Você já leu algum livro ou artigo de Ivo Storniolo?

Ivo Storniolo tratava a Bíblia com habilidade de refinado artista. Você já leu algum livro ou artigo de Ivo Storniolo, falecido em setembro deste ano?

Vá à página da Paulus e digite na busca o nome deste grande biblista para conhecer seus muitos escritos.

Se, por outro lado, quiser ver como Ivo irritava algumas pessoas, leia, por exemplo:

Claro que isto está no Google… é só buscar por “Ivo Storniolo”.

Mas eu queria colocar aqui algo que não está no Google e que costumo utilizar em minhas aulas de Pentateuco como introdução ao estudo mais detalhado de Ex 20,1-17 e Dt 5,6-21, que trazem o texto do Decálogo ou, mais popularmente, Dez Mandamentos.

Durante o ano de 1989, Ivo Storniolo escreveu uma sequência de artigos no folheto litúrgico-catequético O Domingo. O tema desses artigos foi Mandamentos, Hoje. Reproduzo aqui trechos da entrevista com Ivo Storniolo, publicada na Vida Pastoral 149 (novembro/dezembro de 1989), p. 27-29, sob o título “Mandamentos, ontem e hoje”

A partir daqui, palavras do Ivo:

Ao começar a tarefa, deparei-me com a questão da metodologia: como iria abordar esse tema tão importante? De um lado eu sabia que o povo cristão já conhecia os mandamentos pelo catecismo. De outro, sabia também que muitos ignoravam o texto bíblico. Decidi então tratar o assunto comparando o texto dos mandamentos segundo o catecismo com a versão dos mandamentos segundo a Bíblia. Pronto. Para muitos, pareceu que eu estava criticando o catecismo, e até querendo “jogar o catecismo no lixo”. Não foi isso que pretendi.

(…) Mas não bastava conhecer o texto bíblico. Os mandamentos não caíram do céu, como um presente aleatório de Deus. Presente a gente dá na hora certa, para comemorar algum grande acontecimento. Os mandamentos apareceram na hora certa, para coroar a grande luta que o povo de Deus fez para conquistar uma nova forma de viver, superando um sistema de sociedade que explorava e oprimia as pessoas. Os mandamentos eram a grande carta para construir uma nova forma de vida, a fim de que todos pudessem viver de forma digna, com igualdade fundamental, preservada pela justiça, que cria fraternidade e partilha. E aqui veio uma segunda incompreensão. As pessoas não estão muito acostumadas a pensar que os textos bíblicos têm raízes. Pensam que tudo caiu do céu, sem porquê nem para quê. A tarefa que o povo de Deus fez naquele tempo deve se repetir com os mandamentos. Enquanto não fazemos a mesma luta, os mandamentos ficam sendo apenas provocação para aquela luta fundamental entre a Vida e a Morte, que se repete a cada dia na vida do povo.

E aí vem um outro ponto que, creio, foi difícil de aceitar para muitos. Os mandamentos provocam. Se não vivemos numa sociedade igualitária, fundada na justiça, os mandamentos se tornam provocadores, inquietantes, e não nos deixam dormir “como anjos”.

(…) Enquanto introduzi e comentei os cinco primeiros mandamentos não houve reação (…). Do sexto mandamento para a frente a reação foi imediata. A cada mandamento uma classe determinada de pessoas se manifestou. Coisa engraçada. Meu comentário sobre o sexto mandamento afetou principalmente pessoas de Igreja. Quando expliquei que o texto bíblico falava de adultério e não de castidade recebi muita cartas perguntando: fora o adultério, a gente pode fazer tudo? Tudo o quê? Sabe lá Deus. Já prevendo isso, escrevi sobre a sexualidade, explicando bem que ela é função geradora de vida (…) Houve uma chuva de protestos (…) Aí escrevi sobre a castidade e, em boa ou má hora, achei de citar, juntos, Fernando Pessoa e Santo Agostinho. O primeiro dizendo que “tudo vale a pena, se a alma não é pequena”, e o outro: “ame e faça o que você quiser”. Foi a conta. Acharam que eu estava dizendo que pode tudo. Tudo o quê? Sei lá o que anda pela cabeça das pessoas, mas percebi que cada um lê o que quer, e não o que está escrito. A essas pessoas pergunto eu: Será que as pessoas com alma grande e que amam farão qualquer coisa? Para mim, alma é a interioridade de onde nasce o amor, faculdade que tem um discernimento superior para decidir o que fazer a cada momento, de forma muito mais perfeita do que qualquer lei ou regra. Mas a incompreensão foi grande. Será que essas pessoas perderam a alma, nunca a tiveram, ou nunca amaram?

(…) Quando escrevi sobre o sétimo mandamento a incompreensão começou [através dos grandes meios de comunicação]. Primeiro porque eu disse que “lucro é roubo puro”. Comecei a receber cartas de empresários, reclamando que o que eu dizia era generalização, que eles agora achavam duro ir à Igreja etc. Ora, nem direta nem indiretamente pretendi criticar pessoas. Pretendi fazer uma crítica estrutural ao sistema econômico em que vivemos. Um empresário entendeu isso muito bem, e me perguntou por escrito: “Como posso ser justo dentro de um sistema injusto?” Simplesmente não pode. Dentro de um sistema injusto, o máximo que se pode ser é honesto para com o sistema, e injusto para com as pessoas. Dentro dele todos nós nos tornamos, em grau maior ou menor, conivente com a injustiça, que é exatamente o contrário do projeto de Deus.

(…) Muita gente ficou irritada quando dei aquele exemplo (real) da prostituta que protege trombadinhas da polícia e depois os abençoa. Certa pessoa ficou chateadíssima e me escreveu, sem assinar: “Pronto. Agora as prostitutas viraram professoras de moral”. Pois é. Jesus dizia que as prostitutas vão nos preceder no Reino (Mt 21,31). E tem o caso daquela adúltera que, apesar de ser pega em flagrante, estava sozinha para ser linchada, e linchamento previsto por lei. E o adúltero, cadê ele? Esse nunca foi pego. O adúltero somos todos nós, hipócritas consumados, que temos a coragem de fazer Deus assinar as injustiças que cometemos. Jesus não deixou a coisa por menos, e até hoje ele continua a rabiscar no chão, desprezando nossas farisaicas questiúnculas… (leia Jo 8,1-11).

A celeuma, porém, aumentou quando escrevi que “Deus abençoa e legitima o roubo feito pelo pobre”. Pois é. Quando o pobre tem que roubar para comer, a coisa chegou às raias do desespero, e só quem passou por isso é capaz de compreender e compadecer-se (= sofrer junto), deplorando todo esse sistema social que nega os bens da vida a quem suou por ela. São Gregório Magno dizia que “quando damos aos indigentes algo de que necessitam, estamos lhes devolvendo o que lhes pertence e não estamos lhes dando o que é nosso. Estamos antes pagando uma dívida de justiça do que realizando uma obra de misericórdia” (ML 77,87). Nossa esmola é devolução, pagamento de dívida. E São João Crisóstomo diz que “o ladrão pobre nunca furta. Só retoma o que é seu”.

(…) Acho que há coisas muito graves [por trás dessas críticas]. Primeiro as pessoas em geral não lêem o que está escrito, e sim o que lhes convém e não abala o modo de viver em que se acomodaram. Quando algo lhes incomoda, elas tentam a todo custo dar um jeito. Todos nós temos a nossa fronteira de ego: quem está dentro dela é nosso amigo, pensa e vive como nós. Os que pensam e vivem de forma diferente são inimigos e devem ficar fora da fronteira. Não é a melhor solução, mas é a mais cômoda. Também temos a questão do nosso quadro de referências. Ele é uma espécie de superestrutura, formada lentamente pela educação familiar, escolar, social e pelos meios de comunicação, todos eles refletindo a consciência coletiva de um determinado tempo e de suas condições. Quando chega um fato novo, ele imediatamente se choca com o quadro de referência, e aí vem a questão. Ou o fato novo encontra um lugar ou não. É uma questão vital, porque o quadro de referência dirige nossa vida toda, nossa visão e ação no mundo. Quando o fato novo não se encaixa no quadro, tendemos ou a rejeitar o fato ou a mudar o quadro de referência. Mudar não é fácil. É conversão.

(…) A compreensão dos mandamentos é extremamente chocante para nós que não vivemos numa sociedade igualitária. Aí eles se tornam provocadores, e acabamos descobrindo que temos medo da fraternidade, da justiça, da partilha, enfim, de sermos humanos como Deus quer, isto é, à imagem e semelhança dele próprio (Gn 1,26-27).

Acho que isso explica um pouco as reações. Mas devo dizer também que recebi muitos elogios e muito apoio. Muita gente simples não escreve nem carta e nem em jornal, mas fala. E eu descubro então que há muita gente aberta para Deus e para o seu projeto. A certeza de compreensão de milhões de pessoas me encoraja a caminhar para a frente, sem desanimar com os obstáculos. Afinal, se Deus não desiste de acreditar em nós, apesar de tudo, por que é que nós vamos desistir?

Qual seria o nome antigo de Khirbet Qeiyafa?

Quem ainda não sabe do que se trata, deve ler primeiro algum texto em português sobre o assunto.

Como: Descoberta cidade que provaria existência do reino de Davi (Terra) ou Cientistas encontram registro ‘mais antigo de escrita hebraica’ (BBC Brasil) ou ainda Arqueólogo diz ter encontrado o mais antigo texto hebraico (Estadão) e depois ver cuidadosamente o que dizem os biblistas em seus blogs sobre mais este controvertido achado.

O Journal of Hebrew Scriptures publicou recentemente o seguinte artigo em seu volume 8, 2008: Nadav Na’aman, In Search of the Ancient Name of Khirbet Qeiyafa.


Abstract
This article discusses the identity of the recently excavated stronghold of Khirbet Qeiyafa, a tenth century BCE site located near the Valley of Elah, in the area where the story of the battle between David and Goliath takes place. There is also the story of a battle between Elhanan the Bethlehemite and Goliath of Gath that takes place at Gob (2 Sam 21:19). In light of a comparison of the two episodes I suggest identifying Khirbet Qeiyafa with biblical Gob. A close reading of the four anecdotes related in 2 Sam 21:15-22 clarifies the message of the early biblical tradition of four battles fought between Israelite and Philistine elite warriors that culminated in the advance of the Israelite troops to the gates of Philistine Gath.

O debate sobre a Inscrição de Joás continua

Em 2003 foi apresentada à imprensa uma inscrição em pedra, de proveniência desconhecida, reproduzindo um trecho de 2Reis 12, onde o rei Joás, do século IX a.C., fala da reforma do Templo de Jerusalém.

Naquela ocasião a Inscrição de Joás monopolizou o debate de especialistas, especialmente israelenses. Nas listas de discussão, não se falava de outra coisa: é falsa, é autêntica, há um trecho em hebraico moderno na inscrição, não há… Mas o que predominou foi o ceticismo! Veja aqui.

Mas recentemente, um grupo de especialistas está defendendo a autenticidade da Inscrição de Joás, baseado em dados das geociências.

Veja em The Bible and Interpretation, o artigo Archaeometric evidence for the authenticity of the Jehoash Inscription Tablet.