Superando obstáculos nas leituras de Jeremias

Superando obstáculos nas leituras de Jeremias. Estudos Bíblicos, Petrópolis, n. 107, p. 50-62, 2010.

Nos anos 90 publiquei Nascido Profeta: a vocação de Jeremias. São Paulo: Paulus, 1992. Neste livro trato da vida Jeremias a partir de sua vocação, narrada em Jr 1,4-19.

E, em determinado ponto, a questão do “ser profeta” precisou ser colocada. E não só em 600 a.C., mas também hoje. Podemos falar de profetas e profecia hoje? Vale a pena ser profeta? Como ler os profetas hoje? Como ler Jeremias hoje? Hoje, retomo estas questões.

O mundo mudou muito, contudo as crises vividas por Jeremias ainda acontecem. Em contextos diferentes, é claro. Mas ninguém pode negar que os problemas da opressão, do domínio, da manipulação da religião, da falsa consciência são mais atuais do que nunca. E é aí que entra Jeremias: ele pode, com suas palavras tão antigas e tão atuais, nos ajudar a enfrentar as agudas situações de crise neste terceiro milênio.

Isto depende, porém, de um enfoque correto, de uma abordagem adequada dos textos de Jeremias. O que nem sempre é fácil. Persistem ainda muitos obstáculos. Que, curiosamente, não vêm da antiguidade e da complexidade dos textos do profeta, mas de nossa época e de nosso olhar: há toda uma mentalidade, uma secular visão de mundo que nos domina, de tal modo que quase sempre a sobrepomos ao texto bíblico, ocultando o seu sentido original e inutilizando-o frente aos problemas reais do mundo atual.

Por isso, o que aqui proponho é a abordagem de alguns dos obstáculos hermenêuticos mais comuns, nos quais constantemente tropeçamos quando lemos Jeremias. O filósofo francês da ciência Gaston Bachelard (1884-1962) trabalhou de maneira muito interessante a questão dos obstáculos epistemológicos, noção na qual me inspirei para falar de obstáculos hermenêuticos.

Bachelard explica: “Quando se procuram as condições psicológicas do progresso da ciência, logo se chega à convicção de que é em termos de obstáculos que o problema do conhecimento científico deve ser colocado. E não se trata de considerar obstáculos externos, como a complexidade e a fugacidade dos fenômenos, nem de incriminar a fragilidade dos sentidos e do espírito humano: é no âmago do próprio ato de conhecer que aparecem, por uma espécie de imperativo funcional, lentidões e conflitos. É aí que mostraremos causas de estagnação e até de regressão, detectaremos causas de inércia às quais daremos o nome de obstáculos epistemológicos. O conhecimento do real é luz que sempre projeta algumas sombras. Nunca é imediato e pleno. As revelações do real são recorrentes. O real nunca é ‘o que se poderia achar’ mas é sempre o que se deveria ter pensado. O pensamento empírico torna-se claro depois, quando o conjunto de argumentos fica estabelecido. Ao retomar um passado cheio de erros, encontra-se a verdade num autêntico arrependimento intelectual. No fundo, o ato de conhecer dá-se contra um conhecimento anterior, destruindo conhecimentos mal estabelecidos”.

Creio que podemos considerar os obstáculos hermenêuticos, a partir do que foi dito, como armadilhas do pensamento. Isto servirá de alerta e alarme para nós. Pois só uma constante vigilância ideológica manterá aberta a nossa mente para a experiência da criação do sentido que acontece na operação de leitura dos textos proféticos.

Esta é a introdução do artigo. O artigo pode ser lido aqui. O sumário deste número de Estudos Bíblicos pode ser visto aqui.

Leia Mais:
Sobre minhas publicações [links para todos os artigos publicados]

A ignorância continua atrevida e polifacética

Quem gostava de dizer que a ignorância é atrevida e polifacética era o valadarense romanizado Juarez Dutra, meu amigo, bibliotecário do Colégio Pio Brasileiro nos meus tempos de estudante em Roma. Ele dizia que a frase era de Zaratustra – aquele famoso “amigo do Nietzsche” -, quando, na verdade, era uma boa invenção dele mesmo, para ser dita diante de um absurdo desmedido. Daqueles que a gente é obrigado a ouvir com certa frequência…

Pois veja:

  • 71,30% acreditam que Fábio Luís Lula da Silva, um dos filhos do ex-presidente Lula, é sócio da gigante de alimentos Friboi
  • 64,10% acham que o Partido dos Trabalhadores pretende implantar uma ditadura comunista no Brasil
  • 70,90% entendem que a política de cotas nas universidades gera mais racismo
  • 53,20% juram que a facção criminosa PCC é um braço armado do Partido dos Trabalhadores
  • 60,40% acham que o programa bolsa-família “só financia preguiçoso”
  • 42,60% acreditam que o PT trouxe 50 mil haitianos para votar em Dilma Rousseff nas últimas eleições
  • 55,90% dizem que o Foro de São Paulo quer criar uma ditadura bolivariana no Brasil
  • 85,30% acham que os desvios da Petrobras são o maior caso de corrupção da história do Brasil

Quem e quando? Na Paulista. Em 12.04.2015. Na maioria (52,70%) homens, brancos (77,40%), com educação superior completa (68,50%), idade acima de 45 anos e classes de renda A e B.

A base que os defensores do impeachment da presidente Dilma Rousseff chamam de “apoio popular” é formada por cidadãos de perfil extremamente conservador, propensos a acreditar em mitos urbanos e com baixo grau de cultura política. Sob orientação do filósofo Pablo Ortellado, da USP, e da socióloga Esther Solano, da Unifesp, dezenas de pesquisadores organizados pelo núcleo de debates Matilha Cultural, de São Paulo, entrevistaram 571 participantes da manifestação de domingo (12/4), em toda a extensão da Avenida Paulista. O resultado é estarrecedor. E esclarecedor.

Leia: Breviário do perfeito midiota – Luciano Martins Costa: Observatório da Imprensa – 16/04/2015.

Mas nem tudo está perdido. Ainda. Para recuperar sua confiança no Homo sapiens, leia, por exemplo, os textos de Roberto Mangabeira Unger.

Leia Mais:
Protests in Brazil: Tropical tea party – The Economist: Apr 18th 2015. Também aqui.
Economist trata manifestações como Tea Party brasileiro – Brasil 24/7: 17.04.2015
Tea Party: extrema-direita furiosa

Resenhas na RBL – 10.04.2015

As seguintes resenhas foram recentemente publicadas pela Review of Biblical Literature:

Angelika Berlejung, Jan Dietrich, and Joachim Friedrich Quack, eds.
Menschenbilder und Körperkonzepte im Alten Israel, in Ägypten und im Alten Orient
Reviewed by Mark W. Hamilton

William P. Brown
Wisdom’s Wonder: Character, Creation, and Crisis in the Bible’s Wisdom Literature
Reviewed by James Alfred Loader

Martin J. Buss
Toward Understanding the Hebrew Canon: A Form-Critical Approach
Reviewed by Colin Toffelmire

Nuria Calduch-Benages, ed.
Wisdom for Life: Essays Offered to Honor Prof. Maurice Gilbert, SJ, on the Occasion of His Eightieth Birthday
Reviewed by Katharine Dell

Volkmar Fritz
The Emergence of Israel in the Twelfth and Eleventh Centuries B.C.E.
Reviewed by Lester L. Grabbe

Hadi Ghantous
The Elijah-Hazael Paradigm and the Kingdom of Israel: The Politics of God in Ancient Syria-Palestine
Reviewed by Aren M. Maeir

Addison Hodges Hart
Taking Jesus at His Word: What Jesus Really Said in the Sermon on the Mount
Reviewed by Joshua Chatraw

Steven L. McKenzie and John Kaltner, eds.
New Meanings for Ancient Texts: Recent Approaches to Biblical Criticism and Their Applications
Reviewed by Emmanuel Nathan

R. W. L. Moberly
Old Testament Theology: Reading the Hebrew Bible as Christian Scripture
Reviewed by Trent C. Butler
Reviewed by Wilhelm J. Wessels

Roger Mohrlang
Paul and His Life-Transforming Theology: A Concise Introduction
Reviewed by Bas van Os

Francis J. Moloney
The Resurrection of the Messiah: A Narrative Commentary on the Resurrection Accounts in the Four Gospels
Reviewed by Richard I. Pervo

Joy A. Schroeder
Deborah’s Daughters: Gender Politics and Biblical Interpretation
Reviewed by Lena-Sofia Tiemeyer

Dennis E. Smith and Joseph B. Tyson, eds.
Acts and Christian Beginnings: The Acts Seminar Report
Reviewed by Susana Funsten

William J. Subash
The Dreams of Matthew 1:18–2:23: Tradition, Form, and Theological Investigation
Reviewed by Bart J. Koet

>> Visite: Review of Biblical Literature Blog

Resenhas na RBL – 03.04.2015

As seguintes resenhas foram recentemente publicadas pela Review of Biblical Literature:

Itzhak Benyamini
Narcissist Universalism: A Psychoanalytic Reading of Paul’s Epistles
Reviewed by Kari Syreeni

Wim M. de Bruin
Isaiah 1–12 as Written and Read in Antiquity
Reviewed by Ibolya Balla

Trevor J. Burke and Brian S. Rosner, eds.
Paul as Missionary: Identity, Activity, Theology, and Practice
Reviewed by Ronald R. Clark

J. Patout Burns Jr.
Romans: Interpreted by Early Christian Commentators
Reviewed by Daniel Patte
Reviewed by Adam Ployd

Beverly Roberts Gaventa, ed.
Apocalyptic Paul: Cosmos and Anthropos in Romans 5–8
Reviewed by Timothy Gombis

Barbara Green
Jeremiah and God’s Plans of Well-Being
Reviewed by Lissa M. Wray Beal

Richard H. Hiers
Women’s Rights and the Bible: Implications for Christian Ethics and Social Policy
Reviewed by L. Juliana Claassens

William S. Kurz
Acts of the Apostles
Reviewed by Thomas E. Phillips
Reviewed by Troy M. Troftgruben

A. James Murphy
Kids and Kingdom: The Precarious Presence of Children in the Synoptic Gospels
Reviewed by Marianne Blickenstaff

Ruth Poser
Das Ezechielbuch als Trauma-Literatur
Reviewed by Michael S. Moore

Robert M. Price
The Amazing Colossal Apostle: The Search for the Historical Paul
Reviewed by Corneliu Constantineanu
Reviewed by Glenn E. Snyder

Ephraim Stern
The Material Culture of the Northern Sea Peoples in Israel
Reviewed by Raz Kletter

>> Visite: Review of Biblical Literature Blog

Resenhas na RBL – 27.03.2015

As seguintes resenhas foram recentemente publicadas pela Review of Biblical Literature:

Miryam T. Brand
Evil Within and Without: The Source of Sin and Its Nature as Portrayed in Second Temple Literature
Reviewed by Rodney A. Werline

Ronald E. Clements
Jerusalem and the Nations: Studies in the Book of Isaiah
Reviewed by Bo H. Lim

John A. Cook and Robert D. Holmstedt
Beginning Biblical Hebrew: A Grammar and Illustrated Reader
Reviewed by Bálint Károly Zabán

Jason von Ehrenkrook
Sculpting Idolatry in Flavian Rome: (An)Iconic Rhetoric in the Writings of Flavius Josephus
Reviewed by Patrick McCullough

David A. Fiensy and Ralph K. Hawkins, eds.
The Galilean Economy in the Time of Jesus
Reviewed by Ulrich Busse
Reviewed by Sarah E. Rollens

André Gagné and Jean-François Racine, eds.
En marge du canon: Études sur les écrits apocryphes juifs et chrétiens
Reviewed by Edmon L. Gallagher

Jonathan S. Greer
Dinner at Dan: Biblical and Archaeological Evidence for Sacred Feasts at Iron Age II Tel Dan and Their Significance
Reviewed by Aren M. Maeir

Helen R. Jacobus, Anne Katrine de Hemmer Gudme, and Philippe Guillaume, eds.
Studies on Magic and Divination in the Biblical World
Reviewed by Craig A. Evans

David Marcus
Scribal Wit: Aramaic Mnemonics in the Leningrad Codex
Reviewed by Christopher Dost

Susan Marks
First Came Marriage: The Rabbinic Appropriation of Early Jewish Wedding Ritual
Reviewed by Joshua Schwartz

David R. Nienhuis and Robert W. Wall
Reading the Epistles of James, Peter, John and Jude as Scripture: The Shaping and Shape of a Canonical Collection
Reviewed by John Kloppenborg

John Painter and David A. deSilva
James and Jude
Reviewed by Darian Lockett

Luis Sánchez Navarro
Escudriñar las Escrituras: Verbum Domini y la interpretación bíblica
Reviewed by Jeffrey L. Morrow

C. S. Song
In the Beginning Were Stories, Not Texts: Story Theology
Reviewed by Michelle J. Morris

>> Visite: Review of Biblical Literature Blog