Trégua põe uso da força em questão em Israel
Dois dias depois do início do cessar-fogo no conflito contra o grupo libanês Hezbollah, Israel começa a debater sobre o saldo da guerra.
Segundo pesquisas de opinião, a maioria dos israelenses acha que Israel não alcançou os objetivos estabelecidos pelo governo, quando decidiu iniciar uma ampla ofensiva no Libano após a captura de dois soldados israelenses pelo Hezbollah.
Analistas locais descrevem a guerra em termos como “derrota”, “fiasco”, ou no mínimo “uma série insuportável de falhas”.
Nem o primeiro-ministro Ehud Olmert usou a expressão “vitória” quando fez um balanço da guerra perante o Parlamento. Ele se limitou a falar de “ganhos significativos” para Israel com a resolução 1701 do Conselho de Segurança da ONU.
O sentimento de “fracasso” decorre principalmente do fato de que, apesar de toda a força que Israel aplicou contra o Hezbollah, o grupo ter mantido sua capacidade militar. Até o último dia da guerra, a militância xiita continuou lançando foguetes e mísseis contra o norte do país.
As promessas da liderança israelense de “desarmar o Hezbollah” e “eliminar a capacidade do grupo de ameaçar Israel” não se concretizaram.
Unilateralismo
Para vários analistas, os resultados desta guerra vão levar os israelenses a se confrontar com os limites da força e questionar o unilateralismo adotado por Ariel Sharon e seguido por seu sucessor, Ehud Olmert.
“Tento pensar quando foi a última vez que vi líderes israelenses conversando com líderes árabes sobre paz e tenho dificuldades de lembrar”, escreve o jornalista Daniel Ben Simon, em artigo no jornal Haaretz.
“Será que esta guerra desgraçada no Líbano e a matança sem fim em Gaza são conseqüência da falta de disposição para falar com nossos vizinhos? Quando foi a última vez que tentamos falar com os palestinos sobre seu futuro e o nosso? Quando tentamos averiguar com os libaneses a possibilidade de um acordo de paz assinado? Quando tentamos retomar as negociações interrompidas com a Síria?”, pergunta Ben Simon.
De acordo com Gideon Levy, também no jornal Haaretz, “o fracasso pode ter resultados positivos”.
“Se entendermos que aquilo que não funciona com força também não vai funcionar com mais força, esta guerra poderá nos levar à mesa de negociações.”
“Talvez mais israelenses se perguntem para que matamos e morremos e talvez entendam que tudo isso, novamente, foi em vão.”
“Mais força”
A frustração com o fracasso militar, porém, juntamente com uma insatisfação crescente de caráter social, também podem resultar no fortalecimento da direita e da concepção do uso de “mais força”.
Líderes de partidos de direita e pensadores conservadores afirmam que Israel não deveria ter concordado com o cessar-fogo antes de “uma vitória esmagadora”.
Em um artigo no jornal Maariv, o historiador Alexandre Blei, diretor do departamento de história de Israel da Universidade Judéia e Samaria, no assentamento de Ariel (Cisjordânia), pediu a renúncia do governo.
“O Estado de Israel, depois do duro golpe que recebeu de uma organização terrorista, espera por um líder de verdade”, disse Blei.
“Hoje o primeiro-ministro e o ministro da Defesa poderão contribuir para o bem do Estado se renunciarem imediatamente e depositarem a preparação do Exército e do Estado para a próxima guerra nas mãos de líderes melhores.”
O saldo do conflito com o Hezbollah levou Alexandre Blei a também criticar as retiradas do Líbano, em 2000, e da Faixa de Gaza, em 2005.
“O primeiro-ministro e o ministro da Defesa devem admitir, com coragem e honestidade, que a administração da guerra, a saída do Líbano e a retirada da Faixa de Gaza estavam erradas.”
O líder do partido de direita Likud, o ex-primeiro-ministro Binyamin Netaniahu, em discurso no Parlamento, defendeu o uso da força contra inimigos de Israel na região.
“Israel se confronta com a ameaça iraniana, que é uma grande ameaça existencial. Nessas circunstâncias, necessitamos de aliados, e o principal deles é os Estados Unidos”, disse.
“A aliança com os Estados Unidos é baseada em três elementos: valores conjuntos, interesses comuns, e o terceiro elemento importante é a força. A ampliação da força deve ser a primeira de nossas prioridades, a força militar, política e espiritual.”
Fonte: Guila Flint, de Tel Aviv – BBC Brasil: 16/08/2006