrica”, lembrando que as pessoas fazem parte de uma comunidade de vida mais ampla e dividem espaço com muitas espécies. O senhor também defende que falta um “egoísmo inteligente”, no qual o cuidado com outras espécies seja visto como defesa da própria espécie humana. Explique mais esse conceito.

Carlos Alberto Pereira Silva – Nós ainda estamos vivendo em conformidade com a ética antropocêntrica que, ao afirmar a premissa de ser o homem o centro de tudo o que existe, contribui para arraigar a convicção de que o mundo foi feito para a espécie humana. A origem dessa compreensão está estampada na narrativa judaico-cristã sobre a criação do universo na qual, conforme o relato bíblico, Deus teria ordenado ao homem: “enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra”. Acolhida entusiasticamente pela cultura ocidental, essa sentença foi incorporada ao conhecimento científico moderno através das palavras de Francis Bacon que, que em nome da ciência, deixou como legado este conselho: “devemos subjugar a natureza, pressioná-la para entregar seus segredos, amarrá-la a nosso serviço e fazê-la nossa escrava”. Diante dessa antiga crença, se o nosso descentramento parece algo impossível de acontecer, é fundamental então que passemos a enxergar a terra e os outros seres vivos também como centro do mundo. A partir daí, ao interiorizarmos essa premissa ecoantropocêntrica, veremos que a nossa espécie é integrante de uma ampla comunidade de vida e terminaremos por concluir que o mundo não nos pertence.

Eu penso que, em razão dos humanos serem tributários de uma história anterior ao seu surgimento, as convicções que atestam a capacidade de destruição da Terra e o extermínio da vida nela existente por parte da espécie humana revelam-se falsas. Para mim, por sermos apenas “um punhado de mar”, a afirmação, largamente difundida nos dias atuais, de que devemos proteger a natureza porque o futuro do planeta está em nossas mãos é completamente ingênua e presunçosa. Portanto, mesmo que essa afirmação esteja fundada em preocupações com a situação do planeta, os seus defensores não reconhecem a grandiosidade, nem tampouco a capacidade de resiliência que a Terra possui frente às agressões empreendidas pelos humanos. Assim sendo, se reconhecermos que estamos apenas maltratando a Terra e não a destruindo, acredito que iremos implementar ações preenchidas pelo egoísmo inteligente que alicerça-se no sincero princípio de que o cuidado com Terra e os outros seres vivos significa uma tentativa, quiçá vã, de cuidarmos de nós mesmos.

IHU On-Line – O senhor aposta na valorização dos saberes das populações indígenas e iletradas como alternativa à lógica desenvolvimentista, que pode estar ligada ao culto, ao corpo e à violência. De que maneira podemos criar políticas públicas que deem conta desta alternativa?

Carlos Alberto Pereira Silva – Para construirmos sociedades possibilitadoras da emergência de uma vida autêntica, precisamos ter a humildade de aprender com muitas populações iletradas que são portadoras de saberes indispensáveis a uma vida melhor. Temos que reconhecer, como diz a pesquisadora dos “saberes da tradição”, Maria da Conceição de Almeida, que além da ciência “existem outras formas de conhecer que se perdem no tempo e no anonimato porque não encontram espaços e oportunidade de expressão”. Daí porque, para que possamos lutar pela implementação de políticas públicas que contemplem os legítimos anseios das populações que ainda não foram tocadas pela uniformização avassaladora do desenvolvimento ocidental, necessitamos primeiramente reconhecer a pertinência dos múltiplos saberes ancestrais. Reconhecendo a pertinência dos saberes das populações iletradas, certamente contribuiremos com o fortalecimento das lutas em prol da demarcação de terras indígenas e da valorização do saber/fazer de seringueiros, pescadores e roceiros.

Ao constatar que o desenvolvimento possui a capacidade de transformar quase tudo em bens consumíveis, percebo que a incansável busca do corpo perfeito também está vinculada à reprodução da sociedade do crescimento fundada no ter sobre o ser. No atual contexto, onde o desejo do corpo perfeito tornou-se uma nova utopia, a indústria da beleza e da “boa forma” tem aumentado a sua riqueza com a manutenção da pobreza espiritual das consumidoras e consumidores dos seus produtos.

Concomitantemente à disseminação da corpolatria, a existência de vínculos entre a lógica desenvolvimentista e o crescimento da violência física e simbólica em nossas sociedades explicita-se quando verificamos que, em nome do desenvolvimento, o valor das pessoas é medido pelo que elas possuem e não pelo o que elas são. Assim, assentado na concorrência e no individualismo, o desenvolvimento cinde as sociedades através da imposição do lema “salve-se quem puder”, contribuindo decisivamente para a propagação da cultura da violência.

IHU On-Line – O padrão de consumo deve ser reduzido nos países ricos, por quê?

Carlos Alberto Pereira Silva – O padrão de consumo existente nos países materialmente desenvolvidos deve ser reduzido porque, além de não ser capaz de garantir uma autêntica satisfação para os indivíduos, o consumismo constitui-se num fator que tem gerado drásticas alterações nos ecossistemas. Ao incorporarem o consumo excessivo como dimensão vital da existência, parcelas significativas das sociedades ocidentais, na desenfreada busca dos recursos naturais, tornam-se responsáveis pelos desmatamentos, poluições, assoreamento dos rios, envenenamento dos mares e degradação do ambiente urbano. Conforme a publicação “O Estado do Mundo”, os 16% mais ricos do mundo são responsáveis por cerca de 80% do consumo mundial. Considerando que os países materialmente ricos são grandes consumidores de energia, ao discutirmos o problema da superpopulação, possivelmente iremos concluir, como sugeriu Paul Elrich, que há “um número demasiado grande de pessoas ricas” e que são eles que superpovoam a terra.

IHU On-Line – O automóvel foi considerado “irracionalidade completa” pelo professor João Luís Homem de Carvalho, da Universidade de Brasília (UnB), que correlacionou a ineficiência crescente do transporte individual ao aumento do efeito estufa. O senhor concorda com essa afirmação? Por quê?

Carlos Alberto Pereira Silva – Inquestionavelmente, a poluição atmosférica gerada pela queima de combustíveis fósseis, necessária à manutenção da civilização do automóvel, contribui sobremaneira para o aumento do efeito estufa. Podemos dizer que a aposta no automóvel é uma “irracionalidade completa” porque, além de potencializar o aquecimento global do planeta, a expansão do seu uso é multidimensionalmente insustentável. Para constatarmos essa irracionalidade, basta que sintamos as diversas consequências da intensa presença dos carros em nossas cidades. Com mais automóveis, nossas cidades tornaram-se barulhentas e propícias ao aumento das doenças respiratórias e dos males psicofísicos entre os indivíduos. Além disso, o culto ao automóvel, compatível com a lógica do desenvolvimento que se ancora no aumento do PIB, tem arruinado muito lares com as incontáveis mortes e mutilações geradas pela guerra no trânsito.

IHU On-Line – A relocação da produção de alimentos, visando torná-los mais próximos dos consumidores, é uma alternativa sustentável? Por quê?

Carlos Alberto Pereira Silva – A aposta na relocalização da produção é algo fundamental para que possamos sair da sociedade do crescimento. Como diz Latouche, “se as ideias devem ignorar fronteiras, os movimentos de mercadorias e de capitais devem, ao contrário, limitar-se ao indispensável”. Produzir localmente alimentos e outros bens destinados ao atendimento das necessidades das comunidades contribui para a redução dos vultuosos gastos destinados ao transporte das mercadorias. Certamente, além de contribuir para redução da poluição gerada pelos grandes deslocamentos terrestres, aéreos e marítimos, a relocalização da produção possibilitará o aumento da geração de empregos locais e estimulará o sentimento de pertencimento entre os indivíduos de cada localidade.

Fonte: IHU – 16 de novembro de 2011

O cerrado é mais uma vítima da sanha do mercado

“O cerrado é o veio natural da expansão sucroenergética no Brasil”. Entrevista especial com João Humberto Camelini

A crescente ocupação do cerrado brasileiro com cultura de cana-de-açúcar destinada à produção de etanol se explica por causa da proximidade do bioma com São Paulo, “de onde partem as ordens para coordenação da produção e de onde vem a tecnologia para montagem e manutenção das novas instalações”, esclarece o geógrafo João Humberto Camelini à IHU On-Line. Além de concentrar os principais grupos produtores de etanol, São Paulo é um “grande mercado consumidor e também nele encontram-se os principais portos, de onde o etanol pode ser direcionado ao mercado externo”.

Segundo o pesquisador, no ano passado, 172 usinas estavam instaladas no bioma, “número que vem crescendo continuamente”. Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail, Camelini enfatiza que grandes empreendimentos geram diversos problemas econômicos, sociais e ambientais como “acidentes, poluição, prejuízos ao solo e à biodiversidade devido às queimadas, contaminação do ar e águas com pesticidas, etc. Isto resulta na sobrecarga de serviços públicos como a saúde, principalmente em pequenos municípios nos quais o aporte populacional sazonal dos cortadores de cana representa um aumento percentual considerável em relação ao número de habitantes. Há uma transferência de responsabilidades, já que diversos problemas resultantes da produção de etanol acabam sendo resolvidos com recursos públicos”.

João Humberto Camelini é mestre em Geografia com dissertação intitulada Regiões competitivas do etanol e vulnerabilidade territorial no Brasil: o caso emblemático de Quirinópolis, GO, apresentada no Instituto de Geociências – IG.

 

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Há quanto tempo o Brasil investe na produção de etanol a partir da cana-de-açúcar plantada no cerrado brasileiro? Percebe uma expansão dessa cultura na região? Por quais motivos?

João Camelini – No início da década de 1990, a desregulamentação do setor sucroenergético fez com que o controle sobre a produção não fosse mais centralizado no Instituto do Açúcar e do Álcool, o que criou um cenário muito atraente para os investimentos privados nesta atividade, já que as corporações poderiam finalmente direcionar suas estratégias de acordo com os interesses do mercado. Nesta época, o parque de usinas de São Paulo já estava bastante adensado, o que deu início a um movimento um pouco mais intenso de ocupação do cerrado. Especificamente em relação ao etanol, não podemos esquecer que neste período o mercado interno estava totalmente enfraquecido devido ao fim do Proálcool. Então, seria necessário o surgimento de um fato novo que impulsionasse o setor. Bem, podemos identificar claramente que a adoção da tecnologia Flex Fuel a partir de 2003 foi um marco nesse sentido, visto que criou oportunidades para usineiros, montadoras e teve grande impacto de marketing sobre os consumidores. Como se isso não bastasse, o mercado externo passou a apresentar oportunidades mais concretas com a tendência à substituição parcial dos combustíveis por etanol em outros países. O conjunto destes fatores reforçou a necessidade de expansão do setor.

É facilmente perceptível que o cerrado vem sendo ocupado com maior intensidade que o restante do país. Isso vem ocorrendo por diversos motivos, entre os quais podemos destacar a proximidade com São Paulo, de onde partem as ordens para coordenação da produção e de onde vem a tecnologia para montagem e manutenção das novas instalações. Lá estão instaladas as matrizes dos principais grupos, além disso, em São Paulo há um grande mercado consumidor e também nele encontram-se os principais portos, de onde o etanol pode ser direcionado ao mercado externo. As outras regiões oferecem algum tipo de restrição mais importante, que representei por meio de um mapeamento em minha pesquisa. São questões relacionadas à disponibilidade hídrica, clima e/ou solo inadequados, predominância de topografia imprópria para mecanização, impedimentos legais associados a aspectos ambientais etc. O fato é que o cerrado é o veio natural da expansão sucroenergética no Brasil e que, do ponto de vista geográfico, a questão logística é central no entendimento deste direcionamento.

IHU On-Line – Quais são as empresas que investem no setor sucroenergético na região e quantas usinas existem no cerrado?

João Camelini – Ao cruzarmos a delimitação do cerrado fornecida pelo IBGE com as localizações das usinas no início de 2010, encontraremos 172 unidades instaladas, mas este número vem crescendo continuamente. Há diversos grupos que investem na construção de usinas no cerrado e, como disse, eles geralmente são controlados por matrizes no estado de São Paulo, que é o “cérebro” da expansão. Alguns exemplos são os grupos Cosan, USJ, São Martinho, Farias, ETH Bioenergia dentre outros. É importante frisar também que o capital estrangeiro compreendeu que o momento é oportuno para investir no etanol e por isso está atuando de maneira bastante agressiva, o que colabora para tornar o setor ainda mais oligopolizado. De qualquer forma, tanto os grupos nacionais quanto estrangeiros não têm comprometimento algum com os interesses da população, já que isso não é da natureza das corporações, é função do Estado.

IHU On-Line – Como as plantações de cana-de-açúcar e a produção de etanol estão modificando a geografia e as terras do cerrado brasileiro? A cana-de-açúcar é apropriada para o solo do cerrado?

João Camelini – Esta é uma pergunta bastante interessante. Em geral, as pessoas levam em consideração o desmatamento direto realizado para o plantio de cana, mas se esquecem do desmatamento indireto. Explico: quando uma usina se instala numa região, ela tem que obter matéria-prima dentro de um raio aproximado de 40 km a partir do centro de moagem, o que exige grande ocupação nas proximidades, resultando num “mar de cana” que estamos habituados a ver em São Paulo. Para isso ela age agressivamente na substituição de outras culturas, como a soja, que, por sua vez, tem que migrar para novas áreas, gerando desmatamento. Essa preferência pela substituição se deve à redução de custos no preparo da terra para o plantio. Se a soja, sustentada por investidores capitalizados, não tem condições de medir forças com a cana, imagine a situação em que se encontram os pequenos produtores. É por isso que, do ponto de vista geográfico, uma das questões mais preocupantes é a especialização regional produtiva. Não é saudável que haja tamanha dedicação a um único setor.

O solo do cerrado, no passado, foi considerado impróprio para uma série de culturas, mas com os recursos disponíveis atualmente é possível compensar as deficiências a custos aceitáveis. Com isso, pode-se afirmar que este fator econômico não restringe a atividade canavieira de forma significativa. Além disso, os centros de pesquisa trabalham continuamente para desenvolver variedades adaptadas às mais diferentes condições edafoclimáticas, diferentemente do passado, quando toda a pesquisa era voltada para as terras paulistas. Entre os grandes produtos agrícolas, além da cana-de-açúcar, há também o algodão e a soja, que tiveram excelente adaptação no cerrado, onde é bastante difundida. Também planta-se milho, arroz e feijão em pequenas propriedades, o que leva muitos pesquisadores à conclusão de que o avanço da cana pode comprometer a produção de alimentos no Brasil.

IHU On-Line – Quais são as vantagens e as implicações da produção de etanol e cana-de-açúcar na região do cerrado? Vislumbra uma condição de vulnerabilidade econômica, social e ambiental em função da produção sucroenergética?

João Camelini – Quando uma usina se instala num município, as pessoas logo pensam que ela trará consigo o “progresso” e ponto final. Isso é uma distorção presente no senso comum, associada ao ideário do “desenvolvimento”. Eu entendo que a dinâmica da ocupação do cerrado com cana-de-açúcar tem diversos problemas, pois facilita o surgimento de algumas fragilizações, a começar pelo estabelecimento do regime de monocultura associado a mecanismos de expulsão gradual de pequenos produtores, que induz à especialização e dedicação de toda uma região a um único setor, algo muito perigoso, principalmente diante da iminente conversão do etanol numa commodity.

As oscilações bruscas nos preços poderão comprometer toda a organização local, já que ela estará inexoravelmente atrelada ao setor sucroenergético. Além disso, há também os desmatamentos direto e indireto já mencionados, acidentes, poluição, prejuízos ao solo e à biodiversidade devido às queimadas, contaminação do ar e águas com pesticidas, etc. Isto resulta na sobrecarga de serviços públicos como a saúde, principalmente em pequenos municípios nos quais o aporte populacional sazonal dos cortadores de cana representa um aumento percentual considerável em relação ao número de habitantes. Há uma transferência de responsabilidades, já que diversos problemas resultantes da produção de etanol acabam sendo resolvidos com recursos públicos.

IHU On-Line – O que mudou em Quirinópolis, Goiás, após a expansão da cana-de-açúcar?

João Camelini – O município passou a se dedicar intensamente à produção de etanol e açúcar, atraindo investimentos de dois grandes grupos: USJ e São Martinho, que controlam respectivamente as usinas São Francisco e Boa Vista. A força de trabalho do município ficou comprometida com o setor, direta ou indiretamente. O comércio local, por exemplo, conta com diversas revendas de máquinas, implementos, insumos e tudo o que é necessário para atender ao setor. O comércio é baseado em produtos fabricados em outras cidades; não há grande diversidade nas atividades produtivas, já que pequenos proprietários arrendaram suas terras para a produção de cana. A estrutura hoteleira é funcional. Então, só faz sentido se associada aos fluxos relacionados à produção de etanol. Enfim, tudo gira em torno das usinas e essa especialização tende a aumentar, pois há planos para a criação de um distrito industrial que poderá transformar o município numa espécie de Sertãozinho do Cerrado. Além disso, a administração municipal trabalha para que um terminal de cargas da ferrovia Norte-Sul seja criado ali, aumentando o potencial de atração do município. Eu costumo definir Quirinópolis como a nova centralidade do etanol no cerrado.

Uma questão pouco discutida é a irradiação das consequências da ocupação canavieira. Quando uma usina é instalada num município, a tendência é que a área rural dos vizinhos seja ao menos parcialmente ocupada. Além disso, muitos municípios vizinhos se transformam em “cidades-dormitório” para os trabalhadores. Nestes casos, não existe a contrapartida do acréscimo na arrecadação, o que é mais perverso.

IHU On-Line – A plantação de cana-de-açúcar está se expandindo para outras regiões do país?

João Camelini – Sim. Ao que tudo indica a expansão do setor vem seguindo a lógica proposta pelo mapeamento apresentado em minha pesquisa, que identificou o cerrado como foco da ocupação. O Triângulo Mineiro, norte do Paraná e sul do Mato Grosso do Sul também vêm se tornando alvos dos investimentos. É importante salientar que o cerrado, do ponto de vista das empresas, é a opção mais interessante de expansão no momento. No entanto, com o tempo é provável que as redes logísticas se expandam para outras regiões e que isso intensifique a ocupação onde hoje não há grande interesse.

IHU On-Line – Em que consistem as políticas públicas destinadas ao setor sucroenergético atualmente? Quais seus limites? Que avaliação faz da política ambiental do governo brasileiro?

João Camelini – O papel do Estado em relação ao setor sucroenergético é importantíssimo para a compreensão da forma com que a vulnerabilidade territorial se potencializa. Hoje, os estados disputam os investimentos dos grupos usineiros, oferecendo uma série de vantagens para se tornarem atrativos. A competitividade deixa de ser um atributo associado apenas às empresas e torna-se algo presente também nos lugares. Isso faz com que ocorra o que Milton Santos chamou de “guerra entre os lugares”, em que há o esgarçamento do tecido federativo, que torna a nação fragmentada. O posicionamento do Estado facilita o uso corporativo do território, em que os grandes benefícios são privadamente apropriados, enquanto os problemas são socializados. No caso do cerrado, Goiás é um dos estados que mais oferecem incentivos através do programa Produzir.

Vejo que a política ambiental do Brasil apresenta diversos mecanismos de proteção legal em relação à Amazônia e o Pantanal, enquanto o cerrado fica mais exposto a condições como as que vemos atualmente. Por exemplo, apenas cerca de 4% desse bioma é protegido sob forma de unidades de conservação; há dificuldades de fiscalização e na maioria dos estados ainda não há um zoneamento agroecológico que possa ser utilizado como parâmetro de referência para a ocupação. Estas distorções aos poucos vêm sendo corrigidas com medidas como a criação do PP-Cerrado, mas a velocidade com que a agroindústria do etanol cresce é muito maior. É preciso que os mecanismos de proteção ao cerrado sejam revistos com grande cautela, caso contrário ele poderá ser destruído de forma semelhante à Mata Atlântica.

IHU On-Line – O Brasil tem condições de se tornar autossustentável na produção de etanol? Que aspectos são fundamentais para que isso aconteça? Como vê a expectativa do governo brasileiro de dobrar a produção de etanol nas próximas duas décadas?

João Camelini – Hoje existe grande expectativa pela realização do potencial do mercado externo. Com a previsão de retirada parcial de subsídios ao etanol de milho nos Estados Unidos, surgirá uma grande oportunidade de negócio para o setor sucroenergético nacional. O Brasil vem se preparando para produzir enormes quantidades de etanol, o que envolve não apenas o surgimento de novas usinas, mas também o estabelecimento de infraestruturas logísticas que comportem o escoamento para os portos.

Levando em consideração as regiões em que há maior concentração de usinas, não há dúvidas de que a utilização de alcoodutos se apresenta como a alternativa que oferece maiores vantagens para o setor sucroenergético. Há projetos de corredores de exportação baseados neste modal em que o BNDES é um grande agente financeiro, o que demonstra a disposição do Estado em oferecer suporte logístico. Se observarmos o mapeamento destes projetos de alcoodutos, veremos que ao redor deles estão se formando clusters de usinas no intuito de viabilizar economicamente o investimento. Podemos dizer, então, que o Estado possui ferramentas para controlar parcialmente a expansão e que tem elementos sólidos para prever esta consolidação do aumento da produção para as próximas duas décadas. A questão é: qual será o custo desta expansão no que se refere à vulnerabilidade territorial, considerando as imensas regiões que se tornarão dedicadas ao setor para que o aumento da produção seja viabilizado? Os clusters de usinas resultarão no surgimento de “manchas” de ocupação com a monocultura canavieira, funcionalizando grandes porções do território, que estarão sujeitas às intempéries do mercado de commodities agrícolas.

Fonte: IHU – 4 de outubro de 2011

 

Não falo como alguém que (apenas) conhece, falo como alguém que sente. Sou herdeiro de um pedaço de terra em Minas Gerais, da fazenda onde nasci e vivi, de um pedaço de cerrado…

Canto de Guerreiro Mongoió – Elomar

Adeus, adeus meu-pé-de-serra
Querido berço onde nasci
Se um dia te fizerem guerra
Teu filho vem morrer por ti

Japão enfrenta pesadelo nuclear

Após terremoto e tsunami, Japão enfrenta a ameaça nuclear.

Última atualização: 05/04/2011

:: Japão: nível de iodo radioativo no mar é 5 milhões de vezes superior à taxa legal – Ópera Mundi: 05/04/2011
O nível de iodo radioativo nas águas do mar próximo à Usina Nuclear de Fukushima Daiichi, no Nordeste do Japão, é cinco milhões de vezes superior ao limite legal. As informações são da empresa concessionária que administra a usina, a Tepco. De acordo com a Tepco, o nível de césio 137 nas águas do mar, próximas à central, é 1,1 milhões de vezes superior ao limite legal. A companhia informou ainda que enquanto o iodo 131 tem uma vida média relativamente breve, de oito dias, o período de semidesintegração do césio 137 é de 30 anos. Uma amostra recolhida ontem (04/04) em uma área próxima ao reator 2 revelou uma concentração excessiva de iodo, e as análises também mostraram uma presença de césio 137.

:: A energia nuclear em debate – Revista IHU On-Line n. 355 – 28/03/2011
A tragédia de Fukushima repõe na agenda do dia a opção da energia nuclear. Vale a pena que corramos tantos riscos? Trata-se de um debate difícil, mas necessário no momento atual. A IHU On-Line desta semana convidou especialistas de várias áreas do conhecimento para discutir o tema.

Na visão do jornalista Washington Novaes, especialista em meio ambiente, o Brasil poderia economizar 10% do que gasta com energia se investisse em programas de melhoramento de linhas de transmissão. “Não precisamos desse tipo de energia, porque temos outros vários formatos, como a eólica (…), a energia solar, das marés e as biomassas (etanol e outras).” Para o economista sul-africano David Fig, o apoio à energia nuclear é baseado em considerações ideológicas. Ele pondera que a energia nuclear impede o investimento em modelos energéticos alternativos. Já Francisco Rondinelli, diretor da Associação Brasileira de Energia Nuclear – ABEN, defende a manutenção de usinas nucleares no Brasil e afirma que os riscos de acidentes são muito pequenos. O físico Aquilino Senra Martinez também é favorável à energia nuclear e enfatiza que as novas tecnologias proporcionarão a ampliação desse modelo energético nos próximos anos. Na opinião do físico Heitor Scalambrini Costa, o Brasil “tem recursos suficientes para atender as necessidades energéticas até 2030 ou 2040 sem fazer uso na energia nuclear”. Para o conselheiro da Sociedade Angrense de Proteção Ecológica – Sapê, José Rafael Ribeiro, os empreendimentos nucleares Angra I, II e III desconsideram a população local. A falsa imunidade das usinas nucleares é o tema debatido pelo engenheiro Ricardo Baitelo, membro do Greenpeace [do editorial].

:: Fukushima provoca revisão nuclear em escala global – Wilson Sobrinho: Carta Maior 20/03/2011
Um planeta pressionado por necessidades crescentes de energia e pela urgência de cortar as emissões de CO2 começa a se questionar o que deu errado e qual o futuro da energia nuclear após o acidente de Fukushima. Muito antes do evento japonês ter sido elevado para a categoria cinco, de sete possíveis, na Escala Internacional de Eventos Nucleares e Radioativos (o que objetivamente significa que as consequências do acidente têm implicações que vão além dos limites regionais), a crise já havia cruzado fronteiras. Veja a posição de alguns cientistas, jornalistas, ativistas sobre o assunto.

:: A próxima Nagasaki: o medo nuclear assombra o mundo – Yoichi Shimatsu – Global Research, em Carta Maior: 20/03/2011
Uma segunda Hiroshima poderia acontecer com o acidente nuclear no reator de Fukushima. Onde será a próxima Nagasaki? Nos EUA, com os seus 23 envelhecidos reatores de desenho idêntico aos de Fukushima? Na França, o país mais dependente de energia nuclear do mundo? Provavelmente não na Alemanha ou na Venezuela, que estão cortando os seus programas nucleares; nem no Reino Unido, o líder mundial de conversão de energia eólica captada no mar. Nem mesmo na China, um modelo em energia solar que está revendo seus planos para novas usinas nucleares. Muitas pessoas também estão imaginando: como pode que a única nação a experimentar um bombardeio atômico possa ter se tornado tão confiante em energia nuclear? A resposta é ao mesmo tempo simples e complicada. Nas economias modernas, a energia que faz funcionar máquinas está interligada com a segurança nacional, a política externa e a guerra.

::The Next Nagasaki: Nuclear Fears Stalk The World – Yoichi Shimatsu: Global Research – March 19, 2011
A second Hiroshima is happening with the partial meltdowns at Fukushima 1 nuclear reactors. We can only hope the eventual toll in lives comes nowhere near close to that of the world’s first atomic catastrophe. The international community is now asking: Where will be the next Nagasaki? In the US with its 23 aging reactors of identical design as Fukushima’s GE Mark 1 reactors, along with another dozen more of slightly modified design? In France, the world’s most nuclear-dependent country? Probably not in Germany or Venezuela, which are cutting back their nuclear programs, nor Britain, the world leader in conversion to offshore wind power. Or even China, a solar-energy paragon now scaling back plans for new nuclear plants. Many people are also wondering: How can the only nation that ever experienced atomic bombings become so trusting in nuclear energy? The answer is both simple and complicated. In the modern economy, the energy to run machines is intertwined with national security, foreign policy and warfare.

:: Uma advertência ao mundo – Amy Goodman: Democracy Now, em Carta Maior: 18/03/2011
Ao descrever a devastação em uma cidade do Japão, um jornalista escreveu: “É como se uma patrola gigante tivesse passado por cima e arrasado tudo o que existia. Escrevo sobre estes fatos como uma advertência ao mundo”. O jornalista era Wilfred Burchett, que escrevia desde Hiroshima, Japão, em 5 de setembro de 1945. Burchet foi o primeiro jornalista do Ocidente a chegar a Hiroshima após o lançamento da bomba atômica. Informou sobre uma estranha enfermidade que seguia matando as pessoas, inclusive um mês depois desse primeiro e letal uso de armas nucleares contra seres humanos. Suas palavras podiam perfeitamente descrever as cenas de aniquilação que acabam de se verificar no noroeste do Japão. Devido ao agravamento da catástrofe na central nuclear de Fukushima, sua grave advertência ao mundo segue mais do que vigente. O desastre se aprofunda no complexo nuclear de Fukushima após o maior terremoto da história do Japão e o tsunami que o sucedeu, deixando milhares de mortos.

:: A Warning to the World – Amy Goodman: Democracy Now: March 16, 2011
A reporter, describing the devastation of one city in Japan, wrote: “It looks as if a monster steamroller had passed over it and squashed it out of existence. I write these facts … as a warning to the world.” The reporter was Wilfred Burchett, writing from Hiroshima, Japan, on Sept. 5, 1945. Burchett was the first Western reporter to make it to Hiroshima after the atomic bomb was dropped there. He reported on the strange illness that continued to kill people, even a full month after that first, dreadful use of nuclear weapons against humans. His words could well describe the scenes of annihilation in northeastern Japan today. Given the worsening catastrophe at the Fukushima nuclear power plant, his grave warning to the world remains all too relevant.

:: A sociedade atual e a metafísica da destruição

:: Japón admite fugas radiactivas “que pueden afectar a la salud” tras un incendio y una nueva explosión en Fukushima – El País: 15/03/2011

:: Nível de radiação sobe após explosão e já ‘pode afetar a saúde’ – BBC Brasil: 15/03/2011

:: Japan nuclear crisis and tsunami: live updates – The Guardian: 15/03/2011

:: Twitter

A sociedade atual e a metafísica da destruição

Tragédias naturais expõem perda da noção de limite

Nas catástrofes atuais [como a do Japão – 11/03/2011], parece que vivemos um paradoxo: se, por um lado, temos um desenvolvimento vertiginoso dos meios de comunicação, por outro, a qualidade da reflexão sobre tais acontecimentos parece ter empobrecido, se comparamos com o tipo de debate gerado pelo terremoto de Lisboa, no século XVIII, que envolveu alguns dos principais pensadores da época. A humanidade está bordejando todos os limites perigosos do planeta Terra e se aproxima cada vez mais de áreas de riscos, como bordas de vulcões e regiões altamente sísmicas, construindo inclusive usinas nucleares nestas áreas. A idéia de limite se perdeu e a maioria das pessoas não parece muito preocupada com isso. A Terra e a natureza não são prioridades para a sociedade contemporânea. Propagandas de bancos, operadoras de cartões de crédito e empresas telefônicas fazem a apologia do mundo sem limites e sem fronteiras, do consumidor que pode tudo. Kant já refletia sobre nossos limites.

O artigo é de Marco Aurélio Weissheimer e foi publicado por Carta Maior em 12/03/2011.

Leia o texto completo.

Atualização: Japão: níveis de radiação disparam após incêndio e explosão em Fukushima – Folha: 15/03/2011 04h30

Leia Mais:
Terremoto no Japão 2011: Especial Folha
Fotos do terremoto que atingiu o Japão
Imagens de satélite mostram Japão antes e depois do terremoto do dia 11 de março de 2011
O Japão pode estar próximo de um acidente nuclear grave

Ecologia: consciência e responsabilidade

O tema central da REB 70, fascículo 277, de janeiro de 2010 é Ecologia: o cuidado pela vida.

Os artigos:
Juan Antonio Mejia Guerra – Dimensões da crise ecológica
Guillermo Kerber – Justiça climática
José Manuel F. Salinas – Pastoral ecológica. Recursos pedagógicos
Faustino Teixeira – O sentido místico da consciência planetária

Negacionistas climáticos no Brasil e nos EUA

Ceticismo climático não “pega” no Brasil

Por Reinaldo José Lopes

O ceticismo climático, como é conhecida a corrente de pensamento que nega a existência do aquecimento global ou, pelo menos, o papel do homem nesse fenômeno, não “pegou” no Brasil, indica nova pesquisa Datafolha. Mais de 90% dos brasileiros aceitam que o aquecimento é real e, para 75% dos entrevistados, as atividades humanas contribuem “muito” para as mudanças climáticas [enquanto isso o ceticismo climático atinge recorde nos EUA, diz pesquisa].

Os dados, obtidos após entrevistas com 2.600 pessoas em 144 municípios de todas as regiões do país, contrastam com os ataques sofridos pela ciência da mudança climática desde o fim do ano passado -ataques que, em países como os EUA e o Reino Unido, fortaleceram o ceticismo sobre o aquecimento global entre a população.

Os céticos ou negacionistas climáticos, como também são conhecidos, nunca tiveram tanto espaço nos meios de comunicação mundo afora quanto nos últimos meses. A ofensiva desses grupos começou com o chamado “Climagate”, como ficou conhecido o vazamento de e-mails dos servidores da Universidade de East Anglia (Reino Unido). As mensagens documentavam anos de correspondência entre alguns dos principais climatologistas do mundo, e os negacionistas viram nelas indícios de que esses pesquisadores teriam tentado manipular dados, ocultá-los de seus opositores ou impedir que eles publicassem visões “alternativas” do tema em revistas científicas respeitadas…

Leia o texto completo.

Fonte: Folha Online: 21/04/2010 – 11h11

Leia Mais:
Petroleira dos EUA deu US$ 50 mi a céticos do clima – Folha Online: 01/04/2010 – 09h34