Mês da Bíblia 2010: Jonas, segundo Mercedes Lopes

LOPES, M. O livro de Jonas: Uma história de desencontro entre um profeta zangado e um Deus brincalhão. São Paulo: Paulus, 2010, 72 p. – ISBN 9788534931885

Por Tibério Teixeira da Silva Filho

Mercedes Lopes cursou Teologia e Bíblia na Universidad Bíblica Latinoamericana, em San José, Costa Rica (1995) e é Doutora em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2007). Além de outros grupos, assessora o CEBI.

Este livro sobre Jonas, preparado para o Mês da Bíblia, possui uma Introdução de 13 páginas e 8 roteiros para círculos bíblicos. Em cada roteiro ou encontro, temos:
. acolhida e oração inicial
. leitura da vida
. leitura do livro de Jonas
. momento orante
. organização do próximo encontro
. ampliação do assunto do livro de Jonas

Mercedes Lopes começa explicando que, embora colocado entre os livros proféticos, o livro de Jonas é uma novela que combina muito bem fábulas e realidade.

Para que? Para reagir ao nacionalismo fechado de Esdras e Neemias, “cujo projeto de reconstrução estava baseado em um tripé centralizador: a lei, a raça e o templo” (p. 5). Projeto que tinha o apoio do Império Persa, mas também de alguns profetas e sacerdotes. Então, diz Mercedes, “o livro de Jonas reage a esse fechamento de maneira muito bem-humorada, mostrando como era ridículo o fechamento do profeta Jonas e como era ampla e misericordiosa a postura de Javé diante dos estrangeiros” (p. 5).

Por tudo isso é que Mercedes já coloca, na primeira página de seu estudo, a data da escrita do livro de Jonas: século V a.C., quando existiam vários projetos de reconstrução de Jerusalém e Judá e variadas tendências estavam em confronto.

Mercedes vai dizer que, contra o projeto oficial de Esdras e Neemias, uma das tendências que então se destaca é a antiga tradição de mulheres contadoras de histórias. Um dos mais importantes livros da época que reporta esta tradição da luta das mulheres em seu cotidiano, defendendo o seu espaço e o espaço do povo mais pobre, é o livro de Rute.

Mas esta tradição, para Mercedes Lopes, pode ser vista também no livro de Jonas, “embora cada uma dessas histórias tenha seu enfoque próprio. Em Rute, a estrangeira amiga, o enfoque é o resgate dos direitos dos pobres. Em Jonas, o profeta fechado e mesquinho, o enfoque é a visão de Javé como Deus de ternura e misericórdia, que acolhe tanto judeus como estrangeiros” (p. 7).

Ao perguntar, em seguida, quem é Jonas, Mercedes vai dizer que a citação de Jonas, filho de Amati, da época do rei Jeroboão II, três séculos antes, é obviamente um recurso para dar autoridade a este escrito que denuncia o fechamento dos chefes religiosos que tentavam separar os judaítas de todas as pessoas de origem estrangeira. “Como havia profetas que apoiavam o projeto de Neemias e Esdras, o povo do interior de Judá começou uma reação bonita, bem refletida e bem-humorada, para fazer uma crítica a esse tipo de profecia” (p. 8).

Em seguida a autora descreve o enredo da novela de Jonas, para chegar à famosa conclusão aberta, pois a história de Jonas não tem um final padrão, como seria de se esperar para este gênero literário.

Mas, exatamente por isso, o livro tem uma força didática significativa, pois, sem ser uma parábola no sentido estrito, ele contém, no final, uma provocação ao estilo das parábolas “que ficam na memória da gente, questionando e intrigando (…) A historieta de Jonas (…) não somente faz pensar, mas tem cabides na memória do povo, onde as imagens ficam penduradas, provocando perguntas e levando todos a descobrir um sentido novo para suas vidas” (p. 11).

Cabides? Os navios que navegavam para longe, para Társis [na atual Espanha], as tempestades ameaçadoras e os constantes naufrágios, o grande peixe, o tamanho de Nínive e seu enorme poder, o implacável calor da região, a teimosia de Jonas, a misericórdia de Javé… Esta realidade era bem conhecida da vivência dos ouvintes e/ou das histórias que vinham dos antigos.

O esquema do livro é usado, com habilidade, pela autora para clarear a história, pois o livro é muito bem elaborado e estruturado. Mas, chamo a atenção para as 4 chaves de leitura sugeridas para o livro de Jonas:
. superação de preconceitos e fechamentos: gentios abertos – marinheiros e ninivitas – e judaítas, simbolizados por Jonas, fechados
. ser fonte de bênção para todos os povos: estão lembrados de Abraão em Gn 12?
. quando a gente é pequeno, tudo é grande: Judá era um minúsculo território dentro do enorme Império Persa… a palavra “grande” aparece com frequência, mas a grandeza de Javé, em sua misericórdia, é que, finalmente, se impõe
. momentos orantes expressam experiências profundas: marinheiros oram, Jonas ora, os ninivitas, violentos e opressores, que se convertem de suas más ações

Vi também, com interesse, os títulos de cada uma das ampliações existentes nos oito encontros, pois eles nos ajudam a compreender o enfoque dado ao estudo de Jonas por Mercedes Lopes:
. quem eram esses odiados “ninivitas”?
. a misericórdia é a expressão maior da fé
. as ressonâncias bíblicas da oração de Jonas
. a importância do perdão
. espiritualidade profética
. violência e paz
. amor – faísca de Deus – que nos transforma a partir de dentro (Ct 8,6)
. as relações de gênero presentes no livro dos Provérbios (uma das imagens femininas de Deus é a da Sabedoria em Provérbios)