Outros depoimentos sobre José Comblin: 1923-2011

:: Comblin, o profeta da ironia afetuosa – Marcelo Barros: Adital – 31/03/2011
Hoje saí da UTI de um hospital de Olinda, no qual me abriram o peito e me recauchutaram o coração fragilizado, com duas pontes de safena. No reencontro com a vida, ainda no leito de uma enfermaria, fico sabendo da partida do padre José Comblin, meu velho professor de Teologia e amigo de tantos anos e companheiro de lutas e esperanças. A um teólogo de fama mundial e de projeção pastoral como foi o padre Comblin, não faltarão testemunhos de muitos irmãos e irmãs que com ele conviveram e trabalharam por tantos anos. Eu fui apenas um dos seus alunos em todo o curso de Teologia e nem pertenci ao grupo mais ligado a ele na Teologia da Enxada ou mesmo no instituto de vida missionária que ele animava. Entretanto, fui marcado por sua figura e sua doutrina e tenho algumas experiências próprias que podem ser úteis que agora sejam recordadas. Há pouco mais de uma semana, escrevi um pequeno artigo, defendendo a atualidade e a pertinência de sua profecia eclesial e popular. Ele me respondeu com uma breve mensagem de agradecimento e depois me mandou um texto maior explicando suas críticas ao estilo atual do poder na Igreja Católica. Conheci o padre Comblin quando ele ainda era muito jovem, em 1964. Dom Hélder Câmara, então novo arcebispo de Olinda e Recife, trouxera uma equipe célebre de professores de Teologia. Entre eles estava o padre Comblin que, durante seus primeiros anos no Nordeste, ficou hospedado no mosteiro dos beneditinos. Naqueles anos, justamente, eu entrei no Mosteiro com a ânsia de renovação que motivava minha geração. Apesar de ser o tempo em que o Concílio Vaticano II propunha para a Igreja um novo Pentecostes, a maioria dos monges se apegava às velhas tradições. Apesar de ser muito discreto e viver outras preocupações pastorais, Comblin não deixava de ser irônico e quase sarcástico. E aquilo me atraía. No meu tempo de noviciado, li em francês “O Cristo no Apocalipse” onde se vê um Comblin exegeta e pouco conhecido. Li também, já em português “A Ressurreição”, um belo livro da Herder no qual ele, antes do Vaticano II, sustentava que o fato teológico mais marcante para o século XX tinha sido a revalorização teológica e espiritual do mistério pascal e da ressurreição de Jesus. Quando comecei a fazer Teologia no Seminário de Camaragibe, ele era o coordenador do curso. Na minha juventude, eu o achava contraditório. De um lado, ele ensinava uma teologia profunda, mas tradicional (não tradicionalista) e eu compreendia pouco isso. Esperava dele intuições inventivas e estas não apareciam, ao menos para mim. Sei que, neste tempo, ele produziu obras impressionantes como Théologie de la Paix, Théologie de la Ville e um estudo sobre Catolicismo Popular no Brasil. Mas, na época, não tive acesso a estas obras. Suas aulas eram dadas em um tom monocórdio, só interrompidas aqui e ali pelas risadas de alunos que festejavam as ironias do Comblin, aparentemente demolidoras, mas no fundo construtivas. Mais tarde, em 1968, o Instituto de Teologia do Recife nomeia uma equipe de três professores e três alunos para elaborar uma proposta de nova temática e nova metodologia teológica. O coordenador da equipe era Comblin e eu fazia parte dos três alunos que tinham de discutir com ele as propostas dos alunos. Eu tinha a sensação de que ele mal nos escutava, mas me surpreendi quando, depois de muitos debates ácidos, ele assumiu nossas propostas e estas foram, em sua maioria, implementadas. No mesmo ano, um escrito interno com o qual Comblin preparava a conferência episcopal de Medellin e propunha uma revolução social, extravasou para a imprensa. Ele que tinha ido a Europa foi proibido pela ditadura militar de voltar ao Brasil. Quando lhe perguntaram quem poderia, até o final do ano, coordenar o seu curso de Teologia dos Sacramentos, (estávamos em agosto), tive a surpresa e o orgulho de saber que ele escolhera o meu nome. Eu era apenas um dos alunos da classe do terceiro ano. A partir daí, sim, eu o assumi como um mestre de vida e procurava ler e estudar tudo que ele escrevia. A partir de então, descobri como ele inovava sua doutrina. Seu livro em dois volumes “Teologia da Revolução” foi meu batismo nos caminhos do que depois chamaríamos teologia da libertação. Nos anos 70, ele estava fora do Brasil e tivemos poucos contatos. Nos anos 80, o reencontrei mais velho e o achei mais aberto e comunicativo, sempre muito atento aos amigos. Um homem fiel às amizades e às relações. Era um intelectual de erudição raríssima, capaz de dissertar sobre Teologia, Política, Bíblia, Economia e muitos outros assuntos com uma competência incrível, ao mesmo tempo que punha em prática sua visão de uma teologia popular e seu carinho por um instituto para formar padres, missionários/as e religiosos /as que viessem do campo e não precisassem sair do meio rural. Algumas discussões com ele nortearam-me a vida. Por exemplo, a tentativa de libertar a Teologia cristã de sua base helenista (filosófica grega) ainda muito forte em nossa Igreja. Também, me impressionavam sempre a sua capacidade de criticar livremente a estrutura monárquica e absolutista do Vaticano. Mesmo um interesse imenso por uma vida religiosa mais popular e mais inserida, menos centrada nas estruturas das congregações. Nos últimos anos em que vivi no mosteiro de Goiás, sempre passou a Páscoa conosco. No Brasil, temos a graça de contar com teólogos e teólogas dos mais abertos e criativos do mundo, mas a contribuição própria do padre Comblin tem sido sempre a de uma liberdade interior de dizer o que pensa e ser um profeta crítico e irônico sempre capaz de lera história e as estruturas eclesiásticas a partir dos empobrecidos e das grandes causas da América Latina. Em 2006, com Dom Tomás Balduíno e com ele, fomos observadores internacionais das eleições presidenciais da Venezuela e, bem mais do que outros companheiros, eu o vi muito aberto ao bolivarianismo. Quem o conheceu de perto sabe que sua ironia era profunda, mas não era de ruptura e sim de afeição. Como poucas pessoas, é o caso de Dom Helder Câmara, Comblin conseguiu ser cada dia mais aberto e crítico à medida que seus anos avançaram. Que sua herança teológica e profética seja por nós mantida e continuada.

 

:: Preito de gratidão ao Pe. José Comblin – Luís Weel: Adital – 01/04/2011
O que dizer neste momento do falecimento de Pe. José Comblin? Conheci este grande guerreiro antes de ver em pessoa. Nos anos de 1962-1966 estudei teologia no seminário diocesano da diocese de Haarlem (Holanda). Foi aí que encontrei um livro dele em holandês “Ik zag een nieuwe hemel en een nieuwe aarde”= (Vi um novo céu e uma nova terra). O livro me fez sonhar da perspectiva de uma nova era que estava para iniciar no tempo do Concílio Vaticano II. Nem de longe tinha consciência que o apóstolo João, querido de Jesus, tinha escrito o livro do apocalipse como carta de consolação às comunidades de cristãos oprimidos e perseguidos. A grande realidade do tempo de João é que a boa nova da grande alegria passa por um vale de lágrimas. “Quem semeia entre lágrimas, recolhe a cantar”. Empolgado com a perspectiva de uma igreja renovada e a chegada do Reino da Justiça e Paz, fraternidade e partilha, resolvi me oferecer para o serviço da missão. Os caminhos de Deus são misteriosos. Cheguei no Nordeste do Brasil em junho do ano 1970. Levei um grande susto ao ver e sentir os clamores dos oprimidos que como ovelhas eram abatidas e massacradas. Minha primeira tentação era, após cinco anos conforme o contrato entre os bispos, voltar para minha terra. Senti-me incapaz de enfrentar as inúmeras situações de miséria revoltante, brutalidade e morte sem sentido. Porém fiquei continuando, muitas vezes chorando e não querendo mais ouvir os gritos silenciosos de grandes multidões de pobres que não sabiam para onde ir e o que fazer para se libertarem. Naquela época não queria ser um turista que está aí para passear sem compromisso. Foi a partir dos anos de 1973 que aos poucos fui conhecer o Pe. José, que dedicava sua vida com inteligência, ciência, fortaleza e teimosia à causa dos marginalizados no campo, plantando a boa semente do Evangelho nos corações dos preferidos de Jesus, como por último plantou ainda uns dias atrás o pé de Pau Brasil para dar sombra à cova de sua sepultura. A imagem me faz lembrar o profeta Jonas, que, após o cumprimento da missão se sentia debaixo de uma árvore para ter sombra e contemplou que sua mensagem aos Ninivitas deu outros resultados que os esperados por ele. Ele ficou frustrado ainda mais quando a sombra que buscava debaixo da árvore desapareceu. A árvore secou. Sem dúvida vai demorar muito antes que o pau Brasil, plantado por Pe. José vai dar a sombra que está procurando. O pau Brasil cresce muito lento. Também podemos dizer que isso não importa. Paz do cemitério não é a verdadeira paz. A melodia de Luís Gonzaga ressoe na minha cabeça: “Minha vida é andar por este país, para ver se um dia descanso feliz, guardando as recordações das terras onde passei, andando pelos sertões e amigos que lá deixei… Não sinto dor ou saudade neste momento. Somente gratidão por sua coerência com o Evangelho e a vivência até o último suspiro com o projeto de Deus para com os pequenos desta terra. Rezo e espero que Deus me dê um pouco de sua coragem de perseverar até o fim no cumprimento da missão. Obrigado Pe. José por sua vida e seu exemplo. Pêsames para você Monica, companheira e servidora fiel que tem dedicado sua vida de serva humilde à causa da evangelização e apoio a Pe. José em todos os momentos. Sem dúvida é você que mais do que qualquer um vai sentir a ausência do nosso guerreiro. Só as palavras do Evangelho ajudam para passar pelo vale de sombras: “Não tenhas medo. Estou com você até os confins do tempo”. Ao acompanhar, daqui da Holanda, o enterro que está acontecendo por volta deste horário, ouço na minha mente a canção do salmo: “Se Deus nos levar pra casa do nosso exílio, isso será nosso grande sonho”. Adeus a todos.

 

:: A liberdade cristã: um dos núcleos da teologia de José Comblin. Entrevista especial com João Batista Libanio – IHU: 02/04/2011
Comblin reuniu várias qualidades fundamentais como teólogo que manifestam a força do seu pensamento e o peso da sua influência. Sem ser estritamente exegeta, tinha excelente formação bíblica. Produziu uma série de comentários bíblicos (Atos, epístolas de São Paulo), estudos profundos nesse campo e detalhada reflexão sobre a Palavra de Deus (A força da palavra, Ed. Vozes, 1986), não descuidando o leitor popular (Introdução geral ao comentário bíblico: leitura da Bblia na perspectiva dos pobres. Petrópolis: Vozes, 1985). Possuía vasta cultura histórica. Isso lhe dava segurança sobre o passado para analisar com rigor e seriedade o momento atual. Os adversários e desafetos ficavam desarmados diante das críticas que ele fazia, porque elas carregavam enorme peso histórico. Tinha aguda capacidade de análise das situações. Foi pioneiro na crítica da Ideologia da Segurança Nacional que desmascarou os regimes militares da América Latina e abriu os olhos da Igreja que se tinha embarcado no apoio a eles (A ideologia da segurança nacional: o poder militar na América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1973). Escreveu obras significativas que permanecem até hoje como referência. Os dois livros, publicados, em francês, sobre a teologia da revolução e da prática revolucionária marcaram momento na teologia contemporânea (Théologie de la révolution: théorie. Paris: Universitaires, 1974). E, a partir do olhar do nosso continente, foi um dos iniciadores da teologia da libertação e a projetou no cenário mundial. Na qualidade de professor de Lovaina, belga, europeu, a sua palavra em prol da teologia da libertação tinha maior força. Não se tratava de simples moda de países do Terceiro Mundo, mas recebia o impulso de figura do mundo teológico europeu. Nas críticas à Instituição eclesial e a certas práticas cristãs e doutrinais, baseava-se muito na teologia do Espírito Santo. Sem dúvida, desempenhou papel pioneiro na teologia, ao corrigir certo eclesiasticismo, apelando para a pessoa do Espírito Santo. Divulgou o famoso dito de que três brancuras na Igreja católica relegaram para segundo plano a figura do Espírito Santo: a hóstia, a Virgem Maria e o solidéu branco (do Papa). Ele retomou a longa tradição da Igreja anterior a tal deslocamento para acentuar a importância do Espírito Santo durante toda a história e, de modo especial, nos dias atuais (O Espírito Santo e a libertação: o Deus que liberta seu povo. Petrópolis: Vozes, 1987). A temática da liberdade cristã, fazendo eco ao livro de Lutero, constituiu importante núcleo de sua teologia. A ela, naturalmente, vinculava a pessoa de Jesus, sob o signo do homem livre em face do templo, do sábado, das formas religiosas e rituais de seu tempo. Tinha, por isso, preferência por São Paulo, sobre quem escreve livro simples, mas profundamente sugestivo, na perspectiva de homem que se sustentava com o trabalho das próprias mãos (Paulo: trabalho e missão. São Paulo: FTD, 1991). De maneira sistemática, ele produziu um breve curso de teologia para leigos que prestou e ainda presta serviço aos estudantes, publicado pelas editoras Paulinas sobre Jesus Cristo, Espírito Santo, Igreja e Sabedoria cristã. A cidade moderna com os desafios à fé e à pastoral constituiu-se-lhe preocupação constante. Em francês, publicou amplo e importante estudo sobre ela que apareceu em versão simplificada em português (Teologia da cidade. São Paulo: Paulinas, 1991), depois completado por outro pequeno e sugestivo livro (Viver na cidade: pistas para a pastoral urbana. São Paulo: Paulus, 1996). Imaginar o futuro para a fé cristã, para a Igreja, para a pastoral ofereceu-lhe campo de pensar utopias e a partir delas voltar-se para o presente e mostrar a distância entre ambos. Nessa linha escreveu livros de peso (Cristãos rumo ao século XXI: nova caminhada da libertação. São Paulo: Paulus, 1996; Desafios aos cristãos do século XXI. São Paulo: Paulus, 2000). A eclesiologia mereceu belo estudo volumoso sobre o Povo de Deus no espírito do Concílio Vaticano II (O povo de Deus. São Paulo: Paulus, 2002). Ele soube valorizar tal concílio e a pessoa do papa João XXIII e lamentar a perda de sua herança nas últimas décadas.

Leia a entrevista completa.

 

:: Pe. José Comblin, Pregador da Palavra de Deus – Domingos Zamagna: Adital – 04/04/2011
Acabo de participar da Missa de 7º dia em sufrágio do Pe. José Comblin. Presidida por Dom Angélico Sândalo, emérito de Blumenau, ao lado de outros bispos eméritos, foi realizada no Convento dos Dominicanos, em cuja Escola de Teologia (hoje intitulada Instituto Bartolomeu de Las Casas, afiliado à Pontifícia Universidade Santo Tomás de Aquino – Angelicum, em Roma) o Pe. Comblin lecionou durante mais de uma década. Ali fui aluno deste extraordinário mestre e, como centenas e milhares de pessoas, pude aprender com ele as maravilhas da fé cristã. Nossa amizade já durava 46 anos, quando recebi, da querida amiga comum Ana Flora Anderson, a notícia de seu falecimento. Falando dele para alunos ,dentre os quais muitos seminaristas, a maior parte nem sequer sabe quem foi este teólogo. Alguns se recordavam que sobre ele pairava uma proibição de dar conferências em instituições católicas, inclusive na PUC-SP…

Leia o texto completo.

 

:: O método do mestre José Comblin – Luiz Carlos Susin: IHU On-Line 04/04/2011
Quando morre um mestre, fica para os que o conheceram uma herança inelutável: a continuidade de seu ensinamento e ao mesmo tempo a pergunta: “quem pode substituir um mestre?” Na morte de José Comblin, um intelectual cristão, talvez muitos somados possam cobrir um pouco o vazio e dar continuidade a um modo tão radical de ser cristão e de ser intérprete dos caminhos do cristianismo e da humanidade. E o que, nesses dias de luto, mais me ocorre é a lembrança do método tão ao seu estilo. Kierkegaard escreveu sobre o verdadeiro mestre: conduz o discípulo à perplexidade, provocando a descoberta de suas falsidades como ponto de partida de seu caminho para a verdade e para a liberdade. Desde 1985 tive a ocasião de estar regularmente nos encontros da Associação de Teologia e Ciências da Religião, do Brasil, da qual fui presidente na virada de milênio, e de poder escutar perplexo as análises que nosso mestre, nosso “patriarca”, nas palavras de Leonardo Boff , recorrentemente era convidado a fazer para começarmos nossos congressos anuais. Dizíamos com o mesmo bom humor que ele mantinha inalterado, que se tratava de uma “metralhadora giratória”! Mas nós também o cercávamos por todos os lados e o cobríamos de questões. Essa “metralhadora giratória” não era aleatória ou gratuita e sem fundamentos, nem provinha de críticas que superassem a esperança e a paciência. Provinha de uma visão de grande alcance e de uma liberdade sem ideologias. Nem mesmo as mais delicadas e às vezes constrangedoras, as ideologias eclesiásticas. Como um médico concentrado no diagnóstico, ele passava pelos diferentes níveis da realidade humana: internacional, nacional, e nossa, dos teólogos. E por diferentes regiões: a política, a economia, os movimentos sociais, as igrejas, e até nossos pequenos mundinhos de sacristia e academia. Apalpava onde estava a dor, o sintoma, e então disparava o diagnóstico; às vezes usava o bisturi para dar o retoque. E a gente saia meio doído, meio tonto, buscando se localizar de novo, obrigando-nos a discutir, a pesar bem os argumentos, a retomar o fio da meada e alinhavar melhor as nossas ideias. Algo se sabia de antemão: Comblin nos obrigava a pensar, até por uma questão de sobrevivência! Ele não inventava, ele fazia uma leitura dos acontecimentos, dos movimentos da história, e colocava sua leitura diante de nossos olhos: dava o que pensar.

Leia o texto completo.

 

:: José Comblin: um desafio à intelligentzia brasileira – Leonardo Boff: Brasil de Fato – 04/04/2011, reproduzido por IHU On-Line: 05/04/2011
No dia 27 de março morreu aos 88 anos de idade perto de Salvador o teólogo da libertação José Comblin. Belga de nascimento, optou por trabalhar na América Latina, pois se dava conta de que o Cristianismo europeu era crepuscular e via em nosso Subcontinente espaço para a criatividade e um novo ensaio em contacto especialmente com a cultura popular. Ele encarnava o novo modo de fazer teologia, inaugurado pela Teologia da Libertação, que é ter um pé na miséria e outro na faculdade de teologia. Ou dito de outro modo: articular o grito do oprimido com a fé libertadora da mensagem de Jesus, partindo sempre da realidade contraditória e não de doutrinas e buscar coletivamente uma saida libertadora para ela (…) Ele é um dos melhores representantes do novo tipo de intelectual que caracteriza os teólogos da libertação e os agentes de pastoral que estão nesta caminhada: operar a troca de saberes, vale dizer, tomar a sério o saber popular, de experiências feito, banhado de suor e sangue, mas rico em sabedoria, e articulá-lo com o saber acadêmico, crítico e comprometido com as transformações sociais. Essa troca enriquece a uns e a outros. O intelectual repassa ao povo um saber que o ajuda avançar e o povo obriga o intelectual a pensar os problemas candentes e se enraizar no processo histórico. A Intelligentzia brasileira possui uma dívida social enorme, nunca saldada, para com os pobres e marginalizados. Em grande parte as universidades representam macroaparelhos de reprodução da sociedade discricionária e fábricas formadoras de quadros para o funcionamento do sistema imperante. Mas há de se reconhecer também, não obstante seus limites, o fato de que foi e é também um laboratório do pensamento contestatário e libertário. Mas não houve ainda um encontro profundo entre a universidade e a sociedade, fazendo uma aliança entre a inteligência acadêmica e a miséria popular. São mundos que caminham paralalelos e não são as extensões universitárias que irão cobrir esse fosso. Tem que ocorrer uma verdadeira troca de saberes e de experiências. Ignorante é aquele que imagina ser o povo ignorante. Este sabe muito e descobriu mil formas de viver e sobreviver numa sociedade que lhe é adversa. Se há um mérito cultural nos teólogos da libertação (eles existem aqui e pelo mundo afora e Roma não conseguiu exterminá-los) é terem feito este casamento. Por isso não se pode pensar num teólogo da libertação senão metido nos dois mundos, para juntos tentarem gestar uma sociedade mais equalitária que, no dialeto cristão, tenha mais bens do Reino que são justiça, dignidade, direito, solidariedade, compaixão e amor. O Padre José Comblin nos deixou o exemplo e o desafio.

Leia o texto completo.

 

:: O que José Comblin nos contou em 2007? – Eduardo Hoornaert: IHU On-Line: 05/04/2011
Por ocasião dos sessenta anos da ordenação sacerdotal de José Comblin, um bom grupo de amigos(as) e missionários(as) se reuniu no santuário de Ibiapina em Santa Fé (Arara), no brejo paraibano, para festejar a data, reatar os contactos, fortalecer a rede e reanimar o espírito. José tinha 85 anos e estava particularmente eufórico. Ele nos confidenciou detalhes sobre sua vida, algo que não costumava fazer.

Leia o texto completo.

 

:: Agradecimento a um mestre – IHU On-Line: 05/04/2011
No sábado, dia 2 de abril, na Igreja Santo Domingo, em São Paulo, foi celebrada da missa de 7º dia de falecimento do Padre José Comblin. A missa foi presidida por Dom Angélico Sândalo Bernardino, bispo emérito de Blumenau SC. Na celebração eucarística foi lida a mensagem “Agradecimento a um mestre”, assinada, entre outros, por 160 teólogos e teólogas, agentes de pastoral e bispos.

Leia a mensagem.

 

:: Comblin: pedagogo, profeta e santo. Entrevista especial com D. Sebastião Soares e D. Luiz Cappio – IHU On-Line: 08/04/2011
Pe. José Comblin vivia em Barra, no interior da Bahia, há dois anos. Escolheu viver lá porque achava que a diocese da cidade era uma das poucas que estava, efetivamente, ao lado dos pobres. D. Luiz Cappio conviveu com ele durante esses últimos anos de vida e conta, na entrevista que concedeu por telefone à IHU On-Line, sobre como foram esses últimos momentos da vida de Comblin. “Nós estabelecemos um entrosamento muito grande por ocasião do meu segundo jejum em Sobradinho, quando ele esteve lá comigo durante um tempo bastante grande, sendo muito solidário e muito fraterno na nossa luta contrária ao projeto de transposição de águas do rio São Francisco”, conta D. Cappio que, então convidou Comblin para residir na diocese de Barra. Dom Luiz Flávio Cappio vive na Bahia, onde está à frente da diocese de Barra. Em 2005 e 2007 fez jejum em protesto contra o projeto do governo federal de transposição do rio São Francisco. Em 2008, a organização Pax Christi Internacional (Bélgica) lhe deu o prêmio da Paz do mesmo ano, por sua luta em defesa da vida na região do São Francisco. Em 2009, recebeu o Prêmio Kant de Cidadão do Mundo, da Fundação Kant (Alemanha).

“Sem dúvida a morte de José Comblin é um momento de grande dor para a Igreja e particularmente para quem o conheceu mais de perto”. Dom Sebastião Armando Gameleira Soares, bispo da Diocese Anglicana do Recife, reconhece que falar postumamente sobre o grande teólogo e amigo é desafiador. Porém, “ouso acrescentar que é um grande momento de ressaltar a relevância da profecia na Igreja e na sociedade”. Ele também concedeu uma entrevista, por e-email, à IHU On-Line sobre Pe. Comblin. Nascido em Alagoas, Dom Sebastião Armando Gameleira Soares é bispo da Diocese Anglicana do Recife (região Nordeste), da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil. É mestre em teologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana, Roma, e em Ciências Bíblicas, pelo Instituto Bíblico de Roma, e em Filosofia, pela Universidade Lateranense, também em Roma. É também especialista em sociologia e bacharel em direito. Há mais de 25 anos, assessora o Centro de Estudos Bíblicos – Cebi, tendo assumido sua Direção Nacional e sua Coordenação Nacional do Programa de Formação, além da coordenação e da assessoria do Curso Extensivo de Formação de Biblistas. Também colabora na assessoria ao Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e à Educação Popular – Cesep, de São Paulo.

Confira a entrevista com Dom Cappio.

Confira a entrevista com Sebastião Gameleira Soares.

Print Friendly, PDF & Email

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.